Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1665/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: MONTEIRO CASIMIRO
Descritores: EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
RECURSO DA DECISÃO ARBITRAL
Data do Acordão: 09/27/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA GUARDA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: PORTARIA Nº 982-C/99
Sumário: Se a entidade expropriante, ao recorrer para o Tribunal, apenas pôs em crise a classificação da parcela expropriada, alegando ser de a classificar como de solo industrial, é de manter a indemnização encontrada pelos árbitros, se estes e os peritos foram unânimes em classificar tal parcela como de solo para construção condicionada.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:


O Instituto para a Construção Rodoviária (ICOR), mediante declaração de utilidade pública inserta na 2ª Série do D.R. nº 251, de 30/10/2000, procedeu à expropriação da parcela 13, pertencente a A... e a B..., destinada à construção da obra VICEG – Via de Cintura Externa da Guarda.
A referida parcela tem a área de 5402 m2, a destacar do prédio situado na freguesia de S. Vicente, Guarda, inscrito na matriz rústica sob o artº 618 e descrito na Conservatória sob o nº 1833.
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Efectuada a vistoria ad perpetuam rei memoriam, procedeu-se à arbitragem, tendo os árbitros, em 06/05/2001, fixado o montante indemnizatório de 11.630.655$00.
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Os autos foram remetidos ao Tribunal da comarca da Guarda, tendo, por despacho de 25/03/2002, sido adjudicada à entidade expropriante a propriedade da parcela de terreno em causa.
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O expropriante interpôs recurso da decisão arbitral, impugnando a avaliação da parcela de terreno com 1756 m2, que, segundo o PDM da Guarda, é classificada como solo apto para construção industrial e não para o de construção fixado pela Portaria nº 982-C/99, de 30 de Outubro, como foi feito pelos árbitros, pelo que tal custo seria o de 1.875$00/m2, longe dos 4.286$00/m2 apurados pelos mesmos árbitros.


Em consequência, pugna pela fixação da indemnização no montante global de 6.451.000$00, ou 32.177,45 €.
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Os expropriados defenderam a improcedência do recurso, devendo fixar-se a indemnização em 11.630.655$00, valor fixado pelos árbitros.
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Ordenada a avaliação, os peritos, por unanimidade, quantificaram a indemnização global em 37.790,01 €, que corresponde a área de construção (26.340,01 €), a pomar (11.450,00 €) e a lameiros (6.780,00 €).
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Por despacho de 04/06/2003 (fls. 215), foi anulado o relatório dos peritos na parte em que em que se pronunciou sobre o montante indemnizatório do pomar e dos lameiros, por não ter sido impugnado.
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Foi proferida sentença que, em relação à sub-parcela de 1756 m2 (área de construção), considerou ser de manter a indemnização encontrada pelos árbitros, no montante de 37.542,80 €, fixando a indemnização global em 58.013,47 €.
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O expropriante recorreu da decisão, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões:
1 – O tribunal a quo veio fixar que a justa indemnização a atribuir à parcela teria por base o valor apurado em sede de arbitragem.
2 – Dado que a expropriante no recurso da decisão arbitral apenas impugnou a classificação do terreno e não o valor a este atribuído.
3 – No entanto tal não corresponde à verdade, dado que, a expropriante expressamente aí impugna a aplicação da Portaria nº 982-C/99, de 30 de Outubro.
4 – E veja-se que a aplicação de tal Portaria estava errada, pois os peritos avaliadores não a utilizaram.
5 – Assim sendo tal matéria não transitou em julgado, pelo que deveria o Tribunal a quo ter conhecido a avaliação efectuada pelos peritos e atribuído a indemnização com base no valor por estes apontado, dado que este não contem nenhuma obscuridade ou contrariedade à lei.
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Foi apresentada contra-alegação a defender a manutenção da sentença.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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Na sentença deu-se como provado o seguinte:
1 – Por despacho de fls. 99, foi adjudicada à expropriante uma parcela de terreno com o nº 13, com a área de 5.402 m2, sita na freguesia de S. Vicente, Guarda, inscrita na matriz sob o artº 618 e descrita na Conservatória do registo Predial da Guarda sob o nº 1833.
2 - A declaração de utilidade pública foi publicada no D.R. nº 251 II série, de 30/10/2000, destinando-se a área expropriada à construção da obra do VICEG, Guarda.
3 - Por decisão arbitral de fls. 91, a parcela expropriada foi classificada como de solo de construção condicionada (sub-parcela de 1756 m2) e de solo rural (a restante), tendo sido fixada a indemnização global de 11.630.655$00, assim discriminada:
-parcela de construção condicionada: 7.526.655$00;
-solo rural: (pomar – 2.748.000$00 + lameiro – 1.356.000$00).
4 – A fls. 97 e 98 encontram-se os conhecimentos de depósito da quantia global de 11.630.655$00.
5 – Os peritos (laudo de peritagem de fls. 170) fixaram para a sub-parcela, com a área de 1756 m2, o valor global de 26.340,01 euros.
6 – À parte restante, não objecto de recurso, foi fixado o valor de 15.754,53 euros.
7 – Por despacho de fls. 138, foi atribuída aos expropriados a quantia de 31.731,52 euros, que levantaram.
Convém acrescentar mais o seguinte, com interesse para a decisão do recurso (artº 659º, nº 3, do Código de Processo Civil):
8 – Os peritos, para obterem o valor referido em 5, consideraram a sub-parcela como se situando em “área urbana e urbanizável – zona de construção condicionada”.

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Como é sabido, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal da Relação conhecer de matérias nelas não incluídas salvo razões de direito ou a não ser que aquelas sejam de conhecimento oficioso (artºs 664º, 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil).

Na sentença recorrida entendeu-se que a entidade expropriante, ao recorrer para o Tribunal, apenas pôs em crise a classificação da sub-parcela de 1756 m2, alegando ser de a classificar como de solo industrial. Como os árbitros e os peritos foram unânimes em classificá-la como de solo de construção condicionada, teria de se considerar como assente tal classificação, tendo que se manter a indemnização encontrada pelos árbitros, no montante de 37.542,80 euros, para a referida sub-parcela.

Insurge-se o recorrente contra tal decisão, alegando que, além da classificação do terreno, também impugnou o valor a este atribuído, como resulta da expressa impugnação da aplicação da Portaria nº 982-C/99, de 30 de Outubro, na decisão arbitral.
Sem razão, no entanto.
Com efeito, o expropriante apenas impugnou a classificação do solo da aludida parcela, que considerou como solo apto para construção industrial e, partindo desse pressuposto, é que refere que os árbitros não deveriam ter tomado em consideração o custo de construção fixado pela Portaria nº 982-C/99, como se vê do recurso da arbitragem, que se reproduz na parte que reveste interesse para a resolução da presente questão:
1º- O presente processo de expropriação litigiosa tem por objecto uma parcela de terreno com 1.756 m2, contigua à estrada municipal, que segundo o PDM da Guarda é classificada como solo apto para construção industrial.
2º- Pelo que erraram os senhores árbitros na avaliação do terreno, visto que tiveram em consideração o custo de construção fixado pela Portaria nº 982-C/99 de 30 de Outubro.
3º- Quando é sabido que a presente Portaria apenas se refere ao custo de construção para habitação, o que evidentemente não é o caso.
4º- Assim se tivermos em conta que o custo de construção industrial na zona, não ultrapassa os 50.000$00/m2 e adoptando a metodologia seguida pelos árbitros teríamos: 50.000$00/m2 x 0,15 x 0,25 = 1.875/ m2
5º- Longe portanto dos 4.286$00/m2 apurado erradamente pelos árbitros”.
Ora, estando somente em causa a classificação do solo da parcela, e tendo os peritos considerado que a mesma é de construção condicionada – que coincide com a atribuída pelos árbitros -, é óbvio que haveria que manter a fixação da indemnização encontrada pelos árbitros, não sendo de levar em conta o valor encontrado pelos peritos, por tal não estar em jogo.
Só assim não seria se se chegasse à conclusão que o solo era apto para construção industrial, pois, nesse caso, teria que se ver se o valor corresponderia ao indicado pelo expropriante, ou a outro diferente.
Por isso, não merece censura a sentença recorrida, improcedendo, consequentemente, o recurso.
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Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Sem custas.