Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2493/10.9TACBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALICE SANTOS
Descritores: CRIME DE EMISSÃO DE CHEQUE SEM PROVISÃO
FALTA DE NOTIFICAÇÃO DO SACADOR
Data do Acordão: 09/26/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 3º JUÍZO CRIMINAL DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 1º-A DO DEC. LEI 454/91 DE 28/12
Sumário: 1 - Nos termos do artº 1º-A do Dec. Lei 454/91 de 28/12, apresentado a pagamento um cheque que não tenha provisão, a instituição de crédito notificará o sacador para, no prazo de 30 dias consecutivos, proceder à regularização da situação.
2.- A omissão de tal notificação não constitui condição objetiva de punibilidade do crime de emissão de cheque sem provisão
Decisão Texto Integral: 1

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No processo comum, supra identificado após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que:
- Absolveu a arguida A... dos factos e

crime de cuja prática vem acusada.
- condenou o arguido B..., pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, p. e p. pelo art.º 11º n.º 1 al. a) do Dec.–Lei n.º 454/91, de 28/12, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de €:6,00, o que perfaz €:900,00, fixando a prisão subsidiária em 100 dias.
- absolveu a arguida do pedido de indemnização civil contra ela deduzido.
- Julgou procedente por provado o pedido de indemnização civil deduzido contra os demandados B... e W...- Transportes, Lda e, em consequência, condenou-os solidariamente no pagamento à demandante civil da quantia de €:1570,26, acrescida de juros moratórios calculados sobre esta quantia, à taxa prevista para os juros civis, desde a data da
apresentação do cheque a pagamento e até efectivo e integral pagamento, calculados de acordo com as Portarias que os regulam e que sucessivamente foram entrando em vigor.

Inconformado com esta decisão, dela interpuseram recurso os arguidos, “W... – Transportes, Lda e B..., sendo que na respectiva motivação concluíram:

Primeiro. Errou, notoriamente, na apreciação da prova o douto Tribunal recorrido;
Segundo. Deverá o Tribunal recorrido ter dado como provado que a notificação prevista no nº. 5, do art. 11°, e no art. 1º A ambos, do Regime Jurídico do Cheque, não foi emitida e que, consequentemente, os Arguidos (nem um deles) a receberam;
Terceiro. Pelo que se requer a adição de um nº 6, aos Factos provados, que reflicta tal matéria, sugerindo-se a seguinte redacção: "6) Os Arguidos não receberam notificação da entidade bancária (Caixa Geral de Depósitos, S. A.) para, no prazo de 30 dias consecutivos, procederem à regularização da situação (falta de pagamento do cheque dos autos);
Quatro. Os Arguidos dos presentes autos não foram notificados (nem um deles), nos termos acima referidos;
Quinto. Pelo que deveria o douto Tribunal ter declarado verificar-­se uma condição de procedibilidade e ordenar à Caixa Geral Cle Depósitos, S. A. que emitisse tal notificação, esperar pela sua realização e, após notificação, deixar passar o prazo de 30 dias para verificar se a falta de pagamento do cheque dos autos havia sido regularizada ou não, proferindo, depois, sentença;
Sexto. O douto Tribunal recorrido, ao o não fazer, violou o nº 5, do art. 11, e violou o art. 1º A, ambos de Regime Jurídico do Cheque, ambos por os não aplicar;
Sétimo. Claro está que o douto Tribunal entendeu não aplicar tal norma por entender que tal notificação não é uma condição de punibilidade, mas um elemento que se manifesta, exclusivamente, no domínio das relações entre os Arguidos e a Caixa Geral de Depósitos, S. A.;
Oitavo. Errou o douto Tribunal recorrido no sentido com que interpretou o nº 5, do art. 11º, e o art. 1º A ambos do Regime Jurídico do Cheque (não sendo condição de procedibilidade a realização da notificação);
Nono. Devendo ter interpretado tais dispositivos como constituindo condição de procedibilidade, sentindo com que deveria o douto Tribunal recorrido ter aplicado tais normas;
Décimo. Deve ser revogada a sentença em crise e ser a mesma substituída por uma outra que declare verificar-se uma condição de procedibilidade e ordene à Caixa Geral de Depósitos, S. A. que emita tal notificação, ordene a espera pela sua realização e, após notificação, deixe passar o prazo ele 30 dias para verificar se a falta de pagamento do cheque dos autos foi regularizada ou não, proferindo-se, depois, sentença;
Com o que o douto Tribunal fará Justiça

Respondeu o Digno Procurador Adjunto, manifestando-se pela improcedência do recurso.

Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência, cumpre agora decidir.

O recurso é restrito à matéria de direito, sem prejuízo do conhecimento dos vícios constantes do art 410 nº 2 do Código Processo Penal.

Da discussão da causa resultaram provados os factos seguintes constantes da decisão recorrida:
1) Para pagamento de impostos devidos ao Estado pela Sociedade “W... Transportes, Ldª” e em cobrança, a arguida, enquanto sócia-gerente da referida sociedade, assinou e o arguido, seu pai, enquanto gerente da mesma sociedade, no dia 26/07/2010, preencheu os restantes dizeres, designadamente o correspondente valor e entregou nesse mesmo dia na Estação dos CTT em Coimbra o cheque nº … , sacado sobre a conta nº … da agência da Pedrulha (Coimbra) da Caixa Geral de Depósitos, no valor de 1.570,26 € (mil quinhentos e setenta euros e vinte e seis cêntimos), apondo-lhe a data do dia, ou seja, 26/07/2 010, cheque este constante de fls. 3 e aqui dado por reproduzido na íntegra para todos os efeitos legais.
2) Apresentado a pagamento no BES, agência desta cidade, veio o cheque em questão a ser devolvido com a menção de "Falta de Provisão" verificada a 28/07/2010, conforme declaração aposta no verso do mesmo e aqui invocada, operações estas efectuadas dentro do prazo legal.
3) O arguido, ao agir como o descrito, bem sabia não dispor na conta sacada de fundos suficientes ao integral pagamento do cheque, sabendo que com a sua actuação causavam uma diminuição no património do Estado, que deste modo não recebeu nos seus cofres pelo menos o valor titulado no referido cheque, valor que lhe eram devidos e que colocava em causa a confiança depositada pela generalidade das pessoas na livre circulação de tal meio de pagamento, fins que representou e alcançou.
4) O arguido agiu de modo livre, deliberado e consciente, bem sabendo que a sua conduta lhe estava vedada por lei.
5) Os arguidos estavam autorizados a movimentar a conta bancária supra referida através de cheque.
Do pedido de indemnização civil:
Para além do que supra consta provou-se ainda que:
6) Em virtude do supra referido, o Estado, destinatário das receitas fiscais, ficou-se privados nos seus cofres de €:1570,26.
Condições pessoais e económicas e antecedentes criminais dos arguidos:
7) A arguida trabalha em part-time para a Zon e ganha cerca de €:200,00 a €:300,00
É licenciada em comunicação empresarial
Vive com os pais
Não tem antecedentes criminais.
8) O arguido é gerente da sociedade W...- Transportes,
L.da.
Ganha €:575,00 por mês.
Tem o 11º ano de escolaridade.
Vive com a mulher em casa própria, com a arguida e com outra filha, que está a estudar e está a seu cargo.
9) O arguido foi condenado:
a) por sentença datada de 7/11/2006 e transitada em julgado a 22/11/2006, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo art. 24º do RGIT, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de €:5,00.
A pena de multa foi extinta pelo cumprimento.
b) por sentença datada de 9/6/2006, proferida pelo Tribunal Correccional de Saintes, França, foi condenado pela prática de um crime de modificação de dispositivo de limitação de velocidade de um veículo de transporte, na multa de €:2160,00.

Factos não provados.
Para lá dos acabados de descrever, nenhum outro facto se provou.
Não se provou, em especial, que
- o arguido preencheu o cheque em causa nos autos da forma que consta dos factos provados com o conhecimento e consentimento da arguida,
- A arguida, ao agir como o descrito, bem sabia não dispor na conta sacada de fundos suficientes ao integral pagamento do cheque, sabendo que com a sua actuação causavam uma diminuição no património do Estado, que deste modo não recebeu nos seus cofres pelo menos o valor titulado no referido cheque, valor que lhe eram devidos e que colocava em causa a confiança depositada pela generalidade das pessoas na livre circulação de tal meio de pagamento, fins que
representou e alcançou.
- A arguida agiu em comunhão de ideias e de esforços com o arguido, de modo livre, deliberado e consciente, bem sabendo que a sua conduta lhe estava vedada por lei.

Motivação
Relativamente aos factos provados, fundou o Tribunal a sua convicção na conjugação de diversos elementos probatórios, apreciados à luz das regras da experiência e do normal acontecer.
Assim, valorado foi desde logo o depoimento do arguido, que contou que a arguida Ana, sua filha, é gerente da firma W..., sendo ela quem assina os cheques. A determinada altura, a arguida Ana ausentou-se durante cerca de uma semana e meia, de férias, e deixou-lhe vários cheques assinados, em branco,
para ele preencher e pagar as várias despesas que aparecessem e que tivessem de ser pagas. Foi nesta altura que preencheu o cheque em causa nos autos, que era um desses cheques, em favor das Finanças, para pagamento de impostos, embora soubesse na altura que a conta bancária da sociedade não tinha dinheiro disponível suficiente para garantir esse pagamento. Declarou que tentou posteriormente regularizar a situação junto das Finanças e que fez “o cativo do
dinheiro” para pagar o cheque, mas sem qualquer sucesso.
Valorados foram ainda o teor dos documentos de fls. 1 e 2 (de onde resulta que o cheque foi entregue na estação dos CTT da Pedrulha e que se destinava ao pagamento de impostos em execução fiscal), o teor do cheque de fls. 3, e os documentos de fls. 10 a 14 (cópia da ficha de assinaturas das pessoas autorizadas a movimentar a conta em causa nos autos) e de fls. 9 (extracto da conta à ordem em causa nos autos, com os movimentos compreendidos no período de 26/7/2010 a 30/7/2010 e de onde resulta que esta conta bancária, na data em que o arguido preencheu e entregou o cheque, não tinha saldo na sua conta capaz de suportar o seu pagamento. De resto, só em 29/7/2010 é que a conta foi aprovisionada com dinheiro suficiente para assegurar o pagamento do cheque).
Resta referir que a alegação do arguido de que a conta tinha saldo contabilístico mas não disponível não foi credível, já que não foi demonstrada por qualquer documento que o arguido tivesse junto ao processo. Acresce, aliás, que o arguido reconheceu que sabia que o cheque não ia ser pago quando fosse apresentado a pagamento e que sabia também que o que interessa, quando um cheque é emitido, é que a conta sobre a qual ele é sacado esteja aprovisionada em montante suficiente para que o cheque seja pago.
Os descritos esforços do arguido no sentido de pagar o cheque em causa nos autos, o facto de ter feito “o cativo do dinheiro do cheque” depois da sua entrega, ainda que de facto tenham ocorrido, não têm a virtualidade de permitir ao Tribunal concluir em sentido distinto: o arguido no momento em que preencheu e entregou o cheque, sabia que não tinha dinheiro na conta para o pagar e, mesmo assim, fê-lo.
As condições de vida dos arguidos provaram-se considerando as declarações por estes prestadas e os seus antecedentes criminais provaram-se atento o teor dos CRC juntos aos autos.
Relativamente à factualidade não provada, o certo é que se entende que não foi feita prova dos mesmos com a certeza necessária para infirmar o princípio in dúbio pró reo.
Se não, vejamos.
A arguida, é certo, não quis prestar declarações em audiência de julgamento.
Mas a versão que o arguido trouxe do sucedido relativamente ao desconhecimento pela arguida, sua filha, de que ele iria preencher o cheque da forma que o fez e entregá-lo às Finanças não nos pareceu de forma alguma inverosímil.
Efectivamente, a arguida é filha do arguido e, para além de ser gerente da sociedade, tinha 23 anos e era estudante à data dos factos. É natural, pois, que existisse uma relação de autoridade do pai para com a filha e de confiança da filha no pai, a ponto de lhe deixar os cheques assinados para que o pai os preenchesse e entregasse e que não tivesse desconfiado, sequer, que o pai os poderia vir a preencher num montante superior ao dinheiro que a sociedade possuía na conta bancária.
O arguido, note-se, frisou bem que a filha desconhecia que ele iria utilizar um dos cheques para fazer o pagamento em causa nos autos e que só lhe deu disso conhecimento quando ela regressou de férias.
E não é razoável, julga-se, que a arguida tivesse autorizado o arguido a preencher os cheques que deixou assinados em quantias superiores àqueles que eles tinham disponíveis na conta bancária ou sequer que tivesse pensado que isso fosse acontecer, pois é consabido que a emissão de cheques sem provisão é crime.
Assim, e na ausência de qualquer outro elemento probatório, tem de se fazer funcionar o princípio in dubio pro reo, constitucionalmente fundado no princípio da presunção da inocência (art.º 32º n.º 2 da CRP), de acordo com o qual um non liquet na questão da prova terá sempre de ser valorado em favor do arguido.
De facto, não existindo em processo penal o chamado ónus da prova, sempre terá de intervir, em caso de dúvida razoável acerca da responsabilidade criminal de um arguido, o princípio processual da presunção de inocência, “que assenta no reconhecimento dos princípios do direito natural como fundamento da sociedade, princípios que, aliados à soberania do povo e ao culto das liberdade constituem elementos essenciais da democracia” (Germano Marques da Silva, Curso de Direito Processual Penal, I, pg. 74). E, por força de tal princípio, a persistência de dúvida razoável após a produção da prova tem de actuar em sentido favorável ao arguido e, por conseguinte, conduzir à consequência imposta no caso de se ter logrado a prova completa da circunstância favorável ao arguido - cfr. Prof. Figueiredo Dias, acompanhando o Prof. Eduardo Correia,
RDES 14 (1967), pg.22, e Prof. Castanheira Neves, Sumários de Processo criminal (1968), pgs.59 e ss., RLJ ano 105 pg. 140 e 141.
Resta dizer que, se é certo que a testemunha Maria Clara Pereira, mãe da arguida e mulher do arguido, sustentou que se dirigiu às Finanças para pagar o cheque em causa nos autos e que o funcionário das Finanças recusou tal pagamento, a verdade é que tais declarações não convenceram o Tribunal.
Efectivamente, desde logo a testemunha Carlos Almeida, funcionário das Finanças de Coimbra, embora não se recordasse da situação em causa nos autos, explicou que quando os cidadãos pretendem pagar os impostos, ele explica como o podem e devem fazer.
Aliás, é natural que assim seja, pois o objectivo das Finanças não é dificultar os pagamentos mas sim obter esses pagamentos. E; dizem-nos as regras da experiência e do normal acontecer que, caso de facto existisse um verdadeiro empenho dos arguidos em pagar a quantia em causa nos autos à Fazenda Nacional, teriam feito mais diligências do que uma ida da testemunha Maria Clara Pereira à Repartição de Finanças.
*
Cumpre, agora, conhecer do recurso interposto.

O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelos recorrentes da respectiva motivação. Portanto, são apenas as questões suscitadas pelos recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar.

Questões a decidirem:
- Se a notificação a que alude o artº 1º A do DL nº 454/91 de 28/12 é uma condição objectiva de punibilidade;

A questão que se levanta no presente recurso é a de saber se é condição objectiva de punibilidade a notificação a que alude o artº 1º-A do DL nº 454/91 de 28/12.
Esta questão já foi debatida e apreciada por esta Relação no ac. de 23/05/2007, Proc. 81/04.8PECBR relatado pelo Exmo Desembargador Esteves Marques e que seguiremos de perto.
O Dec. Lei 316/97, de 19 de Novembro, veio no seu artº 2º, aditar ao Dec. Lei 454/91, de 28 de Dezembro, entre outros, o artigo 1º-A, com a seguinte redacção:
“1 - Verificada a falta de pagamento do cheque apresentado para esse efeito, nos termos e prazos a que se refere a Lei Uniforme Relativa ao Cheque, a instituição de crédito notificará o sacador para, no prazo de 30 dias consecutivos, proceder à regularização da situação.
2 - A notificação a que se refere o número anterior deve, obrigatoriamente, conter:
a) A indicação do termo do prazo e do local para a regularização da situação;
b) A advertência de que a falta de regularização da situação implica a rescisão da convenção de cheque e, consequentemente, a proibição de emitir novos cheques sobre a instituição sacada, a proibição de celebrar ou manter convenção de cheque com outras instituições de crédito, nos termos do disposto no artigo 3., e a inclusão na listagem de utilizadores de cheque que oferecem risco.
3 - A regularização prevista no nº 1 faz-se mediante depósito na instituição de crédito sacada, à ordem do portador do cheque, ou pagamento directamente a este, comprovado perante a instituição de crédito sacada, do valor do cheque e dos juros moratórios calculados à taxa legal, fixada nos termos do Código Civil, acrescida de 10 pontos percentuais.”.
Prevê-se assim claramente nessa disposição legal, o dever da entidade bancária, uma vez verificada a falta de pagamento do cheque apresentado para esse efeito, notificar o sacador para, no prazo de 30 dias consecutivos, proceder à regularização da situação, sendo que a omissão dessa notificação constitui contra-ordenação ( artº 14º nº 2 b) do Dec. Lei 454/91).
Por outro lado essa falta de regularização por parte do sacador, põe em causa o espírito de confiança que deve presidir à circulação do cheque ( artº 1º nº 2 do DL 454/91), implicando a rescisão da convenção do cheque e, consequentemente a proibição de emitir novos cheques sobre a instituição sacada, a proibição de celebrar ou manter convenção de cheque com outras instituições de crédito, nos termos do disposto no artigo 3º, e a inclusão na listagem de utilizadores de cheque que oferecem risco.
Ainda de harmonia com o artº 2º desse diploma, a inclusão nessa listagem determina para qualquer outra instituição de crédito a imediata rescisão de convenção de idêntica natureza, bem como a proibição de celebrar nova convenção, durante os dois anos seguintes, contados a partir da data da decisão de rescisão da convenção.
Assim a referida notificação opera no âmbito das relações contratuais entre banco e o titular dos cheques, por forma a permitir que este regularize no mencionado prazo a situação, e a sua responsabilidade criminal se extinga (artº 11º nº 5 do DL 454/91).
Não se vislumbra pois onde é que tal exigência possa consubstanciar uma condição de punibilidade do crime de emissão de cheque sem provisão.
A seguirmos o entendimento do recorrente, a omissão de notificação por parte da entidade bancária traduzir-se-ia num claro benefício para o sacador, que por essa forma deixaria de poder ser perseguido criminalmente, apesar de ter sido apresentada queixa contra ele.
Ora tal entendimento está manifestamente ao arrepio dos objectivos que estiveram subjacentes às alterações introduzidas pelo Dec. Lei 316/97, como se escreve no seu preâmbulo “ A tutela penal do cheque..... visa sobretudo a protecção do respectivo tomador, conformando-se o respectivo crime, qualquer que seja a modalidade da acção típica, como de natureza patrimonial, desde logo pela exigência do prejuízo patrimonial como seu elemento constitutivo”.
As condições de punibilidade da emissão de cheque sem provisão estão pois expressamente previstas na parte final do n.º 1 do art. 11.º - apresentação do cheque a pagamento nos termos e prazos estabelecidos pela Lei Uniforme Relativa ao Cheque, entre as quais não se conta a notificação a que alude o artº 1ºA.
Em suma se dirá que a omissão da notificação a que alude o artº 1º-A do Dec. Lei 454/91 de 28/12, não constitui condição de punibilidade do crime de emissão de cheque sem provisão Cfr. neste sentido AcRG 03.02.24, CJ 1/03, 298, AcRG 04.01.12, CJ ¼, 295, AcRL 05.04.07, CJ 2/05, 138..
Pelo que, não é relevante constar dos factos provados que os arguidos não receberam a notificação a que alude o artº 1º-A do DL 454/91.

Assim, nos termos e fundamentos expostos, julga-se improcedente o presente recurso interposto e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida.

Custas pelos recorrentes fixando-se a taxa de justiça em 5 ucs.


Coimbra,

Alice Santos

Belmiro Andrade