Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ATAÍDE DAS NEVES | ||
Descritores: | EXPULSÃO MEDIDAS DE COACÇÃO COMPETÊNCIA PARA APLICAÇÃO | ||
Data do Acordão: | 10/28/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | COMARCA DE COIMBRA – 2º J | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 146º DA LEI 23/2007 DE 4 DE JULHO | ||
Sumário: | 1. No âmbito de processos de expulsão, para além das medidas de coacção enumeradas no Código de Processo Penal, com excepção da prisão preventiva, o juiz pode, havendo perigo de fuga, ainda determinar as seguintes: a) Apresentação periódica no SEF; b) Obrigação de permanência na habitação com utilização de meios de vigilância electrónica, nos termos da lei; c) Colocação do expulsando em centro de instalação temporária ou em espaço equiparado, nos termos da lei. 2. São competentes para aplicação de medidas de coacção os juízos de pequena instância criminal ou os tribunais de comarca do local onde for encontrado o cidadão estrangeiro. | ||
Decisão Texto Integral: | Inconformado com o despacho de fls.19 que validou a sua detenção e ordenou a sua libertação, mantendo-se, no entanto, o TIR prestado no SEF, onde terá de se apresentar no prazo de 5 dias, o arguido V... interpôs recurso. Formula as seguintes conclusões: 1) O artigo 146º da Lei 23/2007 de 4 de Julho dispõe que o estrangeiro que entre ou permaneça ilegalmente em território nacional é detido, entregue ao SEF acompanhado de referido auto e deve ser presente ao juiz para a sua detenção ser validada e para uma eventual aplicação de medida de coação. 2) O arguido aqui em causa foi detido com fundamento na sua permanência ilegal, pelos factos que melhor se encontram discriminados no auto de notícia que tem por finalidade legitimar a sua detenção e que foi acompanhado dos seus elementos de identificação. 3) É verdade que o arguido não possuía, à data da sua detenção, qualquer visto ou autorização que legitimasse a sua permanência em território português, 4) mas não se pode considerar é que o mesmo tenha sido notificado para abandono voluntário do território, em 26/09/2007, pela Delegação do SEF de Vila Real, 5) e é totalmente falso que o mesmo tenha sido notificado para comparência no Posto do SEF da Matinha no dia 26/03/2008 e não tivesse estado presente, 6) sendo ainda pouco provável a existência de um parecer negativo vinculativo, proferido no âmbito da manifestação de interesse que o mesmo já havia efectuado ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 88º do diploma em referência, sendo dele totalmente desconhecedor, e que nada tem a ver com a informação de fls. 14. 7) Nenhuma prova dos factos que constam do auto de notícia foi junta aos autos a não ser um mero extracto retirado do sistema informático, junto a fls. 13 que contém informações incorrectas e não consentâneas com a realidade. 8) Da análise da notificação para abandono do território, que ora se junta, constata-se que a mesma se encontra redigida em língua portuguesa, língua essa que o arguido não lê, não fala nem compreende, pelo que nunca se pode considerar notificado do seu teor, salvo o devido respeito por melhor entendimento. 9) Assim sendo, salvo melhor opinião, não pode ser atribuída qualquer validade e eficácia à mesma, sendo a mesma NULA, não podendo produzir os efeitos previstos no artigo 138º n. 1 do diploma em referência. 10) Isto demonstra que a decisão de validação da detenção, salvo melhor opinião, não poderia ter sido tomada com base em meras informações constantes dum auto que não foram acompanhadas por um único documento comprovativo, para se aferir poder aferir da sua veracidade. 11) Por outro lado é verdade que o arguido foi notificado para comparecer no Posto de Atendimento da Matinha de Lisboa do SEF no passado dia 26/03/2008 mas não é verdade que não tenha comparecido. 12) Não só compareceu como pagou uma taxa de 61,50 euros pela recepção e análise do pedido de concessão de título de residência que havia efectuado ao abrigo do n. 2 do artigo 88º do diploma em referência. 13) Pelo que é falsa a informação constante do auto de notícia a esse respeito. 14) O arguido havia já, em finais do ano de 2007, através do site oficial do SEF, preenchido o formulário destinado à manifestação de interesse prevista no n. 2 do artigo 88º do diploma em referência, para obter título de residência que o legitime não só a permanecer em território português como a exercer uma actividade subordinada. 15) Até à data o arguido nunca foi notificado de qualquer parecer negativo vinculativo que tivesse sido proferido sobre o pedido que efectuou ao abrigo daquele normativo de excepção. 16) E duvida, inclusive, que ele exista porque a decisão só é tomada após entrevista pessoal ao requerente e a mesma só foi efectuada ao aqui arguido no passado dia 30 de Junho do corrente, 4 dias após a validação da sua detenção!!!!!!!! 17) O processo está a decorrer em Lisboa, no posto de atendimento da Matinha, porque à data do pedido o arguido trabalhava e residia na zona. 18) Só em Maio veio residir e trabalhar para a cidade de Coimbra. 19) Tudo isto explicou o arguido no depoimento que prestou no interrogatório a que foi sujeito... 20) A informação de fls. 14 não só é despropositada face à anterior existência do processo de concessão de título de residência que se encontra a decorrer na Direcção Regional de Lisboa, Vale do Tejo e Alentejo, 21) Como contém informações "absurdas" como a de que não poderia sequer ser apreciado um pedido formulado ao abrigo do n. 2 do artigo 88º do diploma em referência, que supostamente teria sido formulado naquela data, por o arguido não ter feito prova de ter permanência legal em território nacional, 22) O que é um verdadeiro contra senso já que, esse regime excepcional foi criado exactamente para quem se encontra precisamente nessa situação (permanência ilegal em território português) e o arguido já anteriormente havia efectuado essa manifestação de interesse. 23) Face ao exposto, e mesmo sem acesso aos documentos que ora se juntam, impunha-se ao juiz que, antes de validar a detenção do arguido efectuada pelo SEF , mesmo que o arguido tivesse permanência ilegal em território nacional, averiguasse se o mesmo havia ou não manifestado o interesse nos termos e para os efeitos do disposto no artº 88º n.2 do diploma em referência e, tendo-o efectuado, se já existia decisão definitiva acerca do pedido de concessão de título de residência para exercício de actividade profissional subordinada que fez ao abrigo desse normativo. 24) Nunca se poderia aceitar, para esse efeito, como válido é o teor da informação de fls. 14 pelos motivos supra expostos. 25) Pelo que, salvo o devido respeito por melhor entendimento, a matéria de facto dada como provada e constante dos autos era insuficiente para a decisão que foi tomada, nos termos do disposto na al. a) do n.2 do artigo 410 do Código Processo Penal, 26) Impondo-se a renovação da prova, nos termos do disposto no artigo 430º do Código Processo Penal com a consequente modificabilidade da decisão recorrida, ao abrigo do disposto no artigo 431º do mesmo diploma legal, 27) Considerando-se inválida a detenção do arguido e, em consequência, revogando-se o douto despacho recorrido bem como a validação da detenção e a manutenção da detenção da medida de coacção ( TIR) que havia sido aplicada ao arguido. Normas jurídicas violadas: artigo 88ºn.2, 138º, n.1 e 146º n.1 da Lei 23/2007 de 04/07 e artigo 410º, n.2 do CPP. O recurso foi admitido. Na resposta diz o Ministério Público que sendo apenas o objectivo do interrogatório de estrangeiro detido por permanência ilegal em Portugal a validação da detenção, a defesa dos eventuais interesses do cidadão estrangeiro passarão a correr no âmbito do processo administrativo de expulsão. Termos em que defende a improcedência do recurso. No mesmo sentido vai o parecer da Exmº Procuradora -Geral Adjunta neste tribunal. Responde o arguido reiterando que a decisão de que recorre deve ser revogada pondo cobro ao TIR. Colhidos os vistos e realizada a conferência cumpre decidir. O recurso tem como única questão verificar se há ou não razão que justifique a detenção e em consequência determine o TIR. Estão assentes os seguintes factos: 1.- Em 26/06/2008 foi detido pelo SEF o cidadão Paquistanês V.... 2.- O cidadão não é possuidor de documento que o habilite a residir legalmente em Portugal; 3.- Não é titular de visto. Da Detenção de cidadão estrangeiro Considera o recorrente que a decisão de validação da detenção, não poderia ter sido tomada com base em meras informações constantes dum auto que não foram acompanhadas por um único documento comprovativo, para se poder aferir da sua veracidade. Impunha-se ao juiz, antes de validar a detenção do arguido efectuada pelo SEF, mesmo que o arguido tivesse permanência ilegal em território nacional, averiguar se o mesmo havia ou não manifestado o interesse nos termos e para os efeitos do disposto no artº 88º n.2 da Lei nº 23/2007 e se já existia decisão definitiva acerca do pedido de concessão de título de residência para exercício de actividade profissional subordinada que fez ao abrigo desse normativo. Não o tendo feito, por falta de fundamentação suscita a renovação da prova, nos termos do disposto no artigo 430º do Código Processo Penal com a consequente modificabilidade da decisão recorrida, ao abrigo do disposto no artigo 431º do mesmo diploma legal. Portanto impõe-se a este tribunal de recurso verificar se há o fundamento para a detenção e suporte legal que sustente a sua validação. Nos termos do artº 146 do regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, constante da Lei nº 23/2007, o cidadão estrangeiro que entre ou permaneça ilegalmente em território nacional é detido por autoridade policial e, sempre que possível, entregue ao SEF acompanhado do respectivo auto, devendo o mesmo ser presente, no prazo máximo de quarenta e oito horas após a detenção, ao juiz do juízo de pequena instância criminal, na respectiva área de jurisdição, ou do tribunal de comarca, nas restantes áreas do País, para a sua validação e eventual aplicação de medidas de coacção. De acordo com a definição estipulada pelo art. 3º aliena p) do mesmo diploma é residente legal o cidadão estrangeiro habilitado com título de residência em Portugal, de validade igual ou superior a um ano. Sem prejuízo das disposições constantes de convenções internacionais de que Portugal seja Parte ou a que se vincule, é expulso do território português o cidadão estrangeiro que entre ou permaneça ilegalmente no território português – art. 134º. No âmbito de processos de expulsão, para além das medidas de coacção enumeradas no Código de Processo Penal, com excepção da prisão preventiva, o juiz pode, havendo perigo de fuga, ainda determinar as seguintes: a) Apresentação periódica no SEF; b) Obrigação de permanência na habitação com utilização de meios de vigilância electrónica, nos termos da lei; c) Colocação do expulsando em centro de instalação temporária ou em espaço equiparado, nos termos da lei. São competentes para aplicação de medidas de coacção os juízos de pequena instância criminal ou os tribunais de comarca do local onde for encontrado o cidadão estrangeiro. Portanto cidadão estrangeiro que permaneça ilegalmente em território nacional está sujeito a expulsão e consequentes medidas coactivas que no essencial, tal qual as medidas previstas no Código Processo Penal, visam garantir que o cidadão ilegal não se exima ao controlo das autoridades. Foi precisamente este procedimento que se adoptou nos autos, o cidadão permanecia ilegalmente em território nacional e o SEF com vista à expulsão administrativa apresentou-o em juízo para que lhe fosse aplicada uma medida coactiva, por acaso quedou-se no mero TIR mas poderia atingir outros patamares de restrição da liberdade se porventura estivesse em causa o receio de fuga. Nada de anormal a registar no procedimento tomado, aliás consentâneo com a aceitação expressa do arguido de que não possuía, à data da sua detenção, qualquer visto ou autorização que legitimasse a sua permanência em território português. Não pode, como é óbvio, argumentar o cidadão indocumentado que está a tratar da autorização de residência para exercício de actividade profissional ao abrigo do art 88º do diploma e que por isso não pode ser detido. Estava então instalado o meio de distorção da intervenção cautelar das autoridades. Basta que o cidadão permaneça ilegalmente no país para que os tribunais comuns tomem as medidas preventivas necessárias á manutenção da sua disponibilidade perante as autoridades administrativas, tudo o mais é estranho a estes tribunais. Os tribunais comuns só intervêm como garante das liberdades e porque as medidas decretadas podem contender com esse espaço de liberdade. Por isso e dado o seu carácter absolutamente excepcional a medida está consagrada no texto constitucional no art. 27º nº3 alínea b). Termos em que se nega provimento ao recurso. Custas pelo arguido – 2 UC de taxa de justiça. |