Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
261/06.1TTCVL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERNANDES DA SILVA
Descritores: TRANSFERÊNCIA DE TRABALHADOR
LOCAL DE TRABALHO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO PELO TRABALHADOR
PREJUÍZO SÉRIO
Data do Acordão: 10/11/2007
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DA COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 315º, NºS 2 E 5, E 443º, Nº 1, DO CÓDIGO DO TRABALHO
Sumário: I – Dispondo sobre a problemática geral da mobilidade geográfica, preceitua o artº 315º, nºs 2 e 5, do Código do Trabalho, que o empregador pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho se a alteração resultar da mudança, total ou parcial, do estabelecimento onde aquele presta serviço.
II – Deverá, então, o empregador custear as despesas do trabalhador impostas pela transferência, decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação e resultantes da mudança de residência.

III – Todavia, em tal caso pode o trabalhador resolver o contrato de trabalho se houver prejuízo sério, tendo direito, nessas circunstâncias, a receber a indemnização prevista no nº 1 do artº 443º.

IV – Por “prejuízo sério” terá de entender-se um juízo antecipado de probabilidade ou de adequação causal, que implica, contudo, a consideração de elementos de facto actuais.

Decisão Texto Integral:
Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:


I –

1 - A..., casado, desempregado, residente na Rua do Serrado, n.º 5, Ferro – Covilhã, instaurou acção declarativa na forma comum contra B..., com sede em Zona Industrial, Roligo, 4520-115 Espargo – St.ª Maria da Feira, pedindo que a ré seja condenada:
a) A reconhecer que o Autor trabalhou sob as suas ordens, autoridade e direcção;
b) A reconhecer que a antiguidade do Autor se conta desde Janeiro de 1995;
c) A reconhecer que o Autor pôs termo ao contrato de trabalho por resolução, com efeitos a 6 de Julho de 2006;
d) A pagar ao Autor a indemnização legal, no valor de 11.948,04 €;
e) A pagar ao Autor as férias e subsídio de férias vencidos no dia 1de Janeiro de 2006, no valor de 1.385,28 €;
f) A pagar ao Autor os proporcionais de férias, de subsídio de férias e de Natal, referentes ao trabalho prestado no ano de 2006, no valor de 1.073,13 €;
g) A pagar ao Autor as diferenças salariais no valor de 836,99 €;
h) A pagar ao Autor os juros vencidos e vincendos sobre cada uma das quantias reclamadas, à taxa supletiva legal, contados desde a data do vencimento de cada uma das quantias até ao seu integral pagamento;
Aos valores reclamados deverão abatidos 150,71 €, referentes às compras do Autor.
A fundamentar a sua pretensão, alegou sinteticamente que:
Trabalhou ininterruptamente sob as ordens autoridade e direcção da Ré de Janeiro de 1995 até 6 de Julho de 2006 nas instalações que a Ré tinha no Fundão.
Por carta datada de 12 de Junho de 2006, a Ré comunicou ao Autor a intenção de o transferir para a Zona Industrial do Roligo, em Santa Maria da Feira, pois pretendia encerrar, como efectivamente encerrou, as suas instalações no Fundão.
Dado que a Ré mantinha o propósito de encerrar as suas instalações no Fundão, o Autor, depois de analisar a sua situação, no dia 5 de Julho de 2006 comunicou à Ré que punha termo ao contrato com base no disposto no n.º 4 do artigo 315º do Código do Trabalho, ou seja, resolveu o seu contrato de trabalho por entender que a mudança de local de trabalho constituiria para si prejuízo sério, o que lhe confere direito à indemnização prevista no n.º 1 do artigo 443º do C.T.
A Ré fez constar do modelo Mod. 346 uma justificação para a cessão do contrato de trabalho que sabe não corresponder à verdade, obstando a que o autor esteja sem receber subsídio de desemprego, pese embora o tenha requerido, razão pela qual a indemnização deverá ser fixada em 45 dias de retribuição por cada ano.
O A. recebia à data da cessação do contrato de trabalho uma remuneração fixa no valor de 498,80 €.
Atendendo à sua categoria profissional, tinha direito, nos termos da regulamentação colectiva aplicável, a uma remuneração fixa que no mínimo teria de ser de 530,00 €, para além do valor da retribuição variável, cuja média, dos últimos 12 meses antes da cessação do contrato de trabalho, foi de 162,64 €.
A ré não lhe pagou as férias e subsídio de férias vencidos em 1 de Janeiro de 2006, bem como não lhe pagou os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal pelo trabalho prestado no ano da cessação do contrato.
A todos estes valores devem acrescer as diferenças salariais no valor de 836,13 € uma vez que ao Autor foram pagos mensalmente 498,80 € em vez dos devidos 530,00 € e o subsídio de Natal devia ainda integrar o valor médio da remuneração variável, ou seja 181,86 €.

Na audiência de partes não foi possível uma composição amigável do litígio pelo que se ordenou a notificação da ré para contestar.

2 - Contestou esta, alegando em resumo útil:
Apenas aceita e reconhece que o A. passou a trabalhar por sua conta a partir de Abril de 2005, não aceitando que a antiguidade do autor se possa contabilizar desde Janeiro de 1995.
O autor teve conhecimento, e confirmou, que ingressava «ex novo» nos quadros da ré a partir de tal data.
Entretanto, os negócios da Ré, que se encontra sedeada em Santa Maria da Feira, não correram tão bem no Fundão como esta projectara, o que determinou que, em 26 de Maio de 2006, reunisse os trabalhadores que possuía no Fundão, a fim de lhes dar conta de que, em salvaguarda dos interesses da empresa, iria encerrar as suas instalações no Fundão e proceder às correspondentes transferências de local de trabalho.
Nessa reunião foi explicado aos trabalhadores (incluindo o A.) que seriam assumidas pela empresa todas – rigorosamente todas – as despesas e encargos inerentes a tal mudança, incluindo, claro está, eventuais mudanças de residência e outras, ao que reafirmou por carta que enviou ao autor em 13 de Junho de 2006.
Na sequência de tal reunião e missiva, por carta datada de 27 de Junho de 2006 o aqui A. fez condicionar a aceitação da sua transferência, para Santa Maria da Feira, a que lhe fosse garantido pela Ré o pagamento de todas as despesas e encargos acrescidos que iria ter de suportar com a mudança.
Em resposta a tal carta asseverou-lhe a Ré, por telefone e por carta datada de 28 de Junho de 2006 que assumiria todas – rigorosamente todas – as despesas e encargos inerentes à transferência e mudança de local de trabalho, preenchendo e cumprindo deste modo a condição que o A. lhe havia estipulado para aceitação da transferência.
A resolução contratual operada pelo A. deve, assim, ser considerada ilegal.
Ainda que assim se não entenda, a resolução contratual deve ser considerada ilegítima e ilegal, por inexistência do chamado «prejuízo sério» na proposta mudança de local de trabalho.

Respondeu o autor concluindo da forma como o fizera na petição inicial.

3 – Prosseguiram os Autos a sua normal tramitação, com prolação da sentença, em que se decidiu julgar a acção procedente, por provada, condenando a R. a:
a) A reconhecer que o Autor trabalhou sob as suas ordens, autoridade e direcção;
b) A reconhecer que a antiguidade do Autor se conta desde Janeiro de 1995;
c) A reconhecer que o Autor pôs termo ao contrato de trabalho por resolução, com efeitos a 6 de Julho de 2006;
d) A pagar ao Autor a indemnização por antiguidade, no valor de 5.830,00 €;
e) A pagar ao Autor as férias e subsídio de férias vencidos no dia 1 de Janeiro de 2006, no valor de 1.385,28 €;
f) A pagar ao Autor os proporcionais de férias, de subsídio de férias e de Natal, referentes ao trabalho prestado no ano de 2006, no valor de 1.073,13 €;
g) A pagar ao Autor as diferenças salariais no valor de 836,99 €;
h) A pagar ao Autor os juros vencidos e vincendos sobre cada uma das quantias reclamadas, à taxa supletiva legal, contados desde a data do vencimento de cada uma das quantias até ao seu integral pagamento;
Aos valores acima referidos deverão abatidos 150,71 €, referentes ao valor das compras que o autor fez à ré.

4 – A R., irresignada, veio apelar.
Alegando, concluiu assim:
1. A decisão sobre a matéria de facto efectuou incorrecta interpretação e apreciação da prova produzida em audiência de julgamento ao caso sub judice, razão pela qual se impõe que a mesma seja impugnada e, consequentemente, alterada.

2. Os pontos de facto que a apelante considera incorrectamente julgados são os constantes dos pontos um, dois, três, quatro, vinte e sete e vinte e oito da fundamentação de facto, designadamente da matéria de facto dada como provada, bem como, outrossim, os últimos dois pontos da matéria de facto dada como não provada.

3. Os testemunhos ou depoimentos gravados, cotejados com os demais elementos probatórios do processo, impunham diversa decisão, sendo que são os seguintes: o que resulta do depoimento de parte prestado pelo apelado e o que sobressai do depoimento prestado pela testemunha José Azevedo.

4. Não se procede, como eventualmente se impunha, nem à transcrição dos excertos dos depoimentos referidos supra, nem sequer à correspondente remissão para os respectivos registos ou suportes magnéticos, porquanto da acta de julgamento de fls...dos autos, pura e simplesmente, não constam tais indicações ou referências.

5. Tal circunstância, para além de implicar para a aqui apelante graves dificuldades para um pleno e perfeito exercício do direito ao recurso, traduz, com todo o alto respeito que nos merece posição contrária, uma falta ou deficiência ao nível da documentação ou registo da audiência final e da prova nela produzida, que coarcta ou cerceia, restringe ou diminui, de forma inadmissível e ilegal, uma garantia que deveria ser cabalmente proporcionada à aqui apelante – a possibilidade do exercício de um verdadeiro e efectivo segundo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto.

6. O que configura, com o devido respeito, uma nulidade processual (cfr. art. 201.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), já que é manifesto que a mesma, como já se deixou dito, e repete-se, coarcta e cerceia, restringe ou diminui, o exercício do direito ao recurso por parte da apelante, impedindo um verdadeiro e efectivo segundo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, susceptível de influir no exame e decisão da causa.

7. Tal situação pode mesmo impedir – dir-se-ia até que impede – que este Venerando Tribunal da Relação reaprecie a prova gravada, o que, por sua vez, representa também um impedimento a que a matéria de facto fixada pelo Mm.º Juiz «a quo» possa ser alterada – como, de resto, a apelante considera primordial para que se faça a devida Justiça – o que se reflecte na decisão de mérito.

8. A apelante insurge-se, pois, contra esta supra aludida situação de deficiência e, em consequência, deixa aqui expressamente arguida tal nulidade, para todos os devidos e legais efeitos, mormente no que tange à necessidade de repetição do julgamento.

9. De qualquer forma, o caso dos autos revela ser um caso de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e a decisão sobre a matéria de facto, nos concretos pontos questionados.

10. Salvo melhor opinião, e tendo até em conta a impugnação da decisão da matéria de facto, a douta sentença recorrida fez também uma incorrecta interpretação e aplicação da lei ao caso «sub judice».

11. Divisa-se ou antolha-se, com singular evidência, que nunca, em momento algum, o apelado esteve ao serviço da apelante no período de tempo anterior a Abril de 2005.

12. A apelante, como empresa recém-criada e constituída – em Fevereiro de 2005 – numa fase inicial apenas estava interessada nas instalações da «Distrifundão», no Fundão.

13. Só com a demonstração de que os legais representantes da «Distrifundão», com o conhecimento e a aquiescência do apelado (e dos outros trabalhadores), lhe efectuaram, em Abril de 2005, de que esta empresa tinha fechado as portas, que os seus trabalhadores (incluindo, pois, o ora apelado) iam para o desemprego, que já tinha sido acertado e pago aos trabalhadores, incluindo, também, o aqui apelado), a apelante aceitou, numa segunda fase, os trabalhadores daquela, que ingressaram, pois, nos quadros da apelante «ex novo», como, de resto, o apelado bem sabe.

14. Não tem aplicação, no caso vertente, o disposto no art. 318.º do Código do Trabalho, não podendo nunca a antiguidade do trabalhador ser reportada a Janeiro do ano de 1995, em virtude de não ter ficado demonstrado nos Autos que o apelado se tivesse mantido ininterruptamente ao serviço e transitado sucessivamente por todas as empresas referidas na fundamentação de facto até à aqui apelante, mas antes – isso sim – apenas até à empresa denominada «Distrifundão», por um lado e, por outro, apenas até Abril de 2005;

Acresce que:
15. Ficou abundantemente demonstrado que, pretendendo a apelante transferir os seus trabalhadores para Santa Maria da Feira, foi-lhes explicado que, por um lado, tais transferências de local de trabalho deveriam operar-se no prazo máximo de 1 (um) mês, tendo em conta a data da reunião em que todos estiveram presentes – 26 de Maio de 2006 –, e que, por auto lado, seriam assumidos pela empresa todas – rigorosamente TODAS – as despesas e encargos inerentes a tal mudança, incluindo, claro está, eventuais mudanças de residência e outras, como, de resto, o apelado acabou por reconhecer na audiência final ao prestar o seu depoimento de parte.

16. Tendo o apelado feito condicionar a aceitação da sua transferência para Santa Maria da Feira, a que lhe fosse garantido, pela apelante, o pagamento de todas as despesas e encargos acrescidos que iria ter de suportar com a mudança, e tendo a apelante preenchido e cumprido essa condição que o apelado lhe havia estipulado para aceitação da transferência sub judice – tal qual o apelado, ele próprio, lhe impôs! – não restaria outra alternativa ao apelado que não fosse, cumprida e preenchida a aludida condição, a de se apresentar ao serviço, em 01 de Julho de 2006, na sede da apelante, na Zona Industrial do Roligo, freguesia de Espargo, concelho de Santa Maria da Feira, mormente em face daquilo que ficou convencionado e acordado entre as partes - pelo menos, assim julgava e confiava, na sua boa fé, a aqui apelante.

17. Infere-se daqui que o apelado, pelo menos numa primara fase, concordaria com a sua transferência para Santa Maria da Feira, sendo que prova inequívoca disso é o teor das suas missivas, as quais levaram a apelante a deduzir que seria esse o comportamento que o apelado adoptaria (vide artigo 236.º do Código Civil).

18. Todo o comportamento posterior do apelado traduz, clara e ostensivamente, uma situação atentatória dos ditames da boa-fé e constitui, manifestamente, um intolerável abuso de direito (cf. artigos 239.º e 334.º do Código Civil), o que, então e desde já, se invoca para todos os devidos e legais efeitos - devendo, por conseguinte, a resolução contratual operada pelo trabalhador, aqui apelado, ser considerada, além de imoral, inoportuna, injusta, ilegítima e ilegal.

19. Caso não se entenda como se deixou dito até aqui e que, nessa conformidade, seria legítimo ao trabalhador resolver o contrato sub judice – o que, diga-se, apenas por mera hipótese de raciocínio ou académica se coloca – deverá, ainda assim, a resolução contratual em apreço ser considerada ilegítima e ilegal por inexistência do chamado «prejuízo sério» na proposta mudança de local de trabalho.

20. Na verdade, a apelante garantiu sempre ao apelado que suportaria todas – ­rigorosamente TODAS – as despesas e encargos inerentes à mudança de local de trabalho, mormente as advindas da deslocação e da mudança de residência, assegurando viatura, refeições e habitação, pelo que, como é normal neste tipo de situações, pelo menos à luz das regras da experiência comum, tudo traduzido, corresponderia a um aumento de retribuição para o apelado, com todas as inequívocas vantagens, mormente patrimoniais, advenientes de tal facto, para si e para o seu agregado familiar.

21. Aliás, não havendo alteração nem ao nível da categoria profissional, nem ao nível do conteúdo funcional – como, de resto, o apelado bem sabia – este continuaria a ser vendedor na zona da sua área geográfica de residência, podendo, por isso mesmo, durante a semana de trabalho, e a título meramente exemplificativo, continuar a prestar apoio ao seu agregado familiar, dormir algumas vezes em casa, etc.

22. Razão pela qual, também por este prisma, deverá a resolução contratual operada pelo trabalhador – aqui apelado – ser considerada infundada e, por conseguinte, ilegítima e ilegal.

23. Para finalizar este ponto, caso se entenda que ainda assim seria legítimo ao apelado resolver o contrato de trabalho – o que, diga-se, apenas por mera hipótese de raciocínio ou académica se coloca –, dir-se-ia sempre que a apelante sempre esteve, em todos os momentos, de boa-fé, razão pela qual deverá o eventual montante indemnizatório ser fixado em 15 (quinze) dias de remuneração de base por cada ano completo de antiguidade (cfr. art. 443.º, n.º 1, do Código do Trabalho).

24. Ao não proceder assim, a sentença recorrida violou, para além do mais e de tudo quanto já se disse, o disposto nos artigos 236.º, 239.º e 334.º do Código Civil, bem como o disposto nos arts. 315.º, 318.º, 441.º e 443.º do Código do Trabalho.


5 – O recorrido respondeu, concluindo, por seu turno, que a matéria de facto foi correctamente decidida e que os factos alegados e provados são suficientes para se concluir que se manteve ininterruptamente ao serviço desde Janeiro de 1995 até à resolução do contrato, em 2006;
Além disso, a alteração provada na vida do recorrido pela mudança de local do trabalho constitui prejuízo sério para este resolver o contrato de trabalho, dado o impacto negativo que tal mudança causava na sua vida familiar.
A sentença fez correcta interpretação dos factos e do Direito aplicável, não merecendo por isso qualquer reparo.

Recebido o recurso e corridos os vistos legais devidos – com o Exm.º P.G.A. a emitir o douto Parecer de fls. 312-315, a que não houve reacção – cumpre decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

1 – DE FACTO.
Vem assente a seguinte factualidade:
1) O Autor iniciou a sua actividade profissional ao serviço de José Antunes Azevedo até Fevereiro de 1995, mantendo-se ininterruptamente ao serviço, e transitando sucessivamente para «Pinto Ferreira & C.ª, Lda.», até Julho de 1998; «Gelfundão – Comércio de Produtos Alimentares, Lda.», até Janeiro de 2003; «Júlia Lopes Azevedo, Unipessoal, Lda.», até Dezembro de 2003; «Distrifundão – Distribuição de Produtos Congelados, Lda.», até Abril de 2005, e, por fim, «B....», até Julho de 2006.
2) O Autor trabalhou sob as ordens autoridade e direcção das referidas firmas exercendo sempre as funções de vendedor, promovendo e realizando vendas fora do estabelecimento, mais propriamente nos concelhos do Fundão, Belmonte, Covilhã, Manteigas e Idanha.
3) As firmas referidas em 1) exerceram sempre a sua actividade nas mesmas instalações sitas no Fundão.
4) Todas as alterações assinaladas em 1) ocorreram por razões estranhas à vontade do Autor, que nunca foi informado das mesmas, delas tendo sabido apenas pelo facto de serem emitidos recibos de empresas diferentes.
5) À data do termo do contrato de trabalho o Autor auferia uma retribuição mista, constituída por uma parte certa e uma parte variável.
6) O valor da retribuição fixa paga pela Ré era de € 498,80, a que acrescia uma parte variável de acordo com as vendas realizadas.
7) As sociedades referidas em 1), designadamente a ora Ré, tinham como actividade o comércio por grosso de produtos alimentares.
8) Por carta datada de 12 de Junho de 2006, junta a fls. 50, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a Ré comunicou ao Autor a intenção de o transferir para a Zona Industrial do Roligo, em Santa Maria da Feira.
9) A razão da mudança prendia-se com o facto de a Ré pretender encerrar, como efectivamente encerrou, as suas instalações no Fundão.
10) O autor não se apresentou em Santa Maria da Feira no dia 1 de Julho de 2006.
11) No dia 5 de Julho de 2006 o autor comunicou à Ré que punha termo ao contrato com base no disposto no n.º 4 do artigo 315º do Código do Trabalho, conforme carta junta a fls. 51 e 52, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
12) Carta que a Ré recebeu no dia seguinte ao envio pelo Autor, ou seja no dia 6 de Julho.
13) O Autor, para pôr termo ao contrato de trabalho, alegou, designadamente, que teria de mudar a sua residência para local mais próximo do novo local de trabalho, que teria de se fazer acompanhar da esposa e dos dois filhos menores, que a esposa trabalha no concelho da Covilhã, nas Confecções Lança.
14) Nessa carta de resolução solicitou o autor que lhe fosse remetido, depois de preenchido, o Mod. 346.
15) Com data de 21 de Julho de 2006 a ré endereçou ao autor a carta que faz fls. 56 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
16) O Autor, por carta datada de 27 de Julho, dirigida à Inspecção-geral do Trabalho, junta a fls. 57, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, solicitou a intervenção da IGT no sentido de ser emitida pela ré a declaração Mod. 346 ou pela IGT no caso desta se recusar a fazê-lo.
17) Após o recurso à I.G.T., a Ré, com data de 4 de Agosto de 2006, emitiu o Mod. 346, junto a fls. 32 e 115, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, dele fazendo constar como motivo da cessação do contrato de trabalho “abandono do serviço a partir de 01/07/2006, por falta de comparência ao serviço na sede em Espargo, após fecho do estabelecimento do Fundão”.
18) A média da retribuição variável do autor nos últimos 12 meses com referência à data da cessação do contrato de trabalho foi de 162,64 €.
19) O autor não gozou as férias vencidas no dia 1 de Janeiro de 2006 nem recebeu da ré o respectivo subsídio.
20) A ré não pagou ao autor os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de natal pelo trabalho prestado em 2006.
21) O autor adquiriu à ré produtos no valor de 150,71 € que ainda não pagou.
22) O agregado familiar do autor é constituído por dois filhos estudantes e pela sua mulher que se encontra empregada, com contrato sem termo, desde 1 de Junho de 1991, na Fábrica de Confecções Lança, sita em Vales do Rio.
23) A Ré foi constituída através de escritura pública lavrada em 25 de Fevereiro de 2005.
24) Em Março/ Abril de 2005 a ré mostrou-se interessada nas instalações, existentes no Fundão, pertencentes à firma «Distrifundão – Distribuição de Produtos Congelados, Ld.ª».
25) Para o efeito, contactou os representantes desta, a Exm.ª Senhora D.ª Júlia Lopes de Azevedo e o Exm.º Senhor José Antunes Ferreira de Azevedo, a fim de efectuar ou consumar o respectivo negócio.
26) Chegados a acordo quanto às instalações, foi proposto à Ré, pelas referidas pessoas, que esta ficasse com alguns dos seus trabalhadores, entre os quais figurava o A.
27) A Ré, perante as aludidas pessoas, mostrou o seu desinteresse em tal proposta, tendo negado assumir a antiguidade dos trabalhadores da Distrifundão.
28) Os representantes da «Distrifundão – Distribuição de Produtos Congelados, Ld.ª», afirmaram que já tinham acertado e pago tudo aos seus trabalhadores, incluindo, o A., pelo que, se Ré aceitasse essa sua proposta, os trabalhadores daquela que ingressassem nos quadros desta estariam a fazê-lo «ex novo».
29) Entretanto, os negócios da Ré no Fundão não correram tão bem como esta projectara e esperara.
30) O que determinou, então, que a Ré, que se encontra sedeada em Santa Maria da Feira, em 25 de Maio de 2006, reunisse os trabalhadores que possuía no Fundão, a fim de lhes dar conta de que, em salvaguarda dos interesses da empresa, iria encerrar as suas instalações no Fundão e proceder às correspondentes transferências de local de trabalho.
31) Nessa reunião foi explicado aos trabalhadores, incluindo o A., que as transferências de local de trabalho deveriam operar-se num curto prazo e que seriam assumidos pela empresa todas as despesas e encargos inerentes a tal mudança.
32) No seguimento da aludida reunião a Ré, enviou ao A., em 13 de Junho de 2006, a carta registada com aviso de recepção datada de 12/06/06, junta a fls. 100 cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
33) Em resposta à carta referida em 32) o autor enviou à ré a carta datada de 27/06/06, que faz fls. 103 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido na qual referiu que por estar a sua transferência condicionada ao pagamento dos respectivos custos por parte da ré “não ponderei dar cumprimento à vossa comunicação no ponto em que refere que me deverei apresentar na Zona Industrial do Roligo, em Santa Maria da Feira, enquanto não me for garantido o pagamento dos invocados encargos acrescidos”.
34) Em resposta a tal carta a Ré, por carta datada de 28 de Junho de 2006, junta a fls. 104, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, entregue em mão ao autor, a ré comunicou que “todas as despesas aplicáveis a este caso serão de nossa responsabilidade”.
35) No seguimento da carta referida em 11), a ré enviou ao autor a carta datada de 19 de Julho de 2006, junta a fls. 105, e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
36) Com data de 11 de Setembro de 2006, a ré enviou ainda ao A. a carta registada e com aviso de recepção, junta a fls 108, cujo teor se dá por integralmente reproduzido
37) A ré, com data de 7 e 20 de Agosto de 2006, enviou à IGT as cartas que fazem fls.111 e 114, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
38) O A., no âmbito do conteúdo funcional inerente à sua categoria profissional, percorria diária e aproximadamente em média 150 kms.
___

2 – CONHECENDO.
Vamos então abordar e solucionar as questões que nos vêm propostas, seguindo o alinhamento conclusivo, por onde – como é sabido – se afere e delimita o objecto da impugnação, por via de regra.

O ‘thema decidendum’ está aliás perfeitamente identificado e vem analisado rigorosamente no antecedente Parecer do Exm.º P.G.A., que há muito nos habituou a proficientes intervenções, normalmente pontuadas com uma argúcia, intuição e equilíbrio das soluções preconizadas que nos apraz registar, constituindo esta nota uma simples homenagem ao Distinto Magistrado.

Com isto significamos, implicitamente, que o sentido do douto Parecer, correspondendo à resposta do Direito que temos por justa – e por isso devida – consubstancia, em síntese, o que de essencial nos provoca dizer a argumentação que suporta as asserções conclusivas da Apelante.

Tudo revisto.
. Pretendeu-se impugnar a decisão da matéria de facto, visando a sua alteração, designadamente por se achar que os pontos de facto n.ºs 1, 2, 3, 4, 27 e 28 da respectiva decisão positiva e os dois últimos da matéria dada como não provada, corresponderiam a uma incorrecta interpretação e apreciação da prova produzida em Audiência de Julgamento.
A esta temática se reportam as nove primeiras conclusões do respectivo elenco.

Depois de expor a sua tese, enunciando os pontos da divergência, a apelante vai mesmo mais longe, ao invocar como nulidade processual a pretensa omissão, na Acta de julgamento, das indicações ou referências devidas, respeitantes à remissão para os respectivos registos ou suportes magnéticos, o que – … além de tolher o cabal exercício da impetrante, (o do pleno e perfeito exercício do direito ao recurso) – impossibilita o exercício de um verdadeiro e efectivo segundo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto.

Foi aliás por essa alegada razão que a recorrente não procedeu, como eventualmente se impunha, nem à transcrição dos excertos dos depoimentos que referiu antes, nem sequer à correspondente remissão para os suportes magnéticos.
A recorrente não só não tem razão, como – com o devido respeito – não reparou bem nos termos da Acta a que se refere.
Atentamente se deu conta disso o Exm.º P.G.A.
Na verdade, conferida a Acta de fls. 187-189, aí constam as ditas menções que se diz terem sido omitidas (v.g., entre outros, as relativas aos depoimentos de que pretendia servir-se, o de parte do A., que ‘ficou gravado na cassete 1, contador de 0000 a 1734’; e o da testemunha da Ré, José Antunes Ferreira Azevedo… - ‘O seu depoimento ficou gravado na cassete 3, contador de 0023 a 1705’.

Não se configura, pois, a pretensa nulidade processual que, (pressurosa, mas mesmo assim sempre tardiamente…), se correu a invocar, com todos aqueles denunciados efeitos deletérios…
Tratar-se-á antes, no mínimo, de um clamoroso lapso da Apelante!...
…Que, não a dispensando do ónus decorrente do n.º2 do art. 690.º-A do C.P.C. – assumidamente não cumprido (‘A impugnação deriva apenas, de forma muito limitada ou exígua, dos apontamentos manuscritos do mandatário da R.’ – fls. 271) – não vai naturalmente livrá-la da respectiva cominação: a da rejeição/não conhecimento do recurso, nessa parte.

Sempre se dirá, não obstante, que – para além do registo em Acta do depoimento do A., na parte relevante, 'ut' art. 653.º do C.P.C. – a fundamentação da decisão de facto é suficientemente sóbria, circunstanciada e esclarecedora para não deixar dúvidas sobre o contexto, as circunstâncias determinantes, a razão de ciência, enfim sobre a credibilidade/valia de cada um dos depoimentos, a que as divergentes considerações e convencimento da postulante, (mesmo com respaldo em excertos de afirmações desgarradas…embora convenientes), não poderiam jamais sobrepujar-se.

Mesmo assim, sempre se dirá que, ouvido o registo global da prova gravada, longe se fica de concluir que se impusesse outra diversa solução.
A devida compreensão do alcance ora permitido pela facilidade processual de impugnação da decisão da matéria de facto deveria impedir que se faça um uso rotineiro e acrítico da mesma.
É sabido – mas infelizmente pouco praticado – que tal expediente não serve para obliterar o princípio da liberdade de julgamento (art. 655.º/1 do C.P.C.), pretextando-se, mais ou menos sistematicamente, que, com base nisto e não naquilo, o Senhor Juiz deveria ter decidido neste e não naquele sentido, desta e não daquela maneira…
Presidindo àquele princípio da liberdade de julgamento um conjunto interactivo de diversificadas e insindicáveis circunstâncias (de ordem psicológica, intuitiva, emocional, para além das racionais e lógicas…), decorrentes da oralidade e da imediação, o Tribunal ‘ad quem’, quando colocado perante duas ou mais versões dos factos e suas circunstâncias relevantes, apenas poderá afastar-se, fundada e objectivamente, do Juízo posto em crise naquilo que, não decorrendo daqueles vectores da oralidade e da imediação, tenha determinado a formação da convicção em evidente afrontamento ou dissonância com elementares regras da lógica, da ciência e da experiência comum.

Como se sabe – e temos repetidamente lembrado – o valor da prova por declarações depende essencialmente da credibilidade que inspire o depoente, do seu carácter e da equidistância que manifeste relativamente aos interesses em litígio, da sua probidade e razão de ciência, qualidades (ainda) apreensíveis e aferíveis pelo Decisor perante quem, em suma, são directamente exibidas.
Só nos casos concretamente identificados em que nos confrontemos com uma flagrante omissão ou desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e a decisão é que se equacionará a possibilidade de fundada censura e eventual modificabilidade da solução eleita.
Só então se desenhará um erro de julgamento, o que não acontece – por via de regra – quando se esteja apenas, como no caso, perante meios de prova simplesmente discrepantes, não de todo sobreponíveis ou mesmo contraditórios.

A subsunção jurídica há-de fazer-se, pois, tendo como pressuposto o quadro de facto nos termos em que vem seleccionado.


. Ficam assim prejudicados/ultrapassados os argumentos maiores a que se arrimava a recorrente para pretextar a censura da parte da decisão relativa à determinada antiguidade do A./recorrido.
Aliás – como bem refere o Exm.º P.G.A. – nem poderia facilmente conceder-se, ante o desenhado cenário de facto e a normalidade das coisas, que os trabalhadores da sociedade cessante (a ‘Distrifundão’) ‘consentissem’, num primeiro momento, na sua colocação em situação de desemprego e, logo a seguir, aceitassem entrar ‘ex novo’ nos quadros da ora apelante…sem que com isso se estivesse a caucionar um procedimento ilícito, directamente conducente à frustração dos direitos legalmente garantidos em situações como a presente (juridicamente bem caracterizada como) de transmissão do estabelecimento, à luz da previsão normativa ora constante do art. 318.º do Código do Trabalho (antes, no art. 37.º do D.L. n.º 49408, de 24.11.68/LCT).

A antiguidade foi correctamente reportada a Janeiro do ano de 1995.
Sem reparo.


. No que tange à resolução do contrato pelo trabalhador e ao conferido direito à reclamada indemnização, a reacção da Apelante é também falha de fundamento, com o devido respeito.
Relembrando a factualidade assente mais relevante – 'maxime' a estampada nos items 30 e 31 do alinhamento da fundamentação de facto constante da sentença – a R., na reunião de 25 de Maio de 2006, por si promovida, informou os trabalhadores (o A. incluído) que ia encerrar as suas instalações no Fundão e proceder às correspondente transferências de local de trabalho, explicando-lhes que as mesmas deveriam operar-se num curto prazo e que seriam assumidos pela empresa todas as despesas e encargos inerentes a tal mudança.
Operou-se depois o intercâmbio epistolar referido nos pontos 32 a 36, a cujo teor relevante já voltaremos.

Dispondo sobre a problemática geral da mobilidade geográfica, preceitua o art. 315.º, n.ºs 2 e 5, do Código do Trabalho que o empregador pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho se a alteração resultar da mudança, total ou parcial, do estabelecimento onde aquele presta serviço.
Deverá então custear as despesas do trabalhador impostas pela transferência decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação e resultantes da mudança de residência.

Todavia, em tal caso, o trabalhador pode resolver o contrato se houver prejuízo sério, tendo direito, nessas circunstâncias, à indemnização prevista no n.º1 do artigo 443.º – n.º4 da mesma norma.

Estamos, 'in casu', perante a previsão referente à transferência colectiva, (‘Apud’ Monteiro Fernandes, ‘Direito do Trabalho, 13.ª Edição, pg. 422), mudança total do estabelecimento, exercício cuja inquestionada legitimidade constitui, mais do que um desvio, uma incontornável derrogação prática do princípio da inamovibilidade, consagrado no art. 122.º, f), do Código do Trabalho.
A única maneira de resistir à inevitável alteração do local de trabalho é, pois, a falada resolução do contrato.


Feito este breve enquadramento, resta-nos saber em primeiro lugar se, no caso sujeito, o A. estaria em condições de fazer tal opção livremente, quando a assumiu, ou se estaria já ‘comprometido’, como se pretexta, por ter previamente concordado/aceitado a determinação da R., na sequência da reunião havida em 26 de Maio de 2006 – facto 8 e doc. de fls. 100.
Depois – e sendo a resposta negativa – fica por dilucidar e determinar se, resolvendo o contrato, o fez afinal com justa causa, ou seja, com o fundamento legal/prejuízo sério, pressuposto cuja verificação lhe conferirá o direito à indemnização reclamada, que a decisão sob protesto lhe reconheceu e atribuiu.

Dir-se-á que sobre a dúvida primeiramente equacionada nada de substancialmente novo se acrescenta ora aos argumentos que a decisão refutou, a nosso ver, correctamente.
Revista a questão, não se nos afigura haver, pois, grande coisa a acrescentar à ratificação dos fundamentos então expendidos.
Na verdade, a adiantada garantia, por banda da R., de que assumiria todas as despesas e encargos inerentes à determinada mudança do local de trabalho não é só por si factor determinante da aceitação da mesma por parte do trabalhador, como facilmente se alcança.
(O dever de custear essas despesas decorre directamente da Lei, como corolário aliás do direito de transferir o trabalhador para outro local de trabalho – n.ºs 2 e 5 do já invocado art. 315.º, sempre do C.T.).

Independentemente disso, o trabalhador não está obrigado a manter-se vinculado, como se disse, podendo resolver o contrato …se houver prejuízo sério.
Pretexta todavia a recorrente que o A. aceitara já a transferência.
Sem razão, porém.
Como já se deixou dito – e ora se reitera – não se retira, da análise dos documentos/cartas a que a R. implicitamente se reporta, a pretendida conclusão.
Na carta/documento n.º4, a fls. 103, datada de 27.6.2006, sob a epígrafe ‘Transferência local de trabalho/Pedido de esclarecimento, o A., em reacção à anterior comunicação da R., de 12.6.2006, diz expressamente que …’por forma a tornar possível a transferência do seu local de trabalho’…vem solicitar os seguintes esclarecimentos’….
Como facilmente se subentende, o A. pretenderia ter a certeza de que a assunção de todos os encargos abarcaria (também…) os decorrentes da necessidade de ‘mudança de residência’.
E se estava ainda a pedir esclarecimentos, é óbvio que não pode aceitar-se que tivesse aceitado já a determinada transferência!...
…Vindo a decliná-la, mediante a resolução do contrato com invocação de prejuízo sério, cerca de vinte dias mais tarde.
Não pode ser outro o alcance deste comportamento, no dito contexto, à luz do sentido normal da declaração, entendido nos termos da regra que preside à interpretação das declarações negociais – arts. 236.º …e 237.º do Cód. Civil.

Prejuízo sério?
Na carta/documento que constitui fls. 51-52 – cfr. pontos 11 a 14 do alinhamento de facto constante da sentença – o A., (comunicando à R. a sua disposição de resolver o contrato, nos invocados termos do n.º4 do art. 315.º do Código do Trabalho), refere a evasiva da Entidade Empregadora na falta de resposta aos pedidos de esclarecimentos sobre a forma como pretendia solucionar os muitos problemas que decorreriam da mudança do seu local de trabalho do Fundão para Santa Maria da Feira e as razões determinantes da sua opção.
Entre outros aspectos, ocorreriam mudanças na organização da sua vida pessoal e profissional, designadamente teria de mudar de residência para uma zona mais próxima do novo local de trabalho; teria de fazer acompanhar-se do seu agregado familiar, composto pela esposa e dois filhos menores, com esta a trabalhar no concelho da Covilhã e os filhos a estudar também aí.
(A alternativa implicava efectuar em deslocação diária cerca de 500 km. no trajecto pendular casa-trabalho/trabalho-casa).

A noção de prejuízo sério assume, pois, particular relevo.
Bem decomposta na análise superiormente feita por Bernardo Xavier (ob. loc. cit. in Monteiro Fernandes, 13.ª Edição, pg. 428), terá necessariamente de entender-se, por definição contextual aberta, como sendo um …juízo antecipado de probabilidade ou de adequação causal, que implica, contudo, a consideração de elementos de facto actuais. (Ibidem).
E, naturalmente, a situação sujeita – na ponderação das distâncias objectivas, da situação profissional do cônjuge e dos filhos menores, sem uma concreta definição da exacta cobertura ou compensação financeira por banda da Entidade Empregadora, em tudo isto – não deixa de constituir, no confronto ou balanço das vantagens/inconvenientes pessoais do trabalhador, (em absoluto ou mesmo em termos relativos, na perspectiva dos motivos do empregador em transferir-se de local…), uma ‘causa adequada’ de prejuízos importantes, a provocar alteração substancial das/nas condições de vida do A., (ausência da família, omissão de acompanhamento regular no apoio aos filhos menores, perda ou diluição das relações sociais, etc.), correspondendo inequivocamente ao tipo de situação prevenida na norma interpretanda.

. Alega-se, por fim, que, vingando a tese oposta à preconizada, sempre deveria o montante da indemnização a arbitrar ser fixado a partir do referencial de 15 dias de remuneração-base por ano completo de antiguidade…
…Isto tão-só porque a R. sempre esteve, em todos os momentos, de boa fé.

Sendo aceitável pretender-se que assim fosse, a razão invocada para o efeito é curta, (ou seja, não faz a diferença, pois não vemos que a parte contrária também não tenha estado sempre de boa fé…), pelo que – pelos fundamentos adrede adiantados aquando dessa ponderação, na decisão 'sub judicio' – a fixação no valor médio previsto (entre 15 e 45 dias foi estabelecido em 30) mostra-se ajustada.

Não foram afrontadas as normas identificadas, ou outras.
Soçobram as asserções conclusivas.
___

III – DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, delibera-se julgar improcedente o recurso, confirmando inteiramente a sentença impugnada.
Custas pela Apelante.
***

Coimbra,