Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3794/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: MONTEIRO CASIMIRO
Descritores: MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO
Data do Acordão: 02/22/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE SÃO PEDRO DO SUL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 712º, Nº 12-. A), 511º, Nº 1 E 268º DO CPC
Sumário: I – A al. a) do nº 1 do artº 712º do C.P.Civil exige, para que a decisão sobre a matéria de facto possa ser alterada pela Relação, que constem do processo todos os elementos de prova que serviram de base a essa decisão sobre a matéria de facto em causa, o que não se verifica se os depoimentos das testemunhas não tiverem sido gravados, por não ser possível apreciar o que cada testemunha disse em relação aos factos constantes do ponto controvertido.
II – A possibilidade de a Relação anular a decisão proferida sobre a matéria de facto quando considere indispensável a ampliação desta (cfr. nº 4 do artº 712º), pressupõe que essa ampliação incida sobre factos alegados pelas partes nos articulados, em consonância com o disposto no nº 1 do artº 511º e o princípio da estabilidade da instância previsto no artº 268º.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

A... e mulher, B..., propuseram, em 04/07/2000, pelo Tribunal da comarca de S. Pedro do Sul, acção com processo sumário contra Junta de Freguesia de C..., com os seguintes fundamentos, em síntese:
Os autores são proprietários de vários prédios rústicos, que identificam, os quais são confinantes com um caminho público.
A ré, não obstante o consentimento dos autores para o alargamento do referido caminho, desrespeitou o compromisso, tendo alargado aquele em medida e por modo não acordados.
Por via de tal obra, destruiu um muro de vedação dos aludidos prédios, soterrou os marcos que se encontravam no local, abateu diversas árvores, colocou o entulho no interior dos prédios dos autores e inutilizou o sistema de condução de água pelos referidos prédios, decorrente da destruição dos canos que a encaminhavam.
Terminam, pedindo que, na procedência da acção, (a)-seja declarado que os autores são donos e legítimos possuidores dos imóveis id. no artº 1º da p.i., e, em consequência, a ré condenada: (b)-a proceder, no prazo de 30 dias após o trânsito da sentença, à construção de um novo muro de vedação ao longo de todo o limite nascente dos prédios dos autores, com a aplicação de materiais idênticos aos existentes antes de o muro ser derrubado, (c)-à colocação de novos marcos em granito, no local onde se encontravam aqueles outros que foram soterrados; (d)-à recolha e retirada do terreno da terra e entulho neles colocados aquando e por via da execução das obras de alargamento da via pública; (e)-a pagar aos autores uma indemnização de 300.000$00 pelo corte e apropriação dos pinheiros; (f)-a pagar a importância de 100.000$00, a título de despesas de transporte; (g)-a pagar uma compensação de 100.000$00 a título de danos não patrimoniais; (h)-a pagar os juros legais de mora; e (i)-a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, a importância de 5.000$00 por cada dia de atraso na execução das obras.
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A ré contestou, por excepção, invocando a ilegitimidade dos autores, por estarem desacompanhados da mãe do autor marido, que é usufrutuária dos aludidos prédios.
Por impugnação, alegou que não existia qualquer muro antes das obras, mas um conjunto de estantes, que não foram soterrados quaisquer marcos, admite que foram derrubados alguns carvalhiços e cerca de uma dúzia de pinheiros, que procedeu à reparação da canalização danificada ou inutilizada, e que o entulho foi integralmente utilizado para a repavimentação do caminho alargado. Conclui pela improcedência da acção.
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Os autores requereram a intervenção principal de Silvina de Pinho Guimarães, mãe do autor marido, na qualidade de usufrutuária dos prédios em questão, a qual veio dizer que fazia seus os articulados dos autores.
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No despacho saneador julgou-se assegurada a legitimidade activa com a intervenção de Silvina de Pinho Guimarães.
Foram seleccionados os factos considerados assentes e os que constituem a base instrutória, com reclamação dos autores, deferida em parte.

Foi realizada uma perícia a requerimento de ambas as partes.

No decurso da audiência vieram os autores requerer a ampliação do pedido, aditando mais dois pedidos, a saber: (a)-condenar-se a ré a reconhecer que os autores são donos e legítimos possuidores e a interveniente usufrutuária dos imóveis identificados na p.i.; (b)-e em consequência condenar-se a ré a repor o terreno dos autores, de que a interveniente é legítima usufrutuária, no estado em que se encontrava antes do início das obras pela ré do alargamento do caminho em questão.
O pedido formulado na al. a) foi deferido e indeferido o formulado na al. b), tendo os autores interposto recurso de agravo, que foi julgado deserto já neste Tribunal, por falta da respectiva alegação.
Durante a audiência vieram os autores, também, desistir do pedido formulado na al. e).
Decidida a matéria de facto controvertida, sem reclamações, foi proferida a sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, reconhecendo os autores titulares do direito de propriedade e a interveniente titula ro direito de usufruto, uns e outra sobre cada um dos prédios identificados no ponto 1º da factualidade apurada e condenando a ré a proceder, no prazo de 60 dias, à colocação dos marcos que delimitavam a extrema da propriedade dos autores relativamente a propriedade de terceiro, no local ou locais onde se encontravam aqueles que foram soterrados com o alargamento do caminho público, e a retirar dos terrenos dos autores os raizeiros (cepos) a que alude o ponto 16º da factualidade apurada.
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Inconformados com a sentença, apelaram os autores, limitando recurso à não condenação da ré a proceder à construção de um novo muro de vedação ao longo de todo o limite dos prédios dos autores com o caminho alargado pela ré, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões:
1. Os recorrentes não concordam com a resposta dada ao ponto 9º da Base Instrutória, pois entendem ter ocorrido erro na apreciação das provas, concretamente da prova pericial efectuada.
2. Com efeito, da resposta dada pelo Tribunal a quo ao ponto 9º resulta que a fiada de pedras que a ré colocou delimitam a propriedade dos autores em toda a sua extensão.
3. Acontece que, da prova pericial efectuada resulta que há uma parte dos prédios dos autores, numa extensão de 21,50 m, que ainda se encontra por delimitar do caminho.
4. Assim, tendo em conta a prova pericial de fls. 110 e 11 dos autos, os recorrentes entendem que a resposta ao ponto 9º deve ser alterada, no sentido de passar a constar que a “A ré, em parte do limite do caminho alargado, e para delimitação das propriedades dos autores, colocou uma fiada de pedra, unidas umas às outras, existindo ainda uma parte sem qualquer muro, numa extensão de 21,50 m”.


5. Caso assim se não entenda, é importante para a boa decisão da causa apurar-se a extensão das propriedades dos autores que confinam com o caminho alargado, qual a altura do muro que existia nos prédios dos autores e qual a extensão da fiada de pedras colocadas pela ré.
6. Pelo que deve anular-se a decisão da matéria quanto ao ponto 9º da Base Instrutória e proceder-se a repetição do julgamento com ampliação da matéria referida na conclusão anterior.
7. Tendo os autores alegado e logrado provar que o muro de que são proprietários foi derrubado pela ré quando procedia ao alargamento do caminho, esta (ré) deve ser responsabilizada pelas consequências que daí advieram para os autores e, nessa medida, o pedido de condenação da ré de proceder à construção de um novo muro de vedação ao longo de todo o limite dos prédios dos autores com o caminho alargado devia, como deve, ser julgado provado e procedente.
8. Isto porque, cabia, como cabe, à ré alegar e provar que construiu o muro derrubado, colocando-o, dessa forma, na situação que se encontrava antes do alargamento do caminho.
9. Prova que, no entendimento dos autores, a ré não fez.
10. Com efeito, a fiada de pedras que a ré construiu não pode nem deve ser entendida como a construção ou reconstrução do muro dos autores que aquela derrubou.
11. Aliás, das respostas dadas pelos Senhores Peritos aos quesitos formulados quer pelos autores quer pela própria ré resulta que a fiada de pedra que a ré colocou a delimitar os prédios dos autores não passa de uma carreira de pedras que servem de base ou alicerces à futura construção do muro que ali existia, o qual foi derrubado pela ré e que esta se comprometeu a reconstruir.
12. Desta forma, da prova pericial efectuada resulta que a fiada de pedras que a ré construiu não é uma estrutura de vedação de todo idêntica ao muro que os autores tinham a delimitar as suas propriedades.
13. Ao não construir ou reconstruir um muro de vedação igual ao que existia antes de ter dado início aos trabalhos de alargamento do caminho alargado, a ré não reconstituiu a situação que existia se não tivesse derrubado o muro dos autores.
14. Pelo que, a ré também devia, como deve, ser condenada a proceder à construção de um muro novo de vedação, caracterizado por uma estrutura composta por pedras não trabalhadas, colocadas na vertical e distanciadas umas das outras, ao longo de todo o limite dos prédios dos autores com o caminho alargado.
15. Caso se entenda que a fiada de pedras colocadas pela ré constitui uma vedação de todo idêntica à parte do muro que os autores tinham antes do alargamento do caminho, ainda assim, sempre a ré devia, como deve, ser condenada a proceder à construção do restante muro de vedação na parte que demoliu e não foi de todo reconstruído, concretamente, numa extensão de mais 21,50 m.
16. A decisão recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos artºs 483, nº 1 e 562º do Código Civil.
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A ré absteve-se de apresentar contra-alegações.
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Colhidos os legais vistos, cumpre apreciar e decidir.
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Na 1ª instância foi dado como provado, com interesse para a decisão do presente recurso, o seguinte:
I - Os autores são donos e possuidores dos seguintes prédios rústicos:
a) Prédio rústico sito no lugar de Sendas, freguesia de C..., concelho de S. Pedro do Sul, a confrontar do norte com Padre António Luís dos Santos, do sul com José Jaime Pinto, do nascente com ribeiro e do poente com caminho, inscrito na matriz sob o artº 340;
b) Prédio rústico sito no lugar de Goja, freguesia de C..., a confrontar do norte com Henrique Pinto Santos Cunha, do sul e poente com caminho e do nascente com ribeiro, inscrito na matriz sob o artº 341;
c) Prédio rústico sito no lugar de Sendas, a confrontar do norte e poente com caminho, do sul com Fernando Ferreira e do nascente com ribeiro, inscrito na matriz sob o artº 342;
d) Prédio rústico sito no lugar de Sendas, a confrontar do norte com Padre António Luís dos Santos, do sul com José Jaime Pinto, do nascente com caminho e do poente com Manuel Figueiredo, inscrito na matriz sob o artº 516;
e) Prédio rústico sito no lugar de Sendas, a confrontar do norte com Manuel Figueiredo, do sul com caminho, do nascente com Henrique Pinto Santos Cunha e do poente com Fernando Ferreira e outros, inscrito na matriz sob o artº 518. – al. A) dos Factos Assentes.
II – Os prédios dos autores, descritos em A), confinam com o caminho público respectivamente pelos limites nascente, sul e poente, norte e poente, nascente e sul – al. B).
III – Esse caminho público é marginado, de um dos lados, por um muro de pedra e do outro, por um pinhal, ambos propriedade dos autores – al. C).
IV – Por volta de 1997, a ré solicitou autorização aos autores para proceder ao alargamento do referido caminho público - al. D).
V – No alargamento do caminho a ré derrubou o muro referido em C), o qual se caracterizava por uma estrutura composta por pedras não trabalhadas, colocadas na vertical, e distanciadas umas das outras, que tinham por função delimitar as propriedades dos autores, e que a ré se comprometeu a reconstruir – resp. ao ponto 2º da Base Instrutória.
VI – A ré, no limite do caminho alargado, e para delimitação das propriedades dos autores, colocou uma “fiada” de pedras, unidas umas às outras – resp. ponto 9º.
VII – A “fiada” de pedras referida na resposta ao ponto 9º tem a altura média de 50 cm. – resp. ponto 22º.
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Como é sabido, a delimitação do objecto do recurso é feita pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o tribunal da relação conhecer de matérias nelas incluídas, salvo razões de direito ou a não ser que aquelas sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs 664º, 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil).

Começam os recorrentes por alegar que não concordam com a resposta dada ao ponto 9º da Base Instrutória, pois entendem ter ocorrido erro na apreciação das provas, concretamente da prova pericial, visto resultar desta que há uma parte dos prédios dos autores, numa extensão de 21,50 metros, que ainda se encontra por delimitar do caminho.


A alteração, pela relação, da decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto só pode verificar-se se ocorrer alguma das situações (excepcionais) contempladas nas três alíneas do nº 1 do artº 712º, a saber:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 690º-A, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
E isto é assim porque no nosso direito processual civil se acha consagrado o princípio da prova livre (artº 655º), segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas e responde de acordo com a convicção que tenha formado acerca de cada facto, salvo se a lei exigir, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial, pois neste caso esta não pode ser dispensada.
De harmonia com esse princípio – que se contrapõe ao princípio da prova legal – as provas são apreciadas livremente, sem nenhuma escala de hierarquização, de acordo com a convicção que geram realmente no espírito do julgador acerca da existência de cada facto, só cedendo às situações de prova legal que se verifiquem especialmente nos casos de prova por confissão, por documentos, por documentos autênticos, por certos documentos particulares quanto à materialidade das suas declarações e por presunções legais (artºs 350º, nº 1, 358º, 371º e 376º do Código Civil).
Daí que, em regra, a Relação não possa alterar as respostas aos quesitos, a não ser, excepcionalmente, nas situações acima descritas.

No caso sub iudice, os recorrentes não indicam em qual das alíneas atrás referidas (nem o respectivo artigo) se apoiam para pretenderem a alteração da resposta ao ponto 9º.
Parece-nos, no entanto, que só podem apoiar-se na al. a), já que o disposto nas outras duas alíneas não pode ter aplicação ao presente caso, uma vez que os elementos fornecidos pelo processo não impõem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas, nem foi apresentado documento novo superveniente.
Verifica-se da acta do julgamento que foram ouvidas diversas testemunhas (João Magalhães Rocha, José Jorge Fernandes Torres, António Lopes de Matos, José Marques Figueiral, Sérgio da Rocha Ferreira e António Pinto Moreira) à matéria desse ponto 9º, sem que, no entanto, os respectivos depoimentos tenham sido gravados.
Ora, a al. a) exige que constem do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre a matéria de facto em causa, o que não se verifica no presente caso, uma vez que, como se viu, os depoimentos das testemunhas não foram gravados, não sendo possível apreciar, aqui e agora, o que cada testemunha disse em relação aos factos constantes do ponto 9º.
Não tendo acesso ao conteúdo desses depoimentos não é possível alterar a resposta a esse quesito unicamente com base no exame pericial.
Até porque o resultado desse exame, além de ser apreciado livremente pelo tribunal, de acordo com o disposto no artº 389º do Código Civil, deixa muito a desejar no que diz respeito à sua fiabilidade, como se vê, nomeadamente, das respostas aos 3º, 4º e 5º quesitos apresentados pelos autores.
Com efeito, perguntava-se nesses quesitos:
3º - “Actualmente, existe algum muro naqueles lado nascente e confinância ?”.
4º - “Em caso positivo, em toda a confinância?”.
5º - “Em caso negativo, qual a distância murada e qual a distância sem muro ?”.
Tendo recebido as seguintes respostas:
3º - “Não existe qualquer muro”.
4º - “Prejudicado pela resposta ao quesito anterior”.
5º - “A distância sem qualquer muro é de 21 m,50”.
Ora, a conjugação destas respostas parece poder levar à conclusão de que a distância de 21,50 metros diz respeito a todo o lado nascente dos prédios dos autores que confina com o caminho público e não apenas a parte dessa confinância, como pretendem os recorrentes., uma vez que tais respostas não podem deixar de ser interpretadas no sentido de que não existe qualquer muro desse lado, sendo tal distância, em que não existe qualquer muro, de 21,50 metros.
Por isso, mantém-se a resposta ao aludido ponto 9º da Base Instrutória.

Alegam os recorrentes que, caso não se entenda altear a resposta ao aludido ponto 9º, deve anular-se a decisão da matéria quanto esse ponto 9º e proceder-se à repetição do julgamento no sentido de se apurar a extensão das propriedades dos autores que confinam com o caminho alargado, qual a altura do muro que existia nos prédios dos autores e qual a extensão da fiada de pedras colocadas pela ré.
O nº 4 do artº 712º estatui que a Relação pode anular a decisão proferida sobre a matéria de facto quando considere indispensável a ampliação desta.
Isso pressupõe, no entanto, como é óbvio, que essa ampliação incida sobre factos alegados pelas partes nos articulados, em consonância com o disposto no nº 1 do artº 511º e o princípio da estabilidade da instância previsto no artº 268º.
Ora, no presente caso, os factos indicados pelos recorrentes como devendo ser objecto de ampliação não constam dos articulados, não sendo, por isso, possível anular a decisão proferida sobre a matéria de facto, a fim de ter lugar a pretendida ampliação.

Dizem, finalmente, os recorrentes que, ao não construir ou reconstruir um muro de vedação igual ao que existia antes de ter dado início aos trabalhos de alargamento do caminho, a ré não reconstituiu a situação que existia se não tivesse derrubado o muro dos autores, pelo que também devia, como deve, ser condenada a proceder à construção de um muro novo de vedação, caracterizado por uma estrutura composta por pedras não trabalhadas, colocadas na vertical e distanciadas umas das outras, ao longo de todo o limite dos prédios dos autores com o caminho alargado.
Não está em dúvida que a ré, tendo derrubado o muro dos autores ficou obrigada a reparar o dano, devendo reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (cfr. artºs 483º e 562º e ss. do Código Civil).
Na sentença recorrida entendeu-se que, com o mesmo tipo de materiais (pedra), a ré erigiu uma estrutura que, se de um ponto de vista “arquitectónico” não é exactamente idêntica à estrutura anterior, a sua funcionalidade ou função resulta idêntica, pelo que, nessa medida, se poderá concluir que a reconstituição natural reparou integralmente os danos ocasionados com o derrube da anterior estrutura.
Convém começar por referir que, conforme se vê da petição inicial, os autores não se preocuparam grandemente em indicar pormenorizadamente as características do muro que foi demolido pela ré, limitando-se a dizer que se tratava de um muro de pedra que vedava os seus prédios a nascente, na confinância com o caminho público que foi alargado pela mesma ré.
A esse propósito deu-se como provado, como se recorda, que o referido muro se caracterizava por uma estrutura composta por pedras não trabalhadas, colocadas na vertical, e distanciadas umas das outras, que tinham por função delimitar as propriedades dos autores (resp. p. 2º), e que a ré, no limite do caminho alargado, e para delimitação das propriedades dos autores, colocou uma “fiada” de pedras, unidas umas às outras, tendo a altura média de 50 cm (resp. ps. 9º e 22º).
Como se disse, pouco se sabe das características do muro antes da demolição, podendo dizer-se que se tratava de uma “fiada” de pedras destinada a delimitar os prédios dos autores e que, portanto, não deve ser muito diferente a “fiada” de pedras lá mandada colocar posteriormente pela ré.
Entendemos, por isso, também, à semelhança do que sucede com a sentença recorrida, que a ré procedeu à reconstituição natural do muro, e em toda a sua extensão, já que delimita as propriedades dos autores do referido caminho público alargado.
Pelo que improcede, igualmente, esta pretensão dos recorrentes e, consequentemente, o recurso.
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Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelos recorrentes.