Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1734/00.5TACBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ATAÍDE DAS NEVES
Descritores: PENA SUSPENSA
REVOGAÇÃO
Data do Acordão: 11/19/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VARA COMPETÊNCIA MISTA DE COIMBRA-2ª SECÇÃO
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 51º, 2 , 56º, 1 CP
Sumário: 1. A obrigação de indemnização deve responder à ideia da exigibilidade e ao princípio da proporcionalidade que são conceitos básicos do Estado de Direito.
2. O tribunal quando aprecia criticamente a conduta não pode exigir ao arguido o cumprimento de qualquer reparação que lhe seja de todo impraticável. Não pode, quer na altura em que procede ao arbítrio, quer na apreciação do seu incumprimento, deixar de atender a todas as envolventes e exigir apenas o que é razoável sob pena de violar o princípio da equidade. Por outro lado não pode descurar a função adjuvante da realização da finalidade da punição.
3. O Tribunal não têm que se aplicar todas as medidas previstas para finalmente revogar a suspensão, basta que na apreciação reiterada do incumprimento se esgote o juízo de prognose favorável.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

O arguido AM..., foi condenado no âmbito deste processo como autor de um crime de burla agravada, previsto e punido pelos artigos 217.º e 218.º, n.º 2, al. a ) e 202.º, al. b) do Código Penal, na pena de três anos de  prisão, suspensa na sua execução pelo período de cinco anos, condicionada ao dever do arguido pagar aos queixosos toda a quantia de que se apoderou, no prazo de três anos, à razão de 1/3 por ano. Não tendo procedido ao pagamento da referida indemnização por despacho de revogo 06-06-2008 foi decretada a suspensão da execução da pena de prisão e determinado o seu cumprimento.

Inconformado com a revogação da suspensão, o arguido interpõe recurso e formula as seguintes conclusões:

1 - Foi o arguido AM…, condenado, com trânsito em julgado em 2510112005, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 5 anos, condicionada ao dever do arguido pagar aos queixosos a quantia de 74.819,68 E, no prazo de 3 anos, à razão de 1/3 por ano.

2- A suspensão da execução da pena foi revogada por decisão de 06/06!2008, considerando o Tribunal a quo que “ o arguido não cumpriu com os deveres, podendo ter cumprido ",

3 - A Douta decisão, no nosso entender, carece de fundamento, porquanto o ora recorrente, apesar de todas as dificuldades económicas, foi pagando conforme as suas possibilidades, conforme requerimentos juntos aos autos.

4 - Na verdade, o recorrente pagou ao ofendido, entre o dia 23/02/2006 e o dia 19/12/2006, um total de 3500,00€, o que demonstra que não se alheou do processo e do seu destino, tentando cumprir, dentro das sua possibilidades, a obrigação que lhe foi imposta.

5 - Continuando, conforme consta dos autos, na expectativa de receber honorários referentes a projectos que efectuou e a quantia de 15.462,73 € a título de indemnização no âmbito do Processo n° 492/99.9JACBR (reqº de 15/01/2007).

6 - Assim, todas as quantias entregues foram provenientes apenas dos seus parcos rendimentos mensais, que se situam em 1032,00 €, atentas as penhoras que incidiam sobre o seu vencimento e a reforma da sua esposa, com os quais tem de fazer face à despesas do seu agregado familiar composto por 4 pessoas, conforme se encontra documentado nos autos,

7 - Acresce que o ora recorrente nunca omitiu qualquer rendimento, auxiliando sempre na investigação da sua situação económica, tendo inclusive autorizado expressamente qualquer banco a fornecer ao Tribunal informação sobre todas as suas contas bancárias.

8 - Em requerimento de 24/10/2007, esclareceu o recorrente, após notificação do Despacho de 03/1 012007, que a simples transcrição dos montantes depositados, não traduzem a situação económica do recorrente.

9 - Tais situações: cheques devolvidos por falta de provisão, necessidade de empréstimo, saldos irrisórios e frequentemente a negativo, são demonstrativos das grandes dificuldades económicas pelas quais o recorrente tem passado que o impediram de liquidar quantia superior da indemnização.

10 - Por ter sido sempre sua intenção proceder ao pagamento da referida indemnização, chegou mesmo a solicitar empréstimo junto do seu pai e posteriormente junto de AJ, uma vez que a sua grave situação económica o impede de solicitar qualquer empréstimo junto de qualquer entidade bancária.

11 - O artigo 56° do C.P ., preconiza a não revogação automática da suspensão e ao abrigo da alínea a) do n° 1 deste normativo, a suspensão da execução da pena de prisão só é revogada se o condenado infringir grosseiramente ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos.

12 - Ora, no nosso entender, dos autos resulta em abundância que o condenado não infringiu com culpa grosseira os deveres que lhe foram impostos - a condição de pagamento - antes sim resulta dos mesmos a sua vontade e empenho na satisfação da condição, apenas não a tendo cumprido na totalidade por motivos económicos alheios à sua vontade.

13 - Assim sendo, e por tudo o que fica exposto, entende-se não existirem motivos para revogar a suspensão da execução da pena aplicada nos presentes autos.

14 - Mesmo que se entenda que o recorrente, culposamente, deixou de cumprir os seus deveres deveria o Tribunal a quo ter prorrogado o período de suspensão e de pagamento da indemnização, nos termos da alínea d) do artigo 55° do Código Penal.

XV - Violou assim o Douto Despacho recorrido os artigos 55° e 56° do C.P .

Termos em que deve o presente Despacho ser revogado, sendo substituído por outro em que seja levada em consideração a ora motivação, e em consequência ser prorrogado o período de pagamento da indemnização, nos termos da alínea d) do artigo 55° do Código Penal.

O recurso foi admitido.

Na resposta diz o Ministério Público que face aos elementos carreados nos autos e examinados pelo tribunal – que o recorrente não rebateu de modo convincente e satisfatório – a decisão ora contestada – e que o Ministério Público já há longo tempo propugnava – não nos merece qualquer reparo, pecando, talvez, por tardia.

No mesmo sentido se pronuncia o assistente, acrescentando que se deve manter o despacho recorrido, sob pena de, a assim não ser, poder passar a ideia de que o incumprimento compensa, o que não contribuirá para o prestígio dos tribunais e para a realização dos fins das penas e das expectativas da comunidade na realização da justiça penal.

Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto dá parecer de improcedência do recurso.

Responde o arguido reiterando os fundamentos do recurso, com apelo para a prorrogação do prazo.

Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

O recurso tem por único objecto sindicar a revogação da suspensão da pena.

É do seguinte teor o despacho recorrido:

O arguido foi notificado para, em 10 dias, a contar do trânsito da decisão, remeter declaração ao processo dizendo o que pretende fazer para começar desde já a pagar aos queixosos.

A decisão transitou a 25 de Janeiro de 2005 e o arguido nada disse quanto à forma como pretendia pagar aos lesados pela burla.

Por promoção do Ministério Público, em 9-3-2005 ( folhas 446 ), o arguido foi  notificado para vir aos autos esclarecer a razão porque não tinha iniciado ainda o  pagamento da dívida, condição para que a suspensão da execução da pena de prisão se mantivesse.

Respondeu por intermédio da sua advogada, em 21 de Junho de 2005, dizendo que não tinha condições económicas, mas que iria pagar em prestações, com início em 15 de Julho de 2005, de três em três meses a quantia de €8 500,00 euros.

Mas não pagou e sob promoção do Ministério Público foi chamado a prestar  declarações tendo sido ouvido em 21 de Novembro de 2005 (folhas 523).

Comprometeu-se a pagar a partir de Dezembro desse ano, pois estava à espera, segundo disse, de receber dinheiro por serviços que havia prestado.

Pagou várias quantias de €500,00 euros, até fins de Maio de 2006, perfazendo a quantia de €3 000,00 euros (folhas 549).

Em 15-12-2006 o Ministério Público promoveu a revogação da suspensão da pena porque o arguido não estava a cumprir os pagamentos (folhas 550).

O arguido veio responder que não tinha pago porque não tinha meios financeiros para o fazer e juntou o comprovativo de mais um pagamento de €500,00 euros (folhas 552 - 15/01/2007).

O ministério Público promoveu que fosse fixado o pagamento de uma quantia certa e mensal ao arguido (folhas 554).

b ) Procurou-se, por fontes diversas da própria informação do arguido, que rendimentos terá .

Com vista a dar seguimento a esta promoção, sendo necessário ter uma ideia dos rendimentos do arguido para se fixar a quantia pretendida, pois só com tal conhecimento se poderia fixar uma quantia que o arguido pudesse pagar, podendo, mais tarde, ser responsabilizado caso não pagasse, procedeu-se à recolha de elementos nesse sentido (informações do arguido sobre a sua actividade profissional e rendimentos mensais e solicitou-se relatório social ao IRS).

O arguido respondeu nos termos de folhas 566 e seguintes e foi junto relatório social (folhas 576).

Os ofendidos informaram que apenas tinham recebido €3 500,00 euros e que as condições económicas do arguido permitiam fixar uma pensão de 3 500,00 euros (581).

O Ministério Público promoveu novamente a fixação de uma quantia certa e mensal ao arguido e respectiva imposição de pagamento.

Despachou-se no sentido de notificar o arguido de que a ausência de pagamentos não podia continuar e que o tribunal teria de indagar se o arguido tinham tido ou não possibilidades de pagar mais do que aquilo que pagou e que caso se apurasse que podia ter pago mais e não pagou, a suspensão da execução da pena poder-lhe-ia ser revogada.

Foram-lhe concedidos 10 dias para vir aos autos mostrar que pagou, que se esforçou por pagar, sob pena do tribunal averiguar se ele tinha tido possibilidades de pagar (folhas 582).

O arguido veio responder nos termos de folhas 590 e seguintes, alegando que o seu agregado familiar é composto por quatro pessoas, que há penhoras a onerar o seu vencimento e o da esposa e que dispõe do rendimento mensal de €1 032,00 euros e não tem tido meios para pagar e que fosse fixada a prestação mensal de acordo com o conteúdo do relatório do IRS.

No relatório social solicitado ao Instituto de Reinserção Social refere-se que o arguido será proprietário de uma firma de transportes, com sede em Buarcos, Figueira da Foz.

Face à falta de elementos objectivos, procurou-se averiguar que rendimentos teria o arguido por fontes diversas da sua própria informação.

Pediu-se ao arguido que fornecesse ao processo a identidade da tal empresa e declaração de onde constasse que autorizava qualquer banco ou qualquer outra entidade que receba depósitos ou aplicações financeiras, a fornecer a este tribunal informação sobre contas bancárias, depósitos ou aplicações financeiras em que o seu nome figure como titular ou um dos titulares.

Ao mesmo tempo solicitou-se aos lesados que sugerissem diligências adequadas à finalidade em causa (folhas 593), os quais nada disseram.

O arguido cumpriu, e pelo despacho de folhas 604 foram pedidas as informações bancárias que agora foram remetidos (folhas 604).

c ) Das informações bancárias consta o que a seguir vai indicado ( valores em euros ).

Caixa de Crédito Agrícola de Coimbra (conta 3035 40190376144) – folhas 645.

29-12-2004………………………………..140,00 – depósito de numerário

25-2-2005…………………………………..52,34 – depósito de valores

20-9-2005………………………………....260,00 - depósito de numerário

27-9-2005………………………………….450,00 - depósito de numerário

29-9-2005………………………………....700,00 - depósito de numerário

12-10-2005…………………………..……315,00 - depósito de numerário

17-10-2005………………................……100,00 - depósito de numerário

19-10-2005………………...…………..…200,00 - depósito de numerário

20-10-2005……………..…………………600,00 - depósito de numerário

27-10-2005……………..…………………470,00 - depósito de numerário

10-11-2005…………………………………70,00 - depósito de numerário

10-11-2005…………………………………20,00 - depósito de numerário

15-11-2005………………………………2850,00 - depósito de numerário

24-11-2005…………….…………………200,00 - depósito de numerário

29-11-2005…………….…………………800,00 - depósito de numerário

29-11-2005……………...…………………50,00 - depósito de numerário

06-12-2005…………………………….…375,00 - depósito de numerário

13-12-2005……………………………..…50,00 - depósito de numerário

13-12-2005…………………………..…1000,00 - depósito de numerário

16-12-2005…………………………….…300,00 - depósito de numerário

16-12-2005………………………………400,00 - depósito de valores

19-12-2005………………………….……680,00 - depósito de valores

22-12-2005………………………………1083,47– depósito de valores

23-12-2005…………………………....…318,00 – depósito de valores

26-12-2005………………………….……512,00 - depósito de valores

28-12-2005………………………….……630,00 - depósito de valores

30-12-2005………………………..….…2500,00 - depósito de valores

02-01-2006……………….……………..1618,00 - depósito de valores

04-01-2006…………….……………….4 700,00 – utilização de empréstimo.

09-01-2006………….…..………………..250,00 - depósito de numerário

24-01-2006………..….………………..2 600,00 - depósito de numerário

24-01-2006…………………………..…2 240,00 - depósito de valores

27-01-2006………………………..……3647,00 - depósito de valores

01-02-2006……………………………..8032,15 - depósito de valores

08-02-2006……………...................…3570,00 – dep. de valores e de numerário

08-02-2006…………………………...…100,00 – depósito de numerário

09-02-2006………………………....….1622,00 – depósito de valores

13-02-2006……………………..…...….2023,00 – dep. de valores e de numerário

14-02-2006…………….………………..4732,00 – depósito de valores

15-02-2006…………….………………..4492,00 – depósito de valores

16-02-2006…………………….…600,00 – transferência da conta 40200429239

17-02-2006……………..………………4220,00 – depósito de valores

20-02-2006……………..………………4484,00 – depósito de valores

20-02-2006……………………………..4128,26 – dep. de valores e de numerário.

20-02-2006……………….………..550,00 – transferência da conta 40200429239

21-02-2006……………………….…...…795,00 – dep. de valores e de numerário

22-02-2006………………………..……1974,00 – depósito de valores

22-02-2006………………………..…...…420,00 – depósito de valores

24-02-2006…………….……….…….…3940,00 – depósito de valores

27-02-2006…………….……………..…2563,00 – depósito de valores

01-03-2006…………….……………..…7680,00 – depósito de valores

02-03-2006…………….………………..2500,00 – depósito de valores

02-03-2006…………….………………..5312,00 – depósito de valores

03-03-2006………………………………4390,00 – depósito de valores

06-03-2006………………………………5873,00 – depósito de valores

07-03-2006………………………...……6813,00 – depósito de valores

03-03-2006………………………..….…7912,00 – depósito de valores

03-03-2006………………………...……3927,00 – depósito de valores

15-03-2006………………………...……2513,00 – depósito de valores

16-03-2006…………..…………….……1900,00 – depósito de valores

17-03-2006……………………….………500,00 – depósito de numerário

20-03-2006…………..…………………1900,00 – depósito de valores

23-03-2006…………..…………1200,00 – transferência da conta 40200429239

27-03-2006……………..………………2027,00 – depósito de valores

29-03-2006………………………………430,00 – depósito de numerário

30-03-2006……………..…………...…4108,00 – depósito de valores

31-03-2006…………………………..…2071,00 – depósito de valores

31-03-2006………………………..……2200,00 – depósito de valores

03-04-2006………………………..……5012,00 – depósito de valores

04-04-2006……………..………………4034,00 – depósito de valores

04-04-2006………………………………825,00 – depósito de valores

05-04-2006………………………………215,00 – depósito de numerário

20-04-2006………………………………120,00 – depósito de numerário

24-04-2006………………………………300,00 – depósito de numerário

26-04-2006………………………………100,00 – depósito de numerário

28-04-2006………………………………180,00 – depósito de numerário

04-05-2006………………………………100,00 – depósito de numerário

04-05-2006…………..…………………1650,00 – dep. de valores e de numerário

09-05-2006………………………………185,00 – depósito de numerário

11-05-2006………………………………780,00 – depósito de numerário

12-05-2006………………………………509,00 – depósito de valores

15-05-2006…………………………..…1550,00 – depósito de numerário

16-05-2006………………...….…1250,00 – transferência da conta 40200429239

17-05-2006………………….……..……630,00 – depósito de valores

18-05-2006………………….………..…237,00 – depósito de valores

22-05-2006……………….……………1774,00 – depósito de valores

23-05-2006……………………….……1580,50 – depósito de valores

25-05-2006……………………….……1507,00 – depósito de numerário

26-05-2006……………………….……1083,00 – depósito de valores

29-05-2006………………………….…1665,00 – depósito de valores

30-05-2006………………………….…1450,00 – depósito de numerário

01-06-2006………………………….…1650,00 – depósito de numerário

05-06-2006……………………….…..…350,00 – depósito de numerário

13-06-2006…………………………….…50,00 – depósito de numerário

30-06-2006…………………………….…40,00 – depósito de numerário

03-07-2006……………………………….60,00 – depósito de numerário

6-07-2006……………………………….500,00 – depósito de numerário

06-07-2006…………………………...…140,00 – depósito de numerário

14-07-2006……………………….………60,00 – depósito de numerário

27-07-2006……………..……………16 500,00 – depósito de valores

08-08-2006………………..…………..…300,00 – depósito de numerário

16-08-2006………………..……………..400,00 – depósito de numerário

16-08-2006…………………………..……90,00 – depósito de numerário

21-08-2006……………….…………...…320,00 – depósito de numerário

23-08-2006…………………………..…1000,00 – depósito de numerário

24-08-2006……………….………..….…250,00 – depósito de numerário

30-08-2006……………………….……1820,00 – depósito de numerário

12-09-2006……………….…………50,00 – transferência da conta 40200429239

14-09-2006……………….…..……100,00 – transferência da conta 40200429239

19-09-2006…………………….…..……300,00 – depósito de numerário

20-09-2006………………………….…2057,35 – depósito de valores

28-09-2006………………………….…1700,00 – depósito de numerário

02-10-2006………………………….…2428,08 – depósito de numerário

10-10-2006…………………….……50,00 – transferência da conta 40207061657

16-10-2006……………………..…100,00 – transferência da conta 40200429239

16-10-2006………………….……….…500,00 – depósito de numerário

19-10-2006…………………...………….55,00 – depósito de numerário

31-10-2006……………………………..100,00 – depósito de numerário

14-11-2006……………………………….20,00 – depósito de numerário

24-11-2006……………………….1020,00 – transferência da conta 40200429239

24-11-2006……………………………..200,00 – depósito de numerário

30-11-2006……………………..…150,00 – transferência da conta 40200429239

06-12-2006………………………….…180,00 – depósito de numerário

06-12-2006……………………..…15,00 – transferência da conta 40200429239

12-12-2006…………………..….…..5000,00 – depósito de numerário

19-12-2006…………………..………1450,00 – depósito de numerário

19-12-2006……………………………100,00 – depósito de numerário

27-12-2006…………………………..…10,00 – depósito de numerário

28-12-2006……………………………150,00 – depósito de numerário

12-01-2007…………………….…600,00 – transferência da conta 40200429239

12-01-2007…………………….…600,00 – transferência da conta 40200429239

29-01-2007……………………………520,00 – depósito de numerário

31-01-2007……………………….….1000,00 – depósito de numerário

31-01-2007………………..….……450,00 – transferência da conta 40200429239

31-01-2007…………………………...200,00 – depósito de numerário

08-02-2007…………………………...300,00 - depósito de numerário

13-02-2007……………………..…..800,00 - transferência da conta 40200429239

16-02-2007………………………....800,00 - transferência da conta 40200429239

13-03-2007……………………......1200,00 - transferência da conta 40200429239

15-03-2007……………………………450,00 - depósito de numerário

15-03-2007………………………..1500,00 - transferência da conta 40200429239

16-03-2007………………………….216,00 - transferência da conta 40200429239

20-03-2007………………………..2700,00 - transferência da conta 40200429239

21-03-2007………………………..….20,00 - transferência da conta 40200429239

13-04-2007………………………….670,00 - transferência da conta 40200429239

17-04-2007…………………..……..200,00 - transferência da conta 40200429239

19-04-2007………………………..….10,00 - transferência da conta 40200429239

***

Crédito Predial Português ( conta 31.0000.060 22813001 ) folhas 673.

20-02-2004………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-03-2004………………………………………398,11 - pensão de reforma

08-04-2004………………………………..………52,93 - compra de moeda

21-04-2004………………………………………398,11- pensão de reforma

21-05-2004………………………………………398,11- pensão de reforma

21-06-2004………………………………………398,11- pensão de reforma

21-07-2004………………………………………995,28 - pensão de reforma

19-08-2004………………………………………597,17 - pensão de reforma

17-09-2004………………………………………597,17 - pensão de reforma

19-10-2004………………………………………398,11 - pensão de reforma

18-11-2004………………………………………995,28 - pensão de reforma

17-12-2004………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-01-2005………………………………..……398,11 - pensão de reforma

17-02-2005………………………………………398,11 - pensão de reforma

17-03-2005………………………………………398,11 - pensão de reforma

20-04-2005………………………………………398,11- pensão de reforma

19-05-2005………………………………………398,11 - pensão de reforma

17-06-2005………………………………………398,11 - pensão de reforma

17-07-2005………………………………………995,28 - pensão de reforma

18-08-2005………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-09-2005………………………………………398,11- pensão de reforma

19-10-2005………………………………………398,11 - pensão de reforma

17-11-2005………………………………………995,28 - pensão de reforma

19-12-2005………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-01-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

17-02-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

17-03-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-04-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

18-05-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-06-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-07-2006………………………………………995,28 - pensão de reforma

17-08-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-09-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

19-10-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

17-11-2006………………………………………995,28 - pensão de reforma

19-12-2006………………………………………398,11 - pensão de reforma

18-01-2007………………………………………398,11 - pensão de reforma

16-02-2007………………………………………403,69 - pensão de reforma

19-03-2007………………………………………400,90 - pensão de reforma

19-04-2007………………………………………400,90 - pensão de reforma

17-05-2007………………………………………400,90 - pensão de reforma

***

Banco Português de Investimento ( conta 342 7864 000 001 ) folhas 721.

28-09-2004………………………………………6 708,57 depósito numerário

13-10-2004………………………………………1 771,53 entrada de valores

28-10-2004………………………………………1 558,06 entrada de valores

23-11-2004………………………………………4 581,16 entrada de valores

09-12-2004………………………………………2 961,55 entrada de valores

21-12-2004………………………………………….50,00 depósito numerário

28-12-2004…………………………………………892,82 entrada de valores

02-02-2005………………………………….……5 202,39 entrada de valores

24-02-2005………………………………………4 264,82 entrada de valores

21-03-2005………………………………………2 892,02 entrada de valores

06-04-2005………………………………………5 416,15 entrada de valores

02-05-2005………………………………………3 500,90 depósito numerário

13-05-2005…………………………………………500,00 depósito numerário

19-05-2005…………………………………….…1 949,58 depósito numerário

03-06-2005…………………………………………701,31 depósito numerário

15-06-2005…………………………………….…2 800,00 depósito numerário

13-07-2005…………………………………………716,55 depósito numerário

26-07-2005…………………………………….…6010,00 depósito numerário

16-08-2005…………………………………….…3010,05 depósito numerário

15-09-2005………………………………………1 913,95 depósito numerário

27-09-2005………………………………………3 410,81 depósito numerário

18-10-2005…………………………………….…3195,38 depósito numerário

04-11-2005………………………………………2 198,42 depósito numerário

15-11-2005…………………………………………874,97 depósito numerário

29-11-2005…………………………………….…1 500,00 depósito numerário

05-12-2005…………………………………………950,00 depósito numerário

13-12-2005…………………………………………753,25 depósito numerário

09-01-2006………………………………………3 018,43 depósito numerário

24-01-2006……………………………………..…323,32 depósito numerário

08-02-2006…………………………………..……226,30 depósito numerário

21-02-2006……………………………………..…242,96 depósito numerário

14-03-2006……………………………………..…612,09 depósito numerário

29-03-2006……………………………...………1 508,51 depósito numerário

10-04-2006………………………………………1 500,00 depósito numerário

11-04-2006………………………………………2 011,47 depósito numerário

19-04-2006……………………………...…………900,00 depósito numerário

26-04-2006…………………………………………894,96 depósito numerário

11-05-2006…………………………………………200,00 depósito numerário

29-05-2006………………………….……………6 050,00 depósito numerário

30-05-2006…………………………………….…2 100,00 depósito numerário

12-06-2006…………………………………………336,59 depósito numerário

27-06-2006…………………………………………372,10 depósito numerário

10-07-2006…………………………………………336,59 depósito numerário

10-07-2006………………………………………1 200,00 depósito numerário

09-08-2006…………………………………………681,26 entrada de valores

30-08-2006…………………………………………696,01 depósito numerário

07-09-2006……………………………..……………28,00 entrada de valores

08-09-2006…………………………………………860,00 depósito numerário

16-10-2006…………………………………………463,19 entrada de valores

31-10-2006…………………………………………152,92 depósito numerário

11-12-2006……………………………....………8 000,00 transferência

26-01-2007…………………………………………500,00 transferência

09-02-2007…………………………………………500,00 depósito numerário

21-03-2007…………………………………………120,00 entrada de valores

11-06-2007…………………………………………800,00 depósito numerário

***

Resumindo os valores que ficam indicados temos:

Caixa de Crédito Agrícola de Coimbra entre 29-12-2004 e 19-04-2007 :

Depósitos de numerário…………………………..44 830,08

Entrada/depósito de valores……………………..159 306,73

Transferência………………………………………14 851,00

Empréstimo………………………………………...4 700,00.

Crédito Predial Português entre 20-02-2004 e 17-05-2007

Pensões ……………………………………………19 919,49

Banco Português do Investimento entre 28-09-2004 e 11-16-2007

Depósitos de numerário…………………………..65 585,99

Entrada/depósito de valores……………………..30 832,95

Transferência……………………………….…….…8 500,00

Totais

Depósitos de numerário………………………..110 416,07

Entrada/depósito de valores…………………..190 139,68

Transferência……………………………………..23 351,00

Pensões ………………………………………….19 919,49

Empréstimo………………………………............4 700,00.

d ) Face a estes valores, que o tribunal referiu ao arguido, pelo despacho de 03-10-2007, foi dito ao arguido que se afigurava ter tido condições para pagar muito mais do que aquilo que tinha pago.

Podia, por exemplo, ter utilizado as pensões para pagar aos ofendidos e teria pago substancialmente mais do que aquilo que pagou.

E se tivesse pago 10% dos montantes relativos a depósitos e transferências teria pago €32 390,50 euros.

Foi chamado à atenção para o facto de já ter sido notificado de que a ausência de pagamentos não podia continuar e que caso se apurasse que podia ter pago mais e não pagou, a suspensão da execução da pena poder-lhe-ia ser revogada.

Isto, porque se alguém teria de ter algum trabalho ou fazer algum sacrifício, teria de ser o arguido e não os ofendidos, pois os desapossou, já em Abril de 2000, da quantia de 15 000 000$00 ( €74 819,68 euros ).

Referiu-se ao arguido que face aos montantes movimentados pelo arguido, aparentemente seria de concluir que o arguido não quis nem quer pagar.

Referiu-se ao arguido que era dever do tribunal terminar com a suspensão da execução da pena se se verificasse que o arguido pretendia continuar na posse do dinheiro que obteve dos ofendidos, tendo tido a possibilidade de pagar, pelo menos, parte da quantia de que se apropriou. Referiu-se ao arguido, nesse despacho que, face aos factos apurados não se colocava, nesse momento, a questão de fixar uma quantia mensal, porque isso relevaria para o futuro, quando é certo que se estava a apreciar dos factos do passado e sua relevância para a manutenção ou não da situação de suspensão da execução da pena de prisão. Que os factos apontavam para a revogação dessa suspensão, pelo que, antes de ser proferida decisão sobre se é ou não caso de lhe revogar a suspensão da execução da pena, o arguido poderá dizer o que entender, em 10 dias.

O arguido respondeu em 24 de Outubro de 2007, alegando os extractos do banco não traduzem a sua situação económica. Diz que as verbas da conta do Crédito Predial Português provêm da reforma da sua esposa. Que a conta do Banco Português de Investimento é movimentada no âmbito da empresa de transportes «Transportes A…., Ld.ª » e que tem de pagar salários a três empregados.

Tal conta apresenta sempre um saldo muito modesto, por vezes até negativo, o que demonstrar não só as dificuldades económicas do arguido, como as da empresa na fase inicial em que a mesma se encontra.

Diz que a conta da Caixa de Crédito Agrícola de Coimbra é também reveladora do que atrás se referiu, a qual também é utilizada no âmbito do seu negócio, pelo que os depósitos efectuados são para fazer face às despesas normais de funcionamento, sendo certo que o arguido apenas retira como seu vencimento a quantia de €951,50 euros.

Diz que os extractos de conta mostram saldos irrisórios e até, frequentemente, negativos.

Acresce que, frequentemente, foram devolvidos cheques que o arguido emitiu por falta de provisão, como ocorreu em 31/01/06, data em que foram devolvidos 6 cheques, em 06/02/06 um cheque, em 09/03/06, 7 cheques, e em 04/04/06, 5 cheques, entre outros casos.

Os cheques emitidos por si e devolvidos, a necessidade de ter recorrido a um empréstimo, os saldos irrisórios e frequentemente a negativo, mostram as grandes dificuldades económicas pelo que o arguido tem passado que o impediram de liquidar quantia superior da indemnização.

Neste requerimento diz que o seu pai conseguirá um empréstimo de €20 000,00 euros, que espera venha a ser concedido até dia 15 de Novembro o que lhe permitirá liquidar parcialmente a indemnização em que foi condenado.

Pediu prazo até ao dia 20 de Novembro de 2007 para entrega aos ofendidos da quantia de 20.000,00 euros e a fixação da quantia mensal a pagar, em valor que não exceda os €500,00 euros, face à situação de carência do arguido.

e) Sobre este requerimento, o tribunal fez saber ao arguido, pelo despacho de 29-10-2008, que a a situação financeira permitia concluir que o arguido podia ter pago mais do que aquilo que pagou e que caso tivesse pago 10% dos montantes relativos a depósitos e transferências teria pago €32 390,50 euros.

Referiu-se também que já tinha sido notificado de que a ausência de pagamentos não podia continuar e que caso se apurasse que podia ter pago mais e não pagou, a suspensão da execução da pena poder-lhe-ia ser revogada.

Concluiu-se nesse despacho que em face dos factos apurados não se colocava, a questão de fixar uma quantia mensal, porque isso relevaria para o futuro, quando é certo que se estava a tratar dos factos do passado e da sua relevância para a manutenção ou não da situação de suspensão da execução da pena de prisão e que os factos apontam para a revogação dessa suspensão.

Por conseguinte, a questão que está em análise era a da manutenção ou não da suspensão face ao comportamento passado.

Referiu-se ao arguido que, no entanto, a questão se tinha alterado face ao requerimento dos ofendidos, que requereram que lhe fosse fixado o prazo de 60 dias para que o arguido pagasse a indemnização.

Se pagasse a indemnização o arguido cumpria a condição da suspensão e a questão ficava solucionada.

Atendeu-se a tal requerimento e foi fixado ao arguido prazo, até ao dia 3 de Janeiro de 2008, inclusive, para ele pagar a quantia .

Foi dito ao arguido que findo tal prazo seria analisada a situação quer julgando cumprida a condição se o arguido tivesse pago, quer decidindo pela revogação ou não da suspensão da execução da pena de prisão em que se encontra condenado.

O arguido nada pagou.

O arguido veio dizer, em 7 de Janeiro de 2008, que o empréstimo não foi concedido ao seu pai e que também não recebeu uma indemnização de €15 462,73 euros, que lhe havia sido atribuída no âmbito do processo n.º 492/99.9 JACBR desta vara Mista de Coimbra.

Disse ainda que espera o pagamento de 15 000,00 de honorários por parte da empresa C.F.A. com sede em Madrid, que prometeu pagar-lhe em breve.

Mis referiu que um amigo de longa data (AJ), que identificou, estaria disposto a emprestar-lhe €70 000,00 euros, entregando-lhe metade em 15 de Janeiro de 2008 e o restante em 30 desse mês.

O tribunal, considerando que o arguido indicou o nome de uma pessoa que lhe prometeu emprestar €70 000,00 euros, partiu do princípio que o alegado pelo arguido seria verdadeiro e decidiu esperar até ao fim do mês de Janeiro de 2008.

Nada foi pago.

Este prazo foi prorrogado por mais 15 dias seguidos, por despacho de 7 de Fevereiro de 2008.

Aproveitou-se esse despacho para advertir o arguido quanto ao já referido no ponto 3 do despacho de 3 de Outubro de 2007, isto é: «Face a estes valores afigura-se que o arguido teve condições para pagar muito mais do que aquilo que pagou. Desde logo, podia ter utilizado as pensões para pagar aos ofendidos e teria pago substancialmente mais do que aquilo que pagou.

E se tivesse pago 10% dos montantes relativos a depósitos e transferências teria pago €32 390,50 euros.

Já foi notificado de que a ausência de pagamentos não podia continuar e que caso se apurasse que podia ter pago mais e não pagou, a suspensão da execução da pena poder-lhe-ia ser revogada.

Se alguém tem de ter algum trabalho ou, digamos, fazer algum sacrifício, é o arguido e não os ofendidos, que foram despojados, já em Abril de 2000, da quantia de 15 000 000$00 ( €74 819,68 euros ).

E o arguido não mostra vontade em devolver esta quantia aos ofendidos.

Face ao exposto, designadamente aos montantes movimentados pelo arguido, indicia-se que o arguido não quis, nem quer pagar».

Ou seja, poder-se-ia concluir, sendo uma das hipóteses possíveis, que o arguido já se comportou por forma justificar a revogação.

Claro que, pagando, assumia um comportamento que tornava a revogação desnecessária.

Nada foi pago.

f ) Solicitou-se ao serviço de finanças respectivo a remessa das declarações fiscais da empresa Transportes A…, Ld.ª, com sede na Rua …, Figueira da Foz desde a sua constituição.

A repartição de finanças informou que o arguido em relação aos rendimentos da categoria A, provenientes da empresa em causa auferiu €2775,00 euros em 2004, €4875,00 euros em 2005 e €13 000,00 em 2006. As declarações que apresentou para efeitos de IRC relativamente aos anos de 2004, 2005 e 2006, mostram um lucro tributável de €13794,61 em 2004 e prejuízos para efeitos fiscais de €7 974,00 euros em 2005 e de €€37560,00 euros em 2006 (folhas 900 e seguintes).

Em 15 de Maio de 2008 foi proferido despacho a mandar notificar o arguido para o caso de pretender dizer algo sobre as informações fiscais referidas, indicando-se que depois seria apreciada a situação da revogação ou não da suspensão.

Não veio dizer nada.

Os assistentes alegam que o arguido tem manifestado vontade de não cumprir com a condição que lhe foi imposta e pedem que seja revogada a suspensão da execução da pena.

O Ministério Público concluiu no mesmo sentido.

2. Apreciação.

a ) Nos termos da al. a) do n.º 1, do artigo 51.º do Código Penal, «A suspensão da execução da pena de prisão pode ser subordinada ao cumprimento de deveres impostos ao condenado e destinados a reparar o mal do crime, nomeadamente:

a ) Pagar dentro de certo prazo, no todo ou na parte que o tribunal considerar possível, a indemnização devida ao lesado, ou garantir o seu pagamento por meio de caução idónea».

No caso dos autos, considerou-se no acórdão condenatório que o arguido tinha já 47 anos de idade e não se mostrava que tivesse antecedentes criminais, existindo a convicção de que a suspensão se justificava.

Referiu-se porém que a suspensão ficaria condicionada para que o arguido fizesse «…alguma coisa para minorar o mal que causou aos queixosos..» impondo-se que pagasse aos queixosos, pelo menos o que fosse possível, não podendo alhear-se da situação em que deixou os queixosos, continuando sem os indemnizar e beneficiando de 15.000.000$00 que não são seus e que por artifícios enganosos extorquiu a dois cidadãos de boa fé.

Convidou-se o arguido a reflectir nos factos que praticou e a fazer alguma coisa no sentido de minorar ao máximo o mal que causou e continua a causar, materialmente e moralmente os queixosos, enquanto não os ressarcir, podendo facilmente averiguar tal situação, se se colocar no lugar de qualquer deles.

Escreveu-se no acórdão: «…o arguido deve ficar bem ciente de que algo tem de fazer para se mostrar merecedor da suspensão. Ou seja, tem de pagar a quantia que subtraiu aos queixosos.

Deve pagá-la quanto antes, no prazo de três anos, à razão de 1/3 por ano ( € 24.939,89 ), trabalhando, vendendo bem pessoais de que seja proprietário, contraindo empréstimos, etc.».

b ) Os factos dos autos são de gravidade suficiente para merecerem que o seu autor cumprisse uma pena efectiva de prisão.

Com efeito, a sociedade não suporta que um cidadão engane outro e se aproprie de €74 819,68 euros, de um dia para o outro.

Este tipo de comportamento é altamente lesivo da confiança que deve existir entre as pessoas e gera danos morais nas vítimas que se reflectem na sua atitude para com os outros deixando de confiar nos outros. Dados os malefícios destas acções os tribunais têm de minorar estes efeitos nocivos tentando que o mal causado seja reparado dentro do possível.

Entendeu-se com a suspensão da execução da pena que o arguido se esforçaria por pagar esta quantia ao longo do período da suspensão e por isso não foi logo decretada pena de prisão efectiva. Se alguém tinha de passar por sacrifícios seria o arguido, que se sacrificaria, prescindindo de comodidades, para poder pagar aos ofendidos aquilo de que se apoderou.

*

Do relato das diligências feitas nos autos verifica-se o seguinte:

….O arguido nunca teve a iniciativa de pagar ou vir mostrar que não podia pagar.

Foi sempre necessário o tribunal interpela-lo para vir aos autos dizer o que tinha feito.

Ora, esta atitude não se consegue entender face às advertências que lhe foram feitas no acórdão condenatório.

Efectivamente um cidadão com reais intenções de reparar o mal que tinha feito tinha tido outro comportamento, isto é, tinha vindo ao tribunal mostrar a sua vida e dizer que pagava «x» por mês e começava a pagar, sem que fosse necessário o tribunal interpelá-lo.

O arguido fez o contrário disto, o que mostra que não é merecedor da medida de suspensão da execução da pena.

*

Além disso, mostra durante todo o processo posterior ao acórdão que nunca toma a iniciativa de vir mostrar que está a fazer tudo para pagar.

É necessário o tribunal notificá-lo continuamente para vir mostrar o que está a fazer para cumprir a condição.

*

Por outro lado, como resulta do movimento das contas bancárias acima referidas, o arguido movimentou somas elevadas de dinheiro.

Ora isto mostra que o arguido podia ter pago muito mais do que aquilo que pagou.

O arguido defende-se alegando que não tem dinheiro, que a sua situação económica não é deficitária.

A este respeito cumpre referir que as declarações fiscais não têm relevo quando são contrárias aos interesses do próprio, pois são feitas pelo contribuinte que as preenche como entende.

As contas bancárias têm a vantagem de nos dizerem que as quantias constantes dos extractos existiram, pelo menos os depósitos em numerário.

Se alguém recebe 1000 e gasta 1000 de seguida, ficando financeiramente a «zero» não é o mesmo que não receber nada.

O facto das contas poderem ficar com saldos negativos ou com saldos diminutos nada significa, pois o que interessa são os fluxos de dinheiro que entram e são utilizados.

Resumindo os valores que ficam indicados temos, entre 29-12-2004 e 11-06-2007:

Depósitos de numerário………………………...€110 416,07

Entrada/depósito de valores…………………….€190 139,68

Transferências……………………………………..€23 351,00

Pensões …………………………………………….€19 919,49

Empréstimo……………………………….................€4 700,00.

Estes valores mostram que o arguido podia ter utilizado parte destes valores e ter pago muito mais do que os €3500,00 euros que pagou, pelos menos 5% ou 10% dos valores.

c ) Não se pretendia que o arguido tivesse pago tudo, mas sim que tivesse feito um esforço real e empenhado no sentido de pagar, de cumprir, de se mostrar merecedor da suspensão.

Como o arguido não cumpriu com estes deveres, podendo ter cumprido, deve  cumprir a pena de prisão em que foi condenado.

A norma referida quando faz depender a suspensão do pagamento da indemnização, não é inconstitucional ( ver ac. do TC n.º 596/99, DR II série de 22-2-2000 e ac. do TC n.º 256/03, DR II série de 2-7-2003, pág. 9872 ).

3. Decisão.

Considerando o exposto, revogo a suspensão da execução da pena de prisão imposta ao arguido neste processo e determino o seu cumprimento.

Notifique-se.

Da Revogação da Suspensão da Pena

Alega o recorrente que a decisão que revogou a suspensão da pena (agora recorrida), carece de fundamento, porquanto o ora recorrente, apesar de todas as dificuldades económicas, foi pagando conforme as suas possibilidades, nunca omitiu qualquer rendimento, auxiliou sempre na investigação da sua situação económica, a simples transcrição dos montantes depositados, não traduzem a situação económica do recorrente e é sua intenção proceder ao pagamento da referida indemnização. Factos ou circunstâncias que demonstram que não infringiu com culpa grosseira os deveres que lhe foram impostos.

Vejamos:

A propósito da natureza da indemnização referiu o Acórdão da Relação de Évora de 21/02/06:

A obrigação de pagar uma indemnização ao lesado, embora não constitua um efeito penal da condenação, assume natureza penal, por se integrar no instituto da suspensão da pena e, por conseguinte, como uma função adjuvante da finalidade da punição.

O dever enunciado tem, em primeira linha, uma finalidade reparadora (reparar o mal do crime) mas, por via dela, fortalece a finalidade da pena enquanto visa a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

Com efeito, limitando-se a suspensão da execução da pena de prisão ao pronunciamento da culpa e da pena, deve encontrar-se, por razões de justiça e equidade, outra maneira de fazer sentir à comunidade e ao condenado, os efeitos da condenação [Jescheck, Tratado de Derecho Penal, Parte Geral, Volume II, Bosch, Casa Editorial, S.A., p. 1160, embora assinalando o fortalecimento da função retributiva da pena]. Do que se trata, em suma, neste dever de indemnizar, é da sua função adjuvante da realização da finalidade da punição [Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, p. 353].

O pagamento da indemnização, na medida em que representa um esforço ou implica até um sacrifício para o arguido, no sentido de reparar as consequências danosas da sua conduta, funciona não só como reforço do conteúdo reeducativo e pedagógico da pena de substituição, mas também como elemento pacificador, neutralizando o efeito negativo do crime e apresentando-se, assim, como meio idóneo para dar satisfação suficiente às finalidades da punição, respondendo, nomeadamente, à necessidade de tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas da comunidade [cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13/10/1999, proc. n.º 665/99, sumariado por Manuel de Oliveira Leal-Henriques e Manuel José Simas Santos, Código Penal Anotado, 3.ª Edição, 1.º Volume, Editora Rei dos Livros, 2002, p. 681].

A obrigação deve responder à ideia da exigibilidade e ao princípio da proporcionalidade que são conceitos básicos do Estado de Direito.

Conexionando esta obrigação com a cláusula de exigibilidade e o princípio da proporcionalidade, estabelece o artigo 51, n.º 2, do CP que «os deveres impostos não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir».

Prescreve o artigo 56.º, n.º1, do C.P., na redacção anterior à Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro:

«1. A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso o condenado:

a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de readaptação social; ou

b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.»

O próprio Prof. Figueiredo Dias, no debate travado no seio da Comissão Revisora do Código Penal, teve a oportunidade de salientar, face a reparos que foram dirigidos à alegada falta de clareza do texto que então se encontrava em discussão, que a questão da revogação centrava-se no especial impacto do crime na obtenção das finalidades que estavam na base da suspensão, tendo esclarecido que o conteúdo da parte final da alínea b) estabelece uma condição comum às duas alínea a) e b) e que, através da expressão “e revelar”, se assinala o carácter não automático dos elementos referidos nas alíneas (cfr. Actas n.º 6,8 e 41, das sessões de 3 de Abril de 1989, 17 de Abril de 1989 e 22 de Outubro de 1990, respectivamente, Código Penal – Actas e Projecto da Comissão de Revisão, Ministério da Justiça, 1993).

Assim, a condenação por crime cometido no decurso da suspensão não consente a revogação da suspensão da execução da pena de prisão como mero efeito automático, antes exigindo a mediação de um juízo fundamentado de concreta demonstração de que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas. No seu propósito político-criminal de combater a pena de prisão, o legislador quis afastar qualquer automatismo formal na revogação da suspensão, subordinando-a a uma cláusula de ultima ratio, como medida extrema para lograr a consecução das finalidades da punição, em que avulta o desiderato de ressocialização do delinquente[1].

Quando no decurso do período de suspensão, o condenado, com culpa, deixa de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta, ou não corresponde ao plano de readaptação, pode o tribunal optar pela aplicação de uma das medidas previstas no artigo 55.º do C. P., a saber: fazer uma solene advertência; exigir garantias de cumprimento das obrigações que condicionam a suspensão; impor novos deveres ou regras de conduta, ou introduzir exigências acrescidas no plano de readaptação; prorrogar o período de suspensão.

Quando no decurso da suspensão, o condenado, de forma grosseira ou repetida, viola os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de readaptação, ou comete crime pelo qual venha a ser condenado e assim revele que as finalidades que estiveram na base da suspensão não puderam, por intermédio desta, ser alcançadas, a suspensão é revogada (artigo 56.º, n.º 1, do C. Penal). A revogação determina o cumprimento da pena de prisão (pena principal) fixada na sentença.

Como atrás se deixou expresso a violação dos deveres impostos só implica a revogação da suspensão se tal facto infirmar, de modo definitivo, o juízo de prognose favorável que esteve na base da suspensão, quer dizer, se revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.

Referiu o Acórdão da Relação de Lisboa de 19 de Fevereiro de 1997 (in Col. Jur. XXII, tomo I, 166) “a violação grosseira dos deveres ou regras de conduta impostos, de que se fala na alínea a) do nº 1 do artº 56º do CP, há-de constituir uma indesculpável actuação, em que o comum dos cidadãos não incorra e que não mereça ser tolerada nem desculpada. Só a inconciabilidade do incumprimento com a teleologia da suspensão da pena é que deve conduzir à respectiva revogação.”

Definidos os critérios gerais dos deveres impostos e destinados a reparar o mal do crime e a consequência do seu não cumprimento, cumpre apreciar criticamente a conduta do arguido/recorrente.

Em primeiro lugar diremos que o tribunal não pode exigir ao arguido o cumprimento de qualquer reparação que lhe seja de todo impraticável. Não pode, quer na altura em que procede ao arbítrio, quer na apreciação do seu incumprimento, deixar de atender a todas as envolventes e exigir apenas o que é razoável sob pena de violar o princípio da equidade. Por outro lado não pode descurar a função adjuvante da realização da finalidade da punição.

Esta ponderação foi devidamente abordada quando na decisão recorrida se consignou que não se pretendia que o arguido tivesse pago tudo, mas sim que tivesse feito um esforço real e empenhado no sentido de pagar, de cumprir, de se mostrar merecedor da suspensão.

É este o verdadeiro desafio do arguido, não pagou nem mostrou vontade de o fazer, pese embora as sucessivas diligências que promoveu e promessas que fez nesse sentido.

Perante este cumprimento omissivo e de acordo com o disposto no art. 55º do Código Penal o tribunal está obrigado a um exercício de controlo que dentro de um critério de justa proporcionalidade tomará as diligências necessárias à creditação do juízo de prognose favorável subjacente à suspensão da pena de prisão, como pena alternativa. Portanto sem perder o desígnio de inserção social do arguido, perante o não cumprimento dos deveres toma as medidas mais adequadas que oscilam entre a solene advertência e a prorrogação do período de suspensão.

Como é bom de ver não têm que se aplicar todas as medidas previstas para finalmente revogar a suspensão, basta que na apreciação reiterada do incumprimento se esgote o juízo de prognose favorável. O tribunal deixa de acreditar na reinserção social do arguido.

Ora, percorrendo a descrição factual do despacho recorrido, verificamos que o tribunal foi paciente, compreensivo e praticamente esgotou as sugestões alternativas à revogação da suspensão previstas no art. 55º do Código Penal.

Por despacho de 03-10-2007, foi dito ao arguido, entre outros avisos explicativos da natureza dos deveres, que era dever do tribunal terminar com a suspensão da execução da pena se se verificasse que o arguido pretendia continuar na posse do dinheiro que obteve dos ofendidos, tendo tido a possibilidade de pagar, pelo menos, parte da quantia de que se apropriou.

Será exigível maior intervenção pedagógica?

Não há dúvida que com esta advertência o tribunal cumpre atempadamente a advertência sugerida no art. 55º aliena a ) do Código Penal.

Depois, convencido que ainda assim seria possível o cumprimento efectivo do dever e a reparação do prejuízo prolonga e aceita uma série de diligências sugeridas pelo próprio arguido com vista ao pagamento parcial da indemnização. Esta tolerância decorre entre Outubro de 2007 e Maio de 2008, sem qualquer resultado senão a conclusão de que o arguido não quer pagar a indemnização, ainda que parcialmente, de forma a restabelecer a confiança que nele depositou o tribunal quando lhe suspendeu a pena.

Falar agora de prorrogação de prazo ou de novas garantias não faz nenhum sentido e derroga os verdadeiros objectivos da lei. Para além do pagamento há uma política de reinserção social que está definitivamente frustrada. O arguido deu provas sobejas de que não quer pagar. Se efectivamente o pretendesse fazer, tinha solvido parcialmente o compromisso e não o fez quando tinha condições para o fazer.

È irrelevante o pagamento de 3.500€ efectuado. Pelo contrário, corrobora as suspeitas de que deixou de estar interessado no prosseguimento do pagamento confiado na putativa clemência do julgador.

Por outro estando quase vencidos quatro anos sobre a sentença de primeira instância não faz sentido apelar à prorrogação do prazo que tem como limite cinco anos, quando já está por demais demonstrado que o arguido não quer cumprir. Também por esta razão são impertinentes a fictícias garantias de pagamento que o arguido foi dando no decurso de três anos. 

Conceder mais no tempo e na atitude seria desvirtuar os fins da pena, enquanto instrumento necessário á reinserção social do delinquente e à tutela dos bens jurídicos.

Sendo certo que nenhum ordenamento jurídico suporta pôr-se em causa a si mesmo, sob pena de deixar de existir enquanto tal. A sociedade tolera uma certa “perda” de efeito preventivo geral – isto é conforma-se com a aplicação de uma pena de substituição. Já não tolera a sua ineficácia[2].

Termos em que se nega provimento ao recurso.


[1] Veja-se neste sentido Acórdãos deste tribunal de 16-01-2008 e 04-06-2008
[2] Cfr. Costa Andrade, RLJ, 134º, p. 76.