Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
458/07.7JACBR-C.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE RAPOSO
Descritores: PRISÃO PREVENTIVA
REVOGAÇÃO E SUBSTITUIÇÃO
AUDIÇÃO DO ARGUIDO
NOTIFICAÇÃO DA POSIÇÃO DOS SUJEITOS PROCESSUAIS
Data do Acordão: 04/22/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DE INSTRUÇÃO CRIMINAL DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 212º,4 ,213º CPP
Sumário: 1. Se o arguido já teve oportunidade de expor a sua posição e argumentos a favor da tese da substituição da prisão preventiva por obrigação de permanência na habitação, não existe qualquer razão que justifique que seja novamente ouvido.
2. Se a arguida requereu a substituição da medida de coacção em momento imediatamente anterior ao do reexame dos pressupostos da prisão preventiva, nos termos do art. 213º do Código de Processo Penal, só uma perspectiva meramente formal das normas processuais justificaria a necessidade de audição da arguida especificamente para esse efeito (ou a justificação da desnecessidade de audição).
3. Ao Juiz de Instrução cabe ouvir o Ministério Público e o arguido nos casos de revogação ou substituição das medidas de coacção, “salvo nos casos de impossibilidade devidamente fundamentada” (art. 212º nº 4 do Código de Processo Penal) ou “se necessário” quando procede ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação (art. 213º nº 3 do Código de Processo Penal).
4. Não existe norma que exija a notificação da posição de um sujeito processual ao outro. A lei apenas exige que ambos se pronunciem, de forma a habilitar o juiz com todos os elementos para poder decidir conscienciosamente. O processo penal não é um processo de partes e as tomadas de posição de cada um dos sujeitos processuais não constituem articulados nem a falta de resposta acarreta qualquer efeito cominatório.
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra:

I. RELATÓRIO.

No termo do primeiro interrogatório judicial da arguida S..., ocorrido em 10 de Julho de 2008, foi proferido despacho em 11 de Julho de 2008 que decretou a sua prisão preventiva.

Em 8 de Janeiro de 2009, a arguida requereu que fosse alterada a medida de coacção que lhe foi imposta, decidindo a M.ma Juiz, por despacho de 12 de Janeiro de 2009, que a arguida deveria permanecer em prisão preventiva.

Inconformada, recorreu a arguida para esta Relação, terminando a motivação com a formulação das seguintes conclusões:

1. O Tribunal procedeu à reapreciação da prisão preventiva, na sequência de requerimento dirigido aos autos pela Recorrente, solicitando a sua substituição, nos termos da lei de processo penal, sem ouvir a arguida em questão.

2. A forma liminar e despicienda com que se demitiu a arguida do seu direito em colaborar na determinação do seu estatuto coactivo culmina numa manifesta ilegalidade que conduz à nulidade do Despacho.

3. Se o art. 212°, nº 4 e o art. 194°, nº 3 do CPP admitem que, em casos e com carácter de excepcionalidade se exclua a audição prévia do arguido preso preventivamente ao se proceder à reapreciação da medida de coacção, nunca será de considerar a falta de justificação, como uma admissível exclusão daquele direito.

4. A Recorrente encontra-se detida no Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo, em Matosinhos, estando perfeitamente localizável e contactável, pelo que não se afigura a existência de qualquer impossibilidade por parte daquela em poder ser ouvida no processo, sempre que tal lhe seja solicitado, o que, in casu, não aconteceu.

5. Viu-se o julgador impossibilitado de tomar contacto com a arguida de modo adequado a tirar conclusões sobre a sua perigosidade (actual, não pretérita) para o processo e demais pressupostos cautelares no que reporta à aplicação da Prisão Preventiva, bem como a arguida se viu impossibilitada de falar em sua defesa, oferecendo à apreciação do Tribunal o que tivesse por relevante para que, em consciência e com respeito pelos princípios fundamentais da Lei, se pudesse chegar a uma decisão nesta matéria.

6. A ora Recorrente não foi notificada sequer em momento algum da posição assumida pelo Ministério Público, não havendo sequer qualquer referência à mesma no Despacho recorrido, desconhecendo-se em absoluto o conteúdo da sua pronúncia sobre a eventual manutenção da medida de coacção em vigor.

7. No que à arguida respeita, a decisão de manter a Prisão Preventiva passou ao largo, não sendo ouvida nem sequer informada da posição assumida pela entidade tutelar da Fase de Inquérito.

8. O Juiz de Instrução sequer invoca qualquer fundamento atendível para dispensar a audição da Recorrente antes de decretar a manutenção do seu encarceramento provisório.

9. A ausência de fundamentação sobre a dispensa da audição do arguido constitui, por se traduzir num acto arbitrário sem qualquer base justificativa e sequer minimamente fundado, também e só por si, nulidade por preterição de um Dever Geral de Fundamentação, que ora se invoca e que promana de imperativos constitucionais (v.g. art. 32°, nº 1 e 7 da Constituição da República Portuguesa) que se vêm aflorados nos arts. 194°, nº 3 e 212°, nº 4 do Código de Processo Penal.

10. Não justificando o Juiz de Instrução a razão de ser da sua decisão em prescindir do contraditório da arguida aquando da fixação apenas se pode dizer a sua decisão como infundada e arbitrária, coarctando-se irrazoavelmente as prerrogativas legais da Recorrente em ser ouvida e participar na determinação do seu estatuto coactivo, derrogando-se, por outro lado, os normativos legais - e constitucionais - que impõem a legalidade das decisões que constrinjam a liberdade de indivíduos ao exigir a estrita fundamentação dos actos que a tanto conduzam bem como a intervenção colaborante e contraditória do agente.

11. Por ter sido aplicada fora das condições previstas na lei e com base numa decisão enfermada de nulidade insanável, deve a prisão preventiva ser revogada (cfr. art. 212°, nº 1, al. a) do Código de Processo Penal) o que ora se requer.

12. O Despacho recorrido, em rigor, não apreciou os pressupostos de aplicação da medida de coacção da prisão preventiva.

13. Tal Despacho implicaria a reapreciação do conteúdo do processo, designadamente, dos resultados da investigação no sentido de verificar e compulsar eventuais alterações de matéria indiciária desta decorrentes ou das declarações da arguida e a sua invocação na fundamentação do despacho.

14. O Despacho do qual se recorre é seco e não especifica sequer os motivos de facto e de direito que justificam a prisão preventiva, sendo, por conseguinte, omisso de qualquer fundamentação. (art. 97°, nº 5 do CPP).

15. A ausência de fundamentação do Despacho, enquanto instrumento gerador da garantia constitucional e legal ao recurso, inviabiliza uma correcta defesa da Recorrente, porquanto, esta desconhece, em concreto, os factos e elementos probatórios que fundaram a convicção do Tribunal.

16. O Despacho recorrido basta-se com a mera indicação de que o "suporte probatório que os sustenta é forte, como já assinalados em locais distintos destes autos", não especificando em concreto nenhum dos elementos de prova que lhe permitiu concluir pela manutenção daquela medida de coacção.

17. O referido Despacho, por não indicar em concreto os factos que possam sustentar a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva à arguida, padece de vício de fundamentação grave que implica a nulidade do mesmo, que se ora invoca, nos termos do art. 97°, nº 5 do CPP, e que gera a caducidade da medida de coação com a imediata restituição da arguida à liberdade.

18. Justifica-se neste momento a reapreciação e a alteração da medida de coacção porquanto existem elementos bastantes no processo que permitem concluir pela sua desnecessidade, assim decorrendo a imperatividade ex lege de rejeitar - por alternativas adequadas existirem - a aplicação de um estatuto coactivo tão agressivo como aquele, ao momento, decretado.

19. A atitude da arguida no processo (rectius, o seu comportamento processual) tem vindo a ser sensivelmente alterada, apontando-se agora, neste momento que consideramos, para uma sua conduta cooperante com os órgãos judiciários para a descoberta da verdade material.

20. Se se pretende que a modificação do comportamento do arguido seja uma das razões de ser da obrigatoriedade da revisão da medida de coacção que se tem vindo a mencionar, então claro fica que a assunção de uma conduta colaborante deve ser transportada em favor da arguida.

21. Os elementos probatórios existentes no processo e a que alude o Despacho recorrido, se constituem indícios da prática dos factos pela Recorrente (o que também é seriamente discutível), em nada permitem que se conclua por um efectivo, real e actual perigo de Fuga e de Continuação da Actividade Criminosa.

22. Por essa razão, veio a arguida requerer a substituição da prisão preventiva pela Obrigação de Permanência na Habitação (OPH - art. 201º do Código de Processo Penal), dispondo-se ainda a ora Recorrente e quando o Tribunal o reputasse necessário, a sujeitar-se à utilização de meios técnicos de controlo à distância do cumprimento da Medida de Coacção (pulseira electrónica).

23. Se o sustentáculo da Prisão Preventiva assenta num risco importante de Continuação da Actividade Criminosa e a Perturbação da Ordem Pública, é absolutamente inegável que fica inteiramente comprometida a possibilidade prática de algum desses riscos se vir a verificar por via de uma actuação da Recorrente quando sujeita a OPH, especialmente quando a obediência à referida Medida de Coacção esteja controlada por pulseira electrónica.

24. Os crimes suscitados nos presentes autos necessariamente carecem de um elemento de credibilidade do agente perante os terceiros com quem contactem que não é compatível com o decurso de um Processo Criminal, por aqui ficando infirmada a possibilidade prática da continuação da actividade criminosa.

25. Se a arguida é "reincidente neste tipo de ilícitos relacionados com estupefacientes"(cfr. Despacho recorrido), claro fica que a actuação a que se reporta o Mmo. Juiz exige mobilidade e contactos pessoais com pessoas situadas no exterior, que não são permitidos a quem se encontre confinado à sua residência pelo período que durar o processo.

26. Com relação ao perigo de fuga da arguida mencionado pelo Despacho recorrido - a que nunca se concede! - esfuma-se um risco neste sentido quando esta se vê limitada ao espaço da sua habitação e quando se encontra sob vigilância por dispositivos tecnológicos adequados.

27. Remetida a Recorrente ao seu domicílio, não existe sequer a oportunidade para estes comportamentos se manifestarem de qualquer forma, até porque a OPH consubstancia, em medida semelhante à prisão preventiva, o afastamento da vida com o exterior e com a comunidade que se poderia ver lesada por potenciais (que nunca reais!, note-se) comportamentos ilícitos da arguida.

28. Se tempos houve em que o cumprimento da OPH era insustentável pela impossibilidade de controlar os movimentos do arguido sujeito a este estatuto coactivo, nos tempos que correm esse problema está absolutamente ultrapassado pelos aparelhos tecnológicos que, com sucesso, permitem a todo o momento aferir da localização do agente do crime.

29. A OPH consegue, com semelhante índice de sucesso, controlar e limitar a actuação do agente submetido a essa medida de coacção, já que este tem conhecimento que está a ser vigiado a todo o momento.

30. Apenas o intenso perigo de fuga ou a patológica e incontrolável tendência para a prática de comportamentos criminais (que traduziria uma inimputabilidade que ora não fica em causa) justifica o encarceramento do agente, já que apenas quando se tratem estas questões - arredadas dos presentes autos e do Despacho recorrido - se impõe que sejam paredes de aço e betão a controlar os seus movimentos.

31. A recorrente carreou para os autos cópia certificada do Livrete nº J69806, relativamente à única arma apreendida no âmbito das diligências de buscas domiciliárias efectuadas a casa da arguida e que reporta a uma caçadeira de calibre 12, marca FABARM, italiana, de cor verde e preta, com a indicação do nº 243689 no cano e do nº 662501 junto à coronha.

32. Tal arma, que se encontra perfeitamente legalizada e é propriedade do sogro da Recorrente, J... (cfr. Documento junto com Requerimento de 06.01.2009), é o único elemento que os agentes encarregues da investigação poderiam associar à Recorrente que, muito embora seja suspeita da prática de crime de tráfico de armas, nunca se envolveu em qualquer tipo de negócios relacionados com estas.

33. A Recorrente encontra-se socialmente inserida, é pessoa bem considerada no meio local em que vive e social com o qual se relaciona. Foi mãe muito recentemente (29/09/2008) e, por força do nascimento da sua filha ter ocorrido já em estabelecimento prisional, a Recorrente detém actualmente uma situação familiar muito frágil e delicada, sendo essencial para a harmonia e estabilidade desta a presença da criança em ambiente e residência familiar, sempre acompanhada pela mãe, que representa um papel fundamental nesta fase tão tenra e especial da sua vida.

34. Actualmente o pai da criança encontra-se a cumprir pena de prisão no Estabelecimento Prisional de Coimbra, pelo que, também pela sua parte, se torna impossível de prestar qualquer acompanhamento ou ajuda à sua filha, em tudo agravando a situação.

35. A concatenação destes elementos permitem concluir que a confirmação da Prisão Preventiva pelo Despacho recorrido - para além de absolutamente ilegal e arbitrária, já se disse, por ter dispensado liminarmente a audição prévia da Recorrente e padecer de um vício de fundamentação - violou grosseiramente, também, o Princípio de Adequação (art. 193°, nº 1 do Código de Processo Penal), já que não se vislumbram aqueles elementos gravosos que impusessem a aplicação da mais agressiva das Medidas de Coacção.

36. Deve, por quanto vem exposto, ser revogada a medida de coacção de prisão preventiva aplicada à Arguida e ainda vigente e, caso assim se entenda, aplicar-se medida que, de forma menos lesiva, consiga atingir suficientes efeitos cautelares, designadamente a Obrigação de Permanência na Habitação que, no caso sub iudice, se revela - é apodíctico! - como a adequada e legal Medida de Coacção a aplicar.

37. O Despacho recorrido não faz, por tudo, boa aplicação e interpretação do Direito, nem obedece aos critérios que vêm sendo definidos na Doutrina e Jurisprudência, pelo que deve ser revogado por este Tribunal Superior nos termos e com os fundamentos alegados.

O Tribunal recorrido violou, entre outros, os arts. 13°, 32°, nº 1 e 7 da Constituição da República Portuguesa e os arts. 97°, nº5, 193°, nºs 1 e 2, 194°, nºs 3 e 4, 212°, nº4, todos do Código de Processo Penal.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que VV. Exas. doutamente suprirão, deve:

a) A Medida de Coacção ser revogada de imediato por haver sido aplicada fora das condições previstas na Lei, nos termos e com os fundamentos alegados ao abrigo do disposto no art. 212°, nº 1, al. a) do Código de Processo Penal;

Ou, quando assim não for entendido,

b) Serem os autos remetidos ao Tribunal recorrido para que seja reparado o vício de irregularidade de que padece o Despacho e que impede a arguida de exercer cabalmente a sua defesa pela via do recurso,

Ou, quando assim não se entenda, e sem conceder:

c) A Medida de Coacção ser revogada por inadequada, estabelecendo-se como estatuto coactivo da ora Recorrente a Obrigação de Permanência na Habitação nos termos do art. 201º do Código de Processo Penal, sujeitando-se ainda a controlo electrónico por Pulseira Electrónica quando este Tribunal da Relação entenda adequada, o que a arguida ora expressamente requer e autoriza.

ASSIM FAZENDO VV. EXAS. A COSTUMADA JUSTIÇA

O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo que o despacho recorrido não violou qualquer norma legal, pelo que deverá ser mantido na íntegra.

Neste Tribunal, a Srª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Foi cumprido o disposto no art. 417º nº2 do Código de Processo Penal.

Foram colhidos os vistos, após o que o processo foi à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO.

Conforme jurisprudência constante e pacífica (por todos, Ac. STJ 24.03.1999, CJ VII-I-247), o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação (art.s 403º e 412º do CPP), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 410º nº 2 do CPP e Ac do Plenário das secções criminais do STJ de 19.10.95, publicado no DR Iª série A, de 28.12.95).


*

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, importa decidir sobre:
1. A invocada violação do direito de audição da arguida e nulidade por falta de fundamentação da dispensa de audição da arguida.
2. Ausência de notificação sobre a posição assumida pelo Ministério Público
3. Ausência de referência no despacho recorrido à posição assumida pelo Ministério Público e insuficiência/omissão de fundamentação da medida de coacção.
4. Necessidade de ponderação da sua conduta colaborante e do facto de ter sido mãe recentemente para fixação da medida de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica.

*

Com relevância para a decisão assinalam-se os seguintes actos processuais:

1. Realizado o interrogatório judicial da recorrente – e de outro – a MMª Juiz considerou encontrar-se fortemente indiciada a prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21º nº 1 do Decreto-Lei 15/93 de 22.1 e de um crime de tráfico de armas p. e p. pelos art.s 87º nº 1 e 86º nº 1 da Lei 5/06 de 23.2.

Fundamentou a prisão preventiva nas penas em questão, no passado criminal, com passado recente de longa reclusão, encontrando-se em liberdade condicional e na gravidade objectiva dos factos, convocando o disposto nos art.s 202º al.s a) e b) e 204º al. c) do Código de Processo Penal. 

2. Em 8.1.09 a arguida requereu a alteração da medida de coacção.

3. Em 12.1.09, foi deduzida acusação contra a arguida ora Recorrente e outros, imputando-lhe a prática em co-autoria e em autoria paralela, de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21º nº 1 do Decreto-Lei 15/93 de 22.1, em referência às tabelas I-A e I-B; em co-autoria, um crime de tráfico de armas p. e p. pelos art.s 87º nº 1 e 86º nº 1 da Lei 5/06 de 23.2; um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256º nº 1 al. d) do Código Penal; e dois crimes de receptação p. e p. pelo art. 231º nº 1 do Código Penal, devendo a mesma ser considerada reincidente em relação a todos os crimes (art.s 26º, 75º e 76º do Código Penal).

Nesse despacho, o Ministério Público pugna pela manutenção da prisão preventiva aplicada à arguida, por se manterem e se terem reforçado com a dedução da acusação os pressupostos que a determinaram.

A final, nesse mesmo despacho, ordena a remessa dos autos para apreciação da medida de coacção por se estarem a completar seis meses sobre a data da prisão “e também face ao requerido pela arguida S..., aqui se dando por reproduzido o que deixámos referido supra quanto às medidas de coacção”.

4. O despacho recorrido tem o seguinte teor, no que à ora Recorrente respeita: 

A fls. 2061 e ss., com data de 9.1.09, foi proferido despacho de acusação contra, entre outros, os arguidos S..., D... e M..., a quem se imputa a prática de factos aí qualificáveis como (co-) autoria de crime de tráfico de produtos estupefacientes, p.p. pelo artº 21º, nº 1, do DL 15/93, de 22.1, e de crime de tráfico de armas, p.p. pelos artºs 87º, nº 1, e 86º, nº 1, da L 5/06, de 23.2, sendo os mencionados arguidos S... e D... acusados mediante a agravante qualificativa da reincidência (artºs 26º, 75º e 76).

(…)

À arguida S... é igualmente imputada a prática de um crime de falsificação de documento e de dois crimes de receptação.

Os arguidos S... e D... aguardam o desfecho processual em situação de prisão preventiva decretada a 10.7.08 (fls. 1075 e ss.), tendo a sua detenção ocorrido no dia anterior.

(…)

Com a formulação da acusação - que salvaguardou o prazo de duração máxima das medidas coactivas detentivas na fase de inquérito (artº 2l5º, nºs 1 a!. a) e 2 do CPP) - foi definido o objecto do processo verificando-se ser extenso e grave o conjunto de ilícitos imputados.

O suporte probatório que os sustenta é forte, como já assinalado em locais distintos destes autos.

Mantêm-se as razões que determinaram a sujeição dos arguidos ao estatuto coactivo em execução.

Não existe fundamento para alterar a medida coactiva de prisão preventiva relativamente à arguida S... (como requereu a 8.1.09) pois que foi já ponderada a possibilidade de obrigação de permanência na habitação tendo a mesma sido expressamente afastada, mormente pelo forte perigo de continuação da actividade criminosa (a arguida é reincidente neste tipo de ilícitos relacionados com os estupefacientes), perigo esse não afastável por medida de coacção menos grave do que a prisão preventiva, acrescendo o perigo de fuga que se verifica com a dedução de acusação por tal extensa factualidade criminosa.

Assim, com compreensão pela situação pessoal da arguida e sua recente maternidade, não pode deixar de se considerar não existir fundamento algum para alterar a situação coactiva já fundamentada anteriormente.

Notifique, não estando os arguidos impedidos de aduzir novos fundamentos que se lhes afigurem, entretanto, quanto às medidas de coacção, na sequência da presente notificação.


*

Invocadas violação do direito de audição da arguida e nulidade por falta de fundamentação da dispensa de audição da arguida.

Constata-se pela leitura do despacho recorrido que o mesmo analisa simultaneamente o requerimento para substituição da medida de coacção apresentado pela ora Recorrente e procede ao reexame trimestral das medidas de coacção, nos termos do art. 213º do Código de Processo Penal.

Nos termos do art. 213º nº 3 do Código de Processo Penal, “sempre que necessário o juiz ouve o Ministério Público e o arguido” ao proceder ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva.

A Lei 48/2007 de 29.8 alterou o disposto no nº 4 do art. 212º do Código de Processo Penal, substituindo a expressão “sempre que necessário” por “salvo nos casos de impossibilidade devidamente fundamentada”. Desta forma, o art. 212º nº 4 do Código de Processo Penal passou a ter a seguinte redacção:

“A revogação e a substituição previstas neste artigo têm lugar oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do arguido, devendo estes ser ouvidos, salvo nos casos de impossibilidade devidamente fundamentada…”.

Da letra do preceito resulta que não se exige a audição presencial do arguido. O vocábulo “estes” coloca no mesmo patamar a audição do Ministério Público (não fazendo sentido a sua audição presencial) e do arguido, pelo que fica claro que em causa está, tão somente, a exigência de cumprimento do princípio do contraditório. Como corolário, “salvo nos casos de impossibilidade devidamente fundamentada” o juiz só pode decidir revogar ou substituir medida de coacção depois de auscultado o arguido e o Ministério Público, com respeito pelo princípio do contraditório.

Efectivamente, quanto aos destinatários o princípio do contraditório “significa: a) dever e direito de o juiz ouvir as razões das partes (da acusação e da defesa) em relação a assuntos sobre os quais tenha de proferir uma decisão; b) direito de audiência de todos os sujeitos processuais que possam vir a ser afectados pela decisão, de forma a garantir-lhes uma influência executiva no desenvolvimento do processo; c) em particular, o direito de o arguido intervir no processo e de se pronunciar e contraditar todos os testemunhos, depoimentos ou outros elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo, o que impõe designadamente que ele seja o último a intervir no processo (cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 54/87 e 154/87)”[i]. Na norma em causa, em nome da conjugação do princípio do contraditório com o princípio da igualdade de armas[ii] também constitucionalizado, a audição do arguido só pode ser compreendido como significando o dever do juiz ouvir as razões das partes (acusação e defesa). Tal como afirma o acórdão do Tribunal Constitucional de 6.5.93[iii], “o sentido essencial do princípio do contraditório está em que nenhuma (…) decisão (mesmo só interlocutória) deve aí ser tomada pelo juiz sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade, ao sujeito processual contra o qual é dirigida, de a discutir, de a contestar e de a valorar”.

Estando em causa apenas a observância do princípio do contraditório assim definido e não um direito de audição presencial que a lei não impõe, mantém-se válida a jurisprudência do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29.3.2000[iv] quando afirma que a audição do arguido “será mesmo inútil se foi o próprio arguido quem requereu a revogação ou substituição da medida aplicada”.

Efectivamente, se o arguido já teve oportunidade de expor a sua posição e argumentos a favor da tese da substituição da prisão preventiva por obrigação de permanência na habitação, não existe qualquer razão que justifique que seja novamente ouvido.

As razões supra aduzidas para considerar cumprido o contraditório em relação à requerida substituição da medida de coacção justificam a desnecessidade de ouvir a arguida especificamente em relação ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva. Se, como ocorreu nos autos, a arguida requereu a substituição da medida de coacção em momento imediatamente anterior ao do reexame dos pressupostos da prisão preventiva, nos termos do art. 213º do Código de Processo Penal, só uma perspectiva meramente formal das normas processuais justificaria a necessidade de audição da arguida especificamente para esse efeito (ou a justificação da desnecessidade de audição). Ora, a norma em causa – o art. 213º nº 3 do Código de Processo Penal – é a consagração do princípio do contraditório (temperada por critérios de necessidade) no reexame dos pressupostos da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação e, face ao requerimento apresentado, esse princípio foi devidamente respeitado.

Assim, os fundamentos que levam alguma jurisprudência antiga a considerar que se verifica “nulidade insanável quando o juiz, no reexame trimestral, se decide oficiosamente pela manutenção da prisão preventiva, sem prévia audição do arguido”[v] e que se prendem com a violação do princípio do contraditório, não ocorrem in casu.

Salienta-se que o Acórdão do Tribunal Constitucional 96/99[vi], a propósito da constitucionalidade do art. 213º do Código de Processo Penal afirma que “não se estando perante a ocorrência de factos ou circunstâncias diversas daquelas que já ocorriam aquando do decretamento da prisão preventiva (ocasião em que o arguido teve, querendo, oportunidade de expor ao juiz razões de facto ou de direito que, na sua óptica, apontava para a não necessidade de imposição da medida em face daqueles factos ou circunstâncias, ou que contraditavam aqueloutras que levaram ao proferimento da decisão afectadora do seu direito à liberdade), não se descortina em que é que o princípio do contraditório esteja afectado pela não obrigatoriedade de audição do mesmo arguido.

É que, o direito que o arguido tem de se fazer ouvir e de contraditar todos os elementos (aqui se incluindo os de prova) ou argumentos (incluindo-se os de ordem jurídica), designadamente os carreados pela acusação, foi já devidamente assegurado aquando da imposição da medida de coacção em causa, sendo que a norma em análise visa um reexame oficioso dos pressupostos e, particularmente, num caso em que estes se não mostram alterados”.

Por isso, também, não se impunha a justificação em despacho para a audição da arguida.   

Consequentemente, não se verifica nem a invocada violação do direito de audição da arguida nem a nulidade por falta de fundamentação da dispensa de audição da arguida.

Ausência de notificação sobre a posição assumida pelo Ministério Público

O despacho foi proferido ainda em fase de inquérito e a posição assumida pelo Ministério Público consta do despacho de acusação proferido que foi entretanto notificado a todos os arguidos, incluindo a ora Recorrente pelo que qualquer eventual irregularidade daí decorrente se encontra já, devidamente sanada.

De qualquer forma, na fase do inquérito, a direcção do processo cabe ao Ministério Público (art. 263º do Código de Processo Penal).

Ao Juiz de Instrução cabe ouvir o Ministério Público e o arguido nos casos de revogação ou substituição das medidas de coacção, “salvo nos casos de impossibilidade devidamente fundamentada” (art. 212º nº 4 do Código de Processo Penal) ou “se necessário” quando procede ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação (art. 213º nº 3 do Código de Processo Penal).

Não existe norma que exija a notificação da posição de um sujeito processual ao outro. A lei apenas exige que ambos se pronunciem, de forma a habilitar o juiz com todos os elementos para poder decidir conscienciosamente. O processo penal não é um processo de partes e as tomadas de posição de cada um dos sujeitos processuais não constituem articulados nem a falta de resposta acarreta qualquer efeito cominatório.

No caso dos autos a iniciativa de requerer a substituição da medida de coacção foi da ora Recorrente, pelo que apenas havia de conceder ao Ministério Público a possibilidade de assumir a defesa da sua posição, estando, então, o juiz habilitado a decidir.

Aliás, em processo de arguidos presos, mal se compreenderia, nesta fase processual, que os autos tivessem de aguardar que todos os sujeitos processuais conhecessem as posições dos restantes e que, eventualmente voltassem a pronunciar-se.

A ausência de notificação referida não é legalmente imposta, não afecta qualquer direito de defesa e não constitui sequer uma irregularidade processual, não afectando a validade de qualquer acto nem dos seus termos subsequentes (art. 123º do Código de Processo Penal).  

Ausência de referência no despacho recorrido à posição assumida pelo Ministério Público e insuficiência/omissão de fundamentação da medida de coacção.

O dever de fundamentação das decisões judiciais está consagrado constitucionalmente no art. 205º nº 1 da Constituição da República Portuguesa, nos seguintes termos: “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.

O art. 97º nº 5 do Código de Processo Penal concretiza que “os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão”.

Para actos especialmente previstas a lei processual impõe exigências acrescidas de fundamentação (na aplicação de medidas de coacção à excepção do termo de identidade e residência, nos termos do art. 194º nº 4 do Código de Processo Penal; na sentença, face ao disposto nos art.s 374º a 376º do Código de Processo Penal).

A referência à posição assumida pelos sujeitos processuais, mormente pelo Ministério Público, só encontra algum paralelismo com a obrigação de fazer constar do relatório da sentença a indicação do crime imputado segundo a acusação ou a pronúncia e de indicar as conclusões contidas na contestação (art. 374º nº 1 al.s c) e d) do Código de Processo Penal). Mas, mesmo a ausência dessa indicação não constitui nulidade (art. 379º nº 1 do Código de Processo Penal), sendo, quanto muito uma irregularidade a arguir em três dias (art. 123º do Código de Processo Penal).

Nem em relação ao despacho de aplicação ex novo de uma medida de coacção o art. 194º nº 4 do Código de Processo Penal exige um relatório em que se indiquem as conclusões dos diversos sujeitos processuais.

Se bem que se possa considerar desejável uma estruturação do despacho que contemple um pequeno relatório em que se identifiquem os sujeitos processuais e as posições assumidas, conclui-se, assim, que a referência à posição assumida pelo Ministério Público não é um elemento exigível na fundamentação dum despacho em que se mantém a medida de coacção antes aplicada.

A este despacho não são aplicáveis as exigências de fundamentação específicas da sentença. As exigências específicas de fundamentação dos art.s 374º e 379º do Código de Processo Penal respeitam exclusivamente à sentença, não tendo qualquer cabimento a sua invocação relativamente ao despacho que mantém medida de coacção[vii].


*

 Quanto à ausência ou insuficiência de fundamentação importa não olvidar que a jurisprudência e a doutrina[viii] vinham entendendo que a falta de fundamentação da decisão que aplicou medida de coacção constitui irregularidade que para ser conhecida tem de ser arguida nos termos do art. 123º nº 1 do Código de Processo Penal, sob pena de sanação do vício. A justificação dessa posição prende-se com o facto de a falta de fundamentação quando não tem tratamento específico[ix] constitui mera irregularidade.

Se bem que esse regime não se possa aplicar já ao despacho que aplica a medida de coacção em que, mercê da alteração legislativa supra referida, a falta de fundamentação passou a ser sancionada com nulidade, continua a ser válido para os despachos que mantêm a medida de coacção aplicada em momento anterior.

É o caso do despacho recorrido.

Ainda assim, a fundamentação do despacho em apreço se bem que sintética é bastante para que quem leia o despacho compreenda as razões que levaram àquela decisão:

Não se altera a medida de coacção como requerido porque já se analisou essa questão, tendo em atenção, mormente, a sua recente maternidade porque existe perigo de continuação da actividade criminosa demonstrada pela reincidência a que acresce agora o perigo de fuga face à dedução de acusação por tantos e tão graves crimes;

Mantém-se a medida coactiva por se manterem os pressupostos da mesma.

Relembrando o que se disse supra sobre as diferentes exigências de fundamentação, é manifesto que a fundamentação da decisão, no caso em apreço, prima pela suficiência.

Estão especificados os fundamentos de facto (a reincidência e a acusação, apesar da maternidade e manutenção dos pressupostos de facto e, também de direito) e de direito (a referência aos crimes constantes da acusação: a moldura penal permite a prisão preventiva, a referência aos pressupostos que a determinaram remete directamente para a fundamentação jurídica do despacho que determinou a prisão preventiva e a referência ao perigo de fuga e de continuação da actividade criminosa remete directamente para os conceitos do art. 202º al.s a) e c) do Código de Processo Penal.

Não se mostrava necessária uma reapreciação do conteúdo do processo. Só a existência de novos elementos relevantes que não ocorreu exigiria uma ponderação sobre a legalidade, necessidade, adequação e proporcionalidade da medida coactiva. Uma reapreciação diferente dos mesmos elementos já anteriormente ponderados em despachos fundamentados anteriores é mesmo inadmissível na mesma instância.

Necessidade de ponderação da conduta colaborante da arguida e do facto de ter sido mãe recentemente para fixação da medida de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica.

Sobre a atitude dita colaborante da arguida importa referir que se limita à demonstração documental da proveniência lícita da arma que foi apreendida em sua casa. Porém, não é esse o único acto de tráfico de armas que a acusação lhe imputa, como se alcança da leitura da acusação, na parte constante de fls. 2069 e 2072 dos autos. Não se vislumbra, pois, qualquer conduta verdadeiramente colaborante que justifique a alteração da medida de coacção.

Por isso, também, quando a Recorrente afirma que a sua perigosidade actual é diferente da pretérita não invoca sequer qualquer facto ou circunstância que suporte essa afirmação.

Sobre a invocação de que a obrigação de permanência na habitação compromete a possibilidade prática de continuação da actividade criminosa e perturbação da ordem pública porque este crime exige mobilidade, ensina a experiência que o tráfico de estupefacientes é um dos crimes em que essa medida de coacção menos contribui para evitar a continuação da actividade criminosa. Basta ter “contactos” e um telemóvel (e as escutas transcritas bem o demonstram) para continuar a actividade ilícita. Aliás a acusação é demonstrativa disso mesmo não só pelos contactos relativos ao tráfico de estupefacientes que a acusação imputa à arguida realizados em casa (fls. 2069, 2070, 2073, 2084) como pela característica “familiar” dessa actividade, incluindo tarefas executadas por familiares menores, de acordo com a acusação (fls. 2069, 2072, 2073, 2084 e 2085).

Com esta envolvência pessoal e familiar desestruturada a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, mesmo que com vigilância electrónica não evita a continuação da actividade criminosa nem o perigo de fuga nem satisfaz minimamente as exigências cautelares.

Quanto à necessidade de ponderar o facto de a arguida ter sido mãe recentemente, é inegável que esse facto e a gravidez que antecedeu o parto foram devidamente ponderados, logo desde o 1º interrogatório judicial, como se alcança do seu teor (fls. 1093): seria ponderada a suspensão da prisão preventiva se fosse apresentada indicação médico-pericial que a aconselhe. A ponderação dessa hipótese deveu-se a requerimento do I. Defensor da arguida no sentido de se suspender a prisão preventiva e de a arguida ficar com obrigação de permanência na habitação, sujeita a vigilância electrónica, invocando então que a arguida tinha uma gravidez de risco.

Também no despacho recorrido se volta a ponderar se o facto de a arguida ter sido mãe em Agosto justifica a alteração da medida de coacção, concluindo-se negativamente.

A ponderação dos interesses em conflito – o direito à liberdade da ora Recorrente e a educar o seu filho recém-nascido fora da prisão e o dever de protecção da sociedade – exige que, perante o circunstancialismo apurado se faça prevalecer os interesses colectivos. Efectivamente, colocada em liberdade condicional em 3.4.2007 quando cumpria pena de cinco anos de prisão por crime de tráfico de estupefacientes, pouco depois (leia-se a acusação – fls. 2063 a 2065) iniciava a actividade indiciada neste processo, obtendo elevados proventos, como indiciariamente demonstram os veículos e objectos apreendidos.

Consequentemente, neste contexto a decisão recorrida de manutenção de prisão preventiva está devidamente justificada, mostrando-se como a única adequada à gravidade e reiteração da actividade criminosa, aos fortes indícios recolhidos e à indiciada incapacidade de manter uma conduta lícita.

Conclui-se, assim, que o recurso deve improceder.

III. DECISÃO.

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam em conferência os juízes do Tribunal da Relação em negar provimento ao recurso interposto por S..., mantendo na íntegra a decisão recorrida.                     

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UCs. (arts. 513º nº 1 do Código de Processo Penal e 87º nº 1 b) do Código das Custas Judiciais).


Coimbra, 22 de Abril de 2009

(Texto elaborado, revisto e rubricado pelo relator

e assinado por este e pelo Ex.mo Adjunto)

 (Jorge Simões Raposo)

 (Fernando Ventura)



[i] Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, 1993, Coimbra, pg. 206
[ii] “O princípio traduz-se (…) na estruturação da audiência e dos outros actos instrutórios que a lei determinará, como uma discussão entre a acusação e a defesa, em que se procura também realizar a igualdade de armas entre os sujeitos do processo, cada um apresentando os seus argumentos e as suas provas, submetendo uns e outros ao controlo das razões e das provas apresentadas pelos outros sujeitos, assim participando activamente na formação da decisão que vier a ser tomada pelo juiz” (acórdão do Tribunal Constitucional nº 350/2006 de 31.5.06, em www.tribunalconstitucional.pt e jurisprudência aí referida sobre o princípio do contraditório)
[iii] Acórdão do Tribunal Constitucional nº 172/92 de 6.5.93, no BMJ 427, pg. 57, 
[iv] Colectânea de Jurisprudência XXV, T. 2, pg. 53.
[v] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17.3.98, na Colectânea de Jurisprudência XXIII, T. 2, pg. 145; em sentido contrário, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 10.3.04, no proc. 449/2004-3, da Relação do Porto de 17.12.03, no proc. 0346058 e de 13.9.06, no proc. 0614857 e da Relação de Guimarães de 8.5.06, no proc. 783/06-1, todos em www.dgsi.pt; paralelamente, o recente acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4.2.09, no proc. 09P0325, em www.dgsi.pt, decidiu que “mesmo a não audição prévia de arguidos sobre a declaração de excepcional complexidade do processo é susceptível de consubstanciar uma irregularidade (art. 118.º, n.ºs 1 e 2, do CPP), já que tal omissão não consta das nulidades insanáveis, nem das dependentes de arguição (arts. 119.º e 120.º do CPP), nem se encontra configurada como tal, quer no âmbito do art. 61.º do CPP, quer nos termos do art. 215.º do CPP; aliás, nem sequer estes normativos identificam e estabelecem qualquer cominação para o caso de violação da injunção contida nos preceitos”.   
[vi] Publicado na IIª série do DR de 31.3.99.
[vii] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17.1.07, no proc. 9118/06-3, em www.dgsi.pt. 
[viii]  Vinício Ribeiro, Código de Processo Penal –Notas e Comentários, pg. 421 e a doutrina e jurisprudência aí referidas.
[ix] Como se disse atrás, exigem uma fundamentação específica, com as exigências expressamente consagradas na lei processual, a sentença e, agora (após a Lei 48/07) a aplicação de medida de coacção.