Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2142/15.9T8CTB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: SÍLVIA PIRES
Descritores: CONTRATO DE FORNECIMENTO
PRESTAÇÕES DE OBRIGAÇÕES GENÉRICAS
DEFEITOS DA COISA
PRAZOS DE CADUCIDADE DO DIREITO
Data do Acordão: 12/19/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO – JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE CASTELO BRANCO – J2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 1º, 2º, 3º E 230º, Nº 2 DO CÓDIGO COMERCIAL; 539º E SEGS., 913º A 917º, 918º E 939º DO C. CIVIL.
Sumário: I – O tipo de relações jurídicas continuadas em que alguém se obriga a transmitir regularmente a propriedade de coisas à contraparte, mediante o pagamento de um preço, caracteriza um contrato juridicamente atípico, embora socialmente típico, denominado contrato de fornecimento, que se aproxima do contrato de compra e venda, apresentando-se como um negócio definitivo e unitário, cujas prestações se sucedem e prolongam no tempo, sendo o fundamento deste contrato a satisfação continuada de uma necessidade duradoura da parte que é fornecida.

II - Estamos, pois, perante um contrato de fornecimento, que tem natureza comercial - em resultado do disposto nos art.ºs 1º, 2º e 230º, n.º 2, do C. Comercial -, ao qual se devem aplicar as regras da compra e venda, por força da dupla remissão resultante do disposto nos art.ºs 3º do C. Comercial e 939º do C. Civil.

III - Contrariamente às prestações de obrigações específicas que incidem sobre algo concretamente individualizado, as prestações de obrigações genéricas incidem sobre bens que não se encontram individualizados, não existindo, no contrato de fornecimento sob análise, a obrigação de entregar um concreto objecto, único na sua existência, mas a obrigação de entregar um bem apenas identificado quanto ao seu género, com mais ou menos determinação das características que lhe devem assistir, mas que não se encontra individualizado.

IV - Tendo-se acordado entre Autora e Ré no fornecimento por esta àquela de fosfato de cálcio, com determinação de algumas das suas qualidades, através de especificações técnicas deste produto, estamos perante um contrato em que a prestação a que a Ré se obrigou corresponde a uma obrigação genérica sujeita às regras especiais previstas nos art.º 539º e seguintes do C. Civil.

V - O art.º 918º do C. Civil, com a epígrafe ‘Defeito superveniente’, incluído no capítulo das regras especiais previstas para regerem os contratos de compra e venda, é aplicável, por força do disposto no art.º 939º do C. Civil, aos contratos de fornecimento.

VI - A remissão para as regras relativas ao não cumprimento das obrigações constante do art.º 918º do C. Civil é inicialmente prevista para as situações em que a coisa vendida deve ser entregue em momento posterior à celebração do contrato e a consequente transmissão do direito de propriedade - art.º 879º, a), do C. Civil -, ocorrendo nesse ínterim a sua deterioração, aquisição de vícios ou perda de qualidades.

VII - Mas o art.º 918º do C. Civil, na sua segunda parte, estende a mesma remissão para as regras do incumprimento das obrigações, nos casos da venda respeitar a coisa futura ou indeterminada de certo género, ou seja coisa genérica.

VIII - Compreende-se a equiparação de situações.

Apesar de na venda de coisa futura ou de coisa indeterminada de certo género o direito de propriedade apenas se transmitir quando a coisa ingressar no património do alienante (no caso da venda de coisa futura) ou ocorrer a concentração da obrigação genérica – art.º 408º, n.º 2, e 541º do C. Civil –, também a existência de defeitos na coisa vendida não pode ser atribuída a erro do comprador no momento da celebração do contrato, uma vez que a coisa não existia ainda no património do vendedor ou não estava ainda individualizada.

IX - Daí que também nestas situações se tenha considerado que os defeitos da coisa resultam de um incumprimento da obrigação de entrega da coisa, uma vez que esta não tem as qualidades que foram assumidas contratualmente, pelo que as regras aplicáveis são as previstas para o incumprimento das obrigações e não as que regem o erro na celebração dos contratos.

X - Porém, tratando-se de um incumprimento da obrigação de entrega da coisa transmitida em consequência da celebração de um contrato de compra e venda, não existem apenas as regras gerais previstas para o incumprimento de qualquer obrigação - art.º 790º e seg. do C. Civil -, mas também as regras especiais constantes dos art.ºs 913º e seg. do C. Civil que pressuponham um incumprimento da obrigação de entrega, não se cingindo a regular a existência de um erro do comprador na celebração do contrato, as quais prevalecem, em caso de conflito, sobre as regras gerais sobre o incumprimento das obrigações.

XI - Na verdade, o disposto nos art.ºs 913º a 917º do C. Civil combinam efeitos próprios do erro na conclusão dos negócios jurídicos e efeitos próprios da disciplina de uma das modalidades do não cumprimento das obrigações – o cumprimento defeituoso.

XII - É o que sucede com o disposto nos art.ºs 916º e 917º do C. Civil, apesar da redacção deste último preceito.

XIII - Apesar deste preceito apenas se referir à acção de anulação, o que aparentemente incluía o disposto nestes dois art.ºs exclusivamente no regime dos vícios da vontade na celebração de um negócio de compra e venda, a doutrina e a jurisprudência tem estendido a sua aplicação aos demais direitos conferidos ao comprador em caso de existência de defeitos na coisa vendida, designadamente àqueles que resultam do regime do incumprimento da obrigação de entrega da coisa vendida, pelo que deve considerar-se que o disposto nestes dois art.º s também se inclui nas regras especiais que integram o regime do incumprimento da obrigação de entrega, para onde remete o art.º 918º do C. Civil.

XIV - Assim se conclui que os prazos de caducidade previstos nos art.ºs 916º e 917º do C. Civil são também aplicáveis aos casos de compra e venda de coisas genéricas.

XV - Conforme resulta do funcionamento dos prazos de caducidade consagrados nos art.ºs 916º e 917º do C. Civil, os mesmos iniciam a sua contagem com o conhecimento do defeito - prazo para a denúncia -, a entrega da obra - segundo prazo para a denúncia - e a denúncia do defeito - prazo para o exercício do direito -, pelo que os direitos que se extinguem pelo decurso desses prazos só podem ser aqueles que têm unicamente como pressuposto a existência do defeito, como seja o direito à sua eliminação, o direito à substituição da coisa, o direito à redução do preço, o direito de resolução do contrato e o direito de indemnização que visa ressarcir apenas o prejuízo resultante da própria existência do defeito.

XVI - Já relativamente ao direito de indemnização pelos danos reflexos que resultaram da existência do defeito, designados como danos colaterais, não pode o mesmo estar sujeito àqueles prazos, desde logo porque a sua ocorrência não coincide necessariamente com os eventos que determinam a contagem daqueles prazos, podendo muitos deles ter lugar já após tais prazos terem-se esgotado, assim como, relativamente a eles perde justificação o fundamento para a consagração daqueles prazos.

XVII – Assim, e independentemente de sabermos se deve ser aplicado o regime da responsabilidade contratual, em que o direito de indemnização apenas está sujeito ao prazo ordinário da prescrição, ou o da responsabilidade extracontratual, em que o direito de indemnização está sujeito aos prazos de prescrição previstos no art.º 498º do C. Civil, seguro é que ao direito de indemnização por danos colaterais resultantes de defeito em coisa objecto de prestação em contrato de compra e venda não são aplicáveis os prazos curtos de caducidade previstos nos art.ºs 916º e 917º do C. Civil.

XVIII – Estes prazos não são, porém, aplicáveis ao exercício do direito de indemnização pelos danos colaterais provocados pelo defeito da coisa vendida.

XIX - Apesar do art.º 917º do C. Civil se referir apenas à acção de anulação como o acto impeditivo da caducidade aí prevista, a doutrina e a jurisprudência têm estendido o seu âmbito aos demais direitos conferidos ao comprador em caso de existência de defeitos na coisa vendida, nomeadamente ao direito de indemnização e ao de redução do preço, pelo que também o exercício desses direitos dentro do referido prazo de 6 meses após ter sido efectuada a denúncia dos defeitos impede a sua caducidade.

XX - O exercício de tais direitos, contrariamente ao que sucede com o direito de anulação do contrato expressamente referido no art.º 917º do C. Civil, não exige o recurso aos tribunais, podendo ser efectuado por mera declaração à contraparte.

Decisão Texto Integral:





Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra
A Autora intentou a presente acção, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de €835.784,18, actualizada à data do pagamento, com juros desde a citação até integral pagamento, bem como todas as importâncias que decorram de prejuízos causados pelos factos alegados nesta acção e que ainda venham a ocorrer ou a ser conhecidos, seja na instrução do processo, seja em liquidação de sentença, valores também actualizados e sobre os quais devem ser contados juros moratórios à taxa legal, sempre tudo com custas a cargo da R.
Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese:
- A A. é uma sociedade comercial que tem por objecto a produção e comercialização de produtos alimentares, entre os quais farinhas, sendo titular de marcas como “B...” e “E...”.
- A R. é uma sociedade comercial que se dedica à importação e exportação de matérias-primas e produtos químicos para a indústria.
- A. e R. têm relações comerciais desde há largos anos, nomeadamente, fornecendo a R. à A. fosfato monocálcico.
- No fabrico industrial da A., como matéria-prima, é incorporado fosfato monocálcico, proveniente do fabricante alemão “B...”, usualmente provindo da fábrica da Alemanha.
- Fosfato monocálcico o qual a A. incorpora no fabrico industrial das farinhas alimentares que comercializa sob as marcas “B...”, ...
- Acontece que a A. começou a receber reclamações de que a farinha não estava em condições, cheirava a “ranço”, “arroz”, “mau cheiro” etc, o que veio a ser confirmado pela A através de análise sensorial das amostras dos lotes reclamados.
- A A informou a Ré de tais factos e enviou-lhe amostras para que esta pudesse efectuar análises, tendo sido pedido à Ré que solicitasse à “B...” o envio de técnicos seus para confirmarem as alterações dos odores.
- A “B...” conclui, no entanto, que não havia alteração organoléptica nas farinhas produzidas com fosfato monocálcico produzido na fábrica do México, o que levou a R. a querer dar o assunto por encerrado.
- Desde janeiro de 2015 a A solicitou colaboração técnico-científica às mais respeitadas autoridades científicas e laboratórios com actividade em Portugal, no sentido de apurar, com toda a certeza, a origem do problema.
- Todas as conclusões dos referidos testes e análises indicam oxidação lipídica acelerada, a qual surge associada aos produtos nos quais se encontra adicionado o fosfato monocálcico produzido pela fábrica do México da “B...”, vendido pela R à A.
- As marcas da A. sofreram com toda esta situação consideráveis prejuízos de reputação e bom nome.
- A A respondeu favoravelmente a todas as reclamações, recolhendo o produto e devolvendo em igual ou maior quantidade, pedindo desculpa, procurando não perder o cliente.
- Os 37.342,70 kg de fosfato monocálcico que tem em armazém valem € 46.678,38, sendo imprestáveis.
- Em consequência, a A. retirou do mercado todos os produtos que tinha fabricado com o dito produto ou reteve-o em armazém.
- E teve que suportar os custos emergentes das operações logísticas implicadas na retirada e armazenamento de todos os produtos que já se encontravam distribuídos em todos os pontos de venda do país e os que ficaram retidos na fábrica e que haviam incluído o fosfato monocálcico vendido pela Ré, num prejuízo de €38.040,82.
- Para eliminação do produto não conforme a A foi obrigada a desembalar os produtos que já se encontravam prontos para o mercado ou já no mercado, o que causou à A prejuízo de €27.431,30.
- Nos estudos e análises que a A teve que fazer gastou, até ao momento, a quantia €10.483,60.
- A A teve custos financeiros no valor de €12.355,08, decorrentes do financiamento e imobilização do capital.
- A A ainda está a desenvolver estudos e análises de mercado e laboratoriais, com os inerentes custos a suportar pela Ré.

A Ré contestou, deduzindo o incidente de intervenção principal provocada de C... F...; a excepção da caducidade do direito da Autora e ainda impugnou, a matéria alegada na p. inicial.

A Autora respondeu à excepção de caducidade, defendendo a sua improcedência.
Foi admitida a intervenção de C... F..., mas como interveniente acessório.
A interveniente apresentou contestação, onde, além do mais, suscitou, também a caducidade do direito invocado pela Autora e impugnou, toda a matéria alegada na p. inicial.

A Autora respondeu às excepções deduzidas pela interveniente, defendendo a sua improcedência.
No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção de incompetência absoluta do Tribunal e relegado para final o conhecimento da excepção da caducidade.
Na audiência de discussão e julgamento a Autora – fls. 719 – requereu a redução do pedido e a ampliação do mesmo, os quais vieram a ser deferidos.
Veio a ser proferida sentença que julgou a acção pela seguinte forma:
Pelo exposto e nos termos e com os fundamentos de direito supra invocados, decide-se:
1. Julgar parcialmente procedente a presente acção, e, consequentemente, decide-se:
a) Condenar a Ré, “..., Ld.ª”, a pagar à A. a quantia total de €646.364,31 (seiscentos e quarenta e seis mil e trezentos e sessenta e quatro euros e trinta e um cêntimos);
b) Condenar a Ré a pagar os respectivos juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento, com ressalva dos juros sobre a quantia de €60.000,00 (sessenta mil) os quais se vencem apenas a partir da data do trânsito da presente sentença;
c) Absolve-se a Ré do demais peticionado.
A Ré interpôs recurso, apresentando as seguintes conclusões:
...
A interveniente recorreu, apresentando as seguintes conclusões:
...
A Autora apresentou resposta, pugnando pela confirmação da decisão.
1. Do objecto dos recursos
Considerando que o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas cumpre apreciar as seguintes questões:
a) Deve ser alterado o julgamento da factualidade contida nos factos provados 11, 42, 70, 71, 72, 74, 75, 76, 80, 84, 91, 92, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 104, 105 e 109?
b) Deve ser aditado aos factos provados o seguinte:
Os exames realizados pela Autora confirmaram que o fosfato monocálcico fornecido se encontrava de acordo com as especificações técnicas?
c) A excepção da caducidade deve ser julgada procedente?
2. Os factos
2.1 Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto
As Ré a Interveniente discordam do julgamento da matéria de facto relativamente a pontos provados que identificam, pretendendo após a reapreciação das provas produzidas a sua modificação no sentido que propugnam.
...
Os factos provados são, pois, os seguintes:
1. A A. é uma sociedade comercial que tem por objecto a produção e comercialização de produtos alimentares, entre os quais farinhas, sendo titular de marcas como “B...” e “E...”.
2. A R. é uma sociedade comercial que se dedica à importação e exportação de matérias-primas e produtos químicos para a indústria.
3. A. e R. têm relações comerciais desde há largos anos, nomeadamente fornecendo a R. à A. fosfato monocálcico.
4. No fabrico industrial da A., como matéria-prima, é incorporado fosfato monocálcico, proveniente do fabricante alemão “B...”, usualmente provindo da fábrica da Alemanha.
5. Fosfato monocálcico o qual a A. incorpora no fabrico industrial das farinhas alimentares que comercializa sob as marcas “...”.
6. Assim, em 19 de Setembro de 2014 a R. forneceu à A., para a mesma finalidade industrial e comercial, 23 toneladas de fosfato monocálcico, proveniente de uma fábrica mexicana do fabricante alemão “B...”.
7. A partir do dia 24 de Outubro de 2014 a A. passou a usar o lote de fosfato monocálcico fornecido pela R. identificado em 6., na produção da sua farinha alimentar “B...”.
8. A 24 de Outubro de 2014 a A. passou a usar o lote de fosfato monocálcico fornecido pela R. identificado em 6., na produção do seu “Preparado em pó para S...”.
9. A partir do dia 6 de Novembro de 2014 a A. passou a usar o lote de fosfato monocálcico fornecido pela R. identificado em 6., na produção da sua farinha alimentar “B...”.
10. A 10 de Dezembro de 2014 a A. passou a usar o lote de fosfato monocálcico fornecido pela R. identificado em 6., na produção da sua farinha alimentar “B...”.
11. No dia 9 de Janeiro de 2015 surgiu a primeira reclamação de uma consumidora, feita via telefónica, relativamente à farinha “B...”, lote ..., tendo a cliente afirmado que “a farinha cheira e sabe a arroz”.
12. No dia 13 de Janeiro de 2015 a A. recebeu uma segunda reclamação, via email, do cliente “S...”, proveniente de um consumidor que adquirira “B...”.
13. Na reclamação é apontado que o consumidor reclamou de “mau cheiro” e “sabor a ranço”, num pacote de farinha “B...”, 1 kg, lote ...
14.No dia 14 de Janeiro de 2015 a A. foi alertada, via email, de reclamação do cliente “J...”, do facto de, na loja ..., vários consumidores terem identificado “coloração amarelada” e “cheiro a mofo” na farinha “B...”, lote ...
15. O cliente supra referido reclamou a mesma situação do produto com o mesmo lote existente na loja, num total de vinte unidades.
16. Em 20 de Janeiro de 2015 surgiu nova reclamação, via telefónica, de uma consumidora que afirmou que a farinha tinha um “cheiro estranho”, tendo comprado 15 pacotes de farinha do lote ...
17. No dia 21 de Janeiro de 2015 chegou à A. nova reclamação, através do “Facebook”, de uma consumidora que afirmou haver “alteração do sabor da farinha”, a qual tinha sabor “a velho”, tendo usado três pacotes diferentes, dos lotes ...
18. Em 27 de Janeiro de 2015 surgiu outra reclamação, através de contacto directo do cliente A..., colaborador da A., o qual questionou o Departamento da Qualidade desta sobre, “o cheiro estranho” da última farinha “B...” que comprara.
19. A mulher do cliente atrás mencionado confeccionou pastéis de carne para venda e notou de imediato, ao preparar a massa, a alteração do cheiro.
20. Comprou três maços de “B...”, ou seja 30 pacotes, lote ...
21. Em 6 de Fevereiro de 2015 ocorreu outra reclamação, via email, proveniente do cliente “S...”, relativa a “mau cheiro” em pacote farinha “B...” do lote ..., identificado por consumidor que participou a ocorrência na loja ...
...
    38. A A. tratou de recolher os produtos objecto de reclamação.
    39. Todas as reclamações foram tratadas pela A.
40.Adicionalmente a A. ressarciu todos os seus consumidores reclamantes, com produto, sempre em quantidade superior à reclamada ou, no caso de reclamações de clientes empresariais (“...”) efectuou o crédito do produto e quantidades reclamadas.
41.Todas as moendas correspondentes aos pacotes de farinha, alvo de reclamação, datam do período compreendido entre 30 de Outubro de 2014 e 11 de Dezembro de 2014.
42. Os factos acima alegados, objecto das várias reclamações, foram confirmados através de análise sensorial das amostras dos lotes reclamados.
43. Em reunião havida a 26 Jan 2015, na qual estiveram presentes pela A. ..., foram a esta informados os factos até então decorridos.
44. Em 15 de Janeiro de 2015, para se poder chegar a conclusões mais precisas sobre as causas da alteração organoléptica constatada - ranço e mofo – foi efectuada internamente, na A., uma análise sensorial pormenorizada às amostras testemunho dos lotes produzidos nos últimos 4 meses.
45. Por cada moenda, a A. mantém amostras testemunho da farinha produzida antes e depois da adição do levedante químico - mistura de fosfato monocálcico, bicarbonato de sódio e farinha de trigo, como excipiente - internamente designado como “Prémix”.
46. Da referida análise concluiu-se que a presença do cheiro a ranço se manifesta a partir da moenda 2014156 com “Prémix”, realizada dia 24 de Outubro de 2014, da qual resultaram 44.830 kg de farinha “B...”.
47.Foi também constatado que todas as amostras das moendas sem adição de “Prémix” não apresentavam qualquer alteração sensorial ao nível do cheiro, sendo este idêntico nas moendas anteriores e posteriores à moenda 2014156, realizada dia 24 de Outubro de 2014.
48. As amostras das moendas com “Prémix”, anteriores ao primeiro uso do produto referido em 6. supra, não apresentam qualquer alteração de cheiro.
49. A moenda 2014156 é o início do consumo de fosfato monocálcico vendido pela R. à A., proveniente da fábrica da “B...” no México.
50.A análise sensorial - avaliação de cheiro - foi alargada a toda a gama de produtos produzidos pela A., tendo-se constatado que, a alteração organoléptica apenas ocorreu nos quatro produtos, nos quais o fosfato monocálcio é utilizado como ingrediente, a saber: “...”.
51. A avaliação foi também realizada às várias matérias-primas isoladamente, não tendo sido identificada qualquer alteração no cheiro das mesmas, nem mesmo nos quatro lotes de fosfato monocálcico provenientes da fábrica da “B...” no México.
52. Existindo muitos outros produtos em que, tendo sido fabricados a partir de lotes de farinha de trigo, farinha de arroz e bicarbonato de sódio comuns aos utilizados na produção dos produtos não conformes, não se identificou qualquer alteração organoléptica ao nível do cheiro, com excepção dos produtos nos quais se utilizou o fosfato monocálcico proveniente da fábrica da “B...” no México.
53.Também se verifica que a intensidade da alteração do cheiro, não sendo totalmente homogénea, era proporcional ao tempo decorrido após a produção do produto.
54. Por esta razão, a A. não conseguiu identificar a alteração do cheiro durante o controlo do processo produtivo, apenas o conseguindo fazer no controlo organoléptico das amostras testemunho de lotes de produto produzido depois de alertada para o problema.
55. Antes de passar a usar fosfato monocálcico proveniente da fábrica da “B...” no México, a A. realizou um exame laboratorial.
56. Contudo, este exame só incidiu sobre a granulometria do produto, por ser requisito interno da A., tendo excluído a análise de parâmetros químicos porque a R. informou que as especificações técnicas eram exactamente as mesmas entre o produto fornecido a partir da fábrica do México e da fábrica da Alemanha.
57. Desde 1996 que a A. possui implementado um “Sistema de Gestão da Qualidade” de acordo com a norma NP EN ISO 9001, devidamente certificado no âmbito da “Produção de Farinhas de Trigo para Usos Domésticos e Industriais e de Preparados em Pó para Usos Culinários (…)”.
58. De acordo com os requisitos da norma internacional implementada, a A. possui um completo e credível sistema de registos dos dados do processo produtivo bem como da rastreabilidade de todos os materiais e produtos recepcionados, transformados e expedidos.
59. Anualmente, a A. é alvo de auditorias internas e externas ao seu “Sistema de Gestão da Qualidade” bem como ao seu sistema de rastreabilidade.
60. O fosfato monocálcico é uma substância química produzida para uso industrial, frequentemente utilizado na indústria alimentar como agente levedante.
61. O uso deste componente em associação com o bicarbonato de sódio nas farinhas autolevedantes, é responsável pela incorporação e produção de compostos gasosos nas massas hidratadas e cozinhadas, tornando-as mais leves, macias e elásticas.
62. O uso desta substância é comum neste tipo de produtos alimentares provindo, quando fornecido pela R. antes do fornecimento em causa na presente acção, da Alemanha.
63. No dia 28 de Janeiro de 2015 a A. mandou à R. amostras, para que esta pudesse efectuar análises.
64. Após, a A. mandou à R. mais amostras, para proceder a mais testes, à semelhança do que já tinha sido feito anteriormente.
65. Foi igualmente solicitado à R. para que, por sua vez, solicitasse à “B...” que fizesse deslocar às instalações da A., técnico qualificado por si designado, para confirmar, em presença, a situação da alteração dos odores.
66. A A., ao solicitar à R. a deslocação do referido técnico, explicou pretender ainda que, face aos resultados obtidos na sequência dos testes e análises efectuados, o mesmo contribuísse para o completo esclarecimento das causas que originaram o problema e que tomasse consciência, de modo directo e presencial, das reais proporções do mesmo.
67. A R. enviou as amostras acima mencionadas à “B...”, para que esta efectuasse testes e análises.
68. A “B...” referiu não haver alteração organoléptica nas farinhas produzidas com fosfato monocálcico produzido na fábrica do México.
    69. O que levou a R. a querer dar o assunto por encerrado.
70. Desde Janeiro de 2015 a A. solicitou colaboração técnico-científica de autoridades científicas e laboratórios com actividade em Portugal, no sentido de apurar, com toda a certeza, a origem do problema.
71. As conclusões dos referidos testes e análises indicam uma oxidação lipídica acelerada, a qual surge associada aos produtos nos quais se encontra adicionado fosfato monocálcico produzido pela fábrica do México da “B...”, na origem do cheiro e sabor a ranço.
 72. A causa da alteração do cheiro tem origem no fosfato monocálcico     produzido pela fábrica do México da “B...”, vendido pela R. à A.
 73. Em todas as outras vezes em que a A. comprou à R. fosfato monocálcico produzido pela fábrica da Alemanha da “B...”, nunca houve qualquer alteração, de cheiro, sabor ou qualidade, ao invés do que aconteceu neste caso.
74. O que é ainda mais evidente no caso dos “Scones”, cuja receita implica a incorporação de mais cerca de 15% de fosfato monocálcico.
75. Sempre que o fosfato monocálcico produzido pela fábrica do México da “B...” é introduzido nas receitas da A., há alterações de cheiro ou sabor.
76. Sempre que, em iguais circunstâncias, é usado outro fosfato monocálcico produzido pela fábrica da Alemanha da “B...” ou de qualquer outro fornecedor aprovado, não há alterações de cheiro ou sabor.
77. Todas as produções da A. anteriores ao fornecimento aludido em 6. supra foram isentas de problemas.
78. O mesmo tendo acontecido com as produções posteriores à utilização
 de fosfato monocálcico produzido pela fábrica do México da “B...”.
79. Desde que, em 1954, a A. começou a usar fosfato monocálcico nas suas receitas, há precisamente 61 anos, nunca acontecera problema semelhante.
80. Na sequência do ocorrido, investigada e detectada a causa, a A. deixou de usar o referido fosfato e bloqueou todos os produtos não conformes nos seus armazéns, suspendendo a produção de novo produto com o fosfato monocálcico produzido pela fábrica do México da B...
81.Para retomar a produção e evitar mais prejuízo, a A. passou a incorporar fosfato monocálcico produzido pela fábrica da Alemanha da “B...” ou de outros fornecedores aprovados.
82. A A. ainda tem armazenados 37.342,7 kg do fosfato monocálcico produzido pela fábrica do México da “B...” que lhe foi vendido pela R. ao abrigo da encomenda de 6. supra, o qual na íntegra pagou.
83. A A. procurou devolver à Ré o produto, mas a R., tendo começado por sugerir tal solução, agora não aceita.
84. Em email datado de 22 de Abril de 2014, data em que se iniciaram as negociações entre a A. e a R. para comercialização deste produto proveniente da fábrica da “B...’ no México, a R. assegurou à A. que o mesmo, é exatamente igual ao da fábrica da Alemanha, e que as especificações técnicas eram as mesmas, disponibilizando-se para o envio de amostra.
85. Os produtos das marcas “B...” da A. têm um reconhecimento ímpar no mercado, sendo as farinhas da marca “B...” as mais conhecidas e reputadas no mercado nacional.
86. As marcas da A. são premiadas, nacional e internacionalmente (capas “Superbrand” dos últimos 5 anos).
87. Comparando, é impossível que os seus clientes aceitem menos que a excelência dos produtos que, mais caros, compram por superior qualidade, fiabilidade e segurança.
88. Falha ou menor qualidade que se tolera a produto da concorrência é intolerável para os clientes e consumidores dos produtos da A., dadas as superiores características e preço destes.
89. Relativamente aos produtos que a A. produz e comercializa, sob marcas e gamas unificadas em termos de designação, aparência, estrutura e rede distribuidora, há ainda um facto agravante para o seu prestígio e bom nome.
90. Dado que, tratando-se de produtos que vendidos em unidades custam escassas dezenas de cêntimos de euro, são de difusão muito alargada, por vasto público consumidor, o qual, perante uma deficiência ou avaria, dificilmente reclama.
91. Nos meses em que andou a tentar descobrir e depois resolver o que se passou com o produto vendido pela R., a A. recebeu mais 500% de reclamações do que usualmente.
92. A A. a todas respondeu favoravelmente, recolhendo o produto e devolvendo em igual ou maior quantidade, pedindo desculpa, procurando não perder o cliente.
93. Nos casos em que as reclamações chegaram ao seu conhecimento, a A. minorou o prejuízo, actuando na relação com o cliente, explicando e ressarcindo, o que não pôde fazer relativamente aos casos ignotos.
94. Os 37.342,70 kg de fosfato monocálcico que tem em armazém, parte do que lhe foi vendido pela R., valem € 46.678,38.
95. A A retirou do mercado todos os produtos que tinha fabricado com o dito produto ou reteve-os em armazém, para impedir que alcançassem o mercado e ainda aumentasse o dano.
96. Factos que causaram à A. prejuízo de € 405.549,00, valor correspondente aos produtos que foram fabricados com o referido fosfato e que a A., na íntegra, retirou do mercado ou reteve em armazém, para impedir que alcançassem o mercado e ainda aumentasse o dano.
97. Suplementarmente a A. teve que suportar os custos emergentes das operações logísticas implicadas na retirada e armazenamento de todos os produtos que já se encontravam distribuídos em todos os pontos de venda do país e os que ficaram retidos na fábrica e que haviam incluído o fosfato monocálcico vendido pela R., no que despendeu €56.537,00.
98. Para eliminação do produto não conforme, a A. foi obrigada a desembalar os produtos que já se encontravam prontos para o mercado ou já no mercado, no que despendeu €27.431,30, por não serem passíveis de ser manuseados nas embalagens e porque tal operação seria funesta para a imagem da A.
99. Só por causa da ocorrência dos factos supra alegados é que a A. teve de realizar todos os estudos e análises documentados, no que gastou, até ao momento, a quantia de €10.483,60.
100. A A. tem até ao dia 15 de Outubro de 2015 prejuízo de €39.685,03, correspondente aos custos financeiros decorrentes dos pagamentos a fornecedores, não cobertos por força da não comercialização dos produtos afectados.
...
107. A R., não obstante considerar que não tinha qualquer responsabilidade no ocorrido, disponibilizou-se de imediato para encontrar uma resposta para o mesmo, tendo para o efeito solicitado à A. amostras das farinhas em causa, para enviar à “B...”, para esta analisar, atendendo a que esta, como fabricante do produto, tem a capacidade necessária para realizar todos os exames necessários, detendo laboratórios acreditados para o efeito.
108. Tendo a “B...” ficado muito apreensiva com o ocorrido, pois nunca teve qualquer reclamação do fosfato monocálcico que produz.
109. A Interveniente realizou testes às amostras que a R. lhe enviou usando a fórmula constante na embalagem, e não a fornecida pela A, não tendo detectado nada de anormal, designadamente qualquer alteração de odor/cheiro, encontrando-se todos os lotes analisados dentro das especificações técnicas, resultados que a R. transmitiu à A.
110. A A. solicitou à R. o envio de amostra de 500 gramas, e o envio da ficha técnica e de segurança, fazendo depender dos resultados dos testes que iria realizar, a aceitação da proposta de fornecimento do fosfato monocálcico monohidratado Levall Ca 100, conforme email de 23 de Abril de 2014.
111. Tendo a R. solicitado à “B...” o envio à A. da amostra pretendida, a qual aprovou o produto, após ter realizado os testes que pretendeu.
112. A Autora, com data de 11 de Fevereiro de 2015, enviou uma carta à Ré com o seguinte conteúdo:
...
113. No dia 6 de Abril de 2015 a Autora enviou uma carta à Ré com o seguinte conteúdo:



3. Da responsabilidade das Rés
As Rés nas alegações de recurso questionaram a sua responsabilidade pela indemnização arbitrada pela sentença recorrida pressupondo a alteração da decisão sobre a matéria de facto.
Tendo improcedido o recurso nessa parte, fica prejudicada apreciação deste fundamento do recurso.  
4. Da excepção da caducidade
A Ré e a Interveniente, nas contestações que apresentaram, invocaram a excepção da caducidade do direito que a Autora pretende ver reconhecido, por terem decorrido quer o prazo de seis meses entre a data da entrega da coisa e a data da denúncia do defeito, quer o prazo de seis meses entre a data da denúncia do defeito e a data da propositura da presente acção, prazos estes previstos nos art.º s 916º, n.º 2 e 917º do C. Civil.
A sentença recorrida sustentou que ao caso é aplicável o disposto no art.º 918º do C. Civil, dado estarmos perante uma venda de coisa genérica, pelo que no seu entendimento não são aplicáveis os prazos de caducidade previstos nos art.º s 916º e 917º do C. Civil, estando apenas o exercício do direito invocado pela Autora sujeito ao prazo geral de prescrição, concluindo, assim pela improcedência da excepção de caducidade.
As recorrentes, nas alegações que apresentaram, pugnam pela procedência desta excepção, alegando que se mostra ultrapassado o prazo de caducidade de seis meses entre a denúncia do defeito e o exercício judicial do direito, previsto no art.º 917º do C. Civil. Defendem, por um lado, que não é aplicável ao caso o disposto no art.º 918º do C. Civil, uma vez que não estamos perante a venda de uma coisa genérica, e por outro lado, que o disposto neste preceito não afasta a aplicação dos prazos de caducidade previstos nos art.º s 916º e 917º do mesmo diploma.
Cumpre decidir esta questão.
A relação jurídica estabelecida entre a Autora e Ré, onde surgiu o litígio em discussão nos presentes autos, caracteriza-se pelos seguintes elementos de facto:
- A Autora é uma sociedade comercial que tem por objecto a produção e comercialização de produtos alimentares, entre os quais farinhas, sendo titular de marcas como “B...” e “E...”.
- A Ré é uma sociedade comercial que se dedica à importação e exportação de matérias-primas e produtos químicos para a indústria.
- Autora e Ré têm relações comerciais desde há largos anos, nomeadamente, fornecendo a Ré à Autora fosfato monocálcico, proveniente do fabricante alemão “B...”.
Este tipo de relações jurídicas continuadas, em que alguém se obriga a transmitir regularmente a propriedade de coisas à contraparte, mediante o pagamento de um preço, caracteriza um contrato juridicamente atípico, embora socialmente típico, denominado contrato de fornecimento[1], que se aproxima do contrato de compra e venda, apresentando-se como um negócio definitivo e unitário, cujas prestações se sucedem e prolongam no tempo, sendo o fundamento deste contrato a satisfação continuada de uma necessi­dade duradoura da parte que é fornecida.
Como explicou Galvão Telles[2], no contrato de fornecimento, que considera um contrato comercial, na sua essência, o fornecedor está adstrito, seja a prestações contínuas, seja a prestações periódicas, a prestações autónomas a que correspondem outros tantos créditos distintos, que se vão formando sucessivamente. Do outro lado o outro contraente fica do mesmo modo vinculado a obrigações sucessivas, as várias e distintas dívidas de preço, cada uma das quais corresponde a um dos períodos de fornecimentos ou a certo período de fornecimento continuado.
Estamos, pois, perante um contrato de fornecimento, que tem natureza comercial - em resultado do disposto nos art.ºs 1º, 2º e 230º, n.º 2, do C. Comercial -, ao qual se devem aplicar as regras da compra e venda, por força da dupla remissão resultante do disposto nos art.ºs 3º do C. Comercial e 939º do C. Civil.
O objecto da prestação do fornecedor no contrato de fornecimento sub iudice é fosfato monocálcico, produto que a Autora adquire para incorporar no fabrico industrial das farinhas alimentares que comercializa sob as marcas ...
O fosfato monocálcico é uma substância química produzida para uso industrial, frequentemente utilizado na indústria alimentar como agente levedante. O uso deste componente em associação com o bicarbonato de sódio nas farinhas autolevedantes, é responsável pela incorporação e produção de compostos gasosos nas massas hidratadas e cozinhadas, tornando-as mais leves, macias e elásticas.
O fornecimento de fosfato de cálcio corresponde a uma prestação cujo objecto se encontra determinado quanto ao género, resultando dos pontos 84 e 109, que o mesmo também se encontraria determinado por algumas especificações técnicas.
Contrariamente às prestações de obrigações específicas que incidem sobre algo concretamente individualizado, as prestações de obrigações genéricas incidem sobre bens que não se encontram individualizados, não existindo, no contrato de fornecimento sob análise, a obrigação de entregar um concreto objecto, único na sua existência, mas a obrigação de entregar um bem apenas identificado quanto ao seu género, com mais ou menos determinação das características que lhe devem assistir, mas que não se encontra individualizado[3].
Tendo-se acordado entre Autora e Ré no fornecimento por esta àquela de fosfato de cálcio, com determinação de algumas das suas qualidades, através de especificações técnicas deste produto, estamos perante um contrato em que a prestação a que a Ré se obrigou corresponde a uma obrigação genérica sujeita às regras especiais previstas nos art.º 539º e seguintes do C. Civil.
No art.º 918º do C. Civil, com a epígrafe Defeito superveniente incluído no capítulo das regras especiais previstas para regerem os contratos de compra e venda, as quais, como já vimos, são aplicáveis, por força do disposto no art.º 939º do C. Civil, aos contratos de fornecimento, dispõe-se o seguinte:
Se a coisa, depois de vendida e antes de entregue, se deteriorar, adquirindo vícios ou perdendo qualidades, ou a venda respeitar a coisa futura ou a coisa indeterminada de certo género, são aplicáveis as regras relativas ao não cumprimento das obrigações.
Esta norma foi uma inovação do Código Civil de 1966 proposta no art.º 44º, n. 1, do capítulo dedicado ao Contrato de Compra e Venda, do Projecto apresentado por Inocêncio Galvão Telles [4], com a seguinte redacção:
Se a coisa, depois de vendida e antes de entregue, se deteriorar, adquirindo vícios ou perdendo qualidades, ou se a venda respeitar a coisa futura ou a coisa indeterminada de certo género, aplicam-se as regras relativas ao não cumprimento das obrigações; mas, não havendo dolo do vendedor, os direitos do comprador ficam sujeitos às disposições dos dois art.º s precedentes, sobre denúncia e caducidade.
Se esta redacção se manteve no Anteprojecto saído da 1.ª Revisão Ministerial - art.º 891º -, viria a ser amputada da sua segunda parte na 2.ª Revisão Ministerial - art.º 918º - que lhe conferiu a redacção actual.
A sentença recorrida, na linha do que já tem sido sustentado por alguma doutrina [5] e jurisprudência [6], entendeu que neste preceito se excluiu a aplicação do regime da venda de coisas defeituosas contante dos art.º 913º e seg. do C. Civil, quando se tenha acordado na venda de coisa genérica, aplicando-se o regime geral do incumprimento das obrigações, o qual não prevê qualquer prazo de caducidade para o exercício dos direitos que a lei atribui perante uma situação de inadimplemento, não estando, pois, o direito à indemnização pelos prejuízos provocados pelo vício da coisa vendida sujeito ao prazo de exercício previsto no art.º  917º do C. Civil.
A remissão para as regras relativas ao não cumprimento das obrigações constante do art.º 918º do C. Civil é inicialmente prevista para as situações em que a coisa vendida deve ser entregue em momento posterior à celebração do contrato e a consequente transmissão do direito de propriedade - art.º 879º a), do C. Civil -, ocorrendo nesse ínterim a sua deterioração, aquisição de vícios ou perda de qualidades. Entendeu-se que, contrariamente ao que sucede quando a coisa é entregue no momento da celebração do contrato, a existência de defeitos na coisa nesses casos não se traduz num erro do comprador, com a consequente anulabilidade do contrato, mas sim no incumprimento da obrigação de entrega, a qual, se não for imputável ao vendedor, determina a aplicação das regras gerais que regulam a repartição do risco, nomeadamente o disposto nos art.º 796º e 797º do C. Civil, e se lhe for imputável as regras previstas para o incumprimento dos contratos, designadamente o cumprimento defeituoso [7].
Mas o art.º 918º do C. Civil, na sua segunda parte, estende a mesma remissão para as regras do incumprimento das obrigações, nos casos da venda respeitar a coisa futura ou indeterminada de certo género, ou seja coisa genérica.
Compreende-se a equiparação de situações.
Apesar de na venda de coisa futura ou de coisa indeterminada de certo género o direito de propriedade apenas se transmitir quando a coisa ingressar no património do alienante (no caso da venda de coisa futura) ou ocorrer a concentração da obrigação genérica – art.º 408º, n.º 2, e 541º do C. Civil –, também a existência de defeitos na coisa vendida não pode ser atribuída a erro do comprador no momento da celebração do contrato, uma vez que a coisa não existia ainda no património do vendedor ou não estava ainda individualizada.
Daí que também nestas situações se tenha considerado que os defeitos da coisa resultam de um incumprimento da obrigação de entrega da coisa, uma vez que esta não tem as qualidades que foram assumidas contratualmente, pelo que as regras aplicáveis são as previstas para o incumprimento das obrigações e não as que regem o erro na celebração dos contratos.
Porém, tratando-se de um incumprimento da obrigação de entrega da coisa transmitida em consequência da celebração de um contrato de compra e venda, não existem apenas as regras gerais previstas para o incumprimento de qualquer obrigação - art.º 790º e seg. do C. Civil -, mas também as regras especiais constantes dos art.º s 913º e seg. do C. Civil que pressuponham um incumprimento da obrigação de entrega, não se cingindo a regular a existência de um erro do comprador na celebração do contrato [8], as quais prevalecem, em caso de conflito, sobre as regras gerais sobre o incumprimento das obrigações.
Na verdade, o disposto nos art.º s 913º a 917º do C. Civil combinam efeitos próprios do erro na conclusão dos negócios jurídicos e efeitos próprios da disciplina de uma das modalidades do não cumprimento das obrigações – o cumprimento defeituoso.
É o que sucede com o disposto nos art.º s 916º e 917. do C. Civil, apesar da redacção deste último preceito.
Dispõe o art.º 916º:
1. O comprador deve denunciar ao vendedor o vício ou a falta de qualidade da coisa, excepto se este houver usado de dolo.
2. A denúncia será feita até 30 dias depois de conhecido o defeito e dentro de seis meses após a entrega da coisa.
3. Os prazos referidos no número anterior são, respetivamente, de um e de cinco anos, caso a coisa vendida seja um imóvel.
A exigência da denúncia ao vendedor dos defeitos num curto espaço de tempo após a sua detecção visa satisfazer o legítimo interesse da definição no mais curto espaço de tempo da responsabilidade daquele, permitindo que o vendedor os verifique e proceda à sua rápida eliminação, evitando o seu agravamento e danos subsequentes.
No art.º 917º, por sua vez, consta o seguinte:
A acção de anulação por simples erro caduca, findo qualquer dos prazos fixados no artigo anterior sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta seis meses, sem prejuízo, neste último caso, do disposto no n.º 2 do artigo  287º.
Apesar deste preceito apenas se referir à acção de anulação, o que aparentemente incluía o disposto nestes dois art.ºs exclusivamente no regime dos vícios da vontade na celebração de um negócio de compra e venda, a doutrina e a jurisprudência tem estendido a sua aplicação aos demais direitos conferidos ao comprador em caso de existência de defeitos na coisa vendida [9], designadamente àqueles que resultam do regime do incumprimento da obrigação de entrega da coisa vendida, pelo que deve considerar-se que o disposto nestes dois art.º s também se inclui nas regras especiais que integram o regime do incumprimento da obrigação de entrega, para onde remete o art.º  918º do C. Civil.
Assim se conclui que os prazos de caducidade previstos nos art.º s 916º e 917º do C. Civil são também aplicáveis aos casos de compra e venda de coisas genéricas [10].
Contudo, isso não significa necessariamente que os mesmos sejam aplicáveis ao direito de indemnização reconhecido à Autora pela decisão recorrida.
A indemnização arbitrada, no valor global de €646.364,31 respeita aos seguintes danos:
- €46.678,38 correspondentes ao preço pago pelo produto defeituoso e que a Autora não utilizou, não tendo a Ré aceite a sua devolução;
- €405.549,00 correspondente ao preço das mercadorias que foram fabricados pela Autora com o produto defeituoso e que a Autora teve que retirar do mercado ou reteve em armazém;
- €56.537,00 correspondente aos custos das operações de retirada do mercado dessas mercadorias;
- €27.431,30 correspondente aos custos de desembalamento das mercadorias fabricadas com o produto defeituoso a fim de serem eliminadas.
- €10.483,60 correspondentes ao custo das análises e estudos com vista a detectar o defeito;
- €39.685,03 correspondentes a custos financeiros decorrentes dos pagamentos a fornecedores, não cobertos por força da não comercialização das mercadorias afectadas
- €60.000,00 como compensação dos prejuízos resultantes para a marca, reputação e bom nome da Autora.
Conforme resulta do funcionamento dos prazos de caducidade consagrados nos art.ºs 916º e 917º do C. Civil, os mesmos iniciam a sua contagem com o conhecimento do defeito - prazo para a denúncia -, a entrega da obra - segundo prazo para a denúncia - e a denúncia do defeito - prazo para o exercício do direito -, pelo que os direitos que se extinguem pelo decurso desses prazos só podem ser aqueles que têm unicamente como pressuposto a existência do defeito, como seja o direito à sua eliminação, o direito à substituição da coisa, o direito à redução do preço, o direito de resolução do contrato e o direito de indemnização que visa ressarcir apenas o prejuízo resultante da própria existência do defeito.
Aliás, só relativamente a estes direitos são que tem justificação os fundamentos apresentados para a previsão de prazos de caducidade – obrigar o comprador a comunicar rapidamente ao vendedor a existência do defeito e a sua vontade de exercer o respectivo direito, para que se verifique uma definição no mais curto espaço de tempo da responsabilidade do vendedor, permitindo-lhe uma actuação que evite o agravamento do defeito e danos subsequentes.
Já relativamente ao direito de indemnização pelos danos reflexos que resultaram da existência do defeito, designados como danos colaterais, não pode o mesmo estar sujeito àqueles prazos, desde logo porque a sua ocorrência não coincide necessariamente com os eventos que determinam a contagem daqueles prazos, podendo muitos deles ter lugar já após tais prazos terem-se esgotado, assim como, relativamente a eles perde justificação o fundamento para a consagração daqueles prazos.
Estes danos colaterais assemelham-se a quaisquer outros que resultam do incumprimento de uma qualquer obrigação, não revelando qualquer particularismo que justifique o funcionamento destes prazos curtos de caducidade, devendo reger, quanto a eles o regime geral das obrigações [11].
Assim e, independentemente de sabermos se deve ser aplicado o regime da responsabilidade contratual, em que o direito de indemnização apenas está sujeito ao prazo ordinário da prescrição, ou o da responsabilidade extracontratual, em que o direito de indemnização está sujeito aos prazos de prescrição previstos no art.º 498º do C. Civil [12], seguro é que ao direito de indemnização por danos colaterais resultantes de defeito em coisa objecto de prestação em contrato de compra e venda, não são aplicáveis os prazos curtos de caducidade previstos nos art.ºs 916º e 917º do C. Civil.
Ora, analisando os danos que foram compensados pela indemnização concedida pela sentença recorrida, verificamos que, com excepção da quantia parcelar de €46.678,38, correspondente ao preço pago pelo produto defeituoso e que a Autora não utilizou, não tendo a Ré aceite a sua devolução, todos os outros respeitam a prejuízos que não correspondem à existência do próprio defeito do produto vendido, mas que resultaram reflexamente dele, sendo, pois, danos colaterais.
Assim sendo, a única parte da indemnização que estará sujeita ao prazo de caducidade cuja ultrapassagem foi invocada nas alegações de recurso é a que respeita ao montante do preço pago pela Autora pelo produto defeituoso não utilizado, cuja devolução a Ré não aceitou.
Na verdade, esta indemnização, mais do que visar o ressarcimento de um dano, procura o restabelecimento do equilíbrio das prestações. Perante a impossibilidade de utilização de parte do produto fornecido, devido a se ter verificado que a parte utilizada se encontrava defeituosa, pretende-se reaver a parte do preço correspondente à parte do produto não utilizado, recuperando-se assim o equilíbrio inicialmente existente entre as duas prestações. Estamos perante o exercício de um direito de indemnização, que, em boa verdade, se traduz numa pretensão de redução do preço através da devolução do que foi pago a mais.
Pelas razões acima aduzidas o exercício deste direito está sujeito ao prazo de caducidade previsto no art.º 917º do C. Civil – seis meses após a denúncia.
O fornecimento do produto em causa ocorreu em 19 de Setembro de 2014.
Se a comunicação pela Autora à Ré da existência de múltiplas reclamações de clientes sobre a qualidade das mercadorias fabricadas com o produto fornecido pela Ré na reunião havida entre ambas em 26 de Janeiro 2015, pode suscitar algumas dúvidas sobre se nos encontramos perante um acto de denúncia eficaz, por falta de elementos suficientes para podermos concluir que foi indicado com o grau de precisão possível o defeito verificado no produto fornecido pela Ré, já a missiva enviada pela Autora à Ré em 6 de Fevereiro de 2015 constitui inequivocamente uma denúncia de que o produto fornecido pela Ré à Autora padecia de defeito, para os efeitos previstos nos art.ºs 916º e 917º do C. Civil, pelo que com a recepção dessa missiva iniciou-se a contagem do prazo de caducidade de 6 meses previsto no art.º 917º do C. Civil.
Apesar da presente acção apenas ter sido intentada em 11 de Dezembro de 2015, deve considerar-se que a caducidade já havia sido anteriormente impedida pelo envio de uma missiva à Ré em 6 de Abril de 2015.
Nos termos do art.º 331º do C. Civil impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal, do acto a que a lei atribua esse efeito.
Como já acima referimos, apesar do art.º 917º do C. Civil se referir apenas à acção de anulação como o acto impeditivo da caducidade aí prevista, a doutrina e a jurisprudência têm estendido o seu âmbito aos demais direitos conferidos ao comprador em caso de existência de defeitos na coisa vendida, nomeadamente ao direito de indemnização e ao de redução do preço, pelo que também o exercício desses direitos dentro do referido prazo de 6 meses após ter sido efectuada a denúncia dos defeitos impede a sua caducidade.
O exercício de tais direitos, contrariamente ao que sucede com o direito de anulação do contrato expressamente referido no art.º 917º do C. Civil, não exige o recurso aos tribunais, podendo ser efectuado por mera declaração à contraparte [13].
Ora, a Autora ao referir, além do mais, na carta enviada à Ré em 6 de Abril de 2015, que pretendiam o total ressarcimento dos prejuízos resultantes das situações já conhecidas e das que houvessem de chegar ao seu conhecimento, sendo que haviam bloqueado a actualização do stock remanescente do fosfato monocálcico fornecido pela Ré até resolução do problema, manifestou a sua vontade de ser indemnizada de todos os prejuízos que para ela haviam de resultar do defeito do produto fornecido pela Ré, exercendo, pois, esse direito, o qual não deixa de incluir a devolução da parte do preço correspondente ao produto fornecido mas entretanto não utilizado por se ter verificado que o mesmo era defeituoso, seja como direito indemnizatório, seja como direito à redução do preço.
Por estas razões deve considerar-se que o envio pela Autora à Ré da carta  de 6 de Abril de 2015 impediu a caducidade do direito de indemnização em análise.
Concluindo-se, por estas razões, que não caducou nenhum dos direitos de indemnização reconhecidos pela sentença recorrida, devem os recursos interpostos pelas Rés, também nesta parte, serem julgados improcedentes, confirmando-se a sentença recorrida.
Decisão
Pelo exposto, julgam-se improcedentes os recursos interpostos pelas Rés, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas dos recursos pelas Recorrentes.


Coimbra, 19/12/2018

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[1] Sobre estes contratos, Carolina Cunha, em O Contrato de Fornecimento no Sector da Grande Distribuição a Retalho: Perspectivas Actuais, em Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Manuel Henrique Mesquita, vol. I pág. 621-637, Coimbra Editora, 2009, Helena Brito, em O Contrato de Concessão Comercial, pág. 133-135, ed. de 1990, Almedina, Engrácia Antunes, em Direito dos Contratos Comerciais, pág. 357-358, ed. de 2012, Almedina, Carlos Ferreira de Almeida, em Contratos II. Conteúdo. Contratos de Troca, pág. 142-143, ed. de 2007, Almedina, e Fernando Ferreira Pinto, em Contratos de Distribuição, pág. 41, ed. de 2013, Universidade Católica Editora.

[2] Em Aspectos Comuns aos Vários Contratos, no B.M.J. n.º 23, pág. 79.
[3] Sobre a distinção entre obrigações genéricas e específicas, Vaz Serra, em Obrigações Genéricas, no B. M. J., n.º 55, pág. 5, Almeida Costa, em Direito das Obrigações, pág. 720 e seg., da 12.ª ed., Almedina, Antunes Varela, em Das Obrigações em Geral, vol. I, pág. 846 e seg., da 9.ª ed., Almedina, Menezes Cordeiro, em Tratado de Direito Civil II, Direito das Obrigações, Tomo I, pág. 593, ed. 2009, Almedina, e Menezes Leitão, em Direito das Obrigações, vol. I, pág. 128, 10.ª ed., Almedina.

[4] Projecto Completo de um Título do Futuro Código Civil Português e Respectiva Exposição de Motivos, publicado no B.M.J. n.º 83, pág. 114 e seg.

[5] Calvão da Silva, em Compra e Venda de Coisas Defeituosas, pág. 87, 4.ª ed., Almedina, que, contudo, defende que a boa-fé não deixa de impor ao comprador que accione o vendedor sem delongas demasiadas e injustificadas sob pena de incorrer em abuso de direito.
 
[6] Acórdãos do S.T.J., de 22.5.2003, relatado por Araújo de Barros, e da Relação de Lisboa, de 20.10.2011, relatado por Ana Paula Boularot, acessíveis em www.dgsi.pt.

[7] Neste sentido, Raul Ventura, em Contrato de Compra e Venda no Código Civil, na R.O.A., Ano 43º (1983), vol. II, pág. 291, Inocêncio Galvão Telles, em Direito das Obrigações, pág. 339-340, 7.ª ed., Coimbra Editora, Carneiro da Frada, em Perturbações Típicas do Contrato de Compra e Venda, em Direito das Obrigações, 3.º vol., sob a coordenação de Menezes Cordeiro, ed. de 1991, da AAFDL, Pedro Romano Martinez, em Cumprimento Defeituoso em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, pág. 225-226, ed. 1994, Almedina, e em Direito das Obrigações (Parte Especial) Contratos, pág. 133-135, 2.ª ed., Almedina, Menezes Leitão em Direito das Obrigações, vol. III, pág. 117, 5.ª ed., Almedina, e Jorge Morais Carvalho, em Código Civil Anotado, vol. I, pág. 1134-1135, ed. 2017, Almedina.
[8] Defendendo a possibilidade dos preceitos contidos nos artigos 913º e seg. poderem ser lidos como normas relativas ao incumprimento da obrigação de entrega da coisa no contrato de compra e venda, Baptista Machado, em Acordo Negocial e Erro na Venda de Coisas Defeituosas, em Obra Dispersa, vol. I, pág. 31 e seg., ed. 1991, Scientia Iuridica, Pedro Romano Martinez, em Cumprimento Defeituoso em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, cit., pág. 291, e em Direito das Obrigações (Parte Especial) Contratos, cit., pág. 133-135, Carneiro da Frada, em Erro e Incumprimento na Não-conformidade da Coisa com o Interesse do Comprador, em O Direito, Ano 121, (1989), n.º 3, pág. 461-484, Calvão da Silva, em Responsabilidade do Produtor, pág. 253 e seg., ed. 1990, Almedina, e Nuno Pinto Oliveira, em Compra e Venda de Coisa Genérica. Defeito do Produto e Tutela do Comprador, 2015, ed. Juruá.
[9] Pires de Lima e Antunes Varela, no Código Civil Anotado, vol. II, pág. 213, 4.ª ed., Coimbra Editora, Menezes Leitão, ob. cit., pág. 125-126, Calvão da Silva, em Compra e Venda de Coisas Defeituosas, cit., pág. 77-78, e em Responsabilidade civil do produtor, cit., pág. 209-212, Pedro Romano Martinez, em Cumprimento Defeituoso em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, cit., pág. 413, e em Direito das Obrigações (Parte Especial) Contratos, cit., pág. 144, nota 4, Carneiro da Frada, em Erro e Incumprimento na Não-conformidade da Coisa com o Interesse do Comprador, em O Direito, Ano 121, (1989), n.º 3, pág. 482, nota 60), e em Perturbações Típicas do Contrato de Compra e Venda, em Direito das Obrigações, pág. 85, e Jorge Morais Carvalho, ob. cit., pág. 1134,
   Contra, Menezes Cordeiro, em Tratado de Direito Civil XI. Contratos em Especial (1.ª parte), cit., pág. 273, ed. de 2018, Almedina.

[10] Neste sentido, Nuno Pinto Oliveira, ob. cit., pág. 103 e seg.
[11] Neste sentido, sobretudo, relativamente à aplicação de prazos idênticos de caducidade dos direitos do dono da obra face à existência de defeitos em contrato de empreitada, Vaz Serra, em Empreitada, no B.M.J. n.º 146, pág. 78-79 e na R.L.J., Ano 108, pág. 141-151, em anotação ao Acórdão do S.T.J. de 2.4.1974, Moitinho de Almeida em A Responsabilidade Civil do Projetista e o seu Seguro, no B.M.J. n.º 228, pág. 28-29, Brandão Proença, em Lições de Cumprimento e não Cumprimento das Obrigações, pág. 360, ed. 2011, Coimbra Editora, e João Cura Mariano, em Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, pág. 133, 6.ª ed., Almedina, e jurisprudência aí citada na nota 364.
     Especificamente sobre a não aplicação dos prazos de caducidade dos artigos 916º e 917º do C. Civil ao direito de indemnização por danos colaterais resultantes de defeitos da coisa vendida no contrato de compra e venda, o Acórdão da Relação de Coimbra de 20.6.2012, relatado por Henrique Antunes, acessível em www.dgsi.pt.

  [12] Defendendo a liberdade de opção do credor entre os dois regimes, Vaz Serra, em Responsabilidade contratual e extracontratual, no B.M.J. n.º 85, pág. 230-239, Rui de Alarcão, em Direito das obrigações, pág. 209 e seg., ed. polic., 1983, Moitinho de Almeida, ob. cit., pág. 29-30, Carlos Mota Pinto, em Cessão da posição contratual, pág. 411, ed. 1982, Almedina, Pinto Monteiro, em Cláusula penal e indemnização, pág. 713-714, ed. de 1980, Almedina, e em Cláusulas limitativas e de exclusão da responsabilidade civil, pág. 429-433, da  separata do vol. XXVIII, do B.F.D.U.C., 1985, e Calvão da Silva, em Responsabilidade do produtor, pág. 251,  ed. 1990, Almedina,
  Sustentando que estamos perante um caso de responsabilidade contratual, salvo os danos causados a terceiros, que já têm natureza extracontratual, Almeida e Costa, ob. cit. pág. 546-553, e em O concurso da responsabilidade contratual e extracontratual, em “Ab vno ad omnes - 75 anos da Coimbra Editora”, pág. 555-565, João Cura Mariano, ob. cit., pág. 82, Ângela Cerdeira, em Da responsabilidade civil dos cônjuges entre si, pág. 113-114, ed. de 2000, Coimbra Editora, e os Acórdãos da Relação de Coimbra de 29.11.2011, relatado por Carlos Querido, e do S.T.J., de 1.7.2010, relatado por Maria dos Prazeres Beleza, acessíveis em www.dgsi.pt.

[13] Neste sentido Menezes Cordeiro, em Tratado de Direito Civil XI. Contratos em Especial (1.ª parte), cit., pág. 273.
   No mesmo sentido, relativamente à caducidade dos direitos do dono da obra no contrato de empreitada, João Cura Mariano, ob. cit., pág. 154.