Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1432/09.4T2AVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL
NULIDADE PROCESSUAL
Data do Acordão: 10/09/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: BAIXO VOUGA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Legislação Nacional: ARTIGOS 227.º;497.º; 762.º, N.º 2 DO CÓDIGO CIVIL; ARTIGOS 167.º; 492.º; 526.º DO CPC
Sumário: 1. Se as informações prestadas por um banco são inexactas, incompletas ou falsas e foram causais da celebração de um acto ou contrato, então terá aquele de ser responsabilizado pelos danos que assim causa, quer por via contratual quer extra-contratual,
2. Não constitui nulidade processual a omissão de notificação a um dos réus da contestação e respectivos documentos apresentada por outro co-réu.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

            A....., viúva, doméstica, residente na Rua S. Martinho de Anta, Espinho, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra:

B....., casado, bancário, residente na R. Torrão do Lameiro, Edifício Casinhoto, Ovar;

C....., com sede na Av. de França, 680 e 694, Porto e;

D....., (sendo que, quanto a esta, foi a extinta a instância, conforme decisão de fls. 239 a 249, já transitada).

Por via da presente acção, pretende a A. que os RR. sejam condenados a pagar-lhe a quantia de € 100.000,00, com juros de mora vencidos à taxa aplicável às operações comerciais.

Para o efeito alegou que o R. B....., na qualidade de gerente do R. BPN, sugeriu à A. que aplicasse as suas poupanças em papel comercial da CNE, aplicação cujo retorno, no prazo de 1 ano e à taxa acordada, o Banco lhe garantia, sendo que, passado tal período, não o fez.

Considera a A. que a responsabilidade do R. B.....emerge do disposto no artº 497º Código Civil.

Contestando, disse o BPN que, à data da operação financeira efectuada pela A., a CNE e o BPN pertenciam ao mesmo grupo empresarial e financeiro. A CNE resolveu emitir papel comercial tendo recorrido, para o efeito, ao Banco Efisa, também integrante do mesmo grupo empresarial, tendo este solicitado a colaboração do BPN que, assim, actuou como mero intermediário financeiro.

De resto, o BPN disponibilizou aos seus clientes uma nota informativa onde se continha a explicação de todas as particularidades do produto em causa, informação que também foi veiculada à A., à qual nunca foi dito tratar-se de um depósito a prazo ou que o Banco assegurava o reembolso do capital e juros.

Por sua vez, o R. B....., em articulado de contestação, disse que agiu sempre sob as ordens e em representação do BPN, não existindo qualquer responsabilidade solidária entre si e aquele.

Mais afirmou que a A. sabia perfeitamente não se encontrar a realizar um depósito bancário a prazo, pois também efectuou um nestes moldes, acrescentando que o por si transmitido, segundo instruções hierárquicas recebidas, era que “o Banco cobriria sempre a solvabilidade do produto”.

Houve réplica, na qual a autora impugnou a versão dada por cada um dos réus na respectiva contestação, reiterando o por si já alegado na petição inicial.

Com dispensa da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e se procedeu à elaboração dos factos assentes e da base instrutória, sem reclamação.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com recurso à gravação da prova produzida e plena observância das formalidades legais, tendo o Tribunal decidido a matéria de facto nos termos constantes de fls. 252 a 255, sem reclamações.

Após o que foi proferida a sentença de fl.s 257 a 266, na qual se decidiu o seguinte:

“Pelo exposto, julga-se a presente acção procedente e, em consequência, condena-se o Banco a restituir à A. a quantia de € 100.000, 00, com juros remuneratórios, à taxa de 5, 553%, desde 22.1.08 até 22.1.09, e juros moratórios legais (actualmente à taxa de 4%) sobre aquele capital, desde 23.1.09 e até integral pagamento.

Absolve-se do pedido o R. B......

Custas por A., na parte da absolvição do co-R. pelo R. BPN no que toca à condenação deste.”.

            Inconformado com a mesma, interpôs recurso o réu BPN, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 358), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

1.

O teor das contestações apresentadas nos autos pelos 1º e 2ª réus não foi nunca notificado ao banco apelante, constituindo tal omissão uma nulidade processual relevante, já que na posse do conhecimento do teor desses articulados, a estratégia de defesa e os meios probatórios por si apresentados seriam seguramente diferentes.

2.

Mais grave do que isso é que ao banco apelante não foi nunca notificada a junção aos autos do documento junto pelo 2º réu, e denominado Instrução de Serviço nº 19/01 (fls. 119 dos autos), de 05.02.2003, cujo teor se veio a revelar importante – parece que até decisivo – na decisão que recaiu sobre a matéria de facto, como se alcança da sua motivação.

3.

Tendo o banco apelante conhecimento da existência de tal documento nos autos e do seu teor apenas quando leu a decisão relativa à matéria de facto e sua motivação.

4.

Já que as intervenções que teve o seu mandatário nos autos após a junção de tal documento se limitaram à elaboração e junção via CITIUS do seu requerimento probatório, e uma vez que a Mma Juiz a quo dispensou nos presentes autos a realização da audiência preliminar.

5.

Não teve, assim, o banco apelante a oportunidade de impugnar o teor de tal documento, e muito menos o de auxiliar o tribunal na sua correcta interpretação, tanto mais que se trata de documento contendo regras genéricas sobre o procedimento do banco em todas as emissões e colocação de papel comercial, independentemente da entidade emitente.

6.

A existência de tais nulidades tem por consequência que deve ser anulado tudo o que nos autos ocorreu a partir do momento em a notificação da junção desse documento deveria ter ocorrido, uma vez que é manifesta a influência da omissão e irregularidade em causa no exame ou decisão da causa.

7.

O que, aliás, sai comprovado e reforçado com a leitura da interpretação feita pela Mma Juiz a quo do teor de tal documento de fls. 119, já que, à revelia da sua letra, dá por assente que dele resulta a garantia de solvabilidade de papel comercial por parte do banco ora apelante.

Por outro lado,

8.

As respostas dadas aos nºs 8, 9 e 10 da base instrutória deverá ser alteradas, de acordo, não apenas com a necessária reapreciação do teor do documento acima citado, mas também com a interpretação corrigida do depoimento das testemunhas que, na motivação da decisão relativa à matéria de facto, se têm por relevantes.

9.

Devendo, assim, tais respostas passar a ser do teor seguinte:

- “provado que não teria qualquer risco de retorno dado ser a CNE uma empresa do mesmo grupo do banco “ ( nº 8) ;

- “provado que o 2º R. assegurou à A. que, dado o facto de serem empresas do mesmo grupo, o retorno dos valores aplicados estava garantido pelo BPN “ ( nº 9);

- “ provado ainda que o 2º R. mais assegurou que, por força das razões indicadas nas respostas dadas aos nºs 8 e 9, os valores aplicados seriam retornados por depósito na dita com tal, em Ovar, no prazo máximo de um ano, no termo do 1º ano de realização da aplicação “ ( nº 10).

10.

Estas alterações, aliás, permitem compatibilizar as respostas dadas aos ditos nºs 8, 9 e 10 com as respostas dadas aos nºs 33, 51, 52 e 53 da mesma base instrutória, pelo que, a não serem aceites, verificar-se-ia então uma clara contradição entre aquelas e estas respostas, contradição essa sancionada com a anulação de umas e outras.

11.

De resto, e admitidas as alterações à matéria de facto acima sustentadas, sempre haveria que concluir pelo teor e conteúdo de contrato entre a autora e o banco apelante que não abrangia, de forma alguma, a existência de uma garantia absoluta e incondicionada do banco ao efectivo reembolso do capital investido pela autora.

12.

Já que o banco apenas teria garantido tal reembolso no pressuposto de ser a CNE – a entidade emitente do papel comercial aqui em causa – uma empresa integrada no mesmo grupo a que o próprio banco pertencia, residindo nesse facto, de forma essencial, a existência de tal garantia.

13.

A destruição e desaparecimento de tal pressuposto por facto a que o banco ora apelante é inteiramente alheio não pode deixar de pesar na interpretação do compromisso existente entre as partes, desqualificando a conduta do banco como sendo de incumprimento de obrigação contratualmente assumida.

14.

E ainda que assim não se entendesse, sempre a alteração imprevista e imprevisível desse pressuposto afastaria a culpa da sua parte no incumprimento dessa obrigação de reembolso, culpa essa que constitui um dos requisitos para que se possa concluir pela existência de responsabilidade contratual da sua parte.

15.

Caso se entenda não conterem os autos elementos necessários a concluir nesse sentido, dir-se-á então que eles foram objecto de alegação nos nºs 48 a 55 da contestação do banco apelante, pelo que a insuficiência da matéria de facto relevante sempre deveria levar à repetição do julgamento para o seu apuramento e consideração.

16.

Em regra, a responsabilidade pelo pagamento do capital investido na subscrição de papel comercial cabe apenas à entidade dele emitente, ou seja, e no caso presente, a CNE, só em circunstâncias excepcionais sendo de admitir solução diferente, e que no caso presente não se verificam.

17.

A douta decisão recorrida traduziu-se, em suma, na responsabilização do banco apelante – que integrava o denominado Grupo SLN – de dívidas de uma outra empresa desse mesmo grupo.

18.

Mas sem que o banco ora apelante fosse a sociedade dominante de tal grupo, condição indispensável a essa responsabilização por dívidas de outras entidades.

19.

A douta decisão recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, as disposições dos arts. 236 nº 1 e 799 nº 1 do CCivil, 15º nº 1 al b) do Dec-lei nº 69/2004, de 25.03, 201 nº 1, 205 e 526, todos do CPC, bem como, finalmente, dos arts. 491 e 501 nº 1 do CSC.

Nos termos expostos, e nos mais de direito que V. Exªs doutamente suprirão, deverá o presente recurso de apelação ser julgado provado e procedente, e a decisão recorrida revogada nos termos constantes das conclusões acima apresentadas.

Assim se fará JUSTIÇA!

            Contra-alegando, a autora, pugna pela manutenção da decisão recorrida, valendo-se dos argumentos nesta expendidos, designadamente que inexiste a invocada nulidade, que a prova foi bem apreciada e aplicada a lei em conformidade com a factualidade apurada e solicitou a condenação do recorrente como litigante de má fé, por este alterar a verdade dos factos e entorpecer a acção da justiça, ao recorrer sem fundamento sério, em consequência do que peticiona a condenação deste a pagar-lhe, a tal título, a quantia de 8.000,00 €, relativa às despesas que causou à autora.

Colhidos os vistos legais, há que decidir.        

            Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 684, n.º 3 e 690, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir:

A. Se a omissão da notificação do teor das contestações apresentadas pelos co-réus e documentos que as acompanhavam, ao ora recorrente, constitui uma nulidade processual;

B. Se importa repetir o julgamento efectuado para apuramento da matéria de facto alegada nos artigos 48.º a 55.º da contestação apresentada pelo ora recorrente;

C. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos quesitos 8.º, 9.º e 10.º, da base instrutória;

D. Se alterada a matéria de facto dada como provada, no sentido propugnado pelo recorrente, se tem de concluir que o contrato celebrado entre a autora e o réu, ora recorrente, não abrangia a existência de uma garantia absoluta e incondicionada do banco ao efectivo reembolso do capital investido pela autora;

            E. Se a alteração imprevista e imprevisível do pressuposto de a CNE deixar de estar integrada no mesmo grupo a que o recorrente pertencia, afasta a culpa deste no incumprimento da alegada obrigação de reembolso;

F. Se a responsabilidade pelo pagamento do capital investido na subscrição de papel comercial cabe apenas à entidade dele emitente e;

G. Se o réu BPN, ora recorrente, deve ser condenado como litigante de má-fé.

           

            É a seguinte a matéria de facto dada por provada na decisão recorrida:

Já Assente

1 - Na certidão do Registo Comercial de D....., consta que, desde 17.5.02, a sua accionista é a Partinvest, SA (al. A).

Das respostas à Base Instrutória

2 - No dia 22.1.08, a A. depositou um cheque de € 200.000, 00, na Conta 27927978 na agência do BPN (resposta ao 1º da BI).

3 - A A. pretendia fazer dessa quantia uma aplicação que não comportasse qualquer risco, i.é, cujo rendimento e a recuperação dos valores aplicado fossem 100% seguros (resposta ao 2º da BI).

4 - A sua intenção era fazer a aplicação em depósito a prazo (resposta ao 3º da BI)

5 - A A. foi atendida pelo 2º R (resposta ao 4º da BI).

6 - Ao tempo, o R. B.....era gerente da agência de Ovar (resposta ao 5º da BI).

7 - O 2º R. propôs à A. que aplicasse o seu dinheiro em papel comercial emitido pela CNE (resposta ao 6º da BI).

8 – O qual rendia 5, 553% (resposta ao 7º da BI).

9 - E não tinha qualquer risco no retorno (resposta ao 8º da BI).

10 - O 2º R. assegurou à A. que o retorno dos valores aplicados estava garantido pelo BPN (resposta ao 9º da BI).

11 - Mais assegurou que os valores aplicados seriam retornados por depósito na dita conta, em Ovar, no prazo máximo de um ano, no termo do 1º ano da realização da aplicação (resposta ao 10º da BI).

12 - Confiada na informação do 2º R., a A. aceitou aplicar € 100.000, 00, naquele papel comercial (resposta ao 11º da BI).

13 - Ao tempo dessa subscrição, a A. não recebeu qualquer nota informativa (resposta ao 12º da BI).

14 - Essa nota informativa, reclamou-a, por influência do seu advogado, em carta de 24.4.09 (resposta ao 13º da BI).

15 - À qual o BPN respondeu em 8.5.09 (resposta ao 14º da BI).

16 – Até Setembro de 2009, não se verificou retorno do capital aplicado pela A. (resposta ao 16º da BI).

17 - Com a recepção da nota informativa (fls. 15 a 27, cujo teor aqui se dá por reproduzido), a A. ficou a saber que o Banco (….), SA, do grupo BPN, fizera a “organização, montagem, agência e registo” da emissão (resposta ao 17º da BI).

18 - A CNE procedeu à emissão de papel comercial (resposta ao 19º da BI).

19 – Um dos argumentos invocados pela Direcção Comercial do BPN e que os funcionários da rede de balcões do banco R. repetiam junto dos seus clientes era o de que se tratava de um investimento seguro, uma vez que a CNE era uma empresa que integrava o mesmo grupo empresarial que o BPN (resposta ao 33º da BI).

20 - As orientações e comunicação internas existente no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões consistiam em afirmar a segurança do produto em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade que vinha demonstrando desde 2001 e assegurar que, sendo a CNE uma empresa do Grupo BPN, o Banco cobriria sempre a solvabilidade do produto (resposta ao 51º da BI).

21 - Sendo esta informação veiculada internamente de forma reiterada, designadamente em todas as reuniões de Quadros em que o 2º R., nessa qualidade, participou, entre 2001 e 2007 (resposta ao 52º da BI).

22 - Sendo a CNE apresentada nessas reuniões como sinónimo de sucesso por parte das hierarquias do BPN (resposta ao 53º da BI).

23 - A Instrução de Serviço (IS) nº 19/01, datada de 5.2.03 (cujo tema é Mercado de Capitais e subtema Papel Comercial), em vigor aquando da comercialização daquele produto, determina que a entidade que garante a solvabilidade do papel emitido é o BPN e/ou o Banco Efisa (resposta ao 54º da BI).

A. Se a omissão da notificação do teor das contestações apresentadas pelos co-réus e documentos que as acompanhavam, ao ora recorrente, constitui uma nulidade processual.

Quanto a tal, alega o recorrente que lhe deveriam ter sido notificadas as contestações apresentadas por cada um dos réus, o que não aconteceu, o que acarreta uma nulidade processual porquanto, se assim tivesse sido, teria apresentado prova que contrariasse alguns dos factos ali alegados.

Designadamente, queixa-se o recorrente do facto de não lhe ter sido notificado um documento junto com a contestação do co-réu B....., denominado Instrução de Serviço n.º 19/01, de 5/2/03, em violação do disposto no artigo 526.º CPC.

Em primeiro lugar, cumpre realçar que a denominada “Instrução de Serviço” é um documento elaborado pelo próprio recorrente, pelo que não se compreende a sua alegação quando este (cf. conclusão 3.ª) refere que apenas teve conhecimento do seu teor quando leu a decisão relativa à matéria de facto e sua motivação.

O que mais se realça quando, conforme resulta da audição da prova produzida na audiência de julgamento e respectiva transcrição efectuada pelo próprio recorrente – veja-se, v.g., fl.s 13, 52, 76, 85 e 91 da mesma – o Ex.mo Mandatário do recorrente confrontou algumas das pessoas inquiridas com tal documento.

Estranha-se que o “criador” desconheça a sua “criação”, mormente depois de no julgamento a ter utilizado nos moldes aí relatados.

Pelo que, sem mais delongas, importa concluir que a apreciação de tal documento em sede de fixação da matéria de facto, não pode ter constituído qualquer surpresa para o ora recorrente.

Posto isto, importa referir que nos termos do artigo 492.º CPC, a contestação ou contestações apresentadas apenas têm que ser notificadas ao autor.

Acto este que a lei determina ser efectuado pela secretaria e não nos moldes previstos no artigo 229.º-A, do mesmo Código, quanto aos demais e que ali se determina sejam notificados reciprocamente pelos mandatários das partes.

            Assim, tanto ao recorrente, como às demais partes do processo, se queriam estar informados do estado dos autos, restava usar as prerrogativas que o artigo 167.º do CPC consagra em matéria de consulta dos autos, quer através do exame e consulta dos mesmos na secretaria quer através do exame e consulta por meios informáticos.

Consequentemente, não se impunha que ao recorrente fosse notificada a junção da contestação apresentada pelos demais réus, pelo que não se verifica a invocada nulidade.

A qual, igualmente, não se materializa pela circunstância de não lhe ter sido notificada a junção e teor do documento que acompanhava a referida contestação.

Como vimos, a mesma não tinha de lhe ser notificada.

O documento em causa destina-se a demonstrar a veracidade dos factos nela alegados, pelo que, pelas mesmas razões não tinha de lhe ser notificado.

Por outro lado, nos termos do artigo 526.º, o que se impõe é a notificação do documento à parte contrária e não aos co-réus (o documento foi apresentado por um dos réus), pelo que apenas tinha de ser notificado à autora.

Por último e ainda que de nulidade se tratasse, o que não se verifica, já há muito que o prazo para a sua arguição se mostra esgotado.

Efectivamente, como acima já referimos, o Ex.mo Mandatário do recorrente confrontou o réu Carlos, quando este foi ouvido em depoimento de parte, na audiência de julgamento, como, igualmente, confrontou algumas das testemunhas ouvidas, com o mencionado documento, pelo que há muito que estaria ultrapassado o prazo para a respectiva arguição, como decorre do disposto nos artigos 153.º, n.º 1 e 205.º, n.º 1, ambos do CPC.

Consequentemente, quanto a esta questão, tem o presente recurso de improceder.

B. Se importa repetir o julgamento efectuado para apuramento da matéria alegada nos artigos 48.º a 55.º da contestação apresentada pelo ora recorrente.

No que a esta questão respeita, alega o recorrente que apenas garantiu o reembolso do capital investido pela autora, no pressuposto de a CNE – emitente do papel comercial em causa – ser uma empresa integrada no mesmo grupo a que ele próprio pertencia, aí residindo de forma essencial, a existência de tal garantia.

Com a sua nacionalização, tal pressuposto deixou de se verificar, não se lhe podendo imputar o incumprimento pelo não reembolso de tal capital, o que, para além do mais, se traduz numa alteração imprevista e imprevisível, o que retrata nos artigos 48.º a 55.º da sua contestação e que importa apurar, ainda que à custa da anulação do julgamento efectuado.

Nos artigos 48.º a 55.º da sua contestação, em suma, o recorrente alega que foi inteiramente alheio à decisão governamental que nacionalizou a totalidade do seu capital social e aos moldes em que a mesma ocorreu e que o separou do restante universo de empresas que constituía o denominado Grupo SLN e em que se integrava a CNE, bem como que não fora tal nacionalização o referido Grupo se manteria unido, o que também aconteceria se a nacionalização tivesse atingido todo o grupo.

Mais alega que tal decisão de nacionalização, bem como o modelo para tal adoptado, criou uma situação nova e de todo inesperada para os investidores no produto em causa e portanto, também, para a autora, bem como para o réu, que tinha apresentado ao Banco de Portugal um plano de consolidação e reestruturação financeira que, na sua perspectiva, resolveria os problemas de todo o Grupo SLN.

Ora, de tais artigos da sua contestação, nada releva para averiguar em termos fácticos para além do que foi inserido na base instrutória.

Efectivamente, alegou o réu e assim foi quesitado (quesitos 33 e 51 da base instrutória), que a segurança do papel comercial em causa derivava do facto de se tratar de empresas do mesmo grupo e que o banco assegurava o reembolso do capital investido, o que não se veio a verificar.

Tudo o que se alega nos artigos 48.º a 55.º mais do que factos são conclusões, sendo notório que a decisão de nacionalização do BPN coube ao governo e os respectivos termos constam da lei que a determinou.

O que releva, para o desfecho da causa, é que o réu BPN assegurou o reembolso do papel comercial que comercializou, importando averiguar quais as consequências de tal facto, o que a seguir tentaremos fazer, mas sendo desnecessário, face ao exposto, o apuramento do que se alegou nos referidos artigos da contestação apresentada pelo ora recorrente.

Pelo que, igualmente, quanto a esta questão tem o presente recurso de improceder.

C. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada – relativamente aos quesitos 8.º, 9.º e 10.º, da base instrutória.

Alega o réu que da interpretação do documento junto pelo 2.º réu, designado “instrução de serviço n.º 19/01”, de 5/2/03 e dos depoimentos prestados pelo co-réu B.....e pelas testemunhas E....., F.....e G....., as respostas a dar aos quesitos em referência, deve passar a ser a que refere na sua conclusão 9.ª.

            Posto isto, e em tese geral, convém, desde já, deixar algumas notas acerca da produção da prova e definir os contornos em que a mesma deve ser apreciada em 2.ª instância.

Toda e qualquer decisão judicial em matéria de facto, como operação de reconstituição de factos ou acontecimento delituoso imputado a uma pessoa ou entidade, esta através dos seus representantes, dependente está da prova que em audiência pública, sob os princípios da investigação oficiosa (nos limites e termos em que esta é permitida ao julgador) e da verdade material, se processa e produz, bem como do juízo apreciativo que sobre a mesma recai por parte do julgador, nos moldes definidos nos artigos 653, n.º 2 e 655, n.º 1, CPC – as já supra mencionadas regras da experiência e o princípio da livre convicção.

Submetidas ao crivo do contraditório, as provas são pois elemento determinante da decisão de facto.

Ora, o valor da prova, isto é, a sua relevância enquanto elemento reconstituinte dos factos em apreço, depende fundamentalmente da sua credibilidade, ou seja, da sua idoneidade e autenticidade.

Por outro lado, certo é que o juízo de credibilidade da prova por declarações, depende essencialmente do carácter e probidade moral de quem as presta, sendo que tais atributos e qualidades, como regra, não são apreensíveis mediante o exame e análise das peças ou textos processuais onde as mesmas se encontram documentadas, mas sim através do contacto directo com as pessoas, razão pela qual o tribunal de recurso, salvo casos de excepção, deve adoptar o juízo valorativo formulado pelo tribunal recorrido.

Quanto à apreciação da prova, actividade que se processa segundo as regras da experiência comum e o princípio da livre convicção, certo é que em matéria de prova testemunhal (em sentido amplo) quer directa quer indirecta, tendo em vista a carga subjectiva inerente, a mesma não dispensa um tratamento a nível cognitivo por parte do julgador, mediante operações de cotejo com os restantes meios de prova, sendo que a mesma, tal como a prova indiciária de qualquer outra natureza, pode e deve ser objecto de formulação de deduções e induções, as quais partindo da inteligência, hão-de basear-se na correcção de raciocínio, mediante a utilização das regras de experiência e conhecimentos científicos, tudo se englobando na expressão legal “regras de experiência”.

Estando em discussão a matéria de facto nas duas instâncias, nada impede que o tribunal superior, fundado no mesmo princípio da livre apreciação da prova, conclua de forma diversa do tribunal recorrido, mas para o fazer terá de ter bases sólidas e objectivas.

Não se pode olvidar que existe uma incomensurável diferença entre a apreciação da prova em primeira instância e a efectuada em tribunal de recurso, ainda que com base nas transcrições dos depoimentos prestados, a qual, como é óbvio, decorre de que só quem o observa se pode aperceber da forma como o testemunho é produzido, cuja sensibilidade se fundamenta no conhecimento das reacções humanas e observação directa dos comportamentos objectivados no momento em que tal depoimento é prestado, o que tudo só se logra obter através do princípio da imediação considerado este como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes de modo a que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da decisão.

As consequências concretas da aceitação de tal princípio definem o núcleo essencial do acto de julgar em que emerge o senso; a maturidade e a própria cultura daquele sobre quem recai tal responsabilidade. Estamos em crer que quando a opção do julgador se centre em elementos directamente interligados com o princípio da imediação (v. g. quando o julgador refere não foram (ou foram) convincentes num determinado sentido) o tribunal de recurso não tem grandes possibilidades de sindicar a aplicação concreta de tal princípio.

Na verdade, o depoimento oral de uma testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, reacções imediatas, o contexto em que é prestado o depoimento e o ambiente gerado em torno de quem o presta, não sendo, ainda, despiciendo, o próprio modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo isso contribuindo para a convicção do julgador.

A comunicação vai muito para além das palavras e mesmo estas devem ser valoradas no contexto da mensagem em que se inserem, pois como informa Lair Ribeiro, as pesquisas neurolinguísticas numa situação de comunicação apenas 7% da capacidade de influência é exercida através da palavra sendo que o tom de voz e a fisiologia, que é a postura corporal dos interlocutores, representam, respectivamente, 38% e 55% desse poder - “Comunicação Global, Lisboa, 1998, pág. 14.

Já Enriço Altavilla, in Psicologia Judiciaria, vol. II, Coimbra, 3.ª edição, pág. 12, refere que “o interrogatório como qualquer testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras”.

Então, perguntar-se-á, qual o papel do tribunal de recurso no controle da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento?

Este tribunal poderá sempre controlar a convicção do julgador na primeira instância quando se mostre ser contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos. Para além disso, admitido que é o duplo grau de jurisdição em termos de matéria de facto, o tribunal de recurso poderá sempre sindicar a formação da convicção do juiz ou seja o processo lógico. Porém, o tribunal de recurso encontra-se impedido de controlar tal processo lógico no segmento em que a prova produzida na primeira instância escapa ao seu controle porquanto foi relevante o funcionamento do princípio da imediação.

Tudo isto, sem prejuízo, como acima já referido, de o Tribunal de recurso, adquirir diferente (e própria) convicção (sendo este o papel do Tribunal da Relação, ao reapreciar a matéria de facto e não apenas o de um mero controle formal da motivação efectuada em 1.ª instância – cf. Acórdão do STJ, de 22 de Fevereiro de 2011, in CJ, STJ, ano XIX, tomo I/2011, a pág. 76 e seg.s.).

Tendo por base tais asserções, dado que se procedeu à gravação da prova produzida, passemos, então, à reapreciação da matéria de facto em causa, a fim de averiguar se a mesma é de manter ou de alterar, em conformidade com o disposto no artigo 712, n.º 1, al. a), do CPC., pelo que, nos termos expostos, nos compete apurar da razoabilidade da convicção probatória do tribunal de 1.ª instância, face aos elementos de prova considerados (sem prejuízo, como acima referido de, com base neles, formarmos a nossa própria convicção).

Vejamos, então, as respostas postas em causa pela ora recorrente, nas respectivas alegações de recurso.

Alteração das respostas dadas aos quesitos 8.º, 9.º e 10.º, da base instrutória.

           

Para melhor esclarecimento e facilitar a decisão desta questão, passa-se a transcrever o teor de tais quesitos:

“8)

E (o papel comercial emitido pela CNE, cf. quesito 6.º) não tinha qualquer risco no retorno?

9)

O 2º R. assegurou à A. que o retorno dos valores aplicados estava garantido pelo BPN?

10)

Mais assegurou que os valores aplicados seriam retornados por depósito na dita conta, em Ovar, no prazo máximo de um ano, no termo do 1º ano da realização da aplicação?”

Como consta de fl.s 252, a M.ma Juiz deu-lhes a resposta de “Provado”.

Motivou tais respostas da seguinte forma (cf. fl.s 253 a 255):

“Motivação da decisão de facto:

Foram considerados os documentos juntos aos autos, com relevo para a nota Informativa referenciada na resposta à Base Instrutória (fls. 15 e ss.) e, bem assim, o que resulta de fls. 11 e 12, quanto ao depósito de € 200.000, 00, no balcão de Espinho (conforme ali impresso, após nome e morada da A.), de fls. 12, quanto à subscrição do papel comercial CNE, 10ª emissão, de fls. 115, a nota interna do BPN, difundida pelos seus Administradores e Directores Coordenadores, de fls. 117 e ss., a instrução de serviço 19/01, de 5.2.03, destinada, entre o mais, aos funcionários do BPN (cfr. fls. 117, fine), onde resulta que a subscrição do papel comercial da CNE surge intimamente ligada ao banco R. (o subscritor teria de ter ali, ou no Banco Efisa, conta domiciliada – fls. 118), surgindo o mesmo banco identificado como Garante, ou seja, “Entidade que garante a solvabilidade do papel emitido” (fls. 119), sendo distinta já da instrução de serviço datada de 29.7.09 (constante de fls. 121 e ss.), onde pode ver-se que como garante o BPN só surge “caso se aplique” (fls. 122), de fls. 153, quanto ao envio, pelo BPN ao mandatário da A., da nota informativa do produto subscrito pela A.

No mais, a convicção de que a A. não pretendeu, com a subscrição do produto em causa, investir em produto de risco, estando convencida, no momento da subscrição, de que, findo o prazo de um ano, lhe seria restituído, sem dúvida, o capital e lhe seria pago o valor de juros, alcançou-se mediante a consideração, além daqueles documentos, do conjunto dos depoimentos prestados em audiência.

Assim, o R. B....., na época gerente do BPN, agência de Ovar, afirmou não ter a certeza de haver entregue à A. a nota informativa relativa ao papel comercial cuja subscrição foi por si proposta a esta quando a mesma lhe referiu pretender efectuar o depósito de € 200.000, 00.

Acrescentou que a A. pretendia, segundo lhe disse, efectuar aplicações sem risco e, de entre estas, aconselhou-lhe a aqui em questão por ter um rendimento ligeiramente superior a um vulgar depósito a prazo e, por se tratar de uma empresa do grupo do BPN, ter a mesma garantia de um depósito a prazo, isto é”, o Banco garantia a empresa se esta não honrasse os seus compromissos”, como, aliás, constava da primeira das instruções de serviço supra mencionadas.

Também E....., sobrinha da A., confirmou que chegou a falar com o R. B....., na qualidade de gerente da referida agência bancária, a fim de este procurar para a A. uma forma de aplicação das poupanças daquela, mas sabendo que para a A. (actualmente com 83 anos), seria impensável efectuar uma aplicação que comportasse qualquer margem de risco.

José Martins, testemunha que assistiu a uma conversa que ocorreu entre a A., o R. B.....e a testemunha anterior, ficou convencido, pelo que ouviu, que a aplicação em causa tinha o mesmo risco que um vulgar depósito a prazo.

Maria Adelaide Oliveira, filha da A., já conhecia o R. B....., por ser o gestor da conta da A., tendo com ele conversado acerca da mesma, noutras ocasiões. Na ocasião dos autos, a A. telefonou-lhe da agência de Ovar do BPN informando-a da proposta para subscrição deste produto pelo que, ignorando do que se tratava, falou ao telefone com aquele gerente, aqui R., afirmando-lhe que a sua mãe era uma cliente de risco zero e que não pretendia efectuar qualquer investimento que envolvesse alguma possibilidade de perda. Isto porque a A. ficara viúva recentemente e dispunha de uma reforma mínima. Obteve do R. B.....a informação de que o BPN garantia o pagamento, após um ano, tal como se se tratasse de um depósito a prazo (até porque era reduzida a diferença relativamente à taxa de juro associada a um depósito a prazo), não lhe tendo falado da existência de uma qualquer ficha informativa.

De igual forma a testemunha João Simão, que conhece a A. há vários anos, sabe que, até por causa da sua idade, a A. não faz aplicações financeiras que envolvam risco de perda.

As demais testemunhas inquiridas, designadamente os funcionários do Banco R(….), (….) e (….), nada revelaram saber quanto ao caso concreto da A., muito embora a segunda destas tenha referido que os funcionários do Banco tinham a indicação interna de que o “risco do produto era idêntico ao risco do Banco”, e era isto que transmitiam aos clientes, facto que foi referido pela terceira das testemunhas que afirmou “não existir risco algum para os clientes” sendo que, desde 2002, participava em reuniões de quadros do Banco onde lhes era transmitida a boa solvabilidade do produto em causa e daí o interesse do Banco em comercializá-lo.

Decorreu do cômputo destes depoimentos e da sua concatenação com os documentos já mencionados que o BPM não actuou, in casu, como mero intermediário na colocação de um produto da CNE, revelando-se como garante (o que consta da própria documentação interna referida aos seus funcionários) da solvabilidade daquela. Assim, ainda que a A. admitisse não se tratar de um vulgar depósito a prazo, nunca lhe foi referida a menor hipótese de o seu dinheiro, findo o prazo, poder não vir-lhe a ser devolvido, se não por outrem, pelo menos pelo Banco onde tinha domiciliada conta bancária, tendo-lho o R. B.....aconselhado com base nas instruções hierárquicas e informações prestadas pelo BPN aos seus funcionários quanto à garantia de solvabilidade.

Os factos não provados resultaram da ausência de prova quanto ao seu conteúdo.”.

Vejamos, então, se dos depoimentos testemunhais invocados pelo recorrente (bem como dos demais produzidos, ouvidos na íntegra) e sem olvidar as considerações prévias, quanto a tal, já acima explanadas, existem motivos para que as supra mencionadas respostas sejam modificadas ou alteradas.

Desde já adiantando a solução, somos de opinião que a prova foi bem apreciada pela M.ma Juiz a quo nos moldes em que acima se transcreveram.

Em primeiro lugar e como aí referido, dos documentos internos do próprio banco ressalta a ideia de que a emissão do papel comercial em causa tinha como alvo os seus clientes (constituía um dos requisitos obrigatórios a titularidade de uma conta D.O. numa das suas agências ou do Banco (….) – cf. fl.s 118), sendo que como expressamente consta de fl.s 119 o BPN aparecia como “Garante – Entidade que garante a solvabilidade do papel emitido”.

Esta expressão apenas pode ser entendida como tendo o sentido de que “fosse como fosse, corressem as coisas como corressem”, o banco assumia a responsabilidade do pagamento (da solvabilidade) do papel emitido.

Passando para análise da prova produzida em audiência de julgamento mais se consolida tal conclusão.

Efectivamente, desde logo, resulta do depoimento de parte prestado pelo réu B....., ao tempo funcionário do BPN, na agência de Ovar e com quem a autora tratou do assunto relacionado com a operação de subscrição de papel comercial que está na génese dos presentes autos, foi referido que “o cliente (autora) o que pretendia quando veio ao BPN, ao banco, pretendia fazer aplicações sem risco e dentro das aplicações sem risco, para nós essa era uma aplicação considerada sem risco”.

Acrescentando que a autora “pretendia fazer aplicações sem risco”.

Reiterando que informou a autora de que se tratava de um produto sem risco.

Mais à frente, afirmou:

“o banco criava condições para que essas empresas honrassem os seus compromissos e penso que isso aconteceu diversas vezes, portanto, penso que já estávamos na 10.ª, 11.ª emissão deste tipo de produtos, e nunca se levantou a questão que podia não honrar esses produtos, quer dizer, esta garantia subjacente que nós dávamos era neste contexto, tal como eu vendia um depósito a prazo;

(…)

eu nunca questionei o risco de um depósito a prazo, e nunca questionei que se o banco porventura nunca fosse nacionalizado, esse juro desse depósito a prazo podiam estar em risco, quer dizer, nem nunca expliquei ao cliente o que era um depósito a prazo efectivamente.

A garantia era a garantia do banco, e nestes produtos no vencimento, era esta garantia que nós transmitíamos, e era esta garantia que era veiculada dentro do banco”.

Relativamente à garantia dada pelo banco, referiu o seguinte:

“o banco garantia essa empresa no caso de ela não conseguir honrar os seus compromissos, por ser do mesmo grupo”.

Quanto à taxa de juros mencionou ser a mesma de cerca de “5.5”.

Por E....., sobrinha da autora, foi referido ter tido uma conversa com o B.....acerca da aplicação da tia, já depois de ter surgido o problema decorrente do não reembolso do capital e não pagamento de juros em que este disse que “o produto que vendeu à tia estava 100% garantido pelo banco, que era um produto garantido, que não tinha risco”.

O teor desta conversa foi escutado e reproduzido pela testemunha José António Costa Martins, que a descreveu em moldes coincidentes com os da anterior testemunha, a quem acompanhava na altura.

A testemunha (….), filha da autora, a qual foi contactada telefonicamente pelo B.....quando a sua mãe subscreveu o produto em causa e lhe explicou do que se tratava, referiu que este lhe disse que “este produto tem a garantia do BPN, isto é mesmo garantido, é a mesma coisa que seja um depósito a prazo, isto não tem risco nenhum, só tem que lá estar um ano e depois vai outra vez para a conta com os juros”.

Acrescentando que o questionou para a hipótese de a empresa não pagar, tendo-lhe este dito que “se a empresa não pagar paga o BPN”, realçando que era a 10.ª emissão e nunca tinha havido problemas e se os houvesse pagava o BPN.

Também a testemunha (…..), funcionário do BPN, na agência de Ovar, referiu que “tinham a informação de que o produto era seguro, tão seguro como a instituição de crédito à data da subscrição”, por se tratar de empresas do mesmo grupo.

Igualmente por (….) gerente da agência do BPN em Viseu, foi dito que “Não havia qualquer risco associado à colocação desse produto, até porque, a própria instrução de serviço, a nota interna do banco, previa exactamente a data da subscrição, a data limite da aplicação, que era um ano, e o retorno de capital, acrescido dos respectivos juros, que a taxa de juro também era garantida”.

Acrescentando que:

“O que era referido aos clientes era exactamente estas condições de comercialização, portanto, era um produto bom, era uma boa alternativa aos depósitos a prazo, nos termos em que a taxa de juro era melhor, era mais atractiva, e como tinha data de subscrição, data de vencimento, e como no vencimento esta aplicação, este capital investido era creditada na conta à ordem, portanto, era um produto excelente, e uma alternativa aos depósitos a prazo”.

Mais referindo expressamente que: “nunca tinham tido problemas com esse produto, nem com outro nenhum papel comercial, sempre foram creditados passado um ano”.

Daqui resulta que o BPN pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação deste produto e passassem a ideia de que ao mesmo não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros, garantindo, se necessário fosse, ele próprio, a satisfação de tais encargos.

Esta conclusão resulta, desde logo, demonstrada pelo teor da Instrução de Serviço criada e veiculada pelo próprio BPN aos seus empregados, referida na fundamentação da matéria de facto dada como provada e confirmada pelos seus funcionários, inquiridos em julgamento, como atrás referimos.

Assim, resulta amplamente demonstrada a factualidade vertida nos artigos 8.ºa 10.º da base instrutória, pelo que as respectivas respostas só poderiam ser, como foram, as de “provado”, sem que se vislumbrem razões (bem pelo contrário) para que as mesmas sejam alteradas, designadamente no sentido propugnado pelo recorrente, o que acarreta a improcedência do presente recurso, quanto a esta questão, em função do que se mantém a factualidade que foi dada como provada em 1.ª instância.

            D. Se alterada a matéria de facto dada como provada, no sentido propugnado pelo recorrente, se tem de concluir que o contrato celebrado entre a autora e o ora recorrente, não abrangia a existência de uma garantia absoluta e incondicionada do banco ao efectivo reembolso de capital investido pela autora.

            No que a esta questão concerne, como o próprio recorrente começa por afirmar, para que o presente recurso pudesse ter sucesso teria de ser alterada a matéria de facto dada como provada em 1.ª instância, no sentido que defende, o que não aconteceu, como resulta da questão anterior.

            Assim e desde logo, se revela de difícil alcance a sua pretensão, concordando-se com a decisão recorrida que se sufraga, sendo, apenas, de referir mais o que se segue.

            Não constitui novidade para ninguém que os bancos se dedicam à prática de actos bancários, com carácter profissional e habitual, com vista à obtenção do lucro, em regime de tendencial exclusividade, para o que constroem uma estrutura e orgânica com vista à realização de tal escopo e também à salvaguarda dos direitos e interesses de quem procura os seus serviços (clientes), que neles depositam confiança nos serviços e informações que pelo banco lhes são prestadas, no âmbito da realização ou preparação de actos e contratos bancários.

            Como refere Agostinho Cardoso Guedes, in A Responsabilidade do banco por informações à luz do artigo 485.º do Código Civil, in Revista de Direito e Economia, Ano XIV, 1988, a pág.s 138 e 139: “… o problema da responsabilidade por informações como problema autónomo, coloca-se, principalmente, quando o dador aparece, perante o destinatário, portador de qualidades específicas que o habilitam a fornecer tais informações, as quais induzem o mesmo destinatário a nelas fazer fé. No caso do banco, o cliente presume uma competência e organização, uma profissionalização específica, que os bancos objectivamente possuem.”.

            Em idêntico sentido se pronuncia Menezes Cordeiro, in Manual de Direito Bancário, Almedina, 1998, quando ali escreve: “a informação bancária distingue-se da comum por ser – tendencialmente – técnico-jurídica, simples, directa e eficaz.”.

            Daí que, cf. artigos 73.º a 76.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (DL n.º 298/92, de 31/12), se exige às instituições de crédito, em todas as actividades que exerçam, que assegurem aos clientes, elevados níveis de competência técnica, dotando a sua organização empresarial com os meios materiais e humanos necessários para realizar condições apropriadas de qualidade e eficiência (art.º 73.º).

            De igual modo, cf. artigo 74.º, se exige que, nas relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito procedam com diligência, lealdade e respeito consciencioso dos interesses que lhe estão confiados.

            Para além de que (artigo 76.º), os seus administradores e membros dos órgãos de administração, devem proceder com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição dos riscos e da segurança das aplicações, e tendo em conta os interesses dos depositantes, dos investidores e demais credores.

            Ainda, de acordo, com o seu artigo 75.º, n.º 1, as instituições de crédito devem informar os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos suportados por aqueles.

            Como fundamento das normas ora citadas, está a intenção de proteger a confiança dos clientes dos bancos nas informações que estes lhes prestam aquando das conversações e ou contactos preliminares à celebração de um acto/contrato bancário, correspondente ao serviço tido em vista e que, hoje em dia, revestem uma panóplia quase infindável de serviços e “produtos financeiros” e em que mais se acentua a necessidade de uma maior protecção dos clientes dos bancos, dada a cada vez maior variedade, especificidade e natureza de tais “produtos”, a que se encontra associada uma maior necessidade de quem os adquire ser cabalmente esclarecido daquilo que está a subscrever ou a comprar, dados os inúmeros riscos que, a muitos deles, se encontram associados.

            Pelo que, se as informações que são prestadas pelo banco são inexactas, incompletas ou falsas e foram causais da celebração de um acto ou contrato com o banco, então, este, terá de ser responsabilizado pelos danos que assim causa, quer por via contratual quer extra-contratual, consoante a particular especificidade fáctica do caso em apreço.

            Efectivamente, como refere Menezes Cordeiro, in Banca, Bolsa E Crédito, Estudos de Direito Comercial e de Direito da Economia, I Vol., Almedina, 1990, pág.s 40 a 42, no caso dos bancos, atenta a sua natureza e organização específica, o dever de informação tem um carácter acentuado (intenso), visando a protecção da parte débil no contrato, sendo que “A fraqueza apura-se, aqui pela falta de conhecimento e de experiência do utente do banco ou pela ausência de liberdade” e em que a “protecção da parte fraca efectiva-se através de particulares deveres de informação e de esclarecimento, a cargo da parte forte.”.

O dever de informação rigorosa e precisa quando contrata com os seus clientes é, pois, um dever de conduta fundamental para o banco e da sua violação resulta a obrigação de indemnizar os danos causados, já que quer ao abrigo do disposto no artigo 762.º, n.º 2, do CC, se exige às partes que actuem de boa fé na execução do contrato, bem como ao abrigo do disposto no seu artigo 227.º, n.º 1, logo nos preliminares ou na formação do contrato, se exige que as partes contratantes procedam segundo as regras da boa fé e em que se contam, indiscutivelmente, os deveres de lealdade, transparência, informação rigorosa e exacta e de cabal esclarecimento.

Como refere Agostinho Cardoso Guedes, ob. cit. a pág.s 147 e 148: “Sempre que alguém se dirige a um banco para com ele celebrar um contrato (um depósito bancário, um empréstimo, a compra de títulos da sociedade proprietária do banco, um desconto, um empréstimo hipotecário, depósito de títulos, etc., e se inicie «uma actividade comum dos contratantes, destinada à análise e elaboração do projecto de negócio», não parece restar qualquer dúvida que qualquer dos contraentes fica imediatamente vinculado aos deveres resultantes do art. 227.º, e, consequentemente, o banco pode ser obrigado a prestar informações ou conselhos ou, quando tal dever não surja por força do dever de agir com boa-fé, responsabilizado, ainda assim, por informações ou conselhos inexactos (desde que, com esse comportamento, se violem outros deveres de conduta, tal como acontecia com os deveres laterais de origem contratual de que resultem danos”.

Tudo isto, como corolário da protecção do princípio da confiança que está subjacente a toda a problemática da responsabilidade por informações prestadas pelos bancos, quando contratam com os respectivos clientes ou nos preliminares de tais contratos, atento o já mencionado dever especial de diligência que sobre aqueles (bancos) impende, atentos os especiais fins que estão inerentes à sua actividade e decorrentes da sua especial orgânica e profissionalização.

Havendo até quem defenda (Luís Teles de Menezes Leitão, in Informação Bancária e Responsabilidade, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, Volume II, Direito Bancário, Almedina, 2002, a pág. 230) que mesmo nos casos em que o banco presta conselhos ou recomendações sobre negócios (consultoria em relação a decisões de investimento, intermediação em operações sobre valores mobiliários, etc.), mesmo neste âmbito, sempre que a informação prestada tenha um cariz objectivo, se deve presumir a culpa do banco, nos termos do disposto no artigo 799.º do CC, que, “como entidade especializada na matéria se compromete à prestação de informações exactas, cabendo a ele ilidir sempre essa presunção com a demonstração de que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua.”.

Isto por contraposição a outros (cf. Agostinho Cardoso Guedes, ob cit., pág.s 139 a 141), que defendem que nos casos de recomendações ou conselhos sobre determinada operação negocial, v.g., compra e venda de acções, obrigações, títulos de participação, é muito difícil controlar a veracidade ou exactidão das informações, já que, para além da recolha e avaliação de factos, estão em causa previsões e prognoses sobre a evolução da situação económico-financeira e diversas análises que comportam maior risco.

Todavia, convém frisar que no caso que ora nos ocupa, se trata de uma informação de cariz elevadamente objectivo: já que apenas se trata de informar o cliente se estava ou não assegurado o reembolso por parte do banco do capital investido, informação, esta, que não estava dependente de quaisquer variantes analíticas ou evolução da conjuntura económico-financeira.

Era uma informação prestada aquando da subscrição do produto, objectiva, não dependendo de qualquer condição e que era verdadeira ou falsa.

A autora, por conselho do funcionário do ora recorrente adquiriu o mencionado papel comercial, com a informação que tinha retorno assegurado do capital investido, sendo que este é um dos casos em que impende sobre o banco o dever de prestação de conselho ou informação, já que se trata de casos em que o banco presta ao cliente informações sobre a respectiva segurança e rendimento ou é aconselhada a sua compra e em que, por regra, sem a prestação de tal conselho ou informação grande parte da clientela não adquiriria tais produtos – neste sentido, Sinde Monteiro, Responsabilidade Por Conselhos Recomendações Ou Informações, Almedina, 1989, a pág. 49.

Traçado este quadro teórico da responsabilidade dos bancos por conselhos ou informações, importa, agora, analisar o quadro factual em apreço a fim de determinar se existe ou não responsabilidade do ora recorrente pelos danos causados à autora.

E, em nossa opinião, a resposta não pode deixar de ser positiva.

Efectivamente, como resulta do que consta dos itens 2 a 12 e 19 a 22 dos factos provados, a autora só adquiriu o papel comercial emitido pela CNE, porque o banco a informou de que se tratava de um produto seguro, com retorno assegurado, que, ele próprio assegurava (cf.item 10.º).

Tal não veio a acontecer, encontrando-se a autora desapossada da quantia investida, reitera-se porque o banco a aconselhou a assim proceder, no pressuposto, erróneo, de que o retorno do capital era garantido.

Atento o que acima se deixou dito, existe responsabilidade do banco, quer porque nos preliminares do contrato informou a autora de que estava garantido o retorno, quando assim não sucedeu, decorrendo a sua responsabilização do disposto no artigo 227.º do CC quer porque ao celebrar o contrato, persistiu na mesma informação ou conselho, violando os ditames da boa fé negocial, nos moldes estabelecidos no artigo 762.º do CC.

Consequentemente, é o ora réu responsável pelos prejuízos que a autora sofreu na sua esfera patrimonial decorrentes da sua (dele, banco) conduta, mantendo-se, pois, a decisão recorrida.

Pelo que, quanto a esta questão, improcede o recurso.

            E. Se a alteração imprevista e imprevisível do pressuposto da CNE deixar de estar integrada no mesmo grupo a que o ora recorrente pertencia, afasta a culpa deste no incumprimento da alegada obrigação de reembolso.

            No que a esta questão concerne, alega o recorrente que apenas aconselhou a compra do papel comercial da CNE, garantindo o seu reembolso, por se tratar de empresas do mesmo grupo, o que deixou de se verificar com a sua nacionalização, a que foi alheio, o que constitui uma alteração imprevista e imprevisível desse pressuposto, sendo que só assim actuou no pressuposto da manutenção de tal empresa no seio do mesmo grupo.

           

            Como já referimos aquando da decisão da questão elencada em B, o que o ora réu alegou foi que actuou como actuou por se tratar de empresas do mesmo grupo.

            Tal matéria foi quesitada e objecto de discussão, tendo vindo a demonstrar-se.

            Mas nada mais do que isto foi alegado e só agora em sede de alegações de recurso (cf. fl.s 289) é que o recorrente alegou que tal garantia de retorno do capital foi dada no pressuposto essencial da manutenção da CNE no seio do mesmo grupo empresarial.

            Uma coisa é alegar que garantiu o reembolso do capital por se tratar de empresas do mesmo grupo e outra que se deu tal garantia condicionada à manutenção de ambas essas empresas no mesmo grupo.

            Conforme artigo 489.º CPC, toda a defesa deve ser deduzida na contestação, pelo que carece de relevância o que a este respeito o ora recorrente veio alegar em sede de recurso.

            O que, verdadeiramente, acarreta a que se trate de “questão nova”, não alegada nem discutida em 1.ª instância.

Ora, é sabido que os recursos não se destinam a apreciar questões novas, não discutidas nas instâncias anteriores.

            Ao invés, constituem “remédios jurídicos” para determinadas questões, de facto ou de direito, já apreciadas na decisão recorrida, pelo que não nos incumbe desta questão conhecer.

            Assim, tem esta questão, igualmente, de improceder.

            F. Se a responsabilidade pelo pagamento do capital investido na subscrição de papel comercial cabe apenas à entidade dele emitente.

            Alega o recorrente que nunca foi a sociedade dominante do grupo SLN, pelo que não pode responder pelo passivo das demais a ele pertencentes, em conformidade com o disposto no artigo 501.º do CSC, para além de que a responsabilidade do pagamento pela subscrição de papel comercial cabe apenas à entidade dele emitente.

            Quanto a isto apenas incumbe referir que, como deixámos exposto aquando da análise e decisão da questão elencada em D, a responsabilização do ora recorrente pelo pagamento da quantia peticionada pela autora assenta na violação das normas legais aí mencionadas, com base nos fundamentos aí, igualmente, expressos e que têm por fundamento a sua própria conduta pré-contratual e contratual, no modo como informou a autora dos termos do contrato e como com ela veio a contratar e não por assumir responsabilidades de outrem.

            Ou seja, a condenação do ora recorrente assenta no facto de ter assegurado o reembolso do capital investido pela autora, o que não se veio a verificar e não em qualquer outro pressuposto, designadamente a assunção de uma obrigação de outrem.

            Isto é, o ora recorrente responde pela sua própria conduta (violação dos deveres acima explicitados) ao contratar, como contratou, com a autora.

            Não de trata, pois, de assumir uma obrigação de uma outra empresa do grupo, mas de uma própria, pelo que não tem aplicação o preceito legal que invoca.

            Consequentemente, tem esta questão, igualmente, de improceder.

            G. Se o réu BPN, ora recorrente, deve ser condenado como litigante de má fé.

            Defende a autora, ora recorrida, que o BPN deve ser condenado por litigância de má fé por nas suas alegações de recurso “invocar nulidades que inventa” e que só teve conhecimento da existência de um documento nos autos quando leu a decisão da matéria de facto e respectiva motivação, quando o usou para confrontar as testemunhas no decurso da audiência de julgamento, o que faz de forma manifestamente reprovável, com o fim de entorpecer a justiça ou protelar o trânsito em julgado da decisão.

Conforme o artigo 456.º, n.º 2 do CPC, litiga de má fé quem, com dolo ou negligência grave, tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar (al. a); tiver alterado a verdade dos factos (al. b) ou tiver feito do processo um uso manifestamente reprovável, com o fim de obter um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade ou entorpecer a acção da justiça (al. d).

            No que concerne à invocação da nulidade por omissão de notificação ao ora recorrente da contestação apresentada por um dos co-réus, estamos no domínio da mera defesa, pelo que não se pode ter por verificada a existência de lide de má fé.

            Tal questão foi julgada improcedente mas não pode sancionar, por isso, como litigante de má fé a parte que arguiu tal nulidade, por não se verificarem os respectivos pressupostos.

            No que se refere ao invocado desconhecimento da junção e teor da supra mencionada informação de serviço já nos pronunciámos no âmbito da decisão da questão elencada em A.

            É certo que o recorrente não teve dela conhecimento só quando leu a decisão da matéria de facto e respectiva fundamentação, pelos motivos já ali referidos e que aqui se dão por reproduzidos.

            Não obstante, entendemos que tal conduta não poderá ser sancionada por litigância de má fé, já que não constitui o único fundamento do recurso, pelo que não se poderá falar em protelar o trânsito em julgado da decisão proferida em 1.ª instância.

            Por outro lado, também não se pode considerar que estejamos perante uma verdadeira “pretensão” ou “oposição”, tal como configurada na al. a) do n.º 2 do art.º 456.º CPC, podendo, quando muito, tratar-se de “lide temerária”.

            Também a sua relevância para a decisão da causa é quase nula, por não se tratar de questão substantiva integrante da causa de pedir da acção, mas apenas de uma questão lateral, sem que, reitera-se, se compreenda tal alegação por parte do réu, ora recorrente.

            Por tudo isto, consideramos não ser de sancionar a conduta do recorrente como litigante de má fé.

           

Nestes termos se decide:       

Julgar improcedente o presente recurso de apelação e, consequentemente, mantém-se a decisão recorrida.

Custas pelo apelante.

            Coimbra, 09 de Outubro de 2012.