Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
133-B/1999.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HÉLDER ROQUE
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
SEPARAÇÃO JUDICIAL DE PESSOAS E BENS
Data do Acordão: 02/12/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TOMAR
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Legislação Nacional: ARTIGO 825.º; 1406.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Sumário: 1. Na estrutura do processo actual, de matriz publicista, não individualista, torna-se necessário, para obviar as insuficiências do princípio do dispositivo, por vezes, a intervenção supletiva do princípio do inquisitório, mediante a imposição de ónus, que constituem outros tantos estímulos para que a parte assuma no processo a atitude que convém à descoberta da verdade e ao triunfo da justiça.
2. Não tendo o requerente, sobre quem recaía o ónus de identificar os bens de que se arrogava titular e cuja penhora, alegadamente, ofendia os seus direitos, apesar de, expressamente, advertido, para tanto, por despacho judicial, correspondido a essa determinação, por entender que tal implicava a prática de um acto inútil, deve o Tribunal não considerar como demonstrado o facto que se queria provar.
Encontrando-se nos autos certidão comprovativa da pendência da acção de separação judicial de bens, instaurada nos termos do estipulado pelo artigo 1406º, nº 1, a), importa, consequentemente, determinar a suspensão da execução, até à partilha, em conformidade com o disposto pelo artigo 825º, nºs 2 e 3, ambos do CPC, mantendo-se, entretanto, as penhoras já decretadas
Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:


M....., residente na Rua ……., requerente nos autos de execução, com processo ordinário, para pagamento de quantia certa, instaurados pela Administração do Condomínio do C……., com sede em Tomar, contra a executada L.....também, residente na Rua ……., interpôs recurso de agravo da decisão que determinou o prosseguimento da execução, em virtude de não ter identificado os bens de que se arroga titular e cuja penhora ofenderá os seus direitos, terminando as suas alegações com o pedido da suspensão da presente execução, até à partilha a efectuar na acção especial de separação judicial de pessoas e bens, formulando as seguintes conclusões:
1ª – O douto despacho recorrido traduz um lapso manifesto do Mº Juiz face aos documentos e elementos já existentes nos autos.
2ª – Com efeito, a folhas 222 a 222 verso, já constava a indicação e descrição total dos bens de que o agravante era titular e, sobre os mesmos, a folhas 227 foi ordenada a penhora da meação do cônjuge do agravante, de nome Lúcia de Jesus Lourenço Simões.
3ª – Logo, constatando tais elementos dos autos, incidindo sobre os mesmos bens e por despacho judicial uma penhora sobre a meação do cônjuge do executado, desnecessário e ilegal se mostrava e mostra uma nova indicação pelo agravante, pois o mesmo seria praticar um acto inútil, o que aliás não é permitido pelo artigo 137º, nº 1, do CPC.
4ª – O Mº Juiz recorrido, por lapso, não atendeu aos mesmos, quando deveria ter atendido, pelo que, impõe-se a revogação ou a reforma do despacho, nos termos da alínea b), do nº 2, do artigo 669º, do CPC, no sentido de considerar tais documentos e elementos anteriormente trazidos aos autos.
5ª – Além do mais o douto despacho recorrido não tem qualquer fundamentação de direito, pelo que é nulo nos termos da alínea b), do nº 1, do artigo 668º, do CPC, aplicável aos despachos nos termos do nº 3, do artigo 666º, do CPC.
6ª – O agravante cumpriu o que se lhe impunha, ou seja, a junção aos autos da certidão comprovativa da pendência no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Ourém da acção especial de separação judicial de pessoas e bens nº 560/05.0TBVNO, o que fez a folhas 240 e 241.
7ª – Por isso, em vez da decisão recorrida, deveria o Mº Juiz ter determinado a suspensão da execução até à partilha no processo referido na conclusão anterior, em cumprimento do nº 3 do artigo 825º do CPC, na redacção anterior à reforma introduzida pelo DL nº 38/2003, de 8 de Março.
8ª – Ao decidir como decidiu violou o Mº Juiz recorrido o artigo 158º, nº 1, b), o nº 1 do artigo 668º, b), o nº 2 do artigo 669º e o nº 3 do artigo 825º, todos do CPC e, este último, na redacção anterior à do DL nº 38/2003, de 8 de Março.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Exº Juiz sustentou a decisão impugnada, por considerar não haver sido causado agravo ao recorrente.
Com interesse relevante para a apreciação do mérito do agravo, importa reter a seguinte factualidade:
1 – Por despacho judicial, datado de 5 de Maio de 2006, o requerente-agravante foi convidado a identificar cada um dos bens de que se arroga titular e que esteja penhorado – Documento de folhas 25.
2 - O requerente-agravante não deu cumprimento ao despacho referido em 1, pois que “de outro modo iria identificar aquilo que já estava previamente identificado” – Documento de folhas 7 a 10.
3 – Em novo despacho judicial, este datado de 12 de Junho de 2006, de que se recorre, o Tribunal «a quo», considerando que o requerente M....., apesar de, expressamente, notificado para o efeito, não identificou os bens de que se arroga titular e cuja penhora ofenderá os seus direitos, entendeu não ser possível conhecer da sua pretensão, pois que depende de tal alegação, determinando o prosseguimento da execução – Documento de folhas 3.
4 – O requerente-agravante instaurou acção especial de separação judicial de pessoas e bens contra a executada, sua esposa, L.....juntando a respectiva certidão aos presentes autos – Documento de folhas 14 a 20.
5 – Nos presentes autos de execução, foi penhorada a meação da executada L.....nos bens comuns do casal que constituiu com o requerente – Documento de folhas 21 a 31 e 32 a 61.

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Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.
As questões a decidir no presente agravo, em função das quais se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3 e 690º, todos do Código de Processo Civil (CPC), são as seguintes:
I – A questão de saber qual a consequência processual da recusa pelo executado no cumprimento de despacho judicial que lhe solicita a identificação de bens cuja penhora o afectará, a pretexto de ser manifesta a evidência da sua prévia individualização nos autos.
II – A questão de saber qual a consequência processual da junção aos autos de certidão da pendência de acção de separação judicial de bens, proposta pelo cônjuge do executado contra este.

I. DA INOBSERVÂNCIA DELIBERADA DO CONVITE À PARTE PARA A PRÁTICA DE UM ACTO

O executado louva-se no entendimento de que o cumprimento da notificação judicial em que lhe era solicitada a identificação de certos bens seria um acto inútil, que o artigo 137º, do CPC, declara ilícito, em virtude de o Tribunal «a quo» não ter atentado, como devia, em que os documentos e elementos existentes nos autos não exigiam que à mesma fosse dado cumprimento.
O princípio da cooperação para a descoberta da verdade e na administração da justiça, está consagrado nos artigos 266º, nºs 1, 2 e 3, 266º-A e 519º, nº 1, todos do CPC, consistindo no dever, imposto a todos os intervenientes no processo, sejam ou não partes na causa, de colaborarem entre si, de boa fé, concorrendo para, com eficácia e brevidade, poder ser obtida a justa composição do litígio, e atingida a descoberta da verdade, quer comparecendo, quando, para tal, forem notificados, quer prestando os esclarecimentos que, por lei, lhes possam ser exigidos, quer submetendo-se às inspecções necessárias, facultando o que for requisitado ou praticando os actos que forem determinados.
No âmbito do princípio da cooperação, de natureza não, meramente, programática, cabe a obrigação de informar ou esclarecer os factos que ao Juiz seja lícito conhecer, exceptuando, como é óbvio, aqueles que caem no âmbito do princípio da livre disponibilidade das partes, importando o não cumprimento deste dever, relativamente aos factos de que o Juiz pode conhecer, a aplicação das consequências que a própria lei, por interpretação ou integração das suas normas, dispõe para o efeito.
Entre estas consequências, destaca-se, pela sua especial importância, o conteúdo do artigo 519º, nº 2, que estipula que “aqueles que recusem a colaboração devida [para a descoberta da verdade material] serão condenados em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis; se o recusante for parte, o tribunal apreciará livremente o valor da recusa para efeitos probatórios, sem prejuízo da inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no nº 2 do artigo 344º do Código Civil”, disposição esta, subsidiariamente, aplicável ao processo comum de execução, atento o preceituado pelo artigo 466º, nº 1, ambos do CPC, de modo a que se realize, com a brevidade possível, a reparação material e efectiva do direito violado ou o acertamento negativo da obrigação exequenda, eliminando a eficácia do título como tal.
Este reforçado princípio da cooperação intersubjectiva e da direcção do processo pelo juiz, que plasma certos factores internos de garantia da nova racionalidade económica do processo executivo Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, Lex, Lisboa, 1998, 24 e 25; e Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, Lex, Lisboa, 1997, 629 e 630., impõe, igualmente, aquele, como decorre do preceituado pelo artigo 266º, nº 4, do CPC, desde que a parte “…alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício da faculdade ou o cumprimento do ónus ou dever processual,…, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo”.
Efectivamente, em relação às partes, importa tomar precauções no sentido de conciliar o dever de cooperação com o direito de defesa do interesse que a parte prossegue, através do processo, a fim de não redundar em negação desse direito.
Na estrutura do processo actual, de matriz publicista, não individualista, o princípio do contraditório já não constitui a panaceia capaz da alcançar, indistintamente, a descoberta da verdade material, tornando-se necessário, para obviar as insuficiências do princípio do dispositivo, por vezes, a intervenção supletiva do princípio do inquisitório, mediante a imposição de ónus que constituem outros tantos estímulos para que a parte assuma no processo a atitude que convém à descoberta da verdade e ao triunfo da justiça Calamandrei, Instituições, 219 a 222..
E, na acção executiva, propriamente dita, ainda que a sua estrutura se traduza, fundamentalmente, em operações materiais e jurídicas, avulta a característica da direcção do processo pelo juiz, que lhe impõe a remoção oficiosa de todos os impedimentos à prolação de uma decisão sobre o mérito da causa, devendo ainda providenciar pelo suprimento das irregularidades do requerimento executivo, bem como sanar a falta de pressupostos processuais, desde que remediáveis, que impedem uma reparação material do direito violado, sob pena de indeferimento, em conformidade com o preceituado pelo artigo 812º, nºs 4 e 5, do CPC.
Tratando-se já de um acto a praticar pelo exequente, sujeito, no exercício dos seus direitos ou no cumprimento dos ónus que lhe são impostos, a prazos pré-fixos, apenas está sujeito, na falta de disposição expressa, às preclusões gerais da interrupção e deserção da instância e à condenação em custas Anselmo de Castro, A Acção Executiva Singular, Comum e Especial, 1973, 2ª edição, 132..
Revertendo ao caso em apreço, importa reter que o executado estava onerado a identificar os bens de que se arrogava titular e cuja penhora, alegadamente, ofenderia os seus direitos, não o tendo feito, apesar de, expressamente, advertido, para tanto, por despacho judicial, por entender, na hipótese de o efectuar, que praticaria um acto inútil, porquanto a prova a realizar já se encontraria carreada para os autos.
Com efeito, face à recusa da parte na observância do dever de cooperação, o Tribunal conferirá à respectiva omissão o valor probatório que entender adequado, desde a sua irrelevância, à prova do acto que se pretendia averiguar ou à não consideração do facto que se queria provar.
Assim sendo, cabendo ao requerente o ónus da prova dos factos constitutivos do seu alegado direito, não o querendo fazer, suporta a consequência, por força do estipulado no artigo 342, nº 1, do Código Civil (CC), de o Tribunal poder determinar o prosseguimento da execução, como se, efectivamente, não o tivesse conseguido efectuar.
Não existe, por isso, a invocada nulidade do despacho, por falta da respectiva fundamentação jurídica, porquanto só a total ausência dos fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão, ainda que se não citem os preceitos da lei que a abonem, desde que se apontem os princípios jurídicos em que se baseou, origina a nulidade da decisão, a que se reporta o artigo 668º, nº 1, b), do CPC STJ, de 1-3-1990, BMJ nº 395, 479; e de 15-11-1985, BMJ nº 351, 304; STA, de 25-1-1977, BTE, 2ª série, 3º, 77, 374. , sendo certo que o mesmo, face ao demonstrado, uma vez que contendia com os meios de prova a oferecer pela parte, não se revelava, manifestamente, como um acto inútil.

II. DA PENDÊNCIA DA ACÇÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL DE BENS

Acontece uma situação de indevida apreensão de bens comuns, quando não tenha sido requerida a citação do cônjuge do executado, em conformidade com o estipulado pelo artigo 825º, nº 1, do CPC, excepto se a penhora tiver incidido sobre os bens aludidos no nº 2, do artigo 1696º, do CC, quando, não tendo sido citado o cônjuge do executado, no património próprio deste ainda existam bens penhoráveis que não foram objecto de apreensão, e, finalmente, quando o cônjuge, único executado, nomear, voluntariamente, à penhora, sem o consentimento do outro, bens comuns cuja oneração careça do consentimento de ambos.
No caso «sub judice», o oponente, cônjuge do executado, não se encontra obrigado, no título que se executa, nem contra si a exequente promoveu a execução.
O artigo 825º, nº 1, do CPC, na redacção antecedente à introduzida pelo DL nº 38/03, de 8 de Março, aplicável, «ex vi» do estipulado pelos artigos 21º, nº 1 e 23º, deste último diploma legal, segundo a qual, “na execução movida contra um só dos cônjuges, podem ser penhorados bens comuns do casal, conquanto que o exequente, ao nomeá-los à penhora, peça a citação do cônjuge do executado para requerer a separação de bens”, podendo, prossegue o respectivo nº 2, qualquer dos cônjuges requerer, dentro de quinze dias, “…a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência da acção em que a separação já tenha sido requerida, sob pena de a execução prosseguir nos bens penhorados”, conjugadamente com o texto actual do nº 1, do artigo 1696º, do CC, em conformidade com o qual, “pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns”, consubstanciou, como continua a suceder com a actual redacção do Código de Processo Civil, oriunda do DL nº 38/03, de 8 de Março, a eliminação da moratória, tornando válida a penhora de bens comuns do casal, realizada em execução instaurada contra um só dos cônjuges, para cobrança de dívidas por que só ele é responsável, desde que o exequente, ao nomear tais bens à penhora, tenha solicitado a citação desse cônjuge para requerer a separação de bens ou feito juntar certidão comprovativa da pendência da acção em que a separação já tenha sido requerida.
Antes da revisão, operada pelo artigo 4º, nº 1, do DL nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, constava do artigo 1696º, nº 1, do CC, que, “pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns, neste caso, porém, o cumprimento só é exigível depois de dissolvido, declarado nulo ou anulado o casamento, ou depois de decretada a separação de pessoas e bens ou a simples separação judicial de bens”, enquanto que o suporte processual pretérito daquele artigo 825º, nº 1, do CPC, estava redigido em termos de, “na execução movida contra um só dos cônjuges, a execução dos bens comuns fica suspensa, depois de penhorado o direito à meação do devedor, até ser exigível o cumprimento, nos termos da lei substantiva”.
Com efeito, face ao estipulado pelo artigo 825º, nº 1, do CPC, resulta, tão-só, que a penhora subsidiária dos bens comuns não pode ser realizada, enquanto não for requerida a citação do cônjuge do executado, sendo, porém, condição suficiente que esta seja solicitada, ainda que a mesma seja ordenada, em momento posterior à respectiva penhora, para que o juiz possa mandar penhorar os bens, alegadamente comuns, nomeados pelo exequente.
No regime actual, não há lugar à aludida moratória forçada à execução do credor, uma vez que os bens comuns podem ser, imediatamente penhorados, mesmo que a execução seja instaurada só contra um dos cônjuges, para cobrança de dívida por que apenas ele seja responsável, restando ao cônjuge do executado a possibilidade de requerer a separação das meações ou de juntar certidão comprovativa da pendência da acção em que a separação já tenha sido requerida, no prazo de que dispõe para a oposição, devendo o exequente, para esse efeito, no momento em que nomeia bens comuns do casal à penhora, pedir que a citação do cônjuge do executado se faça com essa cominação TC, de 12-11-98, DR, IIª série, 16111..
Finalmente, a este propósito, acentue-se que, definindo o artigo 864º-A, do CPC, sucessor do extinto artigo 864º-B, entretanto, revogado, o estatuto processual do cônjuge do executado, ao dispor que este “…, citado nos termos da alínea a) do nº 3 do artigo anterior, é admitido a deduzir, dentro do prazo concedido ao executado, oposição à execução ou à penhora e a exercer, na fase do pagamento, todos os direitos que a lei processual confere ao executado, sem prejuízo de poder também requerer a separação dos bens do casal, nos termos do nº 5 do artigo 825º, quando a penhora recaia sobre bens comuns”, tal significa que, a partir da citação, nos termos do estipulado pelo já aludido artigo 864º, nº 1, c), o cônjuge do executado passa a ocupar, funcionalmente, a posição de executado e a figurar como parte no processo, ainda que não como parte principal, não assumindo a sua intervenção a natureza de litisconsórcio sucessivo, mas, apenas, a de promotor dos termos do processo, designadamente, do processo de separação judicial de bens comuns Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum à Face do Código Revisto, 2000, 365 e 366..
Dispõe ainda o artigo 826º, do CPC95/96, que “nos casos de comunhão num património autónomo ou de compropriedade em bens indivisos, se a execução for movida apenas contra algum ou alguns dos contitulares, não podem ser penhorados os bens compreendidos no património comum ou uma fracção de qualquer deles, nem uma parte especificada dos bens indivisos”, mas, tão-só, o direito que a eles tiver o executado.
Com efeito, o regime consagrado pelo normativo acabado de considerar aplica-se, actualmente, à penhora do direito a uma herança impartilhada, ou seja, à penhora de um quinhão hereditário, ao direito a uma quota parte numa sociedade e à penhora de direito a um património autónomo, cuja titularidade pertença a várias pessoas, mas não, v. g., à penhora do direito à meação do executado nos bens comuns do casal, face à alteração legislativa verificada nos artigos 1696º, nº 1, do CC, e 825º, do CPC, a partir da reforma processual de 1995/96 Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum à Face do Código Revisto, 2000, 215, nota 592. .
É que, podendo o exequente penhorar, imediata, mas, subsidiariamente, bens comuns do casal, concretos e determinados, por ter sido abolida a moratória, nas execuções movidas contra um dos cônjuges, nenhum interesse tem para aquele a penhora do direito à meação, a não ser pela preferência concedida ao exequente sobre o produto dos bens comuns que, por força da dissolução do casamento, venham a caber ao executado, relativamente a credores com penhoras subsequentes sobre os concretos bens que, pela partilha, sejam adjudicados ao cônjuge executado.
Porém, não obstante pela cessação da comunhão conjugal, em consequência do divórcio, se transitar de uma situação de comunhão de mão comum ou de património colectivo Mota Pinto, Direitos Reais, 1971, 258. para uma situação de compropriedade STJ, de 19-1-95, www.dgsi.pt, JSTJ00029845; RC, de 12-11-2002, www.dgsi.pt, JTRC01830; RL, de 30-11-90, www.dgsi.pt, JTRL00002566., considerando que a obrigação exequenda é anterior à dissolução da sociedade conjugal, é-lhe aplicável, consequentemente, a regulamentação legal das dívidas dos cônjuges, contida, designadamente, nos artigos 1688º, 1689º e 1789º, todos do CC, mantendo os bens comuns essa qualidade, até à sua divisão e partilha, porquanto a extinção do vínculo conjugal não faz operar, automaticamente, a alteração do regime matrimonial de bens.
Revertendo à hipótese em análise, considerando que se encontra nos autos certidão comprovativa da pendência da acção de separação judicial de bens, instaurada nos termos do estipulado pelo artigo 1406º, nº 1, a), importa, consequentemente, determinar a suspensão da execução, até à partilha, em conformidade com o disposto pelo artigo 825º, nºs 2 e 3, ambos do CPC, mantendo-se, entretanto, as penhoras já decretadas.

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CONCLUSÕES:

I - Na estrutura do processo actual, de matriz publicista, não individualista, torna-se necessário, para obviar as insuficiências do princípio do dispositivo, por vezes, a intervenção supletiva do princípio do inquisitório, mediante a imposição de ónus, que constituem outros tantos estímulos para que a parte assuma no processo a atitude que convém à descoberta da verdade e ao triunfo da justiça.
II - Não tendo o requerente, sobre quem recaía o ónus de identificar os bens de que se arrogava titular e cuja penhora, alegadamente, ofendia os seus direitos, apesar de, expressamente, advertido, para tanto, por despacho judicial, correspondido a essa determinação, por entender que tal implicava a prática de um acto inútil, deve o Tribunal não considerar como demonstrado o facto que se queria provar.
III – Encontrando-se nos autos certidão comprovativa da pendência da acção de separação judicial de bens, instaurada nos termos do estipulado pelo artigo 1406º, nº 1, a), importa, consequentemente, determinar a suspensão da execução, até à partilha, em conformidade com o disposto pelo artigo 825º, nºs 2 e 3, ambos do CPC, mantendo-se, entretanto, as penhoras já decretadas.

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DECISÃO:

Por tudo quanto exposto ficou, acordam os Juízes que compõem a 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra, em julgar, parcialmente, provido o agravo e, em consequência, decidem no sentido de o Mº Juiz determinar a suspensão da execução, até à partilha, em conformidade com o disposto pelo artigo 825º, nºs 2 e 3, do CPC, confirmando, quanto ao demais, a douta decisão recorrida.

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Custas, a cargo do requerente-agravante, na proporção de 50%.