Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1815/06.1TXCBR-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ESTEVES MARQUES
Descritores: LIBERDADE CONDICIONAL
MOMENTO DE APRECIAÇÃO
Data do Acordão: 10/22/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DE EXECUÇÃO DE PENAS DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 61º, Nº 2 CP
Sumário: Não há que cumprir o período mínimo de seis meses de prisão entre a apreciação da antecipação e a apreciação da liberdade condicional
Decisão Texto Integral: O arguido B.... foi condenado por decisão transitada em julgado, na pena de 6 anos de prisão, por crime de abuso sexual de criança, na forma continuada.
Na apreciação feita no âmbito dos autos de antecipação à Liberdade Condicional e para adaptação à mesma, com vista à sua eventual colocação em obrigação de permanência na habitação, fiscalizada por vigilância electrónica, decidiu a Mmª juiz do TEP, não o colocar nessa situação.
Mais ordenou que:
“…Não tendo sido concedida a Adaptação à Liberdade Condicional, há que renovar a instância, para efeitos de Liberdade Condicional.
Contudo, e tendo presentes, as razões da não concessão deste regime, entendemos que, entre esta data (da presente apreciação) e a da próxima apreciação, haverá de decorrer, um período temporal, não inferior a 6 meses (período de prisão que o legislador considerou, no nº 2 do artigo 61° do CP, como mínimo, para que o recluso se reoriente socialmente e que aqui se deve aplicar, por identidade de razão -vd. considerações gerais, de Docente do Centro de Estudos Judiciários, Juiz de Direito, Artur Vargues, pág. 10).
Assim renovamos a instância, para efeitos de liberdade condicional, para Outubro, próximo, sem prejuízo de eventual apreciação antecipada, que se justifique.
Oportuna e atempadamente, cumpra o disposto no artigo 484°, parte útil, do Código de Processo Penal, para efeitos do artigo 61° do Código Penal, e, juntos aos autos, os necessários elementos, abra Vista”.
É deste segmento do referido despacho que o Ministério Público interpõe recurso, concluindo a sua motivação nos seguintes termos:
“1. Os despachos que calendarizam as datas da apreciação da liberdade condicional são recorríveis, porque afectam direitos, liberdades e garantias individuais.
2. Por maioria de razão quando fazem parte de sentença recorrível
3. A decisão que difere a apreciação da liberdade condicional do recluso para Outubro de 2008, em vez de ordenar a apreciação para a data do meio da pena, viola a lei e o direito do recluso de ver apreciada tempestivamente a sua libertação condicional.
4. Não há que cumprir qualquer período mínimo de seis meses de prisão entre a apreciação da antecipação e a apreciação da liberdade condicional.
5. Foram violadas as normas dos artigos 61º do Código Penal e 484º do Código do Processo Penal.”.
O Exmº Procurador-Geral Adjunto nesta Relação, emitiu douto parecer concluindo pela procedência do recurso.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO


A questão suscitada consiste em saber se há que cumprir o período mínimo de seis meses de prisão entre a apreciação da antecipação e a apreciação da liberdade condicional ou se pelo contrário deveria ter sido ordenada essa apreciação, no caso vertente, para a data do meio da pena.
A questão afigura-se-nos de extrema clareza, face à letra da lei.
Na verdade estabelece o artº 61º CP, que:
“ 1. A aplicação da liberdade condicional depende sempre do consentimento do condenado.
2. O tribunal coloca o condenado a prisão em liberdade condicional quando se encontrar cumprida metade da pena e no mínimo seis meses se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem e da paz social.
3. O tribunal coloca o condenado a prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo seis meses, desde que se revele preenchido o requisito constante da alínea a) do número anterior.
4. Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, o condenado a pena de prisão superior a seis anos é colocado em liberdade condicional logo que houver cumprido cinco sextos da pena.
5. Em qualquer das modalidades a liberdade condicional tem uma duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, até ao máximo de cinco anos, considerando-se então extinto o excedente da pena.”.
Ora conforme decorre claramente da leitura de tal preceito, o legislador não impõe que entre cada apreciação tenha de decorrer um período mínimo de 6 meses.
O que aí se exige, em matéria de requisitos formais é o cumprimento de metade ou dois terços da pena e no mínimo seis meses, e a avaliação sobre se se encontram preenchidos os requisitos de fundo previstos nas alíneas a) e b) do nº 2 do artº 61º CP, para o caso da situação se enquadrar em metade da pena, ou o preenchimento da alínea a) do referido preceito no caso de se acharem cumpridos dois terços da pena.
Significa isto que se exige sempre o cumprimento de um período mínimo de seis meses da pena em que foi condenado, como condição para que possa ser avaliada pela primeira vez a concessão da liberdade condicional.
Nada na letra da lei nos permite concluir que a partir de então entre cada reapreciação tenha de ser respeitado um período de seis meses.
É que a ser feita uma tal interpretação, haveria sempre a possibilidade da mesma impedir que o arguido pudesse beneficiar da liberdade condicional ao meio da pena e aos dois terços, sendo certo que tais momentos para essa apreciação se acham legalmente fixados.
Aliás, no caso vertente tal situação já se verificou, uma vez que o meio da pena ocorreu no passado dia 28 de Junho de 2008.
Assim, impõe-se que o TEP, no mais curto espaço de tempo proceda à reapreciação da liberdade condicional referente à metade da pena.

DECISÃO
Pelo exposto e sem necessidade de mais considerações, acordam os Juízes desta Relação, em conceder provimento ao recurso, e, consequentemente, revogam a decisão recorrida no segmento impugnado, devendo proceder-se de imediato à apreciação da liberdade condicional do arguido referente ao meio da pena.
Sem tributação.
Processado por computador e revisto pelo primeiro signatário (artº 94º nº 2 CPP)
Tribunal da Relação de Coimbra, 22 de Outubro de 2008