Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3753/03
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR. SERRA LEITÃO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
INCAPACIDADE DA ENTIDADE PATRONAL PARA SUPORTAR OS ENCARGOS
Data do Acordão: 01/15/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Legislação Nacional: DEC. LEI Nº 142 / 99, DE 30/04
Sumário:

I - O FAT foi criado pelo DL 142/99, de 30/4, competindo-lhe , além do mais, garantir o pagamento das prestações que forem devidas por acidentes de trabalho sempre que, por motivo de incapacidade económica objectivamente caracterizada em processo judicial, ou por motivo de ausência ou de impossibilidade de identificação da entidade empregadora, aquelas não possam ser pagas pela entidade responsável pelo acidente .
II – O FGAP, extinto desde 15/6/02 , assegurou até essa data o pagamento das pensões por incapacidade permanente ou por morte, em casos de acidentes de trabalho da responsabilidade de entidades insolventes ou equiparadas .
III – Embora o FGAP não respondesse pelas prestações a que o trabalhador tivesse direito resultantes de incapacidades temporárias , por esse tipo de incapacidades já responde o FAT nos casos de a situação de incapacidade da entidade empregadora apenas se ter verificado na vigência do FAT .
Decisão Texto Integral:

Acordam os Juizes da Secção Social do T. Relação de Coimbra
Neste processo e por sentença proferida em 19/12/01, posteriormente confirmada por acórdão desta Relação, datado de 22/5/02 (que transitou em julgado) foi A, na qualidade de entidade patronal do sinistrado B, condenada:
1) a reconhecer que o acidente de que foi vítima B, foi um típico e indemnizável acidente de trabalho;
2) consequentemente a pagar ao trabalhador acidentado
- a quantia de 1.071. 078$00, a título de indemnização por ITA desde a data do acidente até à data da alta, acrescida de juros moratórios, calculados quinzenalmente à taxa supletiva legal, desde o dia seguinte ao do acidente, até integral pagamento;
- a pensão anual e vitalícia no montante de 429. 933$00, com efeitos a partir de 8/10/99, por ser o dia imediato ao da alta, a pagar em duodécimos na residência do sinistrado e por uma só vez, as prestações já vencidas com juros de mora à taxa supletiva legal
- No mês de Dezembro de cada ano, com efeitos a partir de Dezembro de 1999 inclusive, uma prestação suplementar de valor igual ao montante do duodécimo da pensão anual a que nesse mês o sinistrado tiver direito, que é actualmente no valor de 35.828$00 direito
- A quantia de 13. 091$00 a título de despesas com transportes, consultas médicas, medicamentos e canadianas.
Uma vez que a entidade patronal não comprovou no processo o pagamento de tais quantias, foi instaurada a competente execução, no âmbito da qual não foi possível penhorar nenhum bem, dado que aquela se encontra inactiva, não lhe sendo conhecidos bens passíveis de apreensão
Igualmente nas execuções contra ela movidas para cobrança de custas e do montante devido a título de caução, não houve igualmente possibilidade de proceder a qualquer penhora.
Em vista disso o sinistrado veio então requerer que se notificasse o FAT, para efectuar o pagamento das importâncias já aludidas.
Foi então proferido despacho, que determinou que o Instituto de Seguros de Portugal, na qualidade de gestor do FAT, assegurasse o pagamento ao trabalhador acidentado, todas as quantias a que a respectiva entidade patronal fora condenada, com exclusão dos juros moratórios.
Discordando agravou o Instituto de Seguros de Portugal, alegando e concluindo:
1- A responsabilidade do FAT pelo pagamento das prestações emergentes de acidentes de trabalho ocorrido antes de 1/1/00 corresponde, nos exactos termos , àquela que cabia ao ex- FGAP, ou seja de acordo com o estipulado no Anexo à Portaria n.º 642/83 de 1/6
2- Não responde pois, por indemnizações emergentes de incapacidades temporárias.
Não houve contra alegações e o Ex. mo Sr. Juiz, sustentou o despacho em causa.
Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Dos Factos:
É a seguinte a factualidade a ter em conta, que aliás já consta da parte expositiva deste acórdão.
A)- Neste processo e por sentença proferida em 19/12/01, posteriormente confirmada por acórdão desta Relação, datado de 22/5/02 (que transitou em julgado) foi A, na qualidade de entidade patronal do sinistrado B, condenada:
1- a reconhecer que o acidente de que foi vítima B, foi um típico e indemnizável acidente de trabalho, que se produziu em 18/12/98.
2- consequentemente a pagar ao trabalhador acidentado
- a quantia de 1.071. 078$00, a título de indemnização por ITA desde a data do acidente até à data da alta, acrescida de juros moratórios, calculados quinzenalmente à taxa supletiva legal, desde o dia seguinte ao do acidente, até integral pagamento;
- a pensão anual e vitalícia no montante de 429. 933$00, com efeitos a partir de 8/10/99, por ser o dia imediato ao da alta, a pagar em duodécimos na residência do sinistrado e por uma só vez, as prestações já vencidas com juros de mora à taxa supletiva legal
- No mês de Dezembro de cada ano, com efeitos a partir de Dezembro de 1999 inclusive, uma prestação suplementar de valor igual ao montante do duodécimo da pensão anual a que nesse mês o sinistrado tiver direito, que é actualmente no valor de 35.828$00 direito
- A quantia de 13. 091$00 a título de despesas com transportes, consultas médicas, medicamentos e canadianas.
B)- Uma vez que a entidade patronal não comprovou no processo o pagamento de tais quantias, foi instaurada a competente execução, no âmbito da qual não foi possível penhorar nenhum bem, dado que aquela se encontra inactiva, não lhe sendo conhecidos bens passíveis de apreensão
C)- Igualmente nas execuções contra ela movidas para cobrança de custas e do montante devido a título de caução, não houve igualmente possibilidade de proceder a qualquer penhora.
D)- Em vista disso o sinistrado veio então requerer que se notificasse o FAT, para efectuar o pagamento das importâncias já aludidas, o que veio a ser deferido.
Do Direito
Sabe-se que é pelas conclusões das alegações que se delimita o objecto do recurso- artºs 684 n.º 3 e 690º nºs 1 e 3 ambos do CPC-.
Deste modo, a única questão a dilucidar, prende –se com a responsabilização ou não do FAT, pela indemnização da incapacidade temporária, sofrida pelo sinistrado, uma vez que o acidente de trabalho ocorreu antes de 2000.
Vejamos então:
Como é sabido, o FAT foi criado pelo D.L. 142/99 de 30/4 ( seu artº 1º n.º 1), competindo-lhe, e além do mais que ao caso não importa, garantir o pagamento das prestações que forem devidas por acidentes de trabalho sempre que, por motivo de incapacidade económica objectivamente caracterizada em processo judicial de falência ou processo equivalente, ou processo de recuperação de empresa, ou por motivo de ausência, desaparecimento ou impossibilidade de identificação, não possam ser pagas pela entidade responsável( alínea a) dos mesmos n.º e artº).
O caso de que trata o presente processo, integra-se numa destas situações, pois está perfeitamente provada a incapacidade da entidade responsável( na hipótese a empregadora) solver os seus compromissos perante o seu trabalhador sinistrado, derivados da condenação judicial.
Com a criação do FAT, foi determinada a extinção do FGAP, transitando para aquele as respectivas responsabilidades e saldos, nos termos e condições que seriam definidas por portaria dos Ministérios das Finanças e do Trabalho e Solidariedade( artº 15º n.º 2 do citado D.L.).
Este diploma ( Portaria n.º 291/00) datada de 12/5/02 foi publicada no D.R. I- B de 25/5/02 e segundo o seu n.º 1º o FGAP considerava-se extinto a partir de 15/6/02, continuando a assegurar até essa data, o pagamento das pensões por incapacidade permanente ou morte em caso e acidente de trabalho da responsabilidade de entidades insolventes ou equiparadas.
E o seu n.º 2 determinava que os processos do FGAP, referentes a pensões em pagamento ou relativos a responsabilidades já definidas pelos tribunais de trabalho, deveriam ser transferidos para o FAT até 15/5/02, acrescentando o n.º 3 da mesma portaria que as responsabilidades do FGAP, que transitam para o FAT, correspondentes a acidentes de trabalho ocorridos até 31/12/99 ficam limitadas às obrigações legais e regulamentares do anterior fundo.
Ora é inquestionável que o FGAP não respondia( contrariamente ao que sucede com o FAT), pelas prestações a que o trabalhador tivesse direito, na situação de incapacidade temporária( artº 6º do Anexo à Portaria 642/83 de 1/6).
Poder-se-ia então dizer, que no caso concreto e como estamos perante um acidente de trabalho ocorrido antes de 2000, o regime que lhe seria aplicável, não era o da L 100/97 de 13/12, nem o estabelecido no D.L. 142/99, já que estes diplomas apenas regem, por princípio para os acidentes que tenham lugar após 1/1/00 ( artº 41º n.º 1 a) da citada L. 100/97 e 16º do D.L. 142/99).
Todavia- e salvo o devido respeito por diversa opinião- não cremos que seja essa a solução que se extrai das normas legais aplicáveis, embora se tenha por adquirido que a questão não é líquida.
Na realidade, do que dispõem os aludidos nºs 1 e 2 da Portaria 291/00, resulta, como supra se referiu, que em caso de transferência de responsabilidades do FGAP para o FAT e relativamente aos acidentes ocorrido até 31/12/99, aquelas ficam limitadas às obrigações legais e regulamentares do primeiro.
Mas uma coisa é a “ transferência de responsabilidades, outra a assunção directa de obrigações decorrentes de sinistro laboral.
No caso em apreço, a responsabilidade do FAT surge em consequência do despacho ora recorrido, verificada que foi a impossibilidade da entidade responsável proceder aos devidos pagamentos e não como resultante de qualquer obrigação que já impendesse sobre o FGAP.
E este despacho foi proferido- e portanto a responsabilidade foi atribuída ao FAT- em 15/7/03, data em que de há muito, como se viu o FGAP estava já extinto.
Pelo que, o FAT é responsável de acordo como estabelecido no já mencionado artº 1º n.º 1 a) do D.L. 142/99 e com a amplitude ali determinada, ou seja abrangendo também as indemnizações por ITA.
E à mesma conclusão se chega, se se considerar que a responsabilidade do FAT, não advém da prolacção do despacho em causa, mas antes da decisão judicial, que definiu as responsabilidades da reparação infortunística, ou seja do acórdão desta Relação, que definitivamente declarou o direito e que é datado de 22/5/02.
Também nesta altura, o FGAP, já não existia, pois a sua extinção- repete-se- teve lugar em 15/6/00.
Se tal entidade fora extinta , não lhe poderia ser assacada uma responsabilidade definida posteriormente.
Logo não estamos perante uma situação de transferência de responsabilidade, caso em que, então sim, se teria que ter em conta a limitação prevista no n.º 3º da Portaria 291/00.
Concluindo: o FAT é também responsável pelo pagamento da quantia devida ao sinistrado a título de indemnização por ITA a que a entidade patronal foi condenada, nos termos do artº 1º n.º 1 a) do D.L. 142/93 de 30/4( neste sentido já decidiu o Ac. da Rel. Porto, in C.J. , XXVI, IV, 250- ver também o voto de vencido lavrado no acórdão desse mesmo Tribunal, que se encontra junto por fotocópia, por iniciativa do agravante( fls. 391 a 395)
Termos em que e por todo o expendido se nega provimento ao recurso, mantendo-se o despacho impugnado.
Custas pelo impugante.