Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2352/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: MONTEIRO CASIMIRO
Descritores: LETRA
EXCEPÇÕES OPONÍVEIS
PROCEDIMENTO CONSCIENTE EM DETRIMENTO DO DEVEDOR
Data do Acordão: 01/10/2006
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 17º DA LEI UNIFORME S/ LETRAS E LIVRANÇAS
Sumário: De acordo com o disposto no artº 17º da Lei Uniforme s/ Letras e Livranças, para que as excepções sejam inoponíveis ao devedor é necessário que o portador, ao adquirir a letra, tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor.
A doutrina tem entendido que não basta a simples má fé, sendo ainda necessário que o portador tenha agido com a consciência de estar a causar um prejuízo ao devedor, o que se verifica quando o portador tenha tido conhecimento da existência e legitimidade das excepções que o devedor poderia opor ao endossante dele, portador.

A jurisprudência do S.T.J. tem sido mais no sentido de que basta a consciência do prejuízo do devedor, não sendo de exigir a intenção de prejudicar.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

A... deduziu, em 20/06/2001, embargos de executado na execução ordinária nº 428/2000, a correr termos pelo 2º Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz, que lhe foi movida por “B....”, alegando, em síntese, que nunca foi devedor da exequente, ora embargada, e que a letra dada à execução nos autos de processo principal apenas foi por si aceite porquanto se tratou do negócio que lhe fora proposto por D..., sócio-gerente da embargada e Presidente da “C...”, com vista a que este pudesse receber parte da verba que esta associação lhe devia em virtude de ter sido treinador da equipa de futebol sénior da mesma, na quantia de 4.200.000$00, e que aquele descontaria junto de um banco, pagando o respectivo montante ao embargante, e, enquanto presidente daquela agremiação desportiva, garantindo que seria esta a assumir o pagamento por inteiro da letra junto da citada entidade bancária, concluindo que a actuação da embargada foi conscientemente em detrimento do embargante, sendo-lhe oponíveis as excepções fundadas nas suas relações pessoais com o sacador, peticionando a procedência dos presentes embargos e a consequente extinção da execução, bem como a condenação da embargada como litigante de má-fé.
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A embargada “B...”, contestou os embargos, alegando, em síntese, que a letra dada à execução nos autos de execução ordinária titulava um empréstimo efectuado por D... ao embargante, em face das suas dificuldades financeiras, e também da indisponibilidade financeira da “C...” em pagar àquele, pelo qual esperava ser reembolsado assim que esta agremiação desportiva pagasse ao embargante, tendo entretanto a letra sofrido algumas reformas, que alega terem sido pagas por D..., e ter recebido

a referida letra por endosso deste, concluindo estar de boa-fé e não ter agido com a consciência de prejudicar o embargante, não lhe sendo oponíveis as excepções fundadas nas relações pessoais com o sacador, pelo que deveriam os presentes embargos ser julgados improcedentes, por não provados.
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Foi elaborado despacho saneador, tendo sido igualmente fixada a matéria de facto assente e a base instrutória, sem reclamações.
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Procedeu-se a julgamento, com gravação da prova e, decidida a matéria de facto controvertida, sem reclamações, foi proferida a sentença, que julgou os embargos improcedentes
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Na 1ª instância foi dado como provado o seguinte:
1. Dá-se aqui como reproduzido o documento (letra de câmbio) junto a fls. 5 do processo principal, com todos os seus dizeres e assinaturas, dos quais consta, nomeadamente, como local e data de emissão, Figueira da Foz, 04/06/1999, vencimento, 04/09/1999, importância, Esc. 4.500.000$00, e onde consta no local onde o mesmo diz sacador, D... e a assinatura do mesmo, e no local onde o mesmo diz aceite, a assinatura de A..., ora embargante - (Al. A) dos Factos Assentes).
2. No verso de tal documento antecedido da assinatura de D..., consta o carimbo da gerência da ora embargada “B....”, seguido de uma assinatura – (al. B).
3. D... é o Presidente da “C...” – (al. C).
4. D... é sócio gerente da “B...”, ora embargada – (al. D).
5. O embargante foi treinador da associação desportiva “C...” entre sensivelmente a segunda quinzena de Março e Agosto de 1999 – (al. E).
6. Conforme a cláusula VII do acordo escrito subscrito pelo ora embargante e a “C...”, junto a fls. 8 a 11, intitulado “contrato

de trabalho”, o ora embargante, o ora embargante na qualidade de treinador da equipa de futebol sénior da “C...”, teria a receber desta, no mês de Junho de 1999, a quantia de Esc. 4.200.000$00, a acrescer ao seu vencimento – (al. F).
7. Em Junho de 1999, a “C...”, pela pessoa de seu Presidente, D..., comunicou ao ora embargante que não tinha disponibilidade financeira para lhe pagar directamente a referida quantia de Esc. 4.200.000$00 – (al. G).
8. Mais lhe comunicou que para que o ora embargante pudesse receber a referida quantia monetária, teria que subscrever, como aceitante, uma letra de câmbio sacada por D... – (al. H).
9. Tendo, assim, vindo o ora embargante e o D... a subscrever o documento – letra de câmbio – referido em A) supra – (al. I).
10. Tal letra veio depois a ser apresentada a pagamento junto de uma instituição bancária, e recebido desta o correspondente valor, o D..., entregou ao ora embargante a quantia de Esc. 4.250.000$00 – (al. J).
11. Na data de vencimento da letra aludida em A) supra, o ora embargante subscreveu como aceitante uma outra letra de montante inferior, a fim de proceder à substituição daquela primeira, tendo-se essa operação repetido por diversas vezes – (al. L).
12. Nunca foram entregues ao ora embargante os originais da letra aludida em A) supra, nem das letras subscritas para substituir aquela – (al. M).
13. Em 27 de Outubro de 1999, o ora embargante intentou no Tribunal do Trabalho da Figueira da Foz, acção declarativa de processo comum ordinário, contra a “C...” para cobrança de créditos que lhe eram devidos em virtude da supra aludida relação de trabalho, tendo a mesma terminado por transacção, celebrada em data anterior à da entrada em juízo da execução a que os presentes embargos se encontram apensos, sendo que na cláusula 3ª dessa transacção, pelas aí partes foi consignado que “se encontra paga a totalidade da letra referida nos artigos 13º e 14º da petição inicial” – (al. N).

14. A letra referenciada nessa transacção é a referida em A) supra – (al. O).
15. O D... não recebeu qualquer quantia monetária da “C...”, referente à letra aludida em A) supra – (resposta ao quesito 17º da Base Instrutória).
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Inconformado com a sentença, interpôs o embargante recurso de apelação, rematando a sua alegação com as seguintes (extensas) conclusões:
A. Ficou demonstrado nos autos que a origem e razão de ser da emissão e aceite da letra dada à execução foi a de conseguir que o ora recorrente recebesse a quantia de 4.200.000$00 que a C... lhe devia por força de contrato de trabalho desportivo que a ambos unia – cfr. os §§ 7, 8 e 9 da fundamentação de facto.
B. Assim, a causa remota ou relação subjacente ao negócio cambiário não é outra senão o negócio (contrato de trabalho desportivo) existente entre o recorrente e aquela C....
C. Sendo a convenção executiva ou causa próxima do negócio cambiário o pagamento ao ora recorrente da quantia de 4.200.000$00 de que este era credor perante a C....
D. Evidenciando quer a causa remota quer a causa próxima da emissão da letra uma posição de credor do ora recorrente, não pode aquele título servir – como decidido pela sentença recorrida – para reclamar do recorrente essa quantia, como se fora ele o devedor.
E. Face à versatilidade dos títulos de crédito e aos resultados que em concreto se pretenderam e, sobretudo, se conseguiram com a emissão e aceite da letra de câmbio aqui em causa (e que não foram outros senão o recebimento pelo recorrente/aceitante do montante que lhe era devido), então, o facto de o recorrente surgir no título como aceitante não é bastante para que se recusem os factos e negócios supra referidos como causa remota e causa próxima do negócio.
F. Ainda assim, se se entender que essa posição de aceitante do recorrente há-de ser determinante na busca daquelas causas próxima e remota do negócio cambiário (isto é, que terá necessariamente de se procurar um negócio substancial e uma convenção executiva em que o recorrente – por ser aceitante da letra – tenha que ser devedor do sacador), então, sem sucesso aqui se procurará um negócio substancial e uma convenção executiva para a letra.

G. E não só não existe no conjunto dos factos aqui provados notícia de um qualquer negócio em que o recorrente surja como devedor de quem quer que seja como, pelo contrário, o que há é prova de que a origem da letra teve a ver com outras – diametralmente opostas, pois que aí o recorrente é credor – situações e negócios.
H. Ora, se se provou que a origem da letra teve a ver com esses outros factos, então não +poderá sustentar-se que outros (ainda que não provados) tenha havido em que o recorrente figurasse como devedor e que assim hajam ditado a emissão e aceite da letra.
I. O que vale por dizer que o ora recorrente ao provar o que consta dos §§ 7 a 9 da fundamentação de facto da decisão recorrida (e que explicam a origem da letra) cumpriu o ónus de demonstrar que a mesma não se funda, não tem como relação subjacente qualquer negócio em que ele seja devedor nem tem como causa próxima qualquer pagamento do recorrente a qualquer terceiro. Se a origem da letra é aquela, obviamente que não pode ser esta.
J. Então, para esta concreta letra em que o recorrente surge como aceitante (logo, devedor; responsável pelo pagamento) não há relação subjacente nem causa próxima. A letra, para esse efeito, não traduz qualquer débito real do recorrente. Este nada devia que justificasse o aceite da letra.
L. Face o disposto na parte final do artº 17º da Lei Uniforme relativa às Letras e Livranças, o ora recorrente pode opor à recorrida as excepções fundadas nas supra referidas relações extra-cartulares (ou ausência delas). Com efeito,
M. É inequívoco que a recorrida conhecia todos os factos que presidiram à emissão da letra e em que se consubstanciam as invocadas excepções: e isto porquanto o conhecimento que a recorrida haja ou não de ter desses factos afere-se pelo conhecimento que deles tenham ou não as pessoas singulares seus legais representantes.
N. Ora, se a C..., pela pessoa do Sr. D..., conhecia os factos; se o Sr. D... também os conhecia; e se esse mesmo Sr. D... é o gerente da recorrida B..., então obviamente que esta sociedade também os conhecia.
O. Face a diversos elementos fornecidos pelos autos haverá de concluir-se também que a recorrida, ao receber a letra por endosso, mais não pretendia do que obviar à possibilidade de defesa do ora recorrente, mediante a invocação das supra referidas excepções. Com efeito,

P. Apontam inequìvocamente nesse sentido quer a completa ausência de alegação, pela recorrida, de uma causa justificativa para o endosso, quer a sucessão de eventos de que os autos dão conta: o reconhecimento (em transacção judicial) pelo gerente da recorrida (então em representação da C...) de que a letra se encontrava totalmente paga, para breves dias depois, já em representação da recorrida, instaurar acção executiva contra o recorrente com base naquela letra que dias antes havia dado como paga, promovendo (no âmbito dessa execução e logo de seguida) a penhora do crédito que este detinha sobre aquela C... mercê da supra citada transacção judicial.
Disposições violadas: artº 17º da LULL.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Colhidos os legais vistos, cumpre apreciar e decidir.
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Como é sabido, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o tribunal da relação conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo razões de direito ou a não ser que aquelas sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs 664º, nº 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil).

Os embargos foram julgados improcedentes, com o fundamento de que nada se provou quanto aos vícios alegados relativamente à convenção executiva, designadamente que o embargante foi forçado a subscrever como aceitante a letra de câmbio para receber a quantia de 4.200.000$00, que a “C...” lhe devia, e de que, quanto ao negócio causal ou relação subjacente, ficou apenas provado o incumprimento pela “C...” das quantias referentes ao contrato laboral desportivo de que o embargante era credor, o que não pode considerar-se como um verdadeiro negócio causal da emissão da letra de câmbio, atento o teor da convenção executiva expressa na letra, porquanto naquele o embargante assume a veste de credor e na letra a de devedor, não existindo verdadeira identidade quanto às posições das partes em ambos os negócios, nem rigorosa identidade de sujeitos que permita concluir que a letra dada à execução exercia uma função económica de garantia desse pagamento.

Não vamos aqui repetir o que já se encontra, e muito bem, explanado na sentença recorrida acerca do regime legal das letras de câmbio.
Diremos apenas que o artº 17º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças (LULL), que trata das excepções inoponíveis ao portador, estatui que as pessoas accionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador as excepções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador ao adquirir a letra tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor.
Neste preceito estão contidos os princípios da literalidade, abstracção e autonomia, que caracterizam as obrigações cambiárias:
Literalidade da obrigação: a reconstituição da obrigação faz-se pela simples inspecção do título;
Abstracção da obrigação: a letra é independente da causa debendi;
Autonomia do direito do portador: o portador é considerado credor originário.
Resulta deste normativo que a obrigação do aceitante emergente da sua declaração de vontade é formal e abstracta e que, por isso, são inoponíveis ao tomador ou a qualquer subsequente possuidor de boa fé as excepções ou meios de defesa que o aceitante tenha contra o sacador, baseadas em relações de negócios entre eles existentes, ou relativas ao próprio acto da emissão ou do aceite.

No presente caso, o embargante alegou, nos embargos, que o aceite da letra por parte dele não teve outra razão de ser que não o viabilizar o pagamento, pela C..., dos 4.200.000$00 que esta lhe devia, não havendo qualquer outro negócio entre todos os intervenientes, nomeadamente, não existindo qualquer débito do embargante para com o Sr. D..., sacador da letra, e que a embargada, ao adquirir a letra e ao tentar com ela cobrar créditos que sabia não existirem, procedeu conscientemente em detrimento dele, embargante, razão porque lhe são oponíveis as excepções por ele deduzidas, fundadas nas suas relações pessoais com o sacador da letra.
Antes de verificar se a embargada/exequente, ao adquirir a letra, agiu conscientemente em detrimento do devedor, importa ver se existem as excepções invocadas pelo embargante no âmbito das relações pessoais entre ele e o sacador, D..., nomeadamente, se este era credor do embargante de forma a justificar o aceite da letra por banda deste, ou se o embargante se viu na necessidade de aceitar a letra para poder receber a importância de 4.200.000$00 que lhe era devida pela C..., sua entidade patronal.
Importa aqui recordar a matéria de facto que se deu como provada com interesse para a solução desta questão:
O embargante foi treinador da associação desportiva “C...” entre Março e Agosto de 1999.
D... é o presidente da “C...”.
O ora embargante, na qualidade de treinador da equipa de futebol sénior da “C...”, teria a receber desta, no mês de Junho de 1999, a quantia de 4.200.000$00, a acrescer ao seu vencimento.
Em Junho de 1999, a “C...”, pela pessoa do seu presidente, D..., comunicou ao ora embargante que não tinha disponibilidade financeira para lhe pagar directamente a referida quantia de 4.200.000$00.
Mais lhe comunicou que, para que o ora embargante pudesse receber a referida quantia monetária, teria que subscrever, como aceitante, uma letra de câmbio sacada por D....
Tendo, assim, vindo o ora embargante e o D... a subscrever a letra de câmbio dada à execução.
Tal letra veio depois a ser apresentada a pagamento junto de uma instituição bancária e recebido desta o correspondente valor, o D... entregou ao ora embargante a quantia de 4.250.000$00.
Em 27/10/1999, o ora embargante intentou no Tribunal do Trabalho da Figueira da Foz uma acção contra a “C...” para cobrança de créditos que lhe eram devidos em virtude da supra aludida relação de trabalho, tendo a mesma terminado por transacção, celebrada em data anterior à da entrada em juízo da execução a que os presentes embargos se encontram apensos, sendo que na cláusula 3ª dessa transacção pelas partes aí foi consignado que “se encontra paga a totalidade da letra referida nos artºs 13º e 14º da petição inicial”.
A letra referida nessa transacção é a referida na al. A) dos F. Assentes.

Face a esta matéria de facto temos de concluir que se encontra provado que o embargante, ao aceitar a letra, fê-lo apenas para poder receber a quantia de 4.200.000$00, que lhe era devida pela “C...”, de que o sacador D... era presidente. Este, nessa qualidade, comunicou ao ora embargante que aquela Associação não tinha disponibilidade financeira para lhe pagar directamente (o realce é nosso) a referida quantia monetária e que, para o ora embargante poder receber a aludida quantia teria que subscrever uma letra de câmbio sacada pelo D....
Verifica-se, assim, com evidência, que na base da subscrição da letra de câmbio em causa está apenas o crédito laboral detido pelo ora embargante sobre a sua entidade patronal “C...”, e que o D... não era credor do ora embargante, visto não ter sido celebrado entre eles qualquer negócio que justificasse o aceite, pelo embargante, da referida letra de câmbio.

No entanto, resta saber se tais excepções podem ser opostas à exequente/embargada “B..., portadora da letra, a quem foi endossada pelo sacador D....
É que, como vimos, o artº 17º da LULL exige que o portador, ao adquirir a letra, tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor.
Os Prof.s Ferrer Correia (Lições de Direito Comercial, III, pág. 67) e Pinto Coelho (Lições, IV, pág. 70) entendem que não basta a simples má fé – conhecimento do vício anterior, sendo ainda necessário que o portador, ao adquirir a letra, tenha agido com a consciência de prejudicar o devedor, ou seja, além desse conhecimento, é preciso ainda que o portador tenha agido, ao adquirir a letra, com a consciência de estar a causar um prejuízo ao devedor, o que se verifica quando o portador tenha tido conhecimento da existência e legitimidade das excepções que o devedor poderia opor ao endossante dele, portador.
A jurisprudência dominante do S.T.J. é, no entanto, no sentido de que basta a consciência do prejuízo do devedor, não sendo de exigir a intenção de prejudicar.(v. Cons. Abel Delgado, Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças anotada, 7ª ed., pág. 124).
No presente caso, tendo em consideração que o endossante D... é sócio-gerente da endossada “B...,

Ldª”, tem de se concluir que esta tinha conhecimento de que não existia qualquer obrigação causal e que, ao adquirir a letra, tinha consciência de estar a prejudicar o devedor, ora embargante, mais não pretendendo, como invoca este na sua alegação do recurso, obviar à possibilidade de defesa por parte do mesmo embargante, mediante a invocação das supra referidas excepções.
A corroborar tal entendimento está o factualismo constante das als. N) e O) dos Factos Assentes, segundo o qual, em 27/10/1999, o ora embargante intentou no Tribunal do Trabalho da Figueira da Foz uma acção contra a “C...”para cobrança de créditos laborais que lhe eram devidos por essa mesma Associação, tendo a acção terminado por transacção, celebrada em data anterior à da entrada em juízo da execução a que os presentes embargos se encontram apensos, tendo as partes consignado, na cláusula 3ª dessa transacção, que “se encontra paga a totalidade da letra referida nos artºs 13º e 14º da petição inicial” (que é a letra em causa nos presentes autos).

Conclui-se, assim, pela procedência dos embargos, e consequentemente, pelo provimento do recurso.
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Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em, dando provimento ao recurso, julgar os embargos procedentes, com a consequente revogação da sentença recorrida.

Custas pela embargada, ora recorrida.