Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
587/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: SOUSA PINTO
Descritores: ALEGAÇÕES DE RECURSO
FORMULAÇÃO DE CONCLUSÕES
DESPACHO PARA RECORRENTE SINTETIZAR CONCLUSÕES
NÃO CUMPRIMENTO
Data do Acordão: 10/04/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA FIGUEIRA FA FOZ - 3º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 690º, NºS 1 E 4, DO CPC .
Sumário: I – Nos termos do disposto no artº 690º, nº 1, do CPC, o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual concluirá, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou a anulação da decisão .
II – Notificado o Recorrente para apresentar as suas conclusões sintetizadas, nos termos do artº 690º, nº 4, do CPC, verificando-se que a parte não acatou esse convite, tendo-se limitado a dar nova elencagem às anteriores conclusões apresentadas, deve ser negado o recebimento do recurso .
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra,

RELATÓRIO

A..., recorreu da sentença proferida em primeira instância pelo Tribunal Judicial da Figueira da Foz, a qual condenou-a a pagar ao Réu, B..., a quantia de 9.028,11€, acrescida de juros desde a data da notificação do pedido reconvencional e até pagamento, à taxa de 7% e, a partir de 1/05/2003, à de 4%.
Apresentou a recorrente as suas alegações, onde exibiu as seguintes conclusões:

A) Como se verifica do contrato de transacção, as partes estipularam 2 obrigações de indemnização, autónomas e devidamente diferenciadas entre si.

B) A PRIMEIRA OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR, diz respeito às benfeitorias levadas a cabo pela autora na Zona Industrial e ao preço por ela pago para a aquisição ao R. dos lotes que por força da devolução dos mesmos, o R. lhe teria de pagar, ou seja, visa indemnizar o tipo de danos que podemos qualificar de danos emergentes.

C) O seu montante foi logo fixado em 500.000.000$00 e estabeleceu-se como data limite final do vencimento global da obrigação o dia 31 de Dezembro de 2001.

D) Porém, estabeleceu-se que a A., antes da referida data, iria recebendo dos terceiros que contratassem a aquisição dos lotes devolvidos ao R. Município, quantias que seriam por conta do pagamento da quantia final devida, pelo que sempre que o R. Município negociasse e recebesse quantias resultantes da venda de qualquer dos lotes devolvidos, vencer-se-ia imediatamente uma prestação de valor equivalente a 30% do valor real da transacção, quantia essa que o terceiro contratante com o R. Município iria entregar à A., quer as quantias fossem entregues a título de sinal, quer a título de preço definitivo, na data da escritura.

E) Por fim, o pagamento à A. tinha por base um preço mínimo, pelo que a quantia que a A. devia receber, era equivalente a 30% do valor real recebido pelo R. ou o montante equivalente ao valor dos metros quadrados vendidos, fixado segundo o preço mínimo, caso aquele valor real fosse inferior a este.

F) A SEGUNDA OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR, diz respeito aos lucros cessantes que a A. deixava de receber por ter aceite a transacção, como resulta até dos termos da cláusula, trata-se do tipo de danos que podemos qualificar de lucros cessantes, cujo montante não foi logo fixado, mas foram estabelecidas formas da sua determinação — à medida que os lotes fossem transaccionados — e, por isso mesmo, não foi estabelecida qualquer data final para o respectivo vencimento, vencimento este que se faria prestação a prestação, sempre que nascesse o direito da A. a receber quantias, por força do recebimento de quantias por parte do R. Município.

G) A A., iria recebendo dos terceiros que contratassem a aquisição dos lotes devolvidos ao R. Município, quantias que seriam simultaneamente o cálculo da indemnização e o seu pagamento, pelo que o R. Município negociasse e recebesse quantias resultantes da venda de qualquer dos lotes devolvidos, vencer-se-ia imediatamente uma prestação de valor equivalente a 20% do valor real da transacção, quantia essa que o terceiro contratante com o R. Município iria entregar à A., quer as quantias fossem entregues a título de sinal, quer a título de preço definitivo, na data da escritura.

H) Por fim, o pagamento à A. tinha por base um preço mínimo, pelo que a quantia que a A. devia receber, era equivalente a 20% do valor real recebido pelo R. ou o montante equivalente ao valor dos metros quadrados vendidos, fixado segundo o preço mínimo, caso aquele valor real fosse inferior a este.

I) É à luz deste entendimento que deve ser analisada a presente acção, pois, como resulta dos termos da transacção foi esta a intenção das partes contratantes, na data em que a transacção foi celebrada.

J) A sentença recorrida não percebeu o que a transacção significava e considerou indevidamente que os créditos da A. só se venciam com a realização da escritura, meio legal de transferência da propriedade dos imóveis, fazendo-o sem qualquer fundamento, além de que este entendimento não tem um mínimo de expressão verbal na transacção.

K) Resulta evidente da actuação do R. Município, que ele também o não entendeu assim, tanto que enviou para a A. as quantias que lhe cabiam, sempre que celebrava qualquer contrato promessa e nisso A. e R. estão completamente de acordo.

L) O tribunal respondeu negativamente ao quesito 3.º, baseando-se para tanto no facto de o R. Município ter fixado critérios para o destina a dar aos lotes devolvidos.

M) Esses critérios são mais restritivos que anteriormente, pelo que está provado o que é perguntado no quesito, não interessando o que motivou essa actuação mais restritiva.

N) A resposta ao quesito 3.º deve ser de PROVADO, indicando- -se, nos termos do art°. 690.°-A, n.º 1 do Cod. Proc. Civil, o depoimento prestado por escrito pela vereadora Rosário Águas e que se encontra a fls. 478, os depoimentos prestados em audiência de julgamento e gravados conforme fls. 490 e 491 — de José Manuel Neves Vieira Marques volta 0104 a 0993 do lado A da cassete 1 -, de Ricardo Afonso Moreira dos Santos volta 1042 a 1257 do lado A da cassete 1 -, de Rui Sérgio Antunes Caseiro volta 1311 a 2001 do lado A da cassete 1 -, de Dulcíneo Mendes Pedrosa volta 2045 a 2167 do lado A da cassete

1-.

O) No que respeita à questão de fundo, a sentença recorrida esquece completamente os contratos-promessa, o que não é aceitável e contraria a vontade das partes posta em prática após a assinatura da transacção.

P) Do mesmo modo, carece de sentido que a data a que se reporta o termo do prazo para a contagem dos juros, se reporte apenas a 31 de Dezembro de 2001, pois, se é verdade que nessa data se vencia a obrigação de pagar os 30% que visavam pagar a primeira das indemnizações consideradas, ou seja, a que tinha em vista o pagamento das benfeitorias e dos preços pagos, no que respeita aos restantes 20%, não tinham qualquer prazo de vencimento, pelo que essa parte dos pagamentos, o capital que resulta da mora do R. e da actualização dos preços vence juros até integral pagamento.

Q) Por isso, são devidas à A. as quantias reclamadas relativamente aos lotes: Lote 3 (4.346.608$00), Lote 9 (432.500$00), Lote 24 (13.976$00), Lote 32 (24.931$00), Lote 64 (77.674$00), Lote 65 (28.648$00), Lotes 7 e 8 (309.894$00), Lote 76 (1.253.787$00), Lote 76A (3.418.460).

R) Deve ainda ser condenado o R. Município a pagar ao A. mais a quantia de 17.149.167$00, pelos lotes 3A e 109 a 122 e as quantias de 265.107$20 pelo atraso dos pagamentos relativos aos Lotes 85L e 85R e 16.670$00 pelo atraso dos pagamentos relativos ao Lote 47.

S) A estas quantias acrescem as quantias já reconhecidas na sentença, ou seja, 203.767$10 relativamente ao Lote 63, 101.020$50 relativamente aos lotes 851 e 853, 22.651.479$00 relativamente aos Lotes 109 a 122, conforme consta dos pontos 2.2.14, alíneas b) e e) e 2.2.3.1, al. b) da sentença.

T) Não há lugar a serem devolvidas quantias recebidas pagas pelos recebimentos dos lotes 3 e 24, pois essas quantias foram emitidas ao abrigo do acordo de transacção que as partes celebraram e que consta dos autos 254/98 e eram devidas sempre que o R. Município negociasse e recebesse quantias resultantes da venda de qualquer dos lotes devolvidos, vencer-se-ia imediatamente uma prestação de valor equivalente a 20% do valor real da transacção, quantia essa que o terceiro contratante com o R. Município iria entregar à A. quer as quantias fossem entregues a título de sinal, quer a título de preço definitivo, na data da escritura.

U) Sempre foi este o entendimento das partes, a sua prática e é a interpretação que resulta claramente nos termos do art°. 238.° do Cod. Civil, pelo que não têm que ser devolvidas as quantias reclamadas em reconvenção, por não haver fundamento legal para essa devolução.

V) Não existe, aliás, qualquer facto provado que demonstre a intenção com que o R. Município fez o pagamento, pelo que tem de ser revogada a sentença recorrida na parte em que julgou procedente a reconvenção.

X) A sentença recorrida é toda ela um exemplo de precipitação, sendo manifesto que foi elaborada sem o devido cuidado e ponderação, como o prova o facto de sem quaisquer dados ou factos ou até documentos que afirmem que das quantias pagas por força de contratos-promessa não devessem ser entregues à A. as percentagens a que tinha direito, interpretou assim a transacção.

Y) Existe, porém, a prática do R. Município aceite pela A. de que as quantias deviam ser entregues sempre e logo que recebidas, quer em escritura pública, quer em contrato promessa e a sentença recorrida precipitadamente não atentou na prática das partes.

X) A má vontade contra a A. era tal que, depois de reconhecer créditos da A. sobre o R., no valor de 22.956.266$00 e juros, nos pontos 2.2.14, alíneas b) e c) e 2.2.3.1, al. b) da sentença, na conclusão final refere que o crédito da A. é apenas de 736.901$00 (3.675,75 Euros), mas não deixou de reconhecer sem ponderar o pedido de devolução formulado pela R.

Y) Aceita, por fim, uma compensação, sem que sejam considerados provados quaisquer factos que a permitam, nomeadamente qualquer crédito do R. sobre a A., como facilmente se constata do elenco dos factos dados como provados pela sentença recorrida, para se poder concluir que não existe qualquer suporte fáctico para a compensação declarada.

Z) Termos em que, por erro de interpretação e aplicação da transacção celebrada entre as partes na Acção ordinária 254/98, com violação do art.° 238.° do Cod. Civil e porque contrária à vontade e à prática das partes, não pode sufragar-se o entendimento propugnado pela sentença recorrida, que contém erros graves, pelo que a mesma deve ser revogada e substituída por outra decisão, que julgue a acção procedente, como é de lei e de JUSTIÇA!

O recorrido, B..., contra-alegou, tendo defendido a manutenção da sentença recorrida.
O relator a quem foi distribuído o recurso proferiu a fls. 588 o seguinte despacho:
«Nos termos do disposto no art.º 690.º, n.º 1 do CPC “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual concluirá, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.”
“Verifica-se que a apelante nas suas doutas alegações formula 27 conclusões, em grande parte reprodutoras da sua alegação de recurso, não tendo sido sintética na sua apresentação.
Assim, notifique-se tal recorrente para, em dez dias, vir apresentar as suas conclusões sintetizadas, sob pena de não se conhecer do recurso (art.º 690.º, n.º 4, do CPC).”
Na sequência de tal despacho veio a recorrente, ora reclamante, “apresentar conclusões mais sucintas das suas alegações”, as quais constam de fls. 597 a 599.
O recorrido, B..., tendo sido notificado da apresentação de tais conclusões, veio referir que a recorrente não terá dado cumprimento ao determinado por este Tribunal, pois que ao invés de sintetizar as suas conclusões limitou-se “a concentrar em algumas alíneas das novas conclusões aquilo que já constava das anteriores conclusões das respectivas alegações”, entendendo por isso que por força do disposto no art.º 690.º, n.º 4, do CPC, não deveria conhecer-se do recurso.
Por despacho de fls. 608-610, entendeu-se assistir razão ao recorrido, tendo-se referido na parte fundamentadora e decisória o seguinte:
“…
“Cumpre decidir.
“O despacho de fls. 588, determinou efectivamente que a apelante sintetizasse as suas conclusões de recurso, pois que as mesmas reproduzem na quase totalidade (com excepção de escassas linhas) o teor das alegações que apresentara.
“Ora, como se refere no douto acórdão do S.T.J. de 10/07/1996 (in, www.dgsi.pt) “A lei (art.º 690.º do CPC) não exige a formulação de conclusões por exigir, por formalidade puramente burocrática.
“Com essa exigência, visou a lei proporcionar, antes de mais, ao Tribunal uma mais fácil e rápida apreensão dos fundamentos do recurso – clarificando o debate e propiciando um exercício mais perfeito do princípio do contraditório.
Ao empregar o verbo concluir, depois de dizer que o recorrente deve apresentar a sua alegação - onde a tese por ele defendida será exposta, explicada e desenvolvida na sua motivação de facto e de direito - o artigo 690.º n.º 1 do Código de Processo Civil pretende, sem dúvida, com vista à finalidade acima exposta, a enunciação sintética dos fundamentos invocados. Não pode, por isso, o recorrente vazar nas conclusões os pormenores argumentativos próprios da alegação.
“Nas conclusões comportar-se-á apenas o essencial - devendo, porém, individualizar todas as questões que compõem o objecto do recurso (cfr. n. 3 do artigo 684.º do Código de Processo Civil).”
“O despacho de fls. 588 não foi objecto de reclamação para a conferência, tendo transitado em julgado.
“A apelante, na sequência do indicado convite para apresentação sintetizada das suas conclusões, veio juntar aos autos, 18 conclusões.
“Sucede porém que essas 18 conclusões, como muito bem detectou o apelado, mais não são do que a reprodução praticamente total das iniciais 27, apenas concentradas em menor número de alíneas.
“Efectivamente as inicias alíneas A), B) e C), deram origem à alínea A) das novas conclusões, com o mesmo conteúdo daquelas;
- as alíneas E) e H), deram origem à nova alínea D);
- as alíneas F) e G), deram origem à nova alínea C);
- as alíneas I) e J), deram origem à nova alínea E);
- as alíneas L), M) e N), deram origem à nova alínea G);
- as alíneas U) e V), deram origem à alínea N);
“Sendo que estas novas tinham o mesmo conteúdo das iniciais.
“Por seu turno as iniciais alíneas D), K), O), P), Q), R), S), T), X), X)(o segundo que surge, certamente por lapso), Y) (o segundo que surge, certamente por lapso) e Z), deram origem, respectivamente, ás novas alíneas B), F), H), I), J), K), L), M), O), P), Q) e R), com o mesmo conteúdo daquelas.
“Verifica-se assim que apenas foi suprimida uma alínea (a Y – o primeiro que surge, pois que como dissemos foram indicados dois), a qual tem a expressão de apenas três linhas.
“Daqui se conclui que a apelante não deu efectivo cumprimento ao convite que lhe foi feito, tendo-se limitado a dar nova elencagem às conclusões que inicialmente tinha apresentado, sendo certo que tal conduta se nos afigura pouco consentânea com o espírito de cooperação e lealdade processuais que é desejável que exista entre todos os intervenientes processuais.
“A postura exibida pela apelante traduz-se, na prática, no não cumprimento do despacho que a convidava a apresentar as conclusões sintetizadas (sendo por isso equiparável à não apresentação tout court das mesmas), pois que na realidade não o fez, sendo que se lhe deve aplicar a cominação que expressamente lhe foi indicada – não recebimento do recurso.
“No mesmo sentido se decidiu no acórdão do STJ de 04/02/93 (in, www.dgsi.pt): “Transitado em julgado o despacho que convida o recorrente a apresentar novas conclusões por se considerar que as primeiras não correspondem às determinações legais; se, no essencial, se repetirem as anteriores conclusões, tal procedimento conduz à improcedência do pedido.”
“Desta forma, face a todo o exposto e à luz do estatuído no art.º 690.º, n.º 4 do C.P.C., não se conhece do recurso.”

Inconformada com este despacho, veio a recorrente requerer que sobre tal questão – não conhecimento do recurso – recaia acórdão, tendo sustentado a inconstitucionalidade quer da decisão proferida, quer do art.º 690.º, n.º 4 do CPC, quer ainda a circunstância de, na sua óptica, todas as conclusões que terá apresentado respeitarem a questões que o Tribunal teria necessariamente que conhecer, não sendo por isso excessivas.
Dada a natureza da questão suscitada que implicará o seu conhecimento imediato, foi o processo aos vistos.
Os factos provados inerentes a esta questão do conhecimento, ou não, do recurso, são os constantes do relatório.
Cumpre apreciar.

Entendemos ser de perfilhar a tese defendida no despacho proferido pelo relator (aqui dando por reproduzidos os fundamentos aí exarados, bem como as referências jurisprudenciais aí indicadas), pois que na sequência do por si anteriormente lavrado, em que convidava a recorrente a sintetizar as suas conclusões de recurso (as quais revelavam-se extensas, pois que foram formuladas 27 conclusões, em grande parte reprodutoras da alegação de recurso), veio aquela apresentar “… 18 conclusões… (que) mais não são do que a reprodução praticamente total das iniciais 27, apenas concentradas em menor número de alíneas”.
Tal situação traduz-se, como também se referiu no despacho objecto de reclamação para a conferência, “… no não cumprimento do despacho que a convidava a apresentar as conclusões sintetizadas (sendo por isso equiparável à não apresentação tout court das mesmas), pois que na realidade não o fez, sendo que se lhe deve aplicar a cominação que expressamente lhe foi indicada – não recebimento do recurso.”
Em tal despacho aludia-se quer ao acórdão do STJ de 10/07/1996 (in www.dgsi.pt) – que nos dava a noção de “conclusões”, confrontando-a e diferenciando-a da “alegação” - quer ao acórdão do mesmo Tribunal de 04/02/93 (in www.dgsi.pt) - que considerava que tendo havido uma repetição genérica das conclusões a que tinha sido formulado convite para a sua sintetização, não deveria o recurso ser recebido -, sendo certo que consideramos que os dois expressam o melhor entendimento a ter sobre a questão em apreço. Será ainda de acrescentar a esses dois arestos jurisprudenciais, o acórdão da Relação de Lisboa de 16/02/2000 (in www.dgsi.pt) onde se defende que a repetição nas conclusões do expendido na alegação desvirtua o sentido daquelas, na medida em que as mesmas “… são proposições sintéticas que emanam do que se expôs e considerou ao longo das alegações.”
Consideramos pois que a recorrente, na sequência da notificação que lhe foi feita para sintetizar as suas conclusões, ao ter apresentado 18 conclusões que mais não são do que a reprodução praticamente total das iniciais 27, apenas concentradas em menor número de alíneas, actuou como se não tivesse dado cumprimento a tal despacho e, nessa medida, tendo sido advertida para as consequências do não cumprimento do mesmo – não recebimento do recurso – deve ser alvo dessa mesma cominação.
Adiante-se ainda que as alegadas inconstitucionalidades da decisão (que aliás a reclamante não especifica em que se traduz, não indicando qual a norma constitucional que terá sido violada) e do art.º 690.º, n.º 4 do CPC, quanto a nós não se verificam.
Com efeito, é do nosso conhecimento que alguma jurisprudência constitucional (vd. os acórdãos 275/99 e 532/2001, in www.tribunalconstitucional.pt ) tem entendido que o artigo 690º, nº 3, (na redacção anterior à resultante dos Decretos-Leis nºs 329/A-95 e 180/96, subsidiariamente aplicável em processo penal ainda regido pelo Código de 1929), será inconstitucional quando para efeito de decidir se certa alegação não contém conclusões – o que implica o não conhecimento do recurso – ela é interpretada em termos de considerar relevante um critério baseado exclusivamente no número das conclusões formuladas ou das páginas por elas ocupadas. Ora sucede que não foi com base num critério baseado exclusivamente no número das conclusões ou do número de páginas por elas ocupadas que se determinou a sintetização das mesmas.
Com efeito, o que esteve na base do convite para a sintetização das mesmas, foi o facto das mesmas reproduzirem em grande parte a alegação fundamentadora do recurso e não sintetizarem tal alegação, situação que é bem diversa da que esteve na origem daquele juízo de inconstitucionalidade.
Por outro lado, há também que não olvidar que um outro acórdão desse mesmo Tribunal Constitucional (n.º 40/2000, in www.tribunalconstitucional.pt) referiu expressamente que o artigo 690º, nº 3 na redacção anterior ao Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, não era inconstitucional quando interpretado no sentido de que uma vez convidado o recorrente, ao abrigo daquele nº 3, a formular e apresentar alegações (que não existiam), se as mesmas, quando apresentadas, não cumprirem integralmente os requisitos de completude, clareza e concisão ali exigidos, haverá desde logo lugar à rejeição do recurso, sem que seja necessário previamente efectuar um segundo convite ao recorrente, desta vez destinado ao aperfeiçoamento das conclusões que apresentou.
Pelo que se deixa exposto há pois que concluir não se verificar no caso, qualquer situação de inconstitucionalidade.
Diz ainda a reclamante que as conclusões que apresentou eram as necessárias para que o tribunal pudesse apreciar todas as questões que se mostravam em causa.
Paradoxalmente, é a própria reclamante que ao fazer referência a tal circunstancialismo, acaba reduzindo substancialmente as conclusões, fazendo o trabalho de síntese que anteriormente lhe tinha sido solicitado.
Com efeito, fá-lo, ao referir:
- “As conclusões A) a F), são absolutamente necessárias para que o Tribunal da Relação conheça da questão prévia da interpretação das cláusulas do contrato de transacção celebrado”, sendo que tal interpretação se prenderá com duas obrigações de indemnizar: por benfeitorias e por lucros cessantes.
- “A conclusão G) é relativa à alteração da matéria de facto, mais concretamente à alteração da resposta ao quesito 3.º”
- “As conclusões seguintes dizem respeito à questão da relevância dos contratos promessa – conclusão H) e da data a que se deve atender para o cálculo dos juros – conclusão I)”. Seguindo-se uma descriminação de valores que não faz sentido em sede de conclusões, dado não se tratarem de proposições sintéticas que emanam do que se expôs e considerou ao longo das alegações.
- “As conclusões M) e N) dizem respeito ao pedido reconvencional… indicando-se as razões por que o mesmo não deve proceder.”
- “Por fim, as conclusões O) a R), referem os vícios que são imputados à sentença recorrida, fundamentando a razão pela qual a mesma deve ser revogada”.
Daqui se retira que pese embora nem toda a elencagem ora reproduzida devesse constar como conclusão da alegação do recurso, pois que nem toda ela sintetiza o teor da fundamentação alegada, o que é facto é que da mesma extraem-se verdadeiras questões a serem objecto de apreciação no âmbito do recurso, tais como a interpretação das cláusulas do contrato de transacção; a obrigação de indemnizar por benfeitorias e lucros cessantes; a alteração da resposta ao quesito 3.º da base instrutória; a relevância dos contratos promessa celebrados; o cálculo dos juros e a improcedência do pedido reconvencional.
Os fundamentos inerentes a cada uma destas questões seriam encontrados logicamente na alegação de recurso, não havendo a necessidade (nem a possibilidade legal) de o fazer nas conclusões, como foi feito no caso dos autos.
Temos pois que concluir que não assiste razão à recorrente nesta reclamação, sendo pois de manter o despacho que à luz do estatuído no art.º 690.º, n.º 4 do C.P.C., decidiu não ser de conhecer o recurso.

DECISÃO

Desta forma, face a tudo o que se deixa dito, acorda-se em negar provimento à reclamação deduzida, assim se mantendo o despacho reclamado, o que implica que não se conheça do recurso, nos termos do disposto no art.º 690.º, n.º 4 do CPC, por a recorrente não ter sintetizado as suas conclusões.

Custas pela reclamante.

Coimbra,