Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
933/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR. SERRA LEITÃO
Descritores: TRABALHO EVENTUAL
OCASIONAL OU DE CURTA DURAÇÃO
Data do Acordão: 05/26/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: CASTELO BRANCO
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Legislação Nacional: ARTº 8º, Nº 1, DA LEI Nº 100/97, DE 13/09 .
Sumário:

I – Pode considerar-se como trabalho eventual ou ocasional aquele cuja necessidade surge imprevista e excepcionalmente em determinada ocasião, não sendo de exigir a sua periodicidade .
II – Compete à entidade empregadora o ónus de alegação e de prova de factualidade tendente a demonstrar a aplicabilidade do artº 8º, nº 1, al. a), da Lei nº 100/97, de 13/9 .
III – Ficando demonstrado que um trabalhador estava a exercer as funções de servente da construção civil e que laborava na construção de um telhado de uma casa, isso implica a realização de uma série de actos profissionais que não se compadece com a ideia de eventualidade ou de ocasionalidade , tanto mais que o trabalho de construção de um telhado não integra um quadro de trabalho de “ curta duração “ .
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juizes da Secção Social do T. Relação de Coimbra
BB, intentou acção com processo especial, emergente de acidente de trabalho, contra CC., e DD, alegando que:
- Trabalhou por conta do 2º. R., sob a sua direcção efectiva e fiscalização, desde 01.09.2001;
- Na data do acidente tinha as funções de trabalhador rural, estando contidas nestas a função de servente da construção civil;
- Auferia a remuneração diária de 24,94 euros, que incluía o subsídio de alimentação;
- Trabalhava à data do acidente na construção de um telhado de uma casa sita em Vale Figueira, tendo sido nesse local que, em 27.09.2001, enquanto prestava a sua actividade, caiu de um muro onde se encontrava;
- Em consequência da queda fracturou o oleocrâneo e o côndilo externo do úmero do braço e do ombro esquerdos, sendo portador de I. T. A. durante 57 dias, desde a data do acidente até à data da alta;
- Na tentativa de conciliação a que oportunamente se procedeu não houve acordo quanto à I. P. A. para o trabalho habitual de servente da construção civil e de trabalhador rural, com incapacidade funcional residual de 17,2% para o exercício de outra profissão, desde 23.11.2001, não tendo também o 2º. R. aceite a caracterização do acidente como de trabalho e o salário por si declarado;
- Não está a ter qualquer acompanhamento médico na sua recuperação, já que os serviços clínicos da 1ª. Ré não assumem qualquer responsabilidade pela reparação dos danos emergentes do acidente;
- Tem recorrido aos serviços de urgência do Hospital Amato Lusitano, estando sujeito a demoras e a esperas intermináveis;
- Continua com as fixações ( fios K ) utilizadas para tratamento das fracturas, que já deviam ter sido retiradas há muito tempo, podendo agravar-lhe a incapacidade residual e provocando-lhe dores enormes, apenas conseguindo mover a mão;
- Sofreu e sofre de infecções no braço esquerdo, que não foram tratadas;
- A recuperação tem sido lenta e dolorosa, prevendo-se que perdure caso não tenha o tratamento adequado;
- Tem sofrido insónias, irritabilidade e nervosismo sistemático, derivado das dores e da incerteza do seu futuro e da sua recuperação;
- Gastou, até à presente data, a quantia de 121 euros em despesas de alimentação, transportes e medicamentos;
- O 2º. R. transferiu a sua responsabilidade emergente de acidentes de trabalho para a Ré mediante contrato de seguro titulado pela apólice n.º. 25-10-079467.
Concluiu pedindo a condenação da Ré CC. ou do R. DD no pagamento das seguintes prestações:
a) - A pensão anual e vitalícia de, pelo menos, 3.519 euros;
b) - A importância de 4.010,34 euros de subsídio por situação de elevada incapacidade;
c) - A quantia de 995,10 euros, a título de indemnização por I. T. A.;
d) - A importância de 121 euros de despesas de deslocação, alimentação e medicamentos;
e) - A quantia de 7.500 euros, a título de danos não patrimoniais;
f) - Todas as despesas necessárias com o seu tratamento e recuperação.
Contestaram os R.R., alegando o demandado DD que
O acidente que vitimou o A. não é um acidente de trabalho;
Em data anterior ao acidente, deu ao A. 33 caibros para este reparar o telhado da sua casa de residência;
Como forma de agradecimento, o A. ofereceu-se para ajudar na construção de um muro de uma propriedade sua, que demorou dois dias a ser construído e onde trabalhou apenas no dia 27.09.2001 ( dia do acidente );
O A. não trabalhava por sua conta, não estava vinculado por qualquer contrato de trabalho ou outro equiparado, nem recebia qualquer retribuição;
Do trabalho prestado pelo A. não resultou qualquer proveito económico para o contestante;
Trabalha na construção civil no concelho do Fundão, onde permanece durante a semana, e reside em Vale Figueira, onde possui alguns terrenos agrícolas de que cuida nos fins de semana, produzindo apenas para consumo próprio, com ajudas ocasionais da mãe e de outros familiares, os mesmos que o ajudaram na construção do muro à data do acidente, não tendo contratado qualquer trabalhador para a execução daquela obra;
O acidente a que se reportam os presentes autos está assim excluído do âmbito da Lei dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais ( exclusões previstas no n.º. 1 do artº. 8º. da Lei n.º. 100/97, de 13.09 ), não sendo, por isso, um acidente de trabalho;
- Acresce que transferiu a responsabilidade decorrente de acidentes de trabalho para a Ré, através da apólice n.º. 079467/25, mantendo-se o contrato válido e eficaz na data do acidente;
De acordo com as condições especiais da apólice, encontram-se seguros os trabalhos ligados à construção civil que respeitem a pequenas reparações das casas das propriedades que constituem a exploração agrícola, muros ou quaisquer infra-estruturas ligadas à unidade de exploração agrícola, o que era o caso, por se tratar da construção de um muro na propriedade do R.;
Daí que seja a Ré CC. a responsável pelo pagamento das quantias peticionadas pelo A., caso se venha a entender que lhe são devidas;
O A. nunca exerceu a actividade de pedreiro ou de servente da construção civil, tendo sido há muitos anos revisor de autocarros em Lisboa, vindo posteriormente residir para Vale Figueira, onde cultiva os seus terrenos, só trabalhando esporadicamente e sempre ao dia na agricultura;
É desde há muito pessoa doente, não tendo já capacidade de trabalho, pelo que ninguém o contrata para qualquer actividade;
O A. nunca trabalhou para o contestante antes da data do acidente, nem posteriormente;
E continua a trabalhar nas suas propriedades, tal como fazia antes do acidente;
Se não está a ter acompanhamento médico, tal facto é-lhe imputável, pois sempre se pode deslocar ao médico de família e ao Hospital onde seria assistido;
Os danos não patrimoniais peticionados pelo A. não são indemnizáveis no âmbito dos acidentes de trabalho;
A factura n.º. 01195, datada de 27.09.2001, no montante de 10.000$00, junta aos autos, foi paga pelo ora demandado, pelo que não pode o A. reclamar o respectivo montante;
Desconhece se o A. efectuou ou não as restantes despesas cujo pagamento peticiona, pelo que as impugna, sucedendo também que as facturas dos restaurantes não têm qualquer nome, pelo que não aceita que os respectivos montantes tenham sido pagos pelo A..
Concluiu no sentido de que deve declarar-se que o acidente de que o A. foi vítima não é um acidente de trabalho, e, consequentemente, ser absolvido da instância, ou, caso assim se entenda, ser considerado válido e eficaz o contrato de seguro celebrado com a Ré, com a correspondente transferência para aquela da responsabilidade decorrente do acidente, com a sua consequente absolvição da instância, ou, se ainda assim não for entendido, a acção ser julgada improcedente, por não provada, e o contestante absolvido do pedido.
Por sua vez, a Ré CC. alegou que:
- Desconhece, sem obrigação de saber, se corresponde à verdade a matéria vertida nos artºs. 1º. a 6º., 16º. a 24º. e 26º. da petição inicial;
- O contrato de seguro que celebrou com o R., titulado pela apólice n.º. 25-10-079467, vigora em regime de prémio fixo-agrícola por área, conforme resulta dos autos;
- A primeira decorrência deste tipo de seguro consiste na menção, no mapa de inventário que faz parte integrante da apólice, do nome do trabalhador, da localização da área cultivada e das culturas predominantes de cada uma das parcelas que constituem a unidade de produção agrícola, nos termos da condição especial uniforme 05.1-al.a);
- O R. não deu cumprimento àquela condição especial, pelo que fica a dúvida sobre se, e desde quando, integrava o A. a unidade produtiva;
- O A. declarou que andava, no momento do acidente, a trabalhar como servente de construção civil, enchendo as colunas do 1º. piso de um edifício ainda em construção;
- De igual modo, o 2º. R. declarou em 02.11.2001 que há dois dias contratara o A. para lhe dar serventia na reconstrução de uma casa que comprara;
- A contratação do A. como servente para trabalhos da construção civil não se compagina com a natureza da actividade agrícola, tal qual o prevê a condição especial 05.1;
- Por outro lado, os trabalhos ligados à construção civil escapam ao domínio do seguro agrícola, excepto se consistirem em pequenas reparações em casas das propriedades que constituem a exploração agrícola, muros ou quaisquer infra-estruturas ligadas, exclusivamente, à unidade de exploração agrícola.
Concluiu pela improcedência da acção e pela sua absolvição com as legais consequências.
Prosseguindo o processo seus regulares termos veio a final a ser proferida decisão, que:
a) - Absolveu a Ré CC. dos pedidos.
b) – Condenou o R. DD a pagar ao A.
- a pensão anual e vitalícia de 4.117,29 euros, devida desde 24.11.2001, actualizada para 4.236,69 euros e para 4.321,42 euros a partir, respectivamente, de 01.12.2001 e de 01.12.2002, no seu domicílio, adiantada e mensalmente até ao 3º. dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, sendo também devidos subsídios de férias e de Natal, de montante igual ao de cada prestação, pagáveis, respectivamente, nos meses de Maio e de Novembro.
- a quantia de 4.010,28 euros, a título de subsídio por situação de elevada incapacidade permanente.
- a indemnização de 1.160,97 euros pelo período de 57 dias de I. T. A..
- os juros de mora já vencidos e vincendos, até efectivo e integral pagamento, sobre todas as prestações pecuniárias devidas, à taxa anual de 7% até 30.04.2003 e de 4% a partir de 01.05.2003.
- a suportar as despesas com a assistência médica e cirúrgica, geral ou especializada, incluindo todos os necessários elementos de diagnóstico e tratamento, assistência farmacêutica, hospitalar e quaisquer outras prestações em espécie, seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho do A e à sua recuperação para a vida activa, que se venham a mostrar indispensáveis para os indicados fins
Discordando apelou o 2º R , alegando e concluindo:
1- A resposta dada ao quesito 4º é uma resposta manifestamente excessiva, sem qualquer correspondência com o mesmo, pelo que terá de ser considerada não escrita, não podendo produzir qualquer efeito
2- Igualmente é excessiva a resposta dada ao quesito 5º e contraria o alegado pelo A e que foi aceite pelo R, devendo por isso considerar-se como não escrita;
3- Deve assim anular-se a resposta àquele quesito, nos termos do artº 712º do CPC;
4- Não resultou provada a data da contratação do trabalhador, nem por quanto tempo foi;
5- O enchimento de uma viga é um trabalho ocasional e de curta duração;
6- O acidente de que foi vítima o A, não é um acidente de trabalho, nos termos do artº 8º da L. 100/97 de 13/9, já que ocorreu na prestação de um serviço ocasional, de curta duração, numa actividade que não teve por objecto qualquer exploração lucrativa;
7- Pelo que o acidente não podia ser considerado como de trabalho, devendo o R ser absolvido do pedido;
8- Ao decidir assim, violou a sentença recorrida o disposto no artº 8º da L. 100/97 de 13/9;
Mesmo que assim não se considere, o que não se concede
9- Não se provou qual o tempo de duração de trabalho prestado pelo A;
10- Qual a sua categoria profissional
11- Pelo que nunca poderia o R, ser condenado no pagamento dos montantes em que o foi, antes devendo o montante a pagar ser calculado segundo o prudente arbítrio do juiz, tendo em atenção a natureza dos serviços prestados, a categoria profissional do sinistrado e os usos
12- Ao não decidir assim, a sentença recorrida violou o disposto no artº 26º n.º 5 da LAT
13- A sentença recorrida condenou o A em montante superior e em objecto diverso do pedido ao condenar o Apelante no pagamento de juros e mora e indemnização superior ao pedido, pelo que é nula nos termos do artº 661º e 668º do CPC
14- Nestes termos deve a presente apelação ser julgada procedente e em consequência substituir a decisão recorrida por outra que julgue a acção improcedente e absolva o R do pedido, ou,
Se assim não se entender deve ser anulada a decisão a ordenar a realização de novo julgamento.
Contra alegou o recorrido defendendo a correcção da sentença em crise.
Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, tendo o Ex. mo Sr PGA emitido douto parecer, no sentido da respectiva improcedência( fls. 262/265 ), cumpre decidir
Dos Factos:
Foi a seguinte a factualidade dada como assente na 1º instância
1. - O A. trabalhou por conta do segundo R., sob a sua direcção efectiva e fiscalização, desde data não concretamente apurada do mês de Setembro de 2001.
2. - Na data do acidente o A. encontrava-se a exercer funções de servente da construção civil.
3. - O A. auferia o salário de 24,94 euros por dia útil de trabalho.
4. - O A. trabalhava à data do acidente na construção de um telhado de uma casa, sita em Vale Figueira, integrando-se a construção do telhado nas obras de restauração iniciadas pelo R. Joaquim Costa em 16 de Julho de 2001 de uma casa de que é proprietário, consistindo tais obras na substituição do soalho em madeira por uma placa em cimento, na construção de uma placa, também em cimento, para suporte do telhado, na substituição total deste, e na reparação de uma cozinha, de uma casa de banho e de um quarto.
5. - Foi nesse local que o A., em 27.09.2001, enquanto prestava a sua actividade, caiu do telhado, onde se encontrava a encher uma viga, para a placa ao nível do 1º. piso.
6. - Em consequência da queda, o A. sofreu várias lesões no braço e no ombro esquerdos.
7. - Do acidente de que foi vítima resultaram como sequelas para o A. limitação conjugada da mobilidade das articulações do ombro e cotovelo do braço esquerdo e flexão e extensão do cotovelo do mesmo braço, que lhe determinaram incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de servente de pedreiro e trabalhador agrícola, associada a uma I. P. P. de 18%, com capacidade funcional residual de 82% para o exercício de outra profissão que não implique utilização do braço esquerdo, nem habilitações literárias superiores às que possui ( 4ª. classe ), a partir de 24.11.2001, bem como I. T. A. desde 27.09.2001 até 23.11.2001 ( cfr. apenso para fixação da incapacidade para o trabalho ).
8. - Nenhum dos R.R. pagou ao A. qualquer quantia a título de indemnização por I. T. A..
9. - Em data anterior ao acidente, o R. Joaquim Costa deu ao A. caibros em quantidade não concretamente apurada para reparação do telhado de uma dependência da casa de residência do A..
10. - O R. Joaquim Costa trabalhava como servente da construção civil no concelho do Fundão, onde permanecia durante a semana.
11. - O R. Joaquim Costa reside em Vale de Figueira, onde possui alguns terrenos agrícolas de que cuida, tratando também propriedades rústicas da mãe.
12.- Os produtos que colhe nos terrenos agrícolas de que cuida destinam-se apenas a consumo próprio e da mãe, com quem vive.
13. - É o R. Joaquim Costa que cuida dos terrenos referidos em 11. com a ajuda de sua mãe.
14. - O A. nunca exerceu a actividade de pedreiro.
15. - Foi há muitos anos revisor de autocarros na zona do Fundão.
16. - O A. veio residir posteriormente para Vale Figueira e passou a cultivar ali os seus terrenos.
17. - A factura n.º. 01195 que se encontra a fls. 59, datada de 27.09.2001, no montante de 10.000$00, foi paga pelo R. Joaquim Costa.
18. - O A. andava, no momento do acidente, a trabalhar como servente de construção civil, enchendo uma viga no telhado de uma casa do R. Joaquim Costa, que estava a ser restaurada.
19. - Em data não concretamente apurada do mês de Setembro de 2001, o A. passou a dar serventia na restauração de uma casa que o R. Joaquim Costa comprara.
20. - O R. Joaquim Costa transferiu a responsabilidade decorrente de acidentes de trabalho para a Ré CC., através da apólice n.º. 25-10-079467.
21. - O contrato de seguro acima referido vigorava em regime de prémio fixo-agrícola por área.
22. - O mencionado contrato de seguro não é aplicável, nos termos da condição especial uniforme 05.2, alínea h), à execução de trabalhos ligados à construção civil, salvo os que respeitarem a pequenas reparações em casas das propriedades que constituem a exploração agrícola, muros ou quaisquer infra-estruturas ligadas, exclusivamente, à unidade de exploração agrícola.
23. - O contrato de seguro referido em 20. não garantia os acidentes de trabalho que ocorressem no prédio em que se encontrava implantada a casa referida em 4. dos factos provados.
Do Direito
Sabe-se que é pelas conclusões das alegações, que se delimita o âmbito da impugnação- artºs 684 n.º 3 e 690º nºs 1 e 3 ambos do CPC-.
Destarte e n o caso em apreço temos que as questões colocadas pelo Apelante são:
- nulidade da sentença por condenar para além e em objecto diverso do pedido:
- respostas incorrectas( por excesso) dadas aos quesitos 4º e 5º
- inexistência de acidente de trabalho, por o sinistro ter ocorrido na prestação de um serviço ocasional, de curta duração, numa actividade que não teve por objecto qualquer exploração lucrativa
- cálculo das prestações reparadoras.
Vejamos então.
No que concerne ao primeiro item( nulidade da sentença), efectivamente e nos termos do artº 668º n.º 1 e) do CPC, a sentença padecerá de tal vício se condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
Porém e no domínio adjectivo laboral, por força do que determina o artº 77º n.º 1 do CPT a arguição de nulidades da sentença tem que ser feita expressa e separadamente n o requerimento de interposição do recurso( itálico nosso).
Ora “ in casu” tal não sucedeu.
O que impede desde logo o seu conhecimento por este Tribunal, como é posição firme de toda a jurisprudência dos Tribunais Superiores( cfr. p. ex. CJ/STJ, X, I, 261).
Mas mesmo que assim se não entendesse, a verdade é que, na situação concreta essa nulidade nunca se verificaria.
Na realidade no domínio infortunístico laboral, estamos perante direitos indisponíveis do trabalhador.
Do que resulta, que independentemente do que é peticionado, o julgador é obrigado a condenar no pagamento de todas as prestações legalmente previstas e conforme o montante que dos normativos aplicáveis resulta.
Aliás só assim se compreende o teor do prescrito no artº 135º do CPT8 que estabelece regime similar ao artº 138º do anterior CPT) quando determina que o juiz fixe juros de
mora pelas prestações pecuniárias em atraso.
Em suma: a decisão em crise, não é nula.`
Improcede assim a douta conclusão n.º 13.
No que concerne ao excesso contido nas respostas dadas aos quesitos 4º e 5º, também- e salvo o devido respeito- não acolhemos a tese do Recorrente.
Na verdade, o julgador perante um quesito não está limitado a uma resposta de “ provado” ou de “ não provado”.
Existem como se sabe respostas de teor restritivo, e também as de natureza explicativa.
O que importa é que não exorbite a matéria questionada.
E a nosso ver, tal não sucede.
Efectivamente e no que ao quesito 4º concerne, perguntava-se se o A, á data do acidente trabalhava na construção de um telhado de uma casa, sita em Vale de Figueira.
E na respectiva resposta, o Ex. mo Julgador, respondeu afirmativamente, explicitando em que é consistiam tais obras e desde quando as mesmas ocorriam
Cremos- e como bem nota o Ex. mo Sr. PGA no seu douto parecer- que não se foi além do núcleo essencial da matéria de facto contida no quesito.
Aliás e para a caracterização do acidente como de trabalho bastaria por princípio, a demonstração- que foi feita como resulta da factualidade apurada- que o A trabalhava na altura por conta do R e sob a direcção efectiva e a fiscalização deste.
E se simplesmente a resposta a este quesito tivesse sido a de” provado”- quadro em que evidentemente nenhum excesso poderia ter sido cometido- nem por isso poderia se mais, vingar a tese do R, de que estava afastada a caracterização do acidente como de trabalho, por se tratar de sinistro ocorrido na prestação de serviços eventuais ou ocasionais, de curta duração.
E o mesmo tipo de raciocínio vale para a resposta dada ao quesito 5º.
Na verdade neste se perguntava, se fora no local indicado no quesito 4º, que em 27/9/01, enquanto prestava a sua actividade, o A caiu de um muro, onde se encontrava.
A resposta dada foi afirmativa, com a explicação de que no momento o A se encontrava a encher uma viga para a placa ao nível do 1º piso.
Mas estivesse ele a exercer a actividade que estivesse, desde que evidentemente no âmbito da construção do telhado em causa e laborando com base num contrato de trabalho que celebrou com o R e demonstrado que ficou que a queda ocorrera no exercício desse trabalho, julgamos ser indubitável, que o sinistro em causa não poderia nunca deixar por esta via de se considerar como tendo natureza laboral, atento desde logo as definições contidas nos artºs 2º n.º 2 e 6º n.º 1 ambos da L. 100/97 de 13/9.
Pelo que não se acolhem igualmente as conclusões 1, 2 e 3, das doutas alegações de recurso.
Pretende ainda o recorrente, que não existe lugar à reparação infortunística, pois que o acidente em causa, cai na previsão do artº 8º n.º 1 a) da LAT.
E na verdade diz este normativo que são excluídos do âmbito da presente lei os acidentes ocorridos na prestação de serviços eventuais ou ocasionais, de curta duração, a pessoas singulares em actividades que não tenham por objecto exploração lucrativa.
Ora é certo que não ficou provada a data do início do contrato de trabalho celebrado entre A e Réu.
Igualmente nos parece óbvio, que o simples enchimento de uma viga, por si só configura uma actividade de curta duração.
Também se pode aceitar sem esforço que, estando o A a trabalhar numas obras que se integravam no restauro de uma casa do Réu, está afastada a hipótese de qualquer exploração lucrativa.
Mas será isto o bastante para deixar de considerar este sinistro como de trabalho?
Salvo o devido respeito, entendemos que não.
Não nos fornece o legislador, a definição de serviço eventual ou ocasional, assim como do que deve ser entendido por curta duração.
Porém e conforme escreve Carlos Alegre, in Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, Regime Jurídico, Anotado 2º ed. págs. 65 a 68, pode considerar-se como serviço eventual ou ocasional, aquele cuja necessidade surge imprevista e excepcionalmente, em determinada ocasião, não sendo de exigir a sua periodicidade.
Ora e como já se referiu, dúvidas não há, que entre A e R foi celebrado um contrato de trabalho.
E que o acidente ocorreu no tempo e local de trabalho.
Daí que por princípio o aludido evento integra a definição de “ acidente de trabalho”- cfr. citados artºs 2º n.º 2 e 6º n.º 1 da LAT.
Pelo que competiria ao R, o ónus de alegação e prova de factualidade tendente a demonstrar a aplicabilidade do dito artº 8º n.º 1 a)- cfr. artº 342º nº2 do CCv.-.
Salvo melhor entendimento não logrou tal objectivo.
Na realidade não é relevante o facto de se desconhecer a data do início do contrato.
Pode suceder- e por vezes acontecerá- que um trabalhador sofra um acidente logo no primeiro dia de actividade e nem por isso tal evento perde aquela característica.
Depois se é verdade que ficou assente que o sinistro ocorreu quando o A procedia ao enchimento de uma viga, não é menos verdade que não se provou que fosse aquela a única tarefa, para que fora contratado.
Pelo contrário demonstrou- se que ele estava a exercer as funções de servente da construção civil e que laborava na construção de um telhado de uma casa propriedade do aqui recorrente, o que naturalmente implica a realização de uma série de actos profissionais, que não se compadece com uma ideia de eventualidade ou ocasionalidade, como acima foi definida
Depois este tipo de trabalho( construção de um telhado) não integra segundo as regras da experiência comum um quadro de trabalho de “ curta duração”.
E como resulta da economia do dito artº 8º a “ curta duração” do labor é elemento essencial para que não se apliquem as regras da reparação infortunísticas previstas na LAT e demais legislação complementar.
Em suma: da factualidade assente não resulta em nosso modesto entendimento, minimamente demonstrado que o A exercia uma tarefa ocasional e que o seu trabalho ( fosse de curta duração.
Logo afastada fica a aplicação do regime estatuído no aludido artº 8º.
O que vale dizer, que se está perante um verdadeiro acidente de trabalho, o que confere ao A, como sinistrado que foi, o direito á reparação prevista na atinente legislação.
Deste modo igualmente não se acolhem as doutas conclusões 4 a 8(inclusive).
Finalmente insurge-se o apelante quanto á forma como se procedeu ao cálculo dos montantes da reparação entendendo, que pelo contrário se deveria ter lançado mão do prudente arbítrio do juiz, tendo em atenção a natureza dos serviços prestados , a categoria profissional do sinistrado e os usos( cfr. artº 26º n.º 5 da LAT).
Também aqui nos permitimos discordar do Recorrente.
Na realidade e como resulta do cotejo do referido n.º 5 com os nºs anteriores da mesma norma, o comando estabelecido naquele n.º 5 apenas funcionará, quando a retribuição do dia do acidente não corresponder á retribuição normal.
Ora se está dado como assente que vítima na altura do sinistro percebia o salário diário de € 24, 49 então era esta a sua a retribuição normal.
E é a partir dela que se tem que partir para a definição do montante quer da pensão devida por IPP, quer da indemnização concernente a Its( citado artº 26º seus nºs 1 e 2) sendo certo que os montantes das indemnizações e pensões atribuídas em virtude de incapacidades temporárias e permanentes, não dependem do período temporal em que o doente ou sinistrado, esteve ao serviço do empregador, mas sim e apenas da remuneração auferida e o grau de desvalorização sofrido( artºs 26º e 17º nº1 e suas alíneas, ambos da LAT).
Pelo que da mesma forma improcedem as conclusões 9 a 12 ( e consequentemente 14)
das doutas alegações de recurso.
Termos em que e concluindo, confirmando-se a sentença recorrida, se julga improcedente a apelação.
Custas pelo R.
Fixo os honorários devidos ao Ex. mo Patrono Oficioso do A em 8 URs, a pagar pelo CGT.