Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
597/11.0TBTNV.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: DANOS NÃO PATRIMONIAIS
INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 09/16/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE TORRES NOVAS – 2º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 493º, 494º E 496º DO C. CIVIL.
Sumário: I – A lei não define o dano não patrimonial. Doutrinariamente o conceito é recortado pela negativa. O dano diz-se não patrimonial quando a situação vantajosa lesada tenha natureza espiritual; o dano não patrimonial é o dano insusceptível de avaliação pecuniária, reportado a valores de ordem espiritual, ideal ou moral; é o prejuízo que não atinge em si o património, não o fazendo diminuir nem frustrando o seu acréscimo.

II - Diferentemente do que acontece com a indemnização do dano patrimonial, a do dano não patrimonial não é uma verdadeira indemnização, pois não coloca o lesado na situação em que estaria se o facto danoso não tivesse tido lugar, mediante a concessão de bens com valor equivalente ao dos ofendidos em consequência do facto.

III - No tocante à determinação do quantum da indemnização do dano não patrimonial, a lei aponta nitidamente para uma valoração casuística, orientada por critérios de equidade (artº 494, ex-vi artº 493, 1ª parte, do Código Civil). O critério de determinação da indemnização do dano não patrimonial não obedece, portanto, à teoria da diferença que, de resto, se mostra para essa finalidade, imprestável.

Decisão Texto Integral: 1. Relatório.

A ré, Companhia de Seguros T…, SA, e a autora, S…, apelaram, independente e subordinadamente, da sentença, do Sr. Juiz de Circulo de Tomar, proferida no dia 20 de Novembro de 2013, que condenou a primeira a pagar à segunda a quantia total de € 61.481,61, acrescida de juros à taxa legal desde a data da citação (8/4/2011) até efectivo e integral pagamento, à taxa legal que estiver em vigor.

A recorrente independente – que pede, no seu recurso, a revogação desta sentença – rematou a sua alegação com estas conclusões:

Por sua vez, a recorrente subordinada – que pede, no seu recurso, a revogação da mesma sentença e o proferimento de decisão que venha a arbitrar à A. e ora recorrente, indemnização, por danos patrimoniais, de € 62.500,00 e danos não patrimoniais de € 15.000,00, mantendo o demais decidido – encerrou a sua alegação com estas conclusões:

Nenhuma das partes respondeu ao recurso da outra.

2. Factos provados.

O Tribunal de que provém o recurso julgou provados os factos seguintes: …

3. Fundamentos.

3.1. Delimitação do âmbito objectivo dos recursos.

Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito objectivo do recurso pode ser limitado, pelo próprio recorrente, no requerimento de interposição ou, expressa ou tacitamente, nas conclusões da alegação (artº 635 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC).

A autora, fundada numa responsabilidade aquiliana ou extracontratual, pediu a condenação da ré a indemnizá-la do dano, patrimonial e não patrimonial, que sofreu, resultante do embate entre a viatura automóvel …-PC, conduzida por ela mesma, e o veículo automóvel …-EM, de e conduzido por A…, objectiva e subjectivamente imputável à violação, pelo último, de um dever objectivo de cuidado. A obrigação de indemnizar da demandada funda-se, irrecusavelmente, no facto de, por contrato de seguro obrigatório, celebrado com A…, ter assumido a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo …-EM (artºs 1 e 4 nº 1 do Decreto-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto). Simplesmente, o facto da conclusão daquele contrato, não consta dos fundamentos dessa espécie da sentença impugnada, não tendo sido julgado provado ou não provado. Todavia, está definitivamente adquirido para o processo, por modo processualmente válido, o documento comprovativo da celebração daquele contrato – oferecido pela demandada com o articulado de contestação, que não sofreu qualquer impugnação (artº 28 do Decreto-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto). Importa, por isso, julgar provado aquele facto e adicioná-lo aos factos materiais apurados na instância recorrida (artº 662 nºs 1 e 2 c) do CPC).

A demandante computou o valor do dano e, correspondentemente, da indemnização a que, no seu ver, a demandante deve ser vinculada a prestar-lhe, em € 79.000,00, equivalente a soma dos seguintes danos, reparações e compensações parcelares: € 2.357,84 por ITA; € 37.000,00 pelo dano biológico, € 35.000,00 pelos danos futuros; € 2.000,00 pelo quantum doloris; € 1.500,00 pelo auxílio de terceira pessoa e, finalmente, € 685,91 relativos a medicamentos, exames e consultas.

A sentença impugnada, porém, arbitrou-lhe as seguintes quantias: € 3.476,13 pela ITA; € 505,48 pelas despesas médicas; € 50.000,00 a título de indemnização pela incapacidade; e € 7.500,00 por danos não patrimoniais.

      O segmento da sentença impugnada a que ambas as recorrentes se mostram hostis é o respeitante ao quantum da indemnização fixado a título de indemnização pela incapacidade e de compensação dos danos não patrimoniais: a demandada acha que as quantias de € 50.000.00 e de € 7.500,00 devem ser reduzidas, respectivamente, para € 30.000.00 e € 4.000,00; diversamente, a demandante é do parecer que aquelas quantias devem ser aumentadas para € 62.500,00 e € 15.000,00, respectivamente.

Dado que os limites da condenação, ditados pelo princípio da disponibilidade objectiva, se entendem referidos ao pedido global e não às parcelas em que, para a determinação do quantum indemnizatório, há que desdobrar o cálculo do dano, se o autor pede uma determinada indemnização para pagamento dos vários prejuízos decorrentes de um acidente de viação, o tribunal pode considerar a acção totalmente procedente, ainda que faça uma diferente avaliação de cada um desses prejuízos (artº 661 nº 1 do CPC de 1961 e 609 nº 1 do nCPC)[1]. Correspondentemente, não viola a proibição da reformatio in melius – que é uma consequência da vinculação do tribunal superior à impugnação do recorrente, de harmonia com a qual aquele tribunal não pode conceder a essa parte mais do que ela pede no recurso interposto – se a confirmação da procedência da acção no quantitativo total do pedido do autor, ainda que com diferentes montantes de cada uma das parcelas.

Todavia, o que, como corolário do princípio da disponibilidade objectiva, não é lícito ao tribunal ad quem – sob pena de nulidade da decisão por excesso de pronúncia parcial – quantitativo – é condenar em pedido quantitativamente distinto daquele que foi formulado pela parte. E seria justamente essa a consequência se acaso se devesse dar inteira procedência ao recurso subordinado: a soma do valor decorrente dessa procedência com o valor das quantias já arbitradas pela sentença impugnada – que, nessa parte, por ausência de impugnação, constitui res judicata – importaria uma condenação da demandada em valor superior ao do pedido deduzido, na 1ª instância, pela demandante (artºs 609 nº 1 e 615 nº 1 e), 1ª parte, ex-vi artº 613 nº 1 do nCPC). No fundo, o recurso subordinado traz implícita uma ampliação do pedido. Todavia, como o pedido apenas pode ser ampliado se houver acordo das partes - que, no caso, patentemente, não existe - e o recurso ordinário de apelação é um recurso de reponderação e, portanto, visa, normalmente, reapreciar o pedido formulado em 1ª instância, é bem de ver que uma tal ampliação é, de todo, inadmissível (artº 265 nº 1 do nCPC).

Dado que as decisões sobre o recurso principal e o recurso subordinado têm de ser harmónicas e compatíveis, ambos devem ser apreciados conjuntamente, porque ambos têm os mesmos fundamentos de procedência ou de improcedência.

E uma tal apreciação vincula, vincula, naturalmente, à ponderação dos parâmetros ou coordenadas do cálculo do dano patrimonial e não patrimonial.

Os elementos assim obtidos permitirão, regressados ao caso do recurso, aferir da correcção da decisão impugnada.

3.3. Parâmetros de determinação da indemnização do dano não patrimonial e patrimonial.

Qualquer que seja o escopo preciso que, em definitivo, se deva assinalar á responsabilidade civil[2], é inquestionável que esta visa, fundamentalmente, a reparação do dano, juridicamente entendido como a diminuição duma situação favorável que estava protegido pelo Direito[3]. A responsabilidade civil depende tenazmente da existência de dano: a supressão deste assume-se, por isso, como o seu escopo primordial[4].

É ao lesado que cumpre a prova do dano (artº 342 nº 1 do Código Civil). Caso não consiga libertar-se do encargo dessa prova, intervém a regra de julgamento representada pelas normas sobre a distribuição do ónus da prova: a questão de facto correspondente é resolvida contra o lesado (artºs 516 do CPC de 1961 e 414 do nCPC e 346, in fine, do Código Civil).

Já se adiantou a noção jurídica de dano que se tem por exacta: a diminuição duma situação favorável protegida pelo Direito. O dano não tem, porém, uma natureza unitária, podendo separar-se em duas grandes categorias: o dano patrimonial e o dano não patrimonial.

A lei não define o dano não patrimonial. Doutrinariamente o conceito é recortado pela negativa. O dano diz-se não patrimonial quando a situação vantajosa lesada tenha natureza espiritual[5]; o dano não patrimonial é o dano insusceptível de avaliação pecuniária, reportado a valores de ordem espiritual, ideal ou moral[6]; é o prejuízo que não atinge em si o património, não o fazendo diminuir nem frustrando o seu acréscimo. Há uma ofensa a bens de carácter imaterial – desprovidos de conteúdo económico, insusceptíveis verdadeiramente de avaliação em dinheiro[7]; é o prejuízo que, sendo insusceptível de avaliação pecuniária, porque atinge bens que não integram o património do lesado que apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária[8].

A distinção entre o dano patrimonial e não patrimonial assenta, portanto, na natureza do bem ou do interesse afectado. É, por isso, possível que da violação de direitos patrimoniais resultem danos não patrimoniais, da mesma maneira que da violação de direitos ou bens de personalidade podem derivar danos patrimoniais.

A indemnização visa reparar danos não patrimoniais quando tem por objecto um interesse não patrimonial, i.e., um interesse não avaliável em dinheiro[9]. Diferentemente do que acontece com a indemnização do dano patrimonial, a do dano não patrimonial não é uma verdadeira indemnização, pois não coloca o lesado na situação em que estaria se o facto danoso não tivesse tido lugar, mediante a concessão de bens com valor equivalente ao dos ofendidos em consequência do facto. Por isso, melhor se lhe tem chamado satisfação ou compensação[10]. Trata-se, apenas de dar ao lesado uma satisfação ou compensação do dano sofrido, uma vez que este, sendo não patrimonial, não é susceptível de equivalente, e, por isso, possível é apenas uma espécie de reparação, na forma de uma indemnização pecuniária, a determinar, por indicação expressa da lei, segundo juízos de equidade.

Na verdade, no tocante à determinação do quantum da indemnização do dano não patrimonial, a lei aponta nitidamente para uma valoração casuística, orientada por critérios de equidade (artº 494, ex-vi artº 493, 1ª parte, do Código Civil). O critério de determinação da indemnização do dano não patrimonial não obedece, portanto, à teoria da diferença que, de resto, se mostra para essa finalidade, imprestável[11]. Mas esta circunstância não obsta à aplicação àquele dano de um princípio orientador do cômputo do dano patrimonial: o princípio da reparação integral do dano.

A lei é terminante na declaração de que o montante da indemnização do dano não patrimonial será fixado equitativamente (artº 496 nº 3, 1ª parte do Código Civil). Neste contexto, a equidade visa determinar aspectos quantitativos de uma prestação: a indemnização. Mas seria errado pensar-se que a fixação da indemnização, a que a equidade é chamada, está no livre arbítrio do juiz; a leitura da lei evidencia a existência de critérios a que o juiz, nessa tarefa delicada, deve atender.

A actividade do juiz na determinação do montante da indemnização, não se traduz num juízo silogístico-formal de subsunção - dado que o obriga a converter a sua valoração de critérios jurídicos de determinação numa quantificação numérica; trata-se, porém, de uma actividade juridicamente vinculada que constitui estruturalmente autêntica aplicação do direito. Desta constatação faz-se, naturalmente, decorrer a consequência da controlabilidade por via de recurso do procedimento de determinação da indemnização.

No tocante ao processo de determinação do valor da indemnização não se deve reconhecer um espaço de discricionariedade diverso daquele que sempre se encontra presente em qualquer decisão verdadeiramente jurídica, antes se devendo qualificar a actividade correspondente como aplicação do direito, susceptível de controlo por via do recurso.

Mas também aqui se deve reconhecer que os instrumentos dispostos para orientação e racionalização da decisão judicial cobrem apenas parte das variáveis de que o juiz é portador. Se se introduzirem conceitos como basic rules ou second codes, aludindo ao complexo de regras e de mecanismos reguladores que determinam efectivamente a aplicação que o juiz faz da lei, pode dizer-se que os princípios regulativos de determinação do valor da indemnização cobrem apenas uma parte do processo decisório.

Esta constatação decorre da circunstância de a lei se limitar disponibilizar proposições indeterminadas que apenas se materializam no caso concreto. A indeterminação é de resto dupla: ela resulta quer da possibilidade de introduzir, na aplicação, novos factores atendíveis quer da intermutabilidade dos especificados na lei, cujo peso relativo, também se não encontra determinado. Existe, portanto, uma ilimitada variedade dos factores relevantes para o processo de individualização da medida da indemnização, a que soma a ausência de explicitação do seu peso relativo, tudo apontando para uma valoração casuística infindável, que vinca, também por esta via, a natureza móvel ou aberta do sistema.

Tudo inculca, pois, a conclusão de que a determinação da prestação da indemnização não está na dependência de um liberum arbitrium indifferantiae, de uma discricionariedade livre ou desvinculada do juiz – que implicaria conferir a nota de irrecorribilidade à decisão correspondente – e, consequentemente, que o processo de determinação do quantum da indemnização deve, em concreto, ser reconduzível a critérios objectivos, e, portanto, em geral susceptível de motivação e de controlo. Mas seria imprudente não reconhecer a importância de elementos racionalmente não explicitáveis e mesmo puramente emocionais, e, portanto, uma margem inescapável de subjectividade.

Serve isto para dizer que a remissão no caso para a equidade é aparente, visto que esta só ocorre, não quando haja uma qualquer indeterminação que o juiz tenha de resolver no caso concreto – mas quando se verifique uma decisão tomada à revelia do ius strictum, no sentido de sistemático[12]. De resto, um modelo de decisão ex aequo e bono tem ainda a particularidade de não ter preocupações generalizantes, característica que é abertamente contrariada por um dos parâmetros sob cujo signo deve decorrer a actividade de fixação da indemnização: o da uniformização ou padronização do seu valor (artº 8 nº 3 do Código Civil).

Seja como for, a verdade é que o sistema de ressarcimento do dano não patrimonial é móvel ou aberto, indicando a lei, de forma inteiramente exemplificativa, para determinar o dano de cálculo – i.e., a expressão monetária do dano não patrimonial real – o grau de culpa do lesante a situação económica do lesante e do lesado e outras circunstâncias do caso (artº 494 do Código Civil)[13].

O parâmetro representado pela culpa do agente – melhor se diria a forma dolosa ou negligente da imputação - mostra a permeabilidade da lei à ideia de que a indemnização do dano não patrimonial reveste uma certa função punitiva ou sancionatória, à semelhança, de resto, de qualquer indemnização[14].

O critério relativo à situação económica do lesante e do lesado pode, com vantagem, ser reconduzido a uma ideia de proporcionalidade, funcionado como factor da correcção da extensão indemnizatória que se mostre concretamente desproporcionada em face da situação patrimonial dos sujeitos, passivo e activo, da indemnização. No caso de existir seguro da responsabilidade, maxime, tratando-se de seguro obrigatório, fica, no entanto, sem sentido a consideração da situação económica do lesante[15].

É certo que o direito de indemnização do lesado não promana do acordo contratual entre o segurador e o segurado, antes resulta de uma fonte legal de constituição de obrigações: a responsabilidade ex-aquilia; mas não o é menos, que o segurador realiza a prestação indemnizatória à custa de meios – prémio do seguro – facultados pelo segurado – e mesmo por todos os segurados. O seguro de responsabilidade e o seu carácter obrigatório, visa, justamente, tendo presente a desproporção entre o dano sofrido pelo lesado e capacidade económica do directamente responsável, proteger o lesado contra insolvência do último, impondo o dever de prestar a sujeito dotado de reconhecida solvabilidade económica: o segurador. A reparação do lesado não se realiza já em nome da responsabilidade individual – mas em nome do risco social que a circulação automóvel constitui, pelo que lesante paga, conjuntamente com todos os demais automobilistas: a essencialidade da culpa individual é substituída pelo imperativo social de reparação de danos: é nisto que consiste a função social do contrato de seguro[16].

A existência de um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel faz nascer para a seguradora a obrigação de satisfazer ao lesado – no âmbito do risco objectivo e subjectivo coberto e dentro dos limites do capital seguro – a indemnização que recai sobre o responsável civil.

Três postulados legais permitem completar o dano inicial, ou seja: a seguradora assume o papel de garante de uma responsabilidade civil; esta responsabilidade pode recair ou não sobre o tomador do seguro; a intervenção do segurador está condicionada pela verificação substantiva da responsabilidade do respectivo conteúdo indemnizatório (artº 1, 4, 12 e 15 do Decreto-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto, 150 nº 1, 137, 138 nºs 1 e 2 e 145 da LCS). O facto de a seguradora, no relacionamento interno com o seu segurado, não possuir o direito de regresso, está em sintonia com a filosofia subjacente ao carácter obrigatório do seguro e com a fisionomia jurídica do papel da seguradora.

Na verdade, o risco da verificação de um acidente de viação e das suas consequências danosas é assumido pelo segurador a troco de certa contrapartida monetária, motivando-se a sua obrigação com razões principais de solvabilidade atinentes à condição patrimonial dos eventuais responsáveis civis – insuficiência económica, encargo excessivo – e com a necessidade de proteger terceiros. Numa palavra: o dever de indemnizar que vincula o segurador é um dever primário de prestar, assente sobre o dever secundário de indemnizar do segurado. Do que decorre – por ser essa a lógica do seguro obrigatório – a desvinculação do dever de indemnizar do segurador – cuja solvabilidade se presume - da situação patrimonial do lesante, sendo certo que o segurador – ao contrário do responsável directo – pode limitar a sua responsabilidade, através da definição prévia do valor do capital seguro, que representará o quantitativo máximo do seu dever de prestar – ainda que o valor do dano reparável seja infinitamente superior.

De resto, a prova da situação económica do lesante, dado que constitui excepção ao princípio da reparação integral do dano, permitindo a fixação da indemnização em valor inferior ao desse mesmo dano – o que vincula à sua ponderação prudente, quer na frequência da sua utilização quer quanto à extensão da redução[17] – cabe, de harmonia com as regras gerais de distribuição do ónus da prova – aos devedores da indemnização, na espécie do recurso, à seguradora recorrente (artºs 342 nº 2 e 496 do Código Civil). E, no nosso caso, esse facto não se mostra provado – e nem sequer foi alegado.

Entre as outras circunstâncias do caso, devem indicar-se o carácter do bem jurídico atingido e a natureza e a intensidade do dano causado[18], o género e a idade da vítima, etc. Em qualquer caso, a ponderação sobre a gravidade do dano não patrimonial e, correspondentemente, do valor da sua reparação, deve ocorrer sob o signo estrito do princípio regulativo da proporcionalidade – de harmonia com o qual a danos mais graves deve corresponder uma indemnização mais generosa – e numa perspectiva de uniformidade: a indemnização deve ser fixada tendo em conta os parâmetros jurisprudenciais geralmente adoptados para casos análogos (artº 8 nº 3 do Código Civil)[19].

A definição e a valoração do dano não patrimonial são, portanto, tarefas irremediavelmente carecidas de concretização jurisprudencial. O modo como essa actividade concretizadora tem sido desempenhada pela jurisprudência, mesmo no tocante ao dano de natureza máxima – o dano morte - tem merecido, por parte da doutrina, um juízo severo. Em face da exiguidade do valor das indemnizações por danos não patrimoniais comummente fixadas, fala-se, com acrimónia, em página negra da nossa jurisprudência[20], em indemnizações de miséria[21] e em extrema parcimónia[22].

O reparo é justo. Mas seria injusto, de um aspecto, não partilhar a censura com o legislador, que se mostra mais sensível aos danos patrimoniais que aos danos não patrimoniais[23] e aos termos um tanto deprimidos[24] com que se consagrou a ressarcibilidade dos danos desta última espécie e, de outro, não admitir uma clara evolução no reforço das indemnizações desse tipo de dano, consequente ao reconhecimento da sua especificidade e alteralidade relativamente ao dano patrimonial e à consciência da necessidade de uma tutela acrescida dos direitos de personalidade[25].

A única condição de ressarcibilidade do dano não patrimonial é a sua gravidade (artº 496 nº 1 do Código Civil). Na impossibilidade de concretizar um critério geral, porque nesta matéria o casuísmo é infindável, apenas importa acentuar que danos consequentes a lesões a direitos de personalidade devem ser considerados mais graves do que os resultantes de violação de direitos referidos a coisas. De resto, tratando-se de lesão de bens e direitos de personalidade, essa gravidade deve ter-se, por regra, como consubstanciada: deve exigir-se para bens pessoais um tratamento diferente do reservado para as coisas[26].

É irrecusável que toda a pessoa titula um fundamental direito à integridade pessoal, que abrange as duas componentes fundamentais da sua pessoa: a integridade física e a integridade moral (artº 25 nº 1 da Constituição da República Portuguesa).

Qualquer facto que atente contra essa integridade pessoal deve, portanto, ser considerado um dano, não constituindo obstáculo a essa consideração a circunstância de, no tocante à reparação da violação do corpo humano, a restitutio in integrum se mostrar impossível[27].

Parâmetro diferenciado do dano corporal, objecto de progressiva autonomia e de nítida vocação expansiva é o dano da afirmação pessoal[28]dano esistenziale, loss of amenities of life, perte de joie de vivre – que se inclui igualmente entre as consequências não pecuniárias resultantes de lesões não mortais à integridade física ou à saúde. A categoria tem directamente em vista certas lesões que, pela sua gravidade, são susceptíveis de provocar a quem as sofre especialíssimas disfunções relacionais, desenquadramentos situacionais ou alterações comportamentais – na sua forma de estar e de ser com os outros – que se repercutem negativamente sobre o trajecto existencial do lesado, quer retirando-lhe a possibilidade de se dedicar a pequenos prazeres ou gratificações ou privando-o, por exemplo, de interagir com o seu corpo. Neste sentido, o dano à afirmação pessoal é a lesão do conjunto competências sociais, relacionais, que se expressam na capacidade de a pessoa desenvolver, transformando em acto, uma vida com momentos mais ou mais intensos de satisfação ou compensação estética, física, social ou outra[29].

Sucede, com indesejável frequência, que a vítima de lesão corporal, uma vez obtida a cura clínica, fica afectada de uma incapacidade permanente ainda que meramente parcial - apesar dessa limitação funcional não se reflectir numa efectiva diminuição aquisitiva. Mas esta circunstância não obsta à ressarcibilidade de um tal dano.

      O detalhe desta proposição exige a ponderação de um conceito – oriundo da doutrina e da jurisprudência italianas[30] – e que tem vindo a consolidar-se na terminologia da doutrina e da jurisprudência portuguesas: o de dano biológico ou de dano corporal[31].

No plano jurisprudencial, o conceito de dano biológico é utilizado sobretudo no contexto da fixação de indemnizações de lesão corporal causadas por acidentes de viação, que correspondem entre nós a uma percentagem extraordinariamente elevada de processos judiciais de responsabilidade civil delitual - no qual é patente a dificuldade da sua relação com a dicotomia tradicional da avaliação de danos patrimoniais versus danos não patrimoniais[32].

A avaliação do dano corporal, i.e., de alterações na integridade psicofísica de uma pessoa, constitui uma matéria de particular complexidade.

Complexidade que resulta não apenas da dificuldade de interpretação das sequelas e da subjectividade que envolve a avaliação de alguns dos danos, mas também da necessária diferença dos parâmetros da avaliação do dano, consoante os domínios do direito em que essa avaliação se processa, face aos diferentes princípios jurídicos que os caracterizam[33]. Este ponto é patente no tocante às incapacidades a avaliar e a valorizar. Tome-se como exemplo, o direito laboral e o direito civil: ao passo que no primeiro está em causa a avaliação da incapacidade de trabalho resultante de acidente ou de doença profissional, determinante da perda da capacidade de ganho – no segundo, em harmonia com o princípio da reparação integral do dano, deve valorizar-se a incapacidade permanente em geral, i.e., a incapacidade permanente para os actos e gestos correntes do dia-a-dia, assinalando posteriormente o seu reflexo em termos de actividade profissional específica do lesado.

A parametrização da avaliação dos danos corporais por recurso a tabelas suscita opiniões desencontradas[34]. Seja qual for em definitivo a resposta exacta o problema, uma conclusão que parece irrecusável é a do desacerto da utilização de tabelas construídas para avaliar, por exemplo, incapacidades que relevam para um específico ramo de direito para mensurar incapacidades relevantes para outro domínio do direito, orientado por fundamentos finais diferentes.

Mas era isso que até há muito pouco tempo sucedia entre nós, dado que era vulgar a utilização referencial da Tabela Nacional de Incapacidade (TNI), aprovado pelo Decreto-Lei nº 341/93, de 30 de Setembro, ordenada para a avaliação das incapacidades geradas no específico domínio das relações de trabalho, para avaliar e valorizar incapacidades que relevam exclusivamente no plano do direito civil.

Atento ao problema, o legislador optou pela publicação de duas tabelas de avaliação de incapacidades, uma – a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais - vocacionada para a avaliação, designadamente dos danos que afectam a capacidade do trabalhador para continuar a desempenhar de forma normal a sua actividade e, consequentemente, a capacidade de ganho daí decorrente, e outra – a Tabela Nacional para Avaliação das Incapacidades Permanentes em Direito Civil - ordenada para parametrização e reparação do dano em direito civil (artº 1 do Decreto-Lei nº 352/2007, de 23 de Outubro).

Essa tabela médica tem um valor puramente indicativo, dado que se admite que os peritos se afastem das pontuações nela previstas, vinculando-os apenas, quando isso suceda, a motivar as razões da divergência (artº 2 nº 3 do Decreto-Lei nº 352/2007, de 23 de Outubro).

Durante anos, porém, as tabelas das incapacidades por acidentes de trabalho e doenças profissionais serviram de recurso para a determinação do montante de indemnização por danos patrimoniais futuros noutras situações de responsabilidade civil. Na prática, portanto, as consequências da incapacidade laboral constituíram ao longo de décadas o único factor relevante para avaliar danos patrimoniais futuros nas situações de responsabilidade delitual. E como, do mesmo passo, os danos não patrimoniais eram compensados com valores muitos reduzidos, a aplicação da tabela de incapacidade laboral acabava por constituir o factor determinante na fixação do montante indemnizatório, com as consequências discriminatórias inerentes, resultante da aferição de danos em função da perda de remuneração laboral das diferentes vítimas. A única dimensão relevante era a perda da capacidade aquisitiva do lesado – o que explicava que o cômputo da indemnização surgisse sistematicamente referido à vida útil e não à esperança de vida – e no limite, sempre que, apesar da lesão, não se registasse qualquer limitação daquela competência aquisitiva, a indemnização fosse pura e simplesmente excluída.

A orientação jurisprudencial tradicional recorre, para o problema da indemnização por incapacidade derivada de um facto civil delitual, exclusivamente ao distinguo entre danos patrimoniais e não patrimoniais – sem qualquer referência ao conceito de dano biológico ou de dano corporal[35].

A jurisprudência que adopta o conceito de dano biológico qualifica-o como sendo exclusivamente um dano não patrimonial[36], ou como merecendo especial destaque como dano não patrimonial[37] - entendendo-o como a diminuição somático-psíquíca do indivíduo, com natural repercussão na vida de quem a sofre, tendo a natureza de perda in natura que o lesado sofre em consequência de certo facto nos interesses materiais ou espirituais que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar.

Realmente, uma jurisprudência reiterada do Supremo, sustenta que uma diminuição funcional e somático-psíquica relevante do lesado, com uma repercussão substancial na sua vida profissional e pessoal se resolve num dano biológico, reparável como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial e não patrimonial[38].

De harmonia com esta jurisprudência, a ressarcibilidade do dano biológico – representado pelas limitações funcionais relevantes e por sequelas psíquicas graves – visa compensar o lesado, para além da presumida perda de rendimentos associada ao grau de incapacidade de que o lesado é portador, também da inerente perda de capacidades e competências, mesmo que essa perda não esteja imediata e totalmente reflectida ao nível do rendimento auferido[39].

O fundamento da compensação do dano biológico é, à luz desta jurisprudência, duplo: a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou reconversão de emprego pelo lesado, implicando uma patente redução de oportunidades geradoras de possíveis acréscimos patrimoniais futuros, irremissivelmente frustrados pelo grau de incapacidade que definitivamente afecta o lesado; o acrescido grau de penosidade e esforço experimentado pelo lesado, no seu quotidiano, imposto pelas funcionais, graves e irreversíveis, de que é portador, consequentes à lesão física sofrida[40].

A perda relevante de capacidades funcionais, ainda que não imediata e totalmente reflectida nos rendimentos auferidos pelo lesado, representa, realmente, uma capitis diminutio, num mercado laboral exigente, que condiciona de forma relevante e significativa, as possibilidades de exercício, escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo, seriamente, a evolução profissional expectável – e nessa medida o leque de oportunidades profissionais à disposição do lesado – constituindo-se, por essa via, como lucros cessantes compensáveis, desde logo como danos patrimoniais.

Uma incapacidade parcial permanente pode, realmente, projectar-se de dois modos diferenciados no património do seu portador: ou causa uma diminuição efectiva do seu rendimento, em razão da quebra de produtividade; ou sem provocar uma diminuição sensível desse rendimento, impõe ao lesado, para manter o nível de produtividade e, correspondentemente, de ganho, anterior à lesão, por exemplo, um esforço acrescido, desgastando-o anormal e prematuramente.

Abstraindo das naturais dificuldades com que a jurisprudência lida com o conceito de dano biológico – a que não é decerto alheia a sua extraneidade da sua origem – pode questionar-se as virtualidades da sua admissibilidade. Aparentemente, a disponibilidade de amplos regimes de ressarcibilidade dos danos-consequência, tanto de natureza patrimonial como não patrimonial e a aptidão desta dicotomia para abranger a totalidade dos efeitos de qualquer categoria de dano-evento, a ruptura com a estrutura tradicional não parece, prima facie, trazer vantagens relevantes. O exame das espécies jurisprudenciais mais significativas mostra, porém, que o conceito tem potencialidades inegáveis, na medida em que a análise das dimensões que integram a categoria, tem conduzido um expressivo alargamento da compreensão do âmbito dos prejuízos efectivamente sofridos pelas vítimas de factos geradores de responsabilidade civil ex-delicto. Basta ponderar o elenco possível de variáveis que integram o dano biológico – o dano de afirmação pessoal ou dano à vida de relação, o dano estético, o dano psíquico, o dano sexual, o dano da capacidade laboral genérica – elenco que pode ser alargado, por exemplo, com as variantes seguintes: perda de aptidões familiares ou afectivas, perda da faculdade de prática desportiva[41] ou de outra actividade recreativa, perda do gozo dos anos de juventude, perda possibilidade de iniciar ou prosseguir determinados estudos e perda da esperança de vida.

A vantagem da introdução da concepção de dano biológico consiste no alargamento das componentes do dano real a ter em conta e, correspondentemente, a determinação de uma forma mais justa, da indemnização devida pelo lesante, em regra, quanto a consequências, de natureza não patrimonial. Mas não necessariamente só quanto a estas. Também no plano dos efeitos de natureza patrimonial, equivalentes aos danos emergentes e aos lucros cessantes – entendidos, estes últimos, como os valores de perda de rendimentos resultantes da afectação, total ou parcial, temporária ou permanente, da actividade laboral do lesado, será possível extrair novos elementos da concepção ampla do dano biológico como dano real ou dano-evento.

Seja como for, apesar da sua índole biológica, e independentemente da sua qualificação como dano patrimonial[42] - qualificação que se julga preferível[43] - ou não patrimonial, ou mesmo, como tertium genus ou um meio-termo entre uma e outra espécie de dano – tem-se por adquirido, à certeza, que se trata de um dano que deve ser objecto de adequado ressarcimento[44].

A reparabilidade deste dano não, pois, deve oferecer dúvida fundada. Espinhoso é, porém, o problema de saber a que parâmetro deve obedecer a determinação do quantum da indemnização dirigida a essa reparação.

Um dos critérios possíveis de cômputo do referido dano – e que conhece, de resto, uma larga utilização – é de base jurisprudencial.

A jurisprudência tem, com efeito, considerado que a indemnização devida pelos danos futuros deve corresponder a um capital produtor de um rendimento que se extinga na data previsível da vida activa da vítima e lhe garanta as prestações periódicas equivalentes. No cômputo desse capital, deve ponderar-se, inter alia, a natureza da actividade produtiva exercida pela vítima, o valor da remuneração correspondente, a evolução do índice de preços e da taxa de juro, a duração provável da sua vida activa, a esperança de vida[45], e a expectativa de aumento do seu rendimento[46]. Todos estes parâmetros assentam em juízos de prognose de simples probabilidade – assentes no id quod plerumque accidit, no que normalmente sucede - pelo que o seu resultado puramente aritmético deve ser objecto de correcção, por defeito, tendo em conta, designadamente, o facto da antecipação e da concentração da indemnização, necessariamente referida a um dano futuro, que perdura no tempo[47].

Na verdade, dado que o valor do capital assim encontrado representa uma grandeza puramente aritmética, não corresponde, necessariamente, ao valor final da indemnização.

Esse valor mostrar-se-ia exacto, enquanto expressão do valor da reparação, se se devesse assentar na verificação, ne varietur, durante o lapso temporal considerado, dos parâmetros utilizados no seu cálculo.

Efectivamente, aquele valor supõe, por exemplo, a estabilidade da relação de emprego, fonte do rendimento, e da actividade económica em geral. No entanto, a observação sociológica mostra uma instabilidade e uma flexibilização ou amolecimento crescentes do vínculo laboral - de que elevada taxa de desemprego é o sinal mais evidente - e uma desaceleração continuada da actividade e do crescimento económicos que, a par de uma política pública declaradamente orientada para o recuo do valor dos salários e marcada por um nível intolerável de pressão fiscal, provoca, naturalmente, uma contracção no rendimento das pessoas e das empresas.

Exemplo acabado disto mesmo é relativo às remunerações e outros acréscimos patrimoniais das pessoas – como a recorrente – vinculadas por uma relação de emprego público. Em face de uma política económica que, deliberadamente, encara essas retribuições como simples componente contabilístico da despesa pública – e de sucessivas decisões da jurisprudência constitucional que não extrai da inconstitucionalidade material das normas através das quais é instrumentalizada todas as consequências jurídicas ditadas pelo carácter retroactivo da declaração de invalidade da norma constitucionalmente imprópria – a única coisa que se pode ter por certa é a diminuição dessas remunerações – e outros acréscimos – sendo incerta a sua restituição aos valores – ainda que só nominais – anteriores ao momento em que teve início a compressão unilateral do seu valor. A isto acresce – como também é notório – quer o denominado congelamento das carreiras, quer a política pública orientada para a redução do número de funcionários, designadamente na prestação do serviço público de educação, diminuição que, aliás, não é estranha o facto – notório - da contração da sua procura.

Serve isto para ilustrar a afirmação de que aquele valor supõe a certeza de factos absolutamente contingentes e transforma numa prestação actual simples expectativas, e noutro plano, é a expressão concentrada de uma prestação que, no evoluir normal das coisas, seria, na hipótese mais benigna, satisfeita de forma fragmentada.

Mal vale a pena perder uma palavra para explicar que, tratando-se de computar danos tomando como base de cálculo o valor do rendimento do lesado, o valor que deve ser utilizado é, seguramente, o valor líquido desse rendimento – i.e., diminuído das contribuições fiscais e parafiscais obrigatórias – visto que só esse valor, mesmo na ausência do evento danoso, ingressava efectivamente na sua esfera jurídico-patrimonial (artº 566 nº 1 do Código Civil)[48].

Este viaticum habilita-nos a resolver os delicados problemas que constituem o objecto do recurso: determinação do dano que, por força da incapacidade de que é portadora, vulnerou a autora, e o quantum da indemnização exigido para a sua compensação ou reparação, conforme o caso, e, bem assim, a determinação do valor da indemnização orientada para a compensação do dano não patrimonial, comprovadamente suportado pela apelante.

Na verdade, não se discute no recurso a vinculação da recorrida ao dever de indemnizar – mas apenas a extensão desse dever, i.e., o quantum da indemnização devida à recorrente subordinada como compensação do dano não patrimonial e como reparação do dano patrimonial que a atingiu.

É para a determinação da quantidade do dever de indemnizar que vincula a recorrente principal que se dirigem as considerações subsequentes.

3.4. Concretização.

3.4.1. Indemnização do dano não patrimonial suportado pela recorrente subordinada.

A sentença impugnada, individualizando como parâmetros de cálculo, o traumatismo inicial, o tratamento e acompanhamento médico, o quantum doloris, as sequelas permanentes, a angústia, a ansiedade, o stress, a perturbação da vida pessoal e do seu lazer, arbitrou à recorrente, para a compensar do dano não patrimonial que suportou, a quantia de € 7.500,00.

Ambos os recorrentes acham este valor desproporcionado. A recorrente principal, reputando de injusta, excessiva e exagerada a compensação arbitrada, é da opinião de que o seu valor se deve fixar em € 4.000,00; inversamente a recorrente subordinada é do parecer que o valor fixado é exíguo devendo ser-lhe arbitrado - o dobro: € 15.000,00.

Um bosquejo ainda que breve pela jurisprudência do Supremo – com o qual se procura dar expressão à preocupação da normalização ou padronização quantitativa da compensação devida por esta espécie dano, e, por essa via, ao princípios da igualdade e da unidade do direito e ao valor eminente da previsibilidade da decisão judicial – que essa compensação foi fixada em € 30.000,00 para um jovem que teve um período de tratamento particularmente penoso, com intervenções cirúrgicas, acamamento, imobilização, enjoos, dores de grau 3 numa escala de 7, e sequelas com gravidade relativa[49], em € 50.000,00 para uma pessoa de 29 anos de idade que sofreu várias fracturas e um traumatismo crânio-encefálico, com dores de grau 5 numa escala de 7, que esteve hospitalizado duas vezes, foi sujeito a intervenções cirúrgicas e a tratamento de fisioterapia, que teve de se deslocar, longo tempo, com o auxílio de canadianas e que ficou, como sequelas permanentes, com cicatrizes na perna, claudicação de marcha, dificuldade em permanecer de pé, subir e descer escadas impossibilitado de correr e praticar desporto que antes praticava, e que passou de alegre e comunicativo a triste, desconcentrado e ansioso[50], em € 60.000,00 para um lesado de 16 anos de idade, que sofreu fractura basicervical do fémur esquerdo e traumatismo craniano com perda de consciência, que teve de andar de canadianas três meses e fazer fisioterapia, ficou com marca viciosa e marcadamente claudicante, dismetria dos membros inferiores, báscula da bacia com rotação e maior saliência da anca esquerda, desvio escoliótico com dor na palpação lombar, atrofia da coxa e da perna esquerdas e marcada rigidez na anca esquerda; incapacidade para a corrida, para se ajoelhar e adoptar posição de cócoras, dificuldade marcada na permanência de pé, alterações sexuais devido a dificuldades de posicionamento, impossibilidade de praticar desportos que impliquem esforço físico; sensação de tristeza, vergonha e revolta bem como frustração e medo no contacto com o sexo oposto; necessidade de nova intervenção cirúrgica, de fisioterapia, de adaptação automóvel para poder conduzir; não frequência de praias por dificuldade em caminhar na areia e pela vergonha de exibir o corpo, e de piscinas; não participação em jogos de futebol e impossibilidade de carregar pesos; anteriormente alegre e extrovertido, passou a ser mal-humorado, com pesadelos frequentes, insónias e tendências para o isolamento, lendo e escrevendo com dificuldade[51]; € 50.000,00 ao lesado que sofreu vários internamentos hospitalares e intervenções cirúrgicas, apresentando dores no pescoço que se agravam com os esforços ou em viagens a conduzir, dores no punho esquerdo, dores no joelho direito ao subir e descer escadas, perturbações no sono e ansiedade que se manifestaram depois do acidente, uma cicatriz na posição inferior da face anterior do joelho direito, com 2,8 cm de comprimento, desgosto e complexos de inferioridade física bem como angústia e má disposição pelo estado físico em que se encontra[52] e em € 25.000,00 para um jovem de 18 anos de idade, da equipa nacional de cadetes de basquetebol, vítima de atropelamento, que ficou com síndrome pós traumático, cefaleias frequentes, crises de ansiedade, irritabilidade, deficit de memória, cicatrizes e manchas melânicas em várias zonas do corpo, limitação da flexão do joelho direito, dano estético de grau 3 numa escala de 7, quantum doloris de 4 numa escala de 7, prejuízo de afirmação pessoal de grau 2, numa escala de 5, IPP de 20%, desgosto e frustração por ter deixado de praticar basquetebol[53].

No caso do recurso, os factos materiais apurado na instância recorrida mostram que a autora – que antes do evento lesivo, ocorrido quando tinha 36 anos de idade, era uma pessoa alegre e saudável e em boa condição física – sofreu dores em virtude do acidente, e, depois da alta clínica, continuou a sofrer de cefaleias, cervico braquialgia e lombalgia persistente, começou a apresentar, desde a data do acidente, alterações comportamentais do foro depressivo, sentindo ansiedade para a condução automóvel, evitando deslocar-se por esse meio, recorrendo a boleias e outros meios de transporte alternativos - o que, antes do embate, não ocorria - padece de insónias frequentes, passou a ser seguida em consultas de psiquiatria, situação que se mantém actualmente, apresentando o diagnóstico de síndrome depressivo por perturbação de stress pós-traumático; encontra-se actualmente curada, com cefaleias frontais pós TCE, Cervico braquialgia persistente, acompanhada de parestesias do 4º e 5º dedos da mão esquerda, lombalgia persistente com rediculagia esquerda; apresenta alterações comportamentais por perturbação de stress pós traumático - sequelas que importam um quantum doloris fixável no grau 5, numa escala até 7 pontos; que o embate lhe causou angústia, susto e temor pela vida, devendo a terapêutica psicológica manter-se por tempo indeterminado, e que em 2006 e 2007 foi campeã nacional de Tiro com Arco - em virtude das dores que sente, da falta de mobilidade dos braços, com dormências frequentes, e da dificuldade em estar de pé, mesmo por poucos momentos, não mais pode praticar ou qualquer modalidade desportiva, designadamente, o Tiro com Arco, seja em competição, seja como hobby, tendo já abandonado esta prática, o que, por essa prática ser uma fonte de orgulho, lhe causa profundo desgosto.

A matéria de facto apurada espelha, cristalinamente, um contexto de sofrimento, tanto contemporâneo da lesão – quantum doloris que a perícia de avaliação do dano corporal em direito civil computou no grau 5/7 - como actual e futuro, grave, irreversível, com repercussões permanentes, para cuja compensação a quantia de € 4000,00 seria injusta, avara e exígua, e a de € 15.000,00 seria excessiva e exagerada.

Nestas condições, tendo em conta a compensação arbitrada para casos semelhantes[54] e sem prejuízo da especificidade irrepetível de cada caso concreto – e da infindável casuística a que essa variação dá lugar – em face, v.g., da intensidade sofrimento físico e anímico experimentado – e a vivenciar – pela recorrente subordinada, da afectação permanente do seu corpo e da sua saúde, há, efectivamente, razão para divergir da sentença impugnada: o valor lhe, a este título esta lhe arbitrou mostra-se, realmente, parcimonioso, julgando-se mais adequado, naquele mesmo condicionalismo – e à luz dos parâmetros ou coordenadas de fixação da compensação desta espécie de dano - fixá-lo em € 10.000,00.

Quanto a este ponto, o recurso independente deve improceder e o recurso subordinado deve proceder – mas apenas parcialmente.

3.4.2. Indemnização do dano resultante para a recorrente subordinada do défice funcional permanente de 8% de que é portadora. 

A sentença impugnada, ponderando o salário líquido anual de € 18.000,00, a esperança de vida de 82,90 anos – e, portanto, a afectação da recorrente durante 47 anos – encontrou, para indemnizar a recorrente de todos os danos decorrentes da incapacidade – salvo a da perda de rendimento da ITA – a quantia global de € 67.680,00 (€ 18.000,00 x 47 x 8%). A esta quantia operou o desconto por antecipação, tendo julgado equitativa a dedução de 20% - achando, assim, o valor de € 54.144,00. O valor final da indemnização foi fixado, em última extremidade, por aplicação de prudentes critérios de equidade, em € 50.000,00.

A recorrente principal sustenta que o valor justo desta indemnização se cifra em € 30.000,00; já a recorrente subordinada entende como justo o de € 62.500,00.

Apesar da notória divergência das partes quanto à quantificação do valor desta reparação, o primeiro ponto que fere à atenção é que, nem uma nem outra, controvertem os parâmetros declaradamente assumidos pela sentença impugnada como base do seu cômputo: o valor anual líquido da remuneração da vitimizada - € 18.000,00; o valor da esperança de vida – 83 anos - e correspondentemente o período da afectação da lesada – 47 anos; a exigência do desconto, no valor aritmético da indemnização encontrado por aplicação daqueles parâmetros, imposta pela antecipação e pela concentração do seu valor.

Considerando, além destas premissas, a relativa o valor médio da taxa de juro dos depósitos a prazo – que no ano de 2013 foi de 2,59%[55] - por aplicação do critério atrás enunciado – nomeadamente do desconto pela antecipação e concentração do rendimento - obtém-se um valor aritmético final de capital de € 52.074,684. Se – pela razões já adiantadas - sujeitarmos esta grandeza matemática a juízos de equidade, o valor da indemnização encontrado pela decisão impugnada para reparar o dano questionado julga-se inteiramente, proporcional e adequado. 

Portanto, quanto a este segmento, ambas as impugnações deve obter uma decisão de improcedência.

Síntese recapitulativa:

a) A reparação dano não patrimonial não é uma verdadeira indemnização – mas antes uma satisfação ou compensação – dado que não coloca o lesado na situação em que estaria se o facto danoso não tivesse tido lugar, mediante a concessão de bens com valor equivalente ao dos ofendidos em consequência do facto;

b) A determinação do quantum da indemnização do dano não patrimonial ordena-se uma valoração casuística, orientada por critérios de equidade;

c) Se o dever de indemnizar decorrer de seguro obrigatório de responsabilidade civil, não há que ponderar, na determinação do quantum da indemnização, a situação económica do responsável directo, facto cuja prova, todavia, vincula o devedor da indemnização;

 d) Uma diminuição funcional e somático-psíquica relevante do lesado, com uma repercussão substancial na sua vida profissional e pessoal – ainda que tenha implicada qualquer perda da capacidade aquisitiva - resolve-se num dano autonomamente reparável, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial e não patrimonial.

Ambas as apelantes sucumbem nos respectivos recursos, a recorrente subordinada ainda que só parcialmente. Deverão, por essa razão, suportar as custas deles, no tocante ao decaimento parcial, de harmonia com a respectiva sucumbência (artº 527 nº1 e 2 do CPC).

4. Decisão.

Pelos fundamentos expostos, julga-se improcedente o recurso principal e, parcialmente procedente, o recurso subordinado e, consequentemente:

a) Condena-se a apelante principal, Companhia de Seguros T…, SA, a pagar à recorrente subordinada, S…, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 10.000,00;

a) Mantém-se, no mais, a sentença impugnada.

Custas do recurso principal pela respectiva recorrente e, do recurso subordinado, por ambas as recorrentes na proporção da respectiva sucumbência.

                                             

                                               Henrique Antunes (Relator)

                                               Artur Dias

                                               Jaime Ferreira


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[1] Acs. da RL de 26.05.92, BMJ nº 417, pág. 812, e do STJ de 18.11.75, BMJ nº 251, pág. 107, de 15.06.93, BMJ nº 428, pág. 531, de 25.03.10 e de 23.11.10, www.dgsi.pt.
[2] Cfr. Paula Meira Lourenço, A Função Punitiva da Responsabilidade Civil, Coimbra Editora, 2006, págs. 228 a 293.
[3] António Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, AAFDL, 1980, vol. 2º Volume, pág. 283.
[4] Pereira Coelho, “O nexo de causalidade na responsabilidade civil”, Boletim da Faculdade de Direito, Suplemento IX, Coimbra, 1951, pág. 107 e ss. Tratando-se de danos não patrimoniais, só são atendíveis os que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito (artº 496 nº 1 do Código Civil). À luz desta exigência, a jurisprudência sustenta que não compensáveis dos danos não patrimoniais que se traduzam em meros incómodos. Cfr., v.g., Acs. do STJ de 2.10.73, BMJ nº 230, pág. 107, de 26.6.91, BMJ nº 408, pág. 438 e de 10.11.03, CJ, STJ, I, III, pág. 132.
[5] António Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, 2º volume, cit., págs. 285 e 286.
[6] Maria Júlio de Almeida e Costa, Direito das Obrigações, 7ª ed., Almedina, Coimbra, 1998, págs. 514 e 515.
[7] Galvão Telles, Direito das Obrigações, 6ª ed., Coimbra Editora, 1989, pág. 370.
[8] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 10ª ed., Almedina, Coimbra, 2000, pág. 601.
[9] Vaz Serra, Reparação do Dano Não Patrimonial, BMJ nº 83, págs. 65 e ss.
[10] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 5ª edição, Almedina, Coimbra, 1986, pág. 566.
[11] Ac. do STJ de 26.02.04, www.dgsi.pt.
[12] António Menezes Cordeiro, Da Boa Fé no Direito Civil, vol. II, Almedina, Coimbra, 1984, pág. 1202 e 1203, e A Decisão Segundo a Equidade, O Direito, Ano 122, II, 1990, pág. 261 e ss.
[13] Acs. do STJ de 21.02.13, 11.05.12 e 23.11.11, www.dgsi.pt.
[14] António Pinto Monteiro, Sobre a Reparação dos Danos Morais, Revista Portuguesa do Dano Corporal, 1992, Ano 1º, I, pág. 21, Paula Meira Lourenço, A Função Punitiva da Responsabilidade Civil, Coimbra Editora, 2005, pág. 251 e ss. e Ac. da RL de 15.12.94, CJ, 94, V, pág. 135 e José Carlos Brandão Proença, A Conduta do Lesado como Pressuposto e Critério de Imputação do Dano Extracontratual, Almedina, Coimbra, 1997, pág. 167.
[15] Sinde Monteiro, Dano Corporal (Um roteiro do direito português), RDE, 1989, nº 15, pág. 372 e Reparação dos Danos Pessoais em Portugal – A lei o Futuro (Considerações de lege ferenda a propósito da discussão da “alternativa sueca”), CJ, XI, IV, pág. 12, e José Carlos Brandão Proença, A Conduta do Lesado como Pressuposto e Critério de Imputação do Dano Extracontratual, Almedina, Coimbra, 1997, pág. 168, nota 518, e Acs. do STJ de 26.05.02 e de 17.11.05, www.dgsi.pt. No limite, a disposição do artº 494 do Código Civil pode ser julgada constitucionalmente imprópria, por violação do princípio da igualdade. O Supremo tem, realmente, reiterado o entendimento de que a consideração da situação económica do lesado viola o princípio constitucional da igualdade: Acs. do STJ de 11.01.07, 21.10.09, 24.04.13 e de 07.05.14, www.dgsi.pt. Cfr., contudo, Filipe Matos, RLJ, Ano 143, pág. 149.
[16] Maria Manuela Ramalho Sousa Chichorro, O Contrato de Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, pág. 33.
[17] Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2002, pág. 303, nota 626.
[18] Vaz Serra, RLJ Ano 103, pág. 179 e Ac. da RP de 20.04.06, www.dgsi.pt.
[19] Maria Manuel Veloso, Danos não Patrimoniais, Comemorações dos 35 Anos do Código Civil e dos 25 Anos da Reforma de 1977, vol. III, Coimbra Editora, 2007, págs. 543 e 544 e Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, cit., pág. 629; Acs. do STJ de 27.09.07, www.dgsi.pt., e de 30.10.96, BMJ nº 460, pág. 444.
[20] António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, Parte Geral, Tomo III, Pessoas, 2ª ed., 2007, Almedina Coimbra, pág. 169, e António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Responsabilidade Civil, volume II, Indemnização dos Danos Reflexos, Coimbra, Almedina, 2005, pág. 23.
[21] João António Álvaro Dias, Dano Corporal, Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, Coimbra, Almedina, 2001, pág. 357, nota 795.
[22] Luís Manuel Telles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, 2ª edição, Coimbra, Almedina, pág. 318, nota 660.
[23] O paradigma da responsabilidade civil é o da patrimonialidade do dano, e, por isso, a reparação do dano não patrimonial, escapa, em larga medida, às coordenadas daquele sistema: cfr. Pessoa Jorge, Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Almedina, Coimbra, 1995, pág. 376.
[24] António Menezes Cordeiro, Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedade Comerciais, Lex, Lisboa, 1997, pág. 478.
[25] Cfr., v.g., Ac. do STJ de 05.07.07, www.dgsi.pt. Evolução que permite ao Supremo concluir que as nossas indemnizações em absolutamente nada ficam aquém das que vêm sendo fixadas nos países com quem temos mais afinidades: Acs. do STJ de 07.05.14 e de 09.09.10, www.dgsi.pt.
[26] Jorge Sinde Monteiro, Reparação dos Danos Pessoais em Portugal, CJ, 86, IV, pág. 11.
[27] Cfr., Luísa Neto, O Direito Fundamental à Disposição sobre o Próprio Corpo (A Relevância da Vontade na Configuração do Seu Regime), FDUP, Coimbra Editora, 2004, págs. 436 e ss.
[28] Teresa Magalhães, Da Avaliação à Reparação do Dano Corporal, www.trp.pt/notícias/conferência.
[29] João António Álvaro Dias, Dano Corporal, Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, Almedina Coimbra, 2001, págs. 390 e 391.
[30] J. Álvaro Dias, Dano Corporal – Quadro Epistemológico, cit., págs. 130 e ss. e Armando Braga, A Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Civil Extracontratual, Almedina, Coimbra, 2005, págs. 37 e ss. e 201 e ss. e Ac. do STJ de 26.01.12, www.dgsi.pt.
[31] J. Sinde Monteiro, “Dano corporal (Um roteiro do direito português, RDE, 1989, págs. 367 e ss.
[32] O conceito tem, também, enorme relevância no plano normativo: indirectamente, no Decreto-Lei nº 352/2007, de 23 de Outubro, que, para além da aprovação de uma nova Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho, aprovou uma Tabela Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil; directamente para a Portaria nº 377/2008, de 26 de Maio – entretanto já alterada pela Portaria nº 679/2009, de 25 de Junho – que regula o denominado regime de proposta razoável de indemnização, a apresentar pelas seguradoras em casos de acidente de viação.
[33] Armando Braga, Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Civil Extracontratual, Almedina, Coimbra, 2005, págs. 116 a 120 e 130.
[34] João António Álvaro Dias, Dano Corporal, Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, Almedina, Coimbra, págs. 163 a 178.
[35] V.g., acs. do STJ de 25.06.02 e 24.09.09, www.dgsi.pt.
[36] Ac. do STJ de 20.10.10, www.dgsi.pt. O acordão admite, porém, em tese geral, que o dano biológico possa ser avaliado de forma patrimonial ou não patrimonial.
[37] Ac. do STJ de 27.10.09,www.dgsi.pt. O acordão, apesar de se afirmar que a penosidade acrescida no exercício de tarefas profissionais e do dia-a-dia constitui seguramente um dano não patrimonial, conclui, porém, em sentido distinto, ao afirmar que os autos revelam a natureza híbrida do dano biológico, pelo que a perda da capacidade de trabalho, sem consequências imediatas (ou para quem ainda não trabalha) tem (igualmente) importância pela diminuição das possibilidades de mudança ou reconversão de emprego, ou seja, constitui (também) um dano patrimonial.
[38] Acs. do STJ de 15.11.02, 11.11.10, 20.05.10, 06.12.11, 10.10.11 e 11.12.12, www.dgsi.pt.
[39] Assim, também, v.g., os Ac. da RP de 07.01.13, 22.11.12, 29.05.12 e 24.04.12.
[40] Esta dupla fundamentação da reparabilidade do dano biológico e o reconhecimento da sua alteralidade e autonomia levanta, porém, um problema espinhoso: o da cumulação da sua reparação com a reparação do dano estritamente laboral. Admitindo a cumulação - com fundamento em que, o prejuízo que a indemnização do dano biológico visa ressarcir não é um dano laboral, mas um dano de natureza geral, ou seja que correspondente à afectação definitiva da capacidade física ou psíquica do lesado, com repercussões nas actividades da vida diária, incluindo familiares, sociais, de lazer e desportivas, que não tem sequer expressão em termos de incapacidade para o trabalho, apenas exigindo do lesado esforços acrescidos nesse domínio - cfr., v.g, os Ac. do STJ de 11.12.12 e 10.12.12, www.dgsi.pt; contra, porém, o Ac. do mesmo Tribunal de 26.01.12 – www.dgsi.pt – de harmonia com o qual o a conceptualização do dano biológico não veio tirar nem por ao que, em termos práticos já vinha sendo decidido pelos tribunais, quando à indemnização pelos danos patrimoniais de carácter pessoal ou compensação pelos danos não patrimoniais, relevando apenas na fundamentação, designadamente, para se chegar a tal indemnização, afastando as dúvidas que poderiam surgir perante a não diminuição efectiva de proventos apesar da fixação da incapacidade permanente.
[41] Ponderando esta perda - e o desgosto e frustração inerentes, no caso de jovem de 18 anos de idade, da equipa nacional de cadetes de basquetebol que, por força do atropelamento, deixou de praticar este desporto - no contexto dos danos não patrimoniais, cfr. o Ac. do STJ de 30.09.10, www.dgsi.pt.
[42] Acs. da RC de 14.10.97, CJ, XXII, IV, pág. 36 e do STJ de 05.02.87, BMJ, 364, pág. 819.
[43] O entendimento da incapacidade permanente geral, mesmo que não se prove que implica incapacidade para o trabalho, como causa de danos patrimoniais futuros, é a solução para a qual a jurisprudência do Supremo parece inclinar-se: Acs. do STJ de 30.10.08, 30.09.10, 20.10.11, 07.06.11 e 21.02.13, www.dgsi.pt.
[44] Trata-se de jurisprudência firme. Cfr., v.g., Acs. do STJ de 23.11.06, 22.11.07, 25.11.07 e 22.01.08, www.dgsi.pt.
[45] De harmonia com O INE, tendo em conta o índice de mortalidade no período compreendido entre 2009 e 2011, o valor da esperança de vida à nascença é de 79,45 anos para ambos os sexos, sendo de 76,45 anos para os homens.
[46] Assim, por último, v.g., o Ac. do STJ de 07.05.14, www.dgsi.pt.
[47] Cfr., v.g., Acs. do STJ de 24-09.09, 13.09.07, 05.07.07, 02.10.07, 04.12.07, 08.06.06, 02.03.04 e 07.10.10, www.dgsi.pt., e de 10.02.98 e 25.06.02, CJ, VI, I, pág. 66 e X, II, pág. 128, respectivamente, da RP de 11.12.12, 05.11.13 e 24.04.12, www.dgsi.pt., e J. Sousa Dinis, Dano Corporal em Acidentes de Viação. Cálculo da indemnização em situações de morte, incapacidade total e parcial. Perspectivas Futuras, CJ, STJ, 2001, I, pág. 5.
[48] Neste sentido, v.g., Acs. do STJ de 23.11.06 e 19.12.06, www.dgsi.pt.
[49] Ac. do STJ de 27.11.11, www.dgsi.pt.
[50] Ac. do STJ de 07.10.10, www.dgsi.pt.
[51] Ac. do STJ de 27.05.10, www.dgsi.pt.
[52] Ac. do STJ de 28.10.10., www.dgsi.pt.
[53] Ac. do STJ de 30.09.10, www.dgsi.pt.
[54] E, portanto, diferentes, dado que a semelhança é uma qualidade de realidades desiguais.
[55] Informação disponível em www.Pordata.pt/Portugal/taxa de juro.