Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1674/03.6TBFIG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: TERESA PARDAL
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
ACTIVIDADES PERIGOSAS
CONSTRUÇÃO DE OBRAS
Data do Acordão: 04/20/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Legislação Nacional: ARTS.483, 493 Nº2, 570 CC, DL Nº445/91 DE 20/11, DECRETO Nº41821 DE 11/8
Sumário: I - A actividade de construção civil não é, em geral, perigosa, só sendo perigosa se se verificarem circunstâncias que potenciem o risco de ocorrência de danos para terceiros.

II- Não constitui actividade perigosa a abertura de um buraco para colocação de fios e cabos com vista a fornecimento de telecomunicações, no passeio de uma urbanização em obras, cuja área tem acesso proibido ao público, pelo que não se verifica a presunção de culpa a que se refere o artigo 493º nº2 do CC, cabendo à autora o ónus de provar a culpa destas rés, nos termos dos artigos 487º e 342º do CC.

III - Não ficando definida a participação de cada uma das rés nos factos e ficando provado que a autora caiu nesse buraco quando, para cortar caminho, caminhava na zona das obras que estava interdita ao público, conclui-se que a autora não logrou provar a culpa das rés e que a queda lhe é imputável, de acordo com o artigo 570º do CC.

Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

A (…) intentou a presente acção declarativa com processo ordinário, contra Sociedade Imobiliária (…) Lda, C (…)& Cª, Lda, C (…) – E (…), SA, M (…)e C (…)SA alegando, em síntese, que, quando passeava na rua, ainda sem nome oficial, situada em ..., ..., caiu num buraco que se encontrava sem qualquer protecção ou aviso de perigo e não estava interdito à circulação de peões, fazendo parte das obras para a realização das infra-estruturas da “Urbanização X...”, a cargo das três primeiras rés, tendo o réu (…) dado o respectivo licenciamento sem fiscalizar a obra e sendo o referido buraco destinado à exploração pela ré (…)

Mais alegou que com essa queda sofreu lesões e danos por cuja reparação são responsáveis os réus e concluiu pedindo a sua condenação a pagar-lhe a indemnização de 144 262,42 euros, acrescida de juros à taxa legal, até integral pagamento.    

O réu (…) contestou arguindo a incompetência material do tribunal e alegando que o buraco em causa não se situava na via pública mas sim num espaço privado pertencente à ré (…)Lda, titular do loteamento da obra em questão.

Concluiu pedindo a sua absolvição e a condenação da autora como litigante de má fé.

A ré (…) Lda contestou alegando, em síntese, desconhecer os factos alegados pela autora, nomeadamente se o local em causa estava ou não dentro das obras da Urbanização X...”, sendo que, neste último caso, a autora teria entrado por sua conta e risco numa zona que não estava aberta à circulação pública de peões, para além de que a contestante executou os arruamentos da referida urbanização, mas não o calcetamento dos passeios que ladeiam os arruamentos o qual ocorreu posteriormente e sendo ainda exagerados os valores reclamados.

Concluiu pedindo a improcedência da acção e a absolvição do pedido.       

A ré (…) contestou alegando, em síntese, desconhecer completamente os factos, não tendo qualquer relação com o buraco em causa, não o utilizando para qualquer fim, aí não fazendo quaisquer trabalhos ou instalações de ramais ou condutas, não podendo ser responsabilizada por eventuais danos sofridos pela autora.

Concluiu pedindo a absolvição do pedido.

As rés (…) contestaram conjuntamente, invocando a sua ilegitimidade, por a primeira ter transferido a sua responsabilidade pelos danos ocorridos com a execução da obra, bem como da execução dos trabalhos que adjudicou às rés (…) que se obrigaram a ter seguros que dessem cobertura aos danos que pudessem ocorrer na sua área de intervenção, tendo a segunda transferido a sua responsabilidade para uma seguradora; mais alegaram, em síntese, que não estão reunidos os requisitos da responsabilidade civil pois foi a autora quem deu causa aos factos, ao entrar no local onde decorriam as obras com acesso interdito ao público, e não aceitando também os danos invocados.

Concluíram pedindo a procedência da excepção e a improcedência da acção.

Deduziu ainda a ré C (…), SA incidente de intervenção principal passiva de (…)Companhia de Seguros, SA, alegando que a sua responsabilidade estar transferida para a chamada.

A autora replicou mantendo o alegado e pedido na petição inicial e veio deduzir incidente de intervenção principal passiva de (…)SA, alegando que a chamada tem um interesse igual ao da ré (…), SA, no caso de ser a chamada a responsável pela exploração das infra-estruturas das obras.

Os dois incidentes de intervenção principal foram julgados procedentes, tendo sido citadas as duas chamadas.

A interveniente (…) Companhia de Seguros, SA contestou impugnando, por desconhecimento, os factos invocados pela autora, aceitando a existência do contrato de seguro, mas alegando que este não cobre todos os danos invocados e que a ré sua segurada nunca lhe comunicou o sinistro em questão.

Concluiu pedindo o julgamento da acção de acordo com a prova a produzir, levando-se sempre em conta o valor da franquia.

A interveniente (…) SA contestou impugnando, por desconhecimento, os factos invocados pela autora e alegando que, na data dos mesmos, a contestante não tinha nenhuma relação com a urbanização, que se encontrava ainda em construção, só tendo recebido o ofício da respectiva aprovação em Dezembro de 2000.

Concluiu pedindo a absolvição do pedido.

No despacho saneador foi julgada procedente a excepção da incompetência absoluta relativamente ao réu (…) e este foi absolvido da instância e foram julgadas improcedentes as excepções de ilegitimidade passiva arguidas pelas rés (…)

Os autos prosseguiram, tendo as partes apresentado os seus requerimentos de prova, entre os quais o requerimento da ré (…) de realização de perícia ao buraco em questão, o que foi indeferido.

                                                            *

A ré (…) da interpôs recurso desta decisão, o qual foi admitido como agravo, com subida diferida e efeito devolutivo.

A recorrente alegou, formulando as seguintes conclusões:

1ª A perícia requerida e tendo em conta os objectivos nº2 e nº3 da mesma é absolutamente necessária para prova da matéria de facto dos arts. 20º, 21º, 22º, 27º, 28º e 100º da B.I.

2ª Não sendo suficiente para o efeito a inspecção judicial ao local que já foi efectuada. Aliás no entender da agravante essa inspecção só reforçou aquela necessidade.

3ª Porquanto só os peritos tecnicamente habilitados é que poderão dizer qual o uso do actual da caixa e a finalidade da sua abertura.

Termos em que se requer a reparação do agravo ou a revogação do despacho agravado.

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A autora contra alegou pugnando pela manutenção do despacho recorrido.

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O agravo não foi reparado e procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu as rés e as chamadas do pedido.

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Inconformada, a autora interpôs recurso da sentença, que foi admitido como apelação, com subida imediata, nos autos e com efeito devolutivo.

A recorrente alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:

A) A sentença recorrida fez errada subsunção dos factos ao direito aplicável. Com efeito,

B) A materialidade dada como provada impunha e impõe a condenação das rés a indemnizarem a autora nos termos definidos na petição inicial, já que,

C) A ré (…) era titular de alvará de licença de construção emitida pela Câmara Municipal da ..., com o nº655/01, através da qual foi licenciada uma construção que incidia sobre um prédio sito na “Urbanização X...”, Lote AX, da freguesia de ..., que por seu turno celebrou contratos de sub-empreitada com as restantes demandadas. 

D) Todas as rés exerciam por conseguinte, actividade tendente à construção e acabamentos da “Urbanização X...”, as quais estão por isso sujeitas às regras que disciplinam o exercício da actividade, nomeadamente as de sinalização das obras, remoção dos perigos para a generalidade das pessoas.

E) O buraco em que a autora caiu situava-se num passeio que fazia parte da obra em construção da “Urbanização X...”, o qual,

F) Estava ao nível do passeio, disfarçado,

G) Não tinha vedação,

H) Não tinha sinalização que indicasse a sua existência.

I) O dito buraco destinava-se às infra-estruturas de tal construção, à colocação de fios e tubos.

J) A colocação de fios e tubos no buraco aberto destinava-se ao fornecimento de telecomunicações.

K) Os factos descritos nas alíneas C) a J) implicavam para as rés a obrigação de vedar tal buraco, ou sinalizá-lo, já que o mesmo se inseria no conjunto da obra e assim,

L) Remover o perigo que o mesmo constituía.

M) As rés não provaram que a inexistência de vedação ou sinalização do mesmo – buraco –, não provinha de culpa sua, ou, a impossibilidade de em tempo útil terem provido à vedação ou sinalização dele.

N) Por tal razão as rés não afastaram a presunção de culpa que impendia sobre elas, nos termos do disposto no artigo 493, nº2 do CC, já que, “só o caso de força maior devidamente verificado”, exoneram o devedor da sua obrigação de garantir a segurança das pessoas, no âmbito do exercício de uma actividade perigosa pela sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados.

O) A sentença recorrida ao dizer que, e passo a citar:

“(…) Portanto, a este nível não vê bem o Tribunal, e salvo o devido respeito, o que mais poderia ter sido feito para dar a conhecer ao comum das pessoas a necessidade de não se “afoitarem”  no espaço ocupado pelas obras (…)”

P) Nas circunstâncias em que se encontrava a obra, podiam também circular por ali, tal como a autora, crianças e cidadãos com deficiência, maxime invisuais cegos.

Q) Por outro lado, o local do buraco onde a autora caiu (junto à fábrica de cimento e uma cabine) estava sem qualquer vedação, já que se apurou apenas que a vedação existente na altura estava colocada próxima do cemitério e até à casa do (…), ora a uma distância enorme do local do acidente.

R) Nesta conformidade, é óbvio que o facto de as rés terem colocado placas no perímetro da Urbanização X..., a proibir a entrada no local de pessoas estranhas à obra, ou/e de terem colocado uma vedação em espaço e dimensões não concretamente apuradas, próximo do cemitério e até à casa do (…), ou/e de as obras serem visíveis, não significa que as rés tenham feito tudo o que lhes era exigível para remover os perigos, desde logo porque o buraco estava lá, e totalmente desacautelado, razão porque vitimou a autora. 

S) E, nem se diga que os passeios foram executados por Entidade diferente das rés, já que, a autora desconhece sem obrigação de conhecer a miríade de sub-empreiteiros de que a (…) se socorreu, para levar a cabo a obra de cuja licença de construção era titular.

T) Do exposto decorre que a sentença recorrida violou, entre outros, o disposto no artigo 493º, nº2 do CC, ao considerar que as rés ilidiram a presunção de culpa que sobre elas impendia, quando,

U) A matéria de facto dada como provada impunha a conclusão de que as rés actuaram com culpa, pelo que, nunca poderiam ilidir tal presunção.

                                                            *

As rés (…)contra alegaram, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

                                                            *

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

As questões a decidir são:

I) Responsabilidade civil das rés e das chamadas (apelação da autora).

II) Indeferimento da realização de perícia (agravo da ré (…)).

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FACTOS.

Os factos dados como provados na sentença são os seguintes:

Resultantes dos factos assentes.

1- na Conservatória do Registo Comercial de ...., 4ª Secção, encontra-se matriculada, com o nº... a ré “(…) encontrando-se ali também inscritas, com a cota “01” e sob a Ap. ...”, a transformação de empresa pública em sociedade anónima, figurando como empresa transformada (…) e como um dos termos da transformação o objecto, constando que o mesmo consiste em assegurar o estabelecimento, a gestão e os serviços públicos de correios e telecomunicações, o exercício de quaisquer actividades que sejam complementares, subsidiárias ou acessórias das referidas e a prestação de serviços financeiros; com a cota “02” e sob a “AP. 33, 34 e 35/.....”, a cisão, na modalidade de cisão simples, constando como sociedade a constituir “Y...”, figurando como objecto de tal sociedade o estabelecimento, a gestão e a exploração das infra-estruturas e do serviço público de telecomunicações e ainda o exercício de quaisquer actividades que sejam complementares, subsidiárias ou acessórias daquelas, e como objecto da sociedade cindida assegurar o estabelecimento, a gestão e a exploração das infra-estruturas e do serviço público de correios, o exercício de quaisquer actividades que sejam complementares, subsidiárias ou acessórias das referidas, e a prestação de serviços financeiros; com a cota “11” e sob a “Ap.25/961220”, a alteração parcial do contrato, figurando como um dos termos da alteração o objecto, constando que o mesmo consiste em assegurar o estabelecimento, a gestão e a exploração das infra-estruturas e do serviço público de correios, o exercício de quaisquer actividades que sejam complementares, subsidiárias ou acessórias das referidas, bem como a comercialização de bens ou de prestação de serviços, desde que convenientes ou compatíveis com a normal exploração da rede pública de correios e a prestação de serviços financeiros (B).

2- antes da cisão aludida no ponto 1 eram apostas as iniciais (…) em todos os bens constantes do património da empresa, por ser esse o nome pelo qual a empresa era genericamente designada (C).

3- mediante escrito, datado de 19 de Fevereiro de 1998, entre a (…) representada por (…), na qualidade de sócio-gerente da empresa, e a ré (…) representada por (…) na qualidade de administrador desta entidade, foi celebrado um contrato denominado “adjudicação de empreitada nº05/98”, de cuja cláusula primeira consta que a ré (…)confia e a ré “(…) aceita a responsabilidade de executar todos os trabalhos que constituem as infra-estruturas eléctricas, telefónicas e de gás do loteamento urbano turístico “UZ 2”, sito (…)e de cuja cláusula nona consta que serão da responsabilidade da ré (…)todos os prejuízos causados a terceiros ou outros durante o período de execução das obras que adjudicou, comprometendo-se a ter seguros de responsabilidade civil que dêem cobertura a todo e qualquer dano que possa ocorrer na zona de intervenção onde decorrem os trabalhos (D).

4- mediante escrito, datado de 19 de Fevereiro de 1998, entre a ré (…)”, representada por (…) e (…), na qualidade de sócios-gerentes da empresa, e a ré (…)representada por (…), na qualidade de sócio-gerente desta entidade, foi celebrado um contrato denominado “adjudicação de empreitada”, de cuja cláusula primeira consta que a ré “(…)” confia e a ré (…) aceita a responsabilidade de executar todos os trabalhos que constituem as infra-estruturas de arruamentos, águas, esgotos e arranjos exteriores do loteamento urbano turístico “UZ 2”, sito (…), e de cuja cláusula nona consta que serão da responsabilidade da ré “(…) todos os prejuízos causados a terceiros ou outros durante o período de execução das obras que adjudicou, comprometendo-se a ter seguros de responsabilidade civil que dêem cobertura a todo e qualquer dano que possa ocorrer na zona de intervenção onde decorrem os trabalhos (E). 

5- mediante contrato de seguro, titulado pela apólice nº....., e com início em 14 de Abril de 1991, a chamada (…)Companhia de Seguros, SA” assumiu a responsabilidade civil da ré (…)” – então denominada “(…)” – por danos corporais e (ou) materiais causados a terceiros durante a instalação e montagem eléctricas, até ao limite máximo por anuidade ou sinistro de 20 000 000$00, e com uma franquia de 10% com um mínimo de 100 000$00 (F).  

6- mediante acta adicional com o nº8, emitida em 29 de Novembro de 1996 e onde figura como segurada a ré “(…)”, a chamada “(…) Companhia de Seguros, SA” declarou que a apólice aludida no ponto 5 foi alterada a partir de 7 de Novembro de 1996, no que toca aos montantes garantidos, pelo que a mesma apólice passou a garantir as responsabilidades por danos corporais e (ou) materiais por sinistro até ao máximo de 150 000 000$00, e que vigora com uma franquia de 10% do valor dos prejuízos indemnizáveis, com um mínimo de 150 000$00 (H).

7- em 18 de Dezembro de 2001, foi emitido pela Câmara Municipal da ... alvará de licença de construção, com o nº655/01, em nome a ré (…) através da qual foi licenciada uma construção que incide sobre o prédio sito na “Urbanização X...”, lote “AX”, da freguesia de ... (G).

8- a autora nasceu em 11 de Março de 1957 (A).

9- no dia 13 de Agosto de 2000, cerca das 19 horas, a demandante seguia, caminhando e conversando com outras quatro pessoas (seu marido e três amigos), pelo passeio da rua, ainda sem designação, que se situa na “Urbanização X...”, em ..., perpendicular àquela onde se situa a chaminé da fábrica de cimento e uma cabine (1º).

10- a autora e os seus acompanhantes provinham da praia e seguiam com destino à habitação de um eles ((…)) – habitação situada próxima da chaminé aludida no ponto 9, e na qual a demandante e seu marido se encontravam a passar alguns dias de veraneio – quando caiu (a autora) dentro de um buraco (caixa) (2º e 3º).    

11- tal buraco (caixa) encontrava-se aberto, sem tampa (4º).

12- o buraco (caixa) situava-se no passeio dito no ponto 9, a cerca de 1,40 metros do lancil desse mesmo passeio (5º).

13- o buraco estava ao nível do passeio (9º).

14- o buraco não tinha vedação (12º).

15- o buraco não tinha sinalização que indicasse a sua existência (13º).

16- o buraco (caixa) tem uma profundidade aproximada de 90 centímetros, uma largura de 70 centímetros e um comprimento de 85 centímetros (6º).

17- a autora caiu dentro do buraco sobre a perna direita (8º). 

18- o tempo atmosférico estava bom (16º).

19- o piso do passeio estava totalmente seco (17º).

20- o passeio fazia parte da obra, então em construção, da “Urbanização X...” (18º).

21- na construção da “Urbanização X...” intervieram (além do mais) as rés (…), “(…) e “ (…) (19º).

22- o dito buraco destinava-se às infra-estruturas de tal construção, à colocação de fios e de tubos (21º).

23- a colocação de fios e tubos no buraco aberto destinava-se ao fornecimento de telecomunicações (22º).

24- as rés “ (…) receberam do dono  da construção o preço dos materiais nela incorporados, bem como o preço da mão-de-obra e os lucros decorrentes da actividade que exerciam (23º, 24º e 25º).

25- em consequência directa e necessária da queda aludida no ponto 10 a demandante foi de imediato socorrida e transportada para o Hospital da ... (29º e 30º).

26- e do Hospital da ... para os Hospitais da Universidade de Coimbra, em 14 de Agosto de 2000 (31º).

27- em estes últimos hospitais a autora foi internada no Serviço de Ortotraumatologia, onde foi submetida a vários exames laboratoriais (análises de rotina) e a electrocardiogramas e a estudo radiológico, bem como a uma intervenção cirúrgica, em 25 de Agosto de 2000 (32º, 33º, 34º, 35º e 36º).

28- a demandante apresentava fractura de um terço discal dos ossos da perna direita, bem como ferida incisa na face anterior da mesma perna direita (37º e 38º).

29- a autora teve alta da enfermaria em 31 de Agosto, com a orientação terapêutica de prosseguir repouso com o membro elevado e de manter o tratamento antibioterápico (39º e 40º).

30- a demandante regressou à consulta para remoção dos pontos de sutura e confecção de bota engessada em 8 de Setembro de 2000 (41º).

31- e continuou a ser seguida em regime de consulta externa (42º).

32- em 10 de Outubro de 2000 foi removida à demandante a bota gessada (43º).

33- em tal data foi a demandante aconselhada a iniciar a mobilidade do tornozelo e a efectuar novo controlo clínico e radiológico decorridas que fossem seis semanas (44º e 45º).

34- a autora esteve completamente imobilizada até lhe ter sido removida a bota engessada (46º).

35- depois de tal remoção a mobilidade da autora era efectuada com apoio e grande dificuldade (47º).

36- em consequência das lesões referidas no ponto 28 a demandante passou a apresentar uma marcha claudicante (embora sem necessidade de recurso a ajudas técnicas), marcha essa que lhe é dolorosa (48º e 49º).

37- em consequência das lesões mencionadas no ponto 28 a autora tem dificuldade em subir e descer escadas, em manter-se muito tempo de pé, fazer força, suportar pesos, agarrar, puxar, correr saltar, abaixar-se, acocorar-se e manter-se dobrada (50º, 51º, 52º, 53º, 54º, 55º, 56º, 57º, 58º, 59º e 60º).

38- igualmente em virtude das lesões aludidas no ponto 28 a demandante tem falta de segurança nas pernas e tem dores na perna e no joelho, apresentando também uma cicatriz na perna direita (61º, 62º e 63º).

39- até ao momento referido nos pontos 9 e 10 a autora era uma mulher robusta, com bom aspecto, bom porte físico, ágil e com força (64º).

40- em consequência do constante nos pontos 36 a 38 a autora ficou a padecer de uma incapacidade permanente geral fixável em 15% (à qual acrescem, a título de dano futuro, mais 3%) (65º).

41- também em consequência do constante nos pontos 36 a 38 a autora passou a ter dificuldades físicas em exercer a sua profissão de empregada doméstica (66º).

42- devido ao referido nos pontos 36 a 38 a demandante passou a sentir-se desgostosa e algo diminuída na forma como encara a sua imagem perante as outras pessoas (68º, 69º, 70º).

43- até ao momento mencionado nos pontos 9 e 10 a autora trabalhava a dias como empregada doméstica e tratava da lida da sua própria casa, trabalhando também na agricultura (71º, 72º e 73).

44- em consequência do dito em 36 a 38 a autora passou a ter dificuldades físicas em fazer a lida da casa e trabalhar na agricultura, razão pela qual teve de recorrer aos serviços de uma empregada doméstica para lhe cuidar da roupa, da alimentação, dos trabalhos agrícolas e ir às compras, bem como à ajuda de outras pessoas de família (74º, 75º e 76º).

45- como empregada doméstica a demandante fazia diariamente oito horas de trabalho, das 9 horas às 12 horas e das 14 horas às 19 horas e auferia 3,12 euros por hora de trabalho (77º e 78º).

46- a autora teve despesas de transporte com as deslocações ao hospital, bem como com deslocações a consultas, ao centro de saúde, à farmácia e com deslocações ao escritório do seu ilustre advogado (79º, 80º, 81º, 82º e 83º).

47- as despesas referidas no ponto 46 ascenderam a montante não inferior a 300,00 euros (84º).

48- em despesas médicas e medicamentosas a autora gastou 74,82 euros (85º).

49- no momento aludido nos pontos 9 e 10 a autora usava uma blusa, no valor de 20,00 euros, uma saia, no valor de 15,00 euros e umas sandálias, no valor de 35,00 euros (86º, 87º e 88º).

50- a blusa e a saia referidas no ponto 49 rasgou-se com a queda mencionada no ponto 10 (89º).

51- as sandálias também aludidas no ponto 49 rebentaram e partiram o salto (90º).

52- em consequência do referido nos pontos 27 e 29 a 33 autora sentiu dores, sofrimentos e insegurança (91º).

53- a ré “(..)”construiu e asfaltou os arruamentos da Urbanização X...” (96º).

54º- a construção e o calcetamento dos passeios que ladeiam tais arruamentos não foram obras executadas pelas ré “(…)”, nem esta demandada acordou em executar tais obras (97º e 98º).

55º- a ré “(…) construiu as infra-estruturas destinadas ao saneamento, às águas e esgotos (99º, 100º e 101º).

56- a ré “(…)” foi paga pelo referido nos pontos 53 e 55 (102º).

57- a construção e o calcetamento dos passeios da “Urbanização X...” foram posteriores à construção dos arruamentos (103º).

58- a ré “(…) não utiliza o buraco aludido no ponto 10, nem qualquer tampa que o mesmo possa ter (104º).

59- a ré “(…)” também não faz quaisquer trabalhos ou instala quaisquer ramais ou condutas, em profundidade, debaixo do solo ou subsolo (105º).

60- nas imediações do local referido no ponto 9 não existe qualquer estabelecimento comercial da ré “(…)” (106º).

61- com a cisão mencionada no ponto 1 a ré “(…)” deixou de proceder à gestão, à manutenção e ao tratamento dos buracos e das tampas que os tapam, abertos para instalar ramais de comunicação ou afins (107º).

62- as obras que estavam em curso eram somente as de realização de infra-estruturas do loteamento “Urbanização X...” (108º).

63- existiam no perímetro da “Urbanização X...” placas a proibir a entrada no local a pessoas estranhas à realização das obras (109º).

64- no local (e em espaço e com dimensões não concretamente apurados) existia, próximo da zona do cemitério e até uma casa que ali se encontra e é conhecida pela casa do (…), uma vedação (110º, 111º e 112º).

65- em tal local existe uma estrada, junto à casa do (…), no sentido poente-nascente, que dá volta ao loteamento (114º).

66- a autora entrou no terreno em obras das infra-estruturas para seguir o seu caminho e, assim, chegar mais depressa ao seu destino e andar menos (115º e 116).

67- as obras eram visíveis (117º).

68- em tais obras encontravam-se, habitualmente (que não aos domingos), operários a trabalhar (118º).

69- o loteamento “Urbanização X...” tinha mais de 2 quilómetros quadrados (122º).

70- quase todos os buracos existentes nos passeios do loteamento “Urbanização X...” tinham tampas que neles estavam postas (123º).

71- a ré “(…) nunca comunicou à chamada “(…), Companhia de Seguros, SA” o referido nos pontos 9 e 10 (124º).

72- o “Gabinete (…).” enviou à chamada “(…) ofício de onde consta que a aprovação da “Urbanização X...” ocorreu em 21 de Dezembro de 2000 (125º).

73- em alguns locais, a chamada “(…)” tem como procedimento ceder aos loteadores tampas com as iniciais “(…) a pedido dos mesmos (127º).

74- quem executou os passeios, a sua calcetagem e a calcetagem das caixas, na obra, foi a empresa denominada “(…)” (130º).

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ENQUADRAMENTO JURÍDICO.

I) Responsabilidade das rés e das chamadas.

Pretende a recorrente que as rés e as chamadas a indemnizem por danos que sofreu, ao cair num buraco, existente num passeio inserido nas obras de construção de uma urbanização.

A questão deverá ser apreciada face aos factos considerados assentes na 1ª instância, uma vez que a recorrente não impugna a matéria de facto.

Estamos no âmbito da responsabilidade civil extra contratual, em que, nos termos do artigo 483º nº1, “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.

A regra geral é a de que a responsabilidade se baseia na culpa (artigo 483º nº2) e que cabe ao lesado o ónus de provar a culpa do autor da lesão, salvo se houver presunção de culpa (artigos 487º, 342º e 344º do CC).

Excepcionalmente, na responsabilidade extra contratual, prevê a lei situações em que a culpa se presume.

É o caso do artigo 493º nº2 do CC, que estabelece “quem causar danos a outrem no exercício de uma actividade, perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a repará-los, excepto se mostrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir”.

Trata-se ainda de responsabilidade culposa e não pelo risco, em que, face ao desenvolvimento de uma actividade que, com mais probabilidade, seja susceptível de causar danos a terceiros, se presume a culpa do autor dessa actividade, sendo este que tem o ónus de provar que adoptou todas as medidas necessárias a evitar a ocorrência dos danos.

Voltando ao caso dos autos, ficou provado que a autora caiu num buraco, resultando dessa queda lesões e danos vários, sendo que o mesmo fazia parte das obras de infra estruturas de uma urbanização em construção.

Ora, desde logo tem de se concluir que, relativamente às rés (…) , não se provou que, no dia 13 de Agosto de 2000, data da queda da autora, estas rés tivessem qualquer ligação com o buraco em causa e obras em que este se inseria.

Quanto à ré (…), resultou provado que esta ré não utiliza, nem utilizava o buraco em questão a qualquer título (pontos 58, 59, 60 e 61 dos factos provados).

Quanto à ré (…), embora se tenha provado que o buraco se destinava a colocação de fios e cabos para fornecimento de telecomunicações (pontos 22 e 23 dos factos provados), não se provou que à data dos factos já tivesse sido celebrado com esta ré algum contrato que visasse tal fornecimento, provando-se que só em 21 de Dezembro de 2000 foi enviado à (…)um ofício com aprovação da urbanização (ponto 72 dos factos provados), pelo que nenhuma prova foi feita que à data dos factos lhe coubesse qualquer obrigação de vigiar ou tomar providências relativamente ao mesmo.

Quanto à ré (…), ficou provado que a Sociedade (…), titular da licença para as obras (ponto 7 dos factos), lhe adjudicou a realização das infra-estruturas relativas a arruamentos, águas, esgotos e arranjos exteriores (ponto 4 dos factos provados); assim, não lhe cabia efectuar as infra-estruturas relativas às ligações telefónicas, tendo-se provado ainda que esta ré, tendo construído e asfaltado os arruamentos da urbanização e infra-estruturas destinadas ao saneamento, águas e esgotos, não construiu os passeios que ladeiam os arruamentos, que só foram feitos depois da sua intervenção (pontos 53, 54, 55 e 57 dos factos), sendo que o buraco em causa se situava num desses passeios (pontos 9 e 12 dos factos).

Não há, assim qualquer dúvida que inexiste prova que estas três rés (…)tivessem ligação à obra na data dos factos, não se provando que tivessem causado danos à autora, pelo que desde logo não está demonstrado o primeiro requisito do artigo 483º do CC, ou seja, não está demonstrado que estas rés violaram ilicitamente um direito da autora, causando-lhe danos, independentemente de se apreciar se estamos ou não perante uma actividade perigosa que implique a inversão do ónus da prova quanto à culpa, como pretende a recorrente.

A acção tinha, pois, de improceder relativamente a estas rés.

Vejamos então a responsabilidade das rés (…), (…) e (…).

A (…) é a titular da licença de construção para as obras da urbanização (ponto 7 dos factos), e adjudicou à (…) a realização das infra-estruturas eléctricas, telefónicas e de gás (ponto 3 dos factos), sendo que o buraco se destinava à colocação de fios e cabos para fornecimento de telecomunicações (pontos 22 e 23 dos factos) e tendo esta transferido para a Lusitânia a responsabilidade pelos danos causados a terceiros com a sua actividade, mediante contrato de seguro (pontos 5 e 6 dos factos).

Sendo assim, a actividade das rés (…) e (…) está relacionada com a existência do buraco em causa.

É certo que se provou que quem executou os passeios e calcetagem das caixas foi uma outra empresa, a sociedade (…), mas a ré (…) estava encarregada de instalar as ligações telefónicas e a ré (…) era a titular da licença de construção, sendo certo que a cláusula mediante a qual estas duas rés acordaram que a responsabilidade pelos danos causados a terceiros caberia à ré (…) (ponto 3 dos factos) apenas obrigava as duas contratantes nas relações internas entre ambas, não vinculando terceiros; por seu lado, a responsabilidade da ré (…) mede-se pela da ré (…), face ao contrato de seguro celebrado entre ambas.

Dispõe o artigo 70º nº1 do DL 445/91 de 20/11 (regime de licenciamento de obras particulares) que, entre outros, os donos das obras e empreiteiros “são responsáveis, nos termos da lei civil, por danos causados a terceiros que sejam provocados por erros, acções ou omissões de correntes da sua intervenção…”.

Remetendo este artigo para a lei civil, a responsabilidade civil dos intervenientes pelos danos causados a terceiros só se verificará se forem provados os requisitos respectivos, ou seja, se se provar a sua culpa, nos termos dos artigos 483º e 487º do CC, ou se, tratando-se de actividade perigosa, não lograrem provar, nos termos do artigo 493º nº2 do mesmo código, que empregaram todas as providências exigíveis para prevenir tais danos.

Assim, a fim de se avaliar se está ou não provada a culpa das rés (…) haverá que qualificar a respectiva actividade, a fim de estabelecer se se trata de actividade perigosa a que se refere o artigo 493º – caso em que caberá às rés o ónus de provar que tomaram todas as providências necessárias para evitar os danos – ou não se trata de actividade perigosa – caso em que caberá à autora o ónus de provar a culpa das rés.

Não definindo a lei quais as actividades que se devem considerar perigosas para efeitos de inversão do ónus da prova nos termos do referido artigo 493º nº2, terá de se apreciar, caso a caso, as circunstâncias levam a concluir se estamos ou não perante uma actividade perigosa (P. Lima e A. Varela em CC anotado, página 495).

Como exemplos, tem sido já tem sido considerada perigosa a actividade de manuseamento, comércio e armazenamento de materiais inflamáveis (ac. STJ de 28/02/2002 em www.dgsi.pt), a actividade relacionada com as regras de segurança dos elevadores eléctricos (ac. RL 16/10/2008, em www.dgsi.pt), ou, no âmbito da construção civil, a actividade de montagem e desmontagem de uma viga de lançamento com cerca de 100 toneladas e a 30 metros de altura, constituída por várias peças (ac. STJ de 14/05/2009, em www.dgsi.pt), a actividade de uma retro escavadora na demolição de placas, em local circundado por prédios (ac. RL 14/01/2010, em www.dgsi.pt), a actividade de escavações perto de cabos eléctricos (ac. RL 25/06/2009, em www.dgsi.pt).     

Contudo, no que diz respeito à actividade de construção civil em geral, esta não é, por si só, uma actividade perigosa, só o sendo se se verificarem circunstâncias que potenciem o risco de provocar danos a terceiros (cfr. neste sentido, entre outros, acs STJ 12/04/2005, 10/10/2007 e ac. RL 12/02/2008, todos em www.dgsi.pt, onde se entendeu não serem perigosas actividades de construção civil que, nas circunstâncias respectivas, não eram susceptíveis de criar riscos acrescidos).

Ora, no presente caso, não pode deixar de se concluir que não estamos perante uma actividade perigosa para os efeitos do artigo 493º.

A existência de um buraco aberto no solo para colocação de fios e cabos, dentro de uma área em que o acesso do público é proibido, (ponto 63 dos factos provados), não pode considerar-se uma actividade perigosa.

Na verdade, sem prejuízo das regras de segurança no trabalho vigentes, estando interdito o acesso do público ao espaço da obra, o referido buraco não constitui perigo para os transeuntes, não justificando um dever especial de vigilância do mesmo por parte dos intervenientes na obra.

Tal como se expõe no acórdão da Relação de Lisboa de 12/02/2008, acima citado, relativamente à qualificação como perigosa de uma determinada actividade em local de acesso público “a justificação encontra-se no facto de se tratar de locais de acesso ao público, sendo justificada uma maior exigência de um especial dever de cuidado no que concerne à manutenção de condições que evitem quedas ou outros acidentes”.

Não é o que acontece no presente caso, por se tratar de um local onde não estava prevista a passagem de transeuntes.

Não sendo a actividade das rés de qualificar como perigosa e cabendo à autora a prova da culpa das rés, tal prova não foi feita.

Na verdade, não ficou claramente definida a contribuição de cada uma das rés (…) para a existência do buraco nas condições em que se encontrava (nomeadamente relativamente à actividade da terceira empresa que estava encarregada de asfaltar e calcetar as caixas).

De igual modo, não está demonstrado qual o “erro, acção ou omissão” de cada uma destas autoras, sobretudo, ficando provado que existiam placas a proibir a entrada a pessoas estranhas à obra (ponto 63 dos factos), sendo as obras visíveis (ponto 67 dos factos) e tendo a autora entrado no recinto para cortar caminho (ponto 66 dos factos).

À data dos factos (Agosto de 2000) as normas de segurança destinadas à protecção do no âmbito de escavações efectuadas em obras, eram contempladas no DL 41821 de 11/8, que se encontrava em vigor por via do artigo 18º do DL 155/95 de 1/7 (que transpõe para a ordem interna a directiva 92/57/CEE e que entretanto foi revogado pelo DL 273/2003 de 29/10).

No referido diploma, verifica-se que no seu Título V constam as regras relativas a escavações, sendo o respectivo capítulo IV relativo à protecção do público, com duas secções, uma dedicada à sinalização (artigo 83º) e outra dedicada a passadiços e barreiras (artigos 84º e 85º), sendo que da leitura destas disposições resulta claro que a sinalização, passadiços e barreiras são impostos junto a escavações (e buracos resultantes das mesmas), em áreas onde é suposto o público circular livremente.

Se o buraco em dos autos se situasse na via pública, seria obrigatória a sua vedação e sinalização; mas o mesmo encontrava-se em local proibido ao público, não se lhe aplicando as regras do DL 41821.      

Assim, o facto de se ter provado que o buraco em causa não estava vedado nem sinalizado não é relevante, pois a sinalização e vedação não eram obrigatórias, dada a sua situação, fora do acesso público.

Terá de se concluir, portanto, que, nos termos do artigo 570 nº1 do CC, o facto lesivo é imputável à autora, por ter entrado num local vedado ao público e onde era previsível a existência de falta de condições para os transeuntes, face à existência das obras.

Mas mesmo que se entendesse que estamos perante uma actividade perigosa, teria de se concluir que as rés lograram ilidir a presunção de culpa prevista no artigo 493º nº2, na medida em que provaram a existência de placas a proibir a entrada no recinto a pessoas estranhas à obra.

Conclui-se, portanto, que, também relativamente às rés (…), a acção tem de improceder.           

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II) Indeferimento da realização da perícia.

Face à improcedência da apelação e consequente confirmação da sentença recorrida, não haverá que conhecer do agravo interposto pela apelada (…) (artigo 710º nº1 do CPC).

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SUMÁRIO.  

I- Numa acção de responsabilidade civil extra contratual, não se provando sequer a intervenção de algumas das rés nos factos, tem de se concluir que não está verificado, quanto a estas rés, o primeiro requisito previsto no artigo 483º do CC, ou seja, a violação ilícita do direito da autora.

II- A actividade de construção civil não é, em geral, perigosa, só sendo perigosa se se verificarem circunstâncias que potenciem o risco de ocorrência de danos para terceiros.

III- Não constitui actividade perigosa a abertura de um buraco para colocação de fios e cabos com vista a fornecimento de telecomunicações, no passeio de uma urbanização em obras, cuja área tem acesso proibido ao público, pelo que não se verifica a presunção de culpa das restantes rés, a que se refere o artigo 493º nº2 do CC, cabendo à autora o ónus de provar a culpa destas rés, nos termos dos artigos 487º e 342º do CC.

IV- Não ficando definida a participação de cada uma das restantes rés nos factos e ficando provado que a autora caiu nesse buraco quando, para cortar caminho, caminhava na zona das obras que estava interdita ao público, conclui-se que a autora não logrou provar a culpa destas rés e que a queda lhe é imputável, de acordo com o artigo 570º do CC.

V- Mesmo que se considerasse estarmos perante uma actividade perigosa, teria de se concluir que, com a colocação de placas proibindo o acesso à área das pessoas estranhas à obra, as rés teriam ilidido a presunção de culpa a que se refere o artigo 493º nº2 do CC.   

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DECISÃO.

Pelo exposto se decide julgar improcedente a apelação e manter a sentença recorrida, não conhecendo do agravo.