Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1434/21.2T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CRISTINA NEVES
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
OMISSÃO DA INDICAÇÃO DOS PONTOS DE FACTO QUE SE PRETENDE VER REAPRECIADOS E RESPOSTA QUE LHES DEVERIA SER DADA
REJEIÇÃO DO RECURSO DE FACTO
Data do Acordão: 05/02/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO LOCAL CÍVEL DE POMBAL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 639.º, 1; 640.º, 1 E 644.º, 2, D), DO CPC
Sumário: I- Pretendendo o recorrente impugnar a matéria de facto, objecto de decisão pelo tribunal a quo, deve cumprir os ónus primários e secundários, constantes dos nºs 1 e 2, respectivamente, do artº 640 do C.P.C., indicando nas respectivas conclusões os pontos de facto que pretende ver reapreciados e a concreta resposta que lhes haveria de ser dada.
II- Não cumprindo com este ónus, por não constar das conclusões os factos impugnados e a respectiva resposta, não é esta omissão passível de despacho de aperfeiçoamento, por não contido no âmbito do disposto no artº 639, nº3, do C.P.C., impondo-se a rejeição do conhecimento da impugnação na parte viciada.
Decisão Texto Integral:
Proc. Nº 1434/21....- Apelação
Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Juízo Local Cível ...-
J1.  
Recorrente: AA
Recorridos: BB e CC
Juiz Desembargador Relator: Cristina Neves
Juízes Desembargadores Adjuntos: Teresa Albuquerque
                                                              Falcão de Magalhães
 
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Apelações em processo comum e especial (2013)
ACORDAM OS JUÍZES NA 3ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA:
 
 
RELATÓRIO
AA, intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB e CC, pedindo a condenação dos Réus no reconhecimento de que a parcela por si identificada na petição inicial, em que se inclui a churrasqueira e o furo artesiano, faz parte integrante do prédio urbano identificado no art.º 1.º daquele articulado, assim como na restituição de tal parcela, livre e devoluta, na demolição do muro por eles construído e na condenação no pagamento da quantia de 1.500 € a título de indemnização por danos patrimoniais e morais, para além da condenação dos Réus no pagamento do montante de 100 € a título de “cláusula penal compulsória” por cada dia de atraso na restituição da parcela.
Para tanto, alega, em síntese, ser dono de um prédio urbano, com a área de 997 m2, sito na freguesia ..., que confronta do seu lado poente com um prédio urbano dos Réus, tendo-o adquirido por proposta em carta fechada no âmbito de um processo executivo que correu termos no Juízo de Execução .... Aduziu ainda que o seu arrogado prédio foi construído em 1995 por DD e EE, após compra por estes de um prédio urbano e de um prédio rústico a FF, assim como após a compra pelos Réus de um prédio urbano ao mesmo vendedor, prédios que constituíram no passado uma realidade predial única, tendo DD, EE e os Réus acordado na divisão do mesmo de modo a que pudessem construir no local as respectivas habitações, tendo o projecto de arquitectura e de implementação sido apresentado na Câmara Municipal ... em consequência desse acordo e posteriormente sido aprovado com os limites aí assinalados. 
Alegou também que DD e EE construíram um anexo/churrasqueira e mandaram fazer um furo dentro da linha delimitadora do seu prédio, tendo passado a habitar a moradia aí construída, sendo que os Réus procederam à demolição do muro que separava os dois prédios urbanos e que havia sido edificado por
Apelações em processo comum e especial (2013)
DD, no sentido sul/norte, em cerca de 6 metros de comprimento, tendo construído um novo muro, colocado marcos e cordel, avançando 1,20 metros para o seu arrogado prédio, tendo-se apropriado os Réus de cerca de 248 m2 do prédio do A., impedindo-o de usar a churrasqueira e o furo, assim como de ajardinar e cultivar o terreno e aceder ao mesmo pela via pública, através do portão situado a norte.
Mais alega que por via dessa situação sofreu privações do sono e alterações anímicas. *
Válida e regularmente citados, apresentaram os Réus BB e CC a sua contestação e deduziram reconvenção, impugnando a matéria de facto alegada pela contraparte relativamente à extensão e composição do prédio de que o Autor se arroga dono, sustentando que este age em abuso de direito ao peticionar a respectiva condenação no pagamento de quantia indemnizatória. 
Em reconvenção alegaram, em suma, que por escritura pública de compra e venda de 7 de Agosto de 1992, adquiriram um prédio urbano e um prédio rústico a GG com as áreas de 572 m2 e 880 m2, respectivamente, tendo naquele primeiro prédio edificado uma moradia e aquele último perdido área em função do alargamento de uma rua, como também ocorreu com o prédio rústico do antecessor do Autor, detendo actualmente o seu prédio e logradouro uma área de cerca de 1.100 m2, tendo a configuração geométrica dos prédios sido igualmente alterada, sendo que apesar de a churrasqueira, o furo, o empedrado e o portão de acesso aos prédios ter sido construído pelo antecessor do Autor, foram os próprios a custear tais construções. 
Mais alegam que desde a construção da sua moradia e anexos, em 1995, têm vindo a suportar o custo da reparação e manutenção do furo, usufruindo desde 2003 da água aí captada, têm vindo a fazer churrascos na churrasqueira, têm vindo a usar a zona afecta à circulação pedonal, a cuidar do jardim e a manter uma pequena horta com o cultivo de produtos agrícolas, o que têm feito à vista de todos, sem oposição, de forma pacífica e continuadamente, sem interrupção, tendo adquirido por usucapião a faixa de terreno com a área de cerca de 240 m2 a 250 m2 identificada na reconvenção, tendo as benfeitorias por si feitas no imóvel um valor superior ao solo onde foram inicialmente implantadas. 
Apelações em processo comum e especial (2013)
Sustentam também que sobre o muro que delimita os imóveis das partes foi edificado, contra a sua vontade, um muro em blocos, no sentido sul/norte, que provoca danos ao funcionamento do portão de acesso às garagens e cave do prédio que lhes pertence. 
Concluem peticionando a condenação do Autor-reconvindo no reconhecimento de que a faixa de terreno identificada na reconvenção é de sua propriedade, por ter sido adquirida por usucapião, na condenação do Autor-reconvindo no reconhecimento de que o muro de sul/norte está edificado sobre muro comum e que provoca danos no funcionamento de um portão, devendo ser demolido, e no reconhecimento de que os prédios de que são donos não confinam com a via pública nas áreas que deviam confinar e que parte do seu terreno foi indevidamente ocupado pela construção do Autor-reconvindo, com a entrega de “área equivalente na parte posterior dos prédios”  ou, subsidiariamente,  no reconhecimento da aquisição do imóvel por acessão. 

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O Autor apresentou a sua réplica, tendo contraditado o abuso de direito que lhe era assacado e alegado que Réus-reconvintes litigam de má fé, invocando ainda a aquisição do direito de propriedade sobre o seu imóvel por usucapião e impugnado a matéria de facto invocada pela contraparte na reconvenção, concluindo pela improcedência desta. 

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Por decisão de 2 de Novembro de 2021 (constante de fls. 109 a 111 dos autos), foi julgado procedente o incidente de verificação do valor da causa, tendo sido fixado à causa o valor de 25.500 € e, em consequência, julgado o Juízo Central Cível ... incompetente em razão do valor, tendo sido determinada a remessa da presente acção para este Tribunal.  *
O Autor apresentou petição inicial aperfeiçoada, no seguimento de despacho de convite ao aperfeiçoamento de tal articulado, com vista ao suprimento das imprecisões na exposição da matéria de facto atinente à extensão do arrogado prédio do Autor e à cadeia das sucessivas aquisições dos seus antecessores até à aquisição desse prédio por via originária. 

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Apelações em processo comum e especial (2013)
Foi proferido despacho saneador, no qual foi afirmada a validade e a regularidade da instância, admitindo-se a reconvenção dos Réus quanto aos pedidos formulados sob os pontos i), ii) e último parágrafo referente à acessão industrial imobiliária. 

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Foram proferidos despachos a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova.

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Realizada audiência de discussão e julgamento foram a acção e a reconvenção julgadas improcedentes, absolvendo-se RR. e A. dos pedidos formulados. 
 

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Não conformado com esta decisão, veio o A. interpor recurso, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:
“1º O R fez entrada de uma petição que é dono e legitimo proprietário, de um prédio urbano, área de 997 m2, numero 5315º da matriz do ..., que confronta do norte, sul e nascente com caminho, e a poente com BB, sito em ..., com valor patrimonial de 112.260,00€, descrito na CRP ... sob o nº ...84. 
2º Que os RR são donos e legítimos proprietários, de um prédio urbano, com a área 572 m2, número 5316º da matriz do ..., que confronta do norte e do sul com caminho, e nascente com AA, e a poente com A..., sito em ..., descrito na CRP ... sob o nº ...83. 
3º O R adquiriu este imóvel pelo valor de 122.000,00€, nos autos executivos de processo nº 346/14...., TJC ... e havia sido construído por DD e mulher EE, no ano de 1995. 
4º Este prédio foi construído e licenciado com o prédio dos RR, através de projetos de construção aprovados pela CM de ... e ao qual foi atribuído o nº ...2 e ...2. 5º Os RR fizeram um projeto global com os antepossuidores do R, decidindo comprar os imóveis rústicos e urbanos sobre os quais iriam ser feitas as edificações das moradias, recebendo igual desenho arquitetónico. 
Apelações em processo comum e especial (2013)
6º O DD e mulher compraram um prédio urbano em ..., composto de casa de habitação, com superfície coberta de 84m2, descoberta de 115m2, e terreno anexo com 400 m2, a confrontar de Norte e sul com Caminho, e no nascente e poente HH, matriz 107º da freguesia ... e um prédio rustico também em ..., terra de cultura com oliveiras, com a área de 600m2, a confrontar de N/S com estrada e do poente com II, matriz do ... sob o artigo ...18º 
7º Os RR compraram o imóvel Urbano, em ..., casa de habitação, com superfície coberta de 72m2, e terreno anexo com 500 m2, a confrontar de Norte e Sul com Caminho, do nascente com JJ e do Poente com KK, matriz 106º do .... 
8º Os três prédios, suprarreferidos, perfaziam uma unidade única e física continua e como o terreno na sua totalidade possuía mais de 2.000 m2 de área, apesar de registados só estarem
1.771 m2.
9º A EE e o DD dividiram o terreno com os RR para permitir a construção das duas habitações familiares, sendo que apesar do prédio que os RR compraram ter a área de 572 m2, afinal vieram a ficar com muito mais área, área esta próxima da área com que ficou a EE e o DD. 
10º Acordada a divisão do terreno e implantação dos dois imoveis, urbanos a construir, foi submetida a CM de ... o mapa de arquitetura. 
11º O R procedeu a um novo levantamento topográfico, conforme o projeto aprovado na Camara, identificando os dois imoveis na sua implantação, letra A, a implantação do imóvel dos RR, sob a letra B a implantação do imóvel da EE e do DD, atualmente do R, e os números 1, 2 e 3 que transmitem a linha divisória dos respetivos imoveis no terreno. 
12º E ainda, assinalado a sombreado preto a faixa de terreno com que os RR ilicitamente esbulharam do prédio do A. 
13º Os projetos e respetivos desenhos arquitetónicos foram elaborados no mesmo gabinete de arquitetura B..., sendo-lhes atribuído os números nº 910/92 e 909/92. 
14º Nos meses de março e abril de 95 foram entregues as telas finais, respectivamente, tendo os processos de construção vindo a ser aprovados em 12/05/1995, mas dentro da linha
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delimitadora do imóvel do DD e que já constava do projeto de alterações, e identificado pela letra C, aqueles procederam a edificação de um anexo/churrasqueira, e dentro do mesmo mandaram fazer um furo artesiano. 
15º A EE e o DD passaram a habita-la com licença de utilização emitida a 13/07/1995, com o alvará de licença de utilização para habitação com o nº119/95. 
16º Os projetos que deram entrada na CM de ..., elaborados pelo mesmo gabinete, na sua implantação e a delimitação, não suscitam quaisquer dúvidas em relação ao acordado entre o BB (RR) e o DD. 
17º Os RR no ano de 2004, em má fé e abuso de direito através ação declarativa, processo nº 1820/04...., pediram a demarcação e reivindicação de área á custa da subtração de área no imóvel da EE, ora propriedade do R á revelia dos acordos anteriores na demarcação ou delimitação. 
18º E ação foi votada ao insucesso, tendo os ora RR vindo a desistir da instância, mas o que os RR não conseguiram através da via judicial, decidiram passar a agressão do ora prédio do R. 19º Os RR apropriaram-se de cerca de 248 m2, conforme resulta do levantamento topográfico e devidamente assinalada na zona a sombreado e da churrasqueira e um furo artesiano que haviam sido mandados construir pelo DD. 
20º Os RR demoliram ainda um muro, no sentido Sul/Norte, que separava os dois imoveis urbanos, em cerca de 6m de comprimento e 1m de altura, mandado edificar por DD
Carreira sobre a linha divisória dos dois imoveis, 
21º Os RR contruíram um novo muro, avançando cerca de 1,20 m para o imóvel do R colocaram marcos e uma linha divisória em cordel, para a delimitação da parcela de que se pretendem apropriar. 
22º Desde os projetos de construção de obras, da moradia dos RR e da moradia do R, aqueles sempre respeitaram as implantações dos referidos imoveis, 
23º O R está desapossado da parcela identificada a sombreado pela letra ..., no documento ...5, e na qual foi edificada a churrasqueira e o furo artesiano, identificados sob a letra C, do mesmo documento e está impedido de utilizar a sua parcela de terreno, podendo-lhe dar o uso que bem entender designadamente ajardina-la ou cultiva-la. 
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24º Está impedido igualmente de usar churrasqueira e a água do furo artesiano de sua propriedade e imedido de aceder à via publica pelo portão pedonal a Norte, comum aos dois imoveis, 
25º Os R tem vindo a ter privações de sono, alterações anímicas uma vez que as expectativas do uso e habitação do bem que se propôs comprar estão a ser limitadas e impostas por aqueles
26º O R para reconstrução do muro destruído pelos RR computa o valor global de 1.000,00€ e pelos de danos morais reclama o valor de 500,00€. 
27º A legitimidade do R para esta acção não lhe advém apenas da aquisição translativa de propriedade, porque sucedeu na posse a DD e sua ex-mulher que o possuíram ate que ele fosse vendido em leilão electrónico. 
28º Desde a entrada dos projetos o DD e a EE têm vindo a possuir a parcela de terreno aonde implantaram o seu imóvel urbano, tendo sucedido na posse a GG que lhes vendeu o terreno.
29º Desde essa data passaram a limpar os terrenos cortando vegetação, edificando o seu imóvel de habitação, passando nele a habitar, praticando todos estes factos dentro dos limites do seu terreno conforme o levantamento topográfico para edificação do seu imóvel urbano, em conjunto com o imóvel dos RR. 
30º Ano após ano, sem qualquer intervalo de tempo, á vista de toda a gente, sem violência e oposição de terceiros e com a convicção que eram donos e que não lesavam interesses de ninguém o DD e a mulher também usucapiram em relação ao seu imóvel, sendo que o R, agora lhes sucedeu na posse.
31º O R tem o seu prédio devidamente registado e também goza da presunção de propriedade pelo registo de aquisição e a atuação dos RR é em abuso de por oposto ao que haviam acordado. 
32º O R dirigiu-se aos anteriores proprietários DD e mulher, questionando-os sobre a delimitação e implantação do seu imóvel. 
33º O DD disse-lhe que as linhas delimitadoras dos dois imoveis são as constantes do levantamento topográfico que deu entrada na CM de ... tendo em vista a aprovação dos dois projetos que vieram a ser aprovados. 
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34º A churrasqueira e o furo foi o DD que mandou fazer e suportou as respectiva despesas tendo destinado ao abastecimento de água à sua moradia e encontrando-se dentro do seu logradouro, assim como o passeio em calçada à antiga portuguesa, separador dos dois imoveis, por si mandado edificar, tendo suportado os respetivos custos. 
35º O R consultou o processo judicial, os projetos de construção na CM de ..., e verificou que nenhuma razão assistia aos RR para se terem apoderado da sua parcela de terreno da churrasqueira e furo artesiano, na mesma edificados e procedido à demolição do muro separador das propriedades. 
36º O R instou os RR a reporem o muro que demoliram e a procederem à restituição da parcela que vêm ocupando assim como a churrasqueira e o furo artesiano na mesma incorporado, respeitando a linha demarcadora dos dois imoveis. 
37º Os RR negam a pretensão do R com alegação de que aquela parcela constitui um prédio rustico que adquiriram, sendo isto surreal, porque os prédios rústicos desapareceram com a implantação e aprovação dos dois imoveis urbanos. 
38º O DD e RR erraram na participação do imoveis urbanos às finanças porquanto estes deveriam ter uma área correspondente aos rústicos nos quais foram edificados e deveriam ter pedido a eliminação destes. 
39º Os RR contestaram e deduziram pedido reconvencional alegando que a 7 de agosto de 1992, adquiriram um prédio urbano e um prédio rústico a GG com as áreas de 572 e 880 m2 respectivamente tendo naquele primeiro prédio edificado uma moradia. 
40º Que aquele último perdeu área em função do alargamento de uma rua como também, ocorreu com o prédio do antecessor do autor, detendo atualmente o seu prédio e logradoiro com a área de 1.100 metros quadrados tendo a configuração geométrica do prédio sido igualmente alterada. 
41º A churrasqueira, o furo, o empedrado e o portão de acesso apesar de terem ter sido construídos pelo antecessor do R, foram os próprios a custear tais construções. 
42º Dizem os RR que já adquiriram por usucapião a churrasqueira, o furo e a faixa de terreno com cerca de 240m2 a 250m2 identificadas na reconvenção tendo as benfeitorias por si feitas no imóvel um valor superior ao solo aonde foram implantadas, terminando pela
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improcedência da acção e pela procedência do seu pedido reconvencional no sentido de lhes ser reconhecido o direito de propriedade sobre a parcela de que se apossaram, do furo e da churrasqueira. 
43º Foi apresentada a respectiva replica e elaborado o saneador e fixados os temas de prova a saber: 
. Dos termos em que foram adquiridos os imoveis de Autor e Réus descritos na petição inicial; 
. da configuração do prédio do Autor e Réus quanto a sua aquisição; 
. Do acordo alcançado entre os anteproprietários do prédio do Autor e os Réus quanto á divisão dos terrenos adquiridos; 
. Do exercício de poderes de facto do autor e antepossuidores do prédio, sobre a parcela de terreno em disputa, assim como dos réus; 
. Do período de tempo em que tais poderes de facto foram exercidos; 
. Das características de tais poderes de facto; 
. Da ocupação dessa parcela pelos Réus e a sua não utilização pelos autores; 
. Da construção da churrasqueira e furo de água na parcela do terreno em disputa; 
. Da demolição do muro delimitador dos prédios de Autor e Réus e da construção de um novo muro; 
. Dos danos patrimoniais e não patrimoniais; 
. Da ilicitude do comportamento dos Réus; 
. Da culpa dos Réus; 
. Do nexo de causalidade entre factos praticados pelos Réus e os danos sofridos pelo Autor. 44º Foi efetuada a audiência de julgamento, foi proferida a decisão final, na qual o Mº Juiz julga a acção totalmente improcedente absolve os RR de litigância de má fé, assim como improcedente o pedido reconvencional. 
45º O senhor juiz, fundamenta esta decisão com considerações legais, doutrinais, e jurisprudenciais para concluir que o R não logrou fazer a prova que lhe competia, sendo que pese embora o apreço que temos por este distinto Senhor Juiz, “in casu”, com todo e sentido respeito, na nossa humildade, permitimo-nos não concordar. 
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46º Esta decisão vai totalmente de encontro a uma expressão ouvida e retida a um sabedor e experiente magistrado “as testemunhas podem mentir ….. os documentos não mentem”. Isto porque a filha dos RR não falou com a verdade sobre a factualidade sobre que depôs  47º Com todo o respeito, tecnicamente o senhor Juiz incorreu em três atos que se tivessem sido observados, o desfecho da decisão seria outro, designadamente: 

d) Em sede de primeira audiência, (1ª ata) como havia já marcação para segunda sessão, para ouvir as testemunhas do RR, o R ditando para a ata e requereu que a testemunha LL, não lhe era por si possível apresenta-la naquele momento fosse ouvida logo no inicio da segunda sessão, o senhor Juiz sem oposição dos RR indeferiu, cerceando a prova ao R e violando o principio do inquisitório, quando tal pedido não prejudicava a ordem dos trabalhos 

e) Foi requerido a inspeção judicial ao local, que o senhor Juiz indeferiu violando mais uma vez o princípio do inquisitório  

f) O senhor Juiz referindo que não haveria necessidade de ouvir declarações de parte, porque tal estava já nos articulados, sugeriu ou influenciou que fosse operada a desistência de tal modalidade de prova. 
48º A recusa de meios de prova limitou o exercício da prova pelo R e o Tribunal não se municiou de todos os elementos que poderia colher para efeitos de uma decisão justa.  49º O Senhor Juiz na apreciação da causa e á luz das razões da experiência comum também andou menos bem. 
50º O senhor Juiz da análise quer da prova documental quer testemunhal impunha-se outra análise critica, repare-se neste erro relevante de apreciação e conjugação da provada prova pelo senhor juiz: 
Contradições e erros de apreciação da decisão ora posta em crise: 
Factos Provados: 
Na alínea g) e h) dos factos provados é referido que atualmente o prédio inscrito sob o número ...15, do R tem a área coberta de 203,07m2 e de descoberta de 793,93m2. 
Na alínea v) e x) é referido que a casa de habitação identificada na alínea g) foi construída por DD e EE no ano de 1995, através do licenciamento 909/92. 

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Na alínea aa) DD e o Réu BB, de comum acordo, deram os projetos e respetivos desenhos arquitetónicos ao gabinete “B...”.  Nas alíneas dd) a nn) os antepossuidores do R adquirem por usucapião a propriedade do imóvel, posse titulada, de boa fé (15 anos), mandam construir o passeio em calçada empedrado, mandaram construir uma churrasqueira e furo de abastecimento de água, tudo por si custeado. 
Nas alíneas ss) a aa) a posse dos RR e precária porque em nome e consentimento dos antepossuidores do R. 
Alínea zz) 
51º Factos não provados mas que deveriam ser dados como provados: Alíneas, a), b), c), d)  52º Alíneas d) a l) poderiam ser dados como provados se não tivesse sido violado o princípio do inquisitório, por negação da audição de uma testemunha, importante porque anterior locatário do prédio do R, por negação da inspeção judicial e por limitação da tomada de declarações de parte (deficit de prova). 
53º MATÉRIA DE FACTO DADA COMO NÃO PROVADA POR ERRO NA SUA
APRECIAÇAO 
Factos das alínea a) b) c) d) e) 
54º IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO: 
– Gravação da prova 
O Senhor Juiz não valorou devidamente o depoimento da testemunha MM. Solicitadora que ajude o R nas consultas prévias, á aquisição na Camara Municipal .... A GRAVAÇÃO DA PROVA – com referência em acta - artigo 155º do CPC. Depoimento registado em CD, dia 19/09/2022 de 14:34:53h” a 15:11:45h (155º do CPC) (14:38h) “…Fui contactada pelo AA para ver se estava tudo em ordem em relação á casa que ia comprar até porque tinha de fazer empréstimo”. (14:46h) “ ..Os prédios estão delimitados entre si..(14:57h) …. (15:00h) O perito das finanças foi retificar a área de acordo com o projeto aprovado na Câmara Municipal…(15:03h)…...Fui á camara municipal ver como tinham sido aprovados os projeto e é tudo conforme o prédio do AA….até porque foi emitida licença de utilização . Critica: esta testemunha tem um depoimento absolutamente isento, esclarecedor com razão de ciência, porque se deslocou á Camara Municipal para ver
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projetos e licenciamentos dos prédios do R e dos RR e se estavam devidamente aprovados nas suas implantações. 
55º O Senhor Juiz não valorou devidamente o depoimento da testemunha DD (presta depoimento a todos factos. A GRAVAÇÃO DA PROVA – com referência em acta - artigo 155º do NCPC. Depoimento registado em CD, 19/09/2022 de 15:14:58h a 15:59:37h (155º do CPC) (15:17h) “… eu é que construi as duas casas com a minha empresa….(15:21) ele comprou um rustico e uma casa velha e eu comprei tambem um rustico e uma casa velha mas eu tinha mais área e cedi lhe área gratuitamente …(15:20h) ele pediume para lhe fazer também a casa dele…..(15:22) fiz um alinhamento em toda a volta das casas ……(15:24h) desde que lá moramos a nossa convivência sempre foi pacifica …………….(15:25) …havia uma linha delimitadora entre os dois prédios conforme o acordo e feita pelo gabinete de projetos e entrou nessas condições na camara Municipal. ( Critica: esta testemunha tem um depoimento absolutamente isento, esclarecedor com razão de ciência, porque mandou construir para si, a actual casa do R, construiu também a casa dos RR mandou fazer os dois projetos conforme o acordado com o seu cunhado, ora RR.
 56º O Senhor Juiz não valorou devidamente o depoimento da testemunha EE (presta depoimento a todos factos. A GRAVAÇÃO DA PROVA – com referência em acta - artigo 155º do NCPC. Depoimento registado em CD, 19/09/2022 de 16:00:55h a 16:32:33h (155º do CPC) (16:04) …as dua moradias ficaram prontas ao mesmo tempo….A minha irmã e o meu cunhado tinham um restaurante e só vinham ao fim de semana …. Fui a primeira a ir para lá viver16:05) …havia um portão do lado de trás …. A divisão era um passeio que estava do nosso lado (16:08) colocamos lá um gradeamento …estivemos durante 8 anos a darmo-nos bem (16:10) eu vivia na minha moradia e a minha irmã na dela… (16:13) fui para la viver em
1995 até 2003 …. O meu marido fez as duas casas, a churrasqueira e o furo … eu aluguei a casa ao senhor LL entre 2003 e 2011.
57º Factos incorrectamente julgados por não provados mas que deveriam ter sido julgados provados face à prova documental ou testemunhal.
Atenta a prova documental e testemunhal deveriam os factos constantes da alíneas al. a) b), c), d) e e) dos factos não provados, terem sido dados como provados. 
Apelações em processo comum e especial (2013)
58º MATÉRIA DE FACTO DADA NÃO PROVADA COM LIMITAÇÃO DE PROVA
Factos que deveriam ser dados como provados se a prova não tivesse sido limitada com violação do princípio do inquisitório alíneas e) a l) 
59º Repare-se senhores juízes conselheiros como pode o senhor juiz deixar de ouvir a testemunha LL que foi locatário na casa do ora R no período de 2003 a 2012.  60º Face á prova documental, com respeito não pode o senhor juiz deixar de fazer inspecção judicial para aquilatar das linhas divisórias dos dois imoveis e de acordo com projetos de licenciamento de construção e alvarás de utilização. 
61º Os RR nunca poderão reclamar de qualquer faixa de terreno depois da linha divisória dos dois prédios sem incorrerem em manifesto litigância de má fé e abuso de direito, porquanto as delimitações dos dois prédios foi realizada por acordo entre os RR e antepossuidores do prédio do R.
62º Ate 2012 estava lá o LL como arrendatário e nenhuma agressão ou invasão houve sobre os prédios do R e foi impedido de prestar depoimento 
63º O senhor Juiz não dá a sucessão na posse e propriedade ao R violando o artigo 1254º e seguintes do Código Civil 
64º Senhores juízes desembargadores qual homem razoável e bom pai de família não ficaria revoltado ver o vizinho que previamente acordou nas delimitações dos dois imoveis, vir agora ultrapassando tais linhas divisórias plantar-nos couves no nosso jardim numa área de cerca de 240m2 e ilicitamente fazer seu a churrasqueira e o furo artesiano, pelo anterior proprietário mandado construir.
65º Recurso nos termos do 640º do CPC 
Termos em que, e nos melhores de direito e com o sempre muito douto suprimento de Vossas Exª, deve ser concedido provimento, devendo este Venerando Tribunal da Relação, revogando a decisão em crise, por douto acórdão, julgue a acção totalmente procedente, porque provada e RR por abuso de direito, condenados a restituírem ao R a parcela de que indevidamente se apossaram, como da churrasqueira, do furo e pagamento de indemnização para edificação de novo muro e danos morais, nos termos peticionados. 
Devem os RR ser condenados como litigantes de má fé Porque assim Vs. Exs., farão a costumada JUSTIÇA.”
Apelações em processo comum e especial (2013)
 

*
 

QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos do disposto nos artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.
Nesta medida, as questões a decidir são:
a) Se se verificam os requisitos de admissibilidade do recurso relativamente à impugnação da matéria de facto e se esta deve ser alterada no sentido propugnado pelo recorrente;
b) Se, nessa medida deve ser julgada procedente a acção.
 

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Corridos que se mostram os vistos aos Srs. Juízes Desembargadores adjuntos, cumpre decidir.
 

*
 

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O tribunal recorrido considerou a seguinte matéria de facto como provada:
a) No dia 7 de Agosto de 1992, no Cartório Notarial ..., foi outorgada a escritura a que se reporta o documento de fls. 15 v. a 17 dos autos, com o título “compra e venda”, da

Apelações em processo comum e especial (2013)
qual consta, além do mais, que pelo primeiro outorgante GG foi declarado que “pelo preço total de um milhão e duzentos mil escudos, que já recebeu, vende ao segundo outorgante…” DD, que declarou aceitar, “…os seguintes bens, situados na dita freguesia ...: 
Primeiro: – Prédio urbano, composto de casa de habitação de rés-do-chão, com a superfície coberta de oitenta e quatro metros quadrados, dependências com cento e quinze metros quadrados e terreno anexo com quatrocentos metros quadrados, no sítio de ..., inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo número ...07 (…), pelo preço de um milhão de escudos;  e Segundo: – Prédio rústico composto de terra de cultura com oliveiras, no sítio de ..., com a área de seiscentos metros quadrados, inscrito na respectiva matriz rústica sob o artigo número ...18 (…), pelo preço de duzentos mil escudos”, estando tais prédios “descritos na Conservatória do Registo Predial ... sob os números três mil quatrocentos e oitenta e quatro e três mil oitocentos e quarenta e cinco, respectivamente”. 
b) O prédio urbano identificado em a) esteve descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...92 como prédio urbano situado em ..., freguesia ..., concelho ..., composto por casa de habitação de rés-do-chão, com a área de 84 m2 de superfície coberta, de 115 m2 de superfície descoberta e terreno anexo com a área de 400 m2, a confrontar do norte com caminho, do nascente com HH, do sul com caminho e do poente com HH, tendo estado inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...07.
c) A aquisição deste prédio esteve registada a favor de GG, mediante a respectiva apresentação n.º ...92, por “sucessão hereditária deferida em inventário por óbito de II”, abrangendo 3 prédios. 
d) A aquisição desse prédio esteve também registada a favor de DD e
EE, mediante a respectiva apresentação n.º ...92, por “compra”, abrangendo 2 prédios. 
e) Mediante a respectiva apresentação n.º ...94, foi feito um primeiro averbamento à descrição desse prédio, desta tendo passado a constar que “o prédio foi demolido e nele
Apelações em processo comum e especial (2013)
encontra-se em construção uma moradia de cave e rés do chão, destinada a habitação”, com a superfície coberta de 250 m2. 
f) Mediante a respectiva apresentação n.º ...95, foi feito um segundo averbamento à descrição desse prédio, desta tendo passado a constar a menção a urbano, “por construção”, composto de casa de habitação de cave, rés do chão e quintal, com a superfície coberta de 236 m2 e com a superfície descoberta de 363 m2. 
g) Actualmente, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o mesmo n.º ...84 um prédio urbano situado em ..., na Rua ..., freguesia ..., concelho ..., composto por casa de habitação de dois pisos e logradouro, com a área coberta de 203,07 m2 e descoberta de 793,93 m2, num total de 997 m2, estando inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...15 com base em modelo 1 do IMI n.º ...00, entregue em 25 de Agosto de 2020. 
h) A aquisição deste prédio encontra-se registada a favor do Autor AA, mediante a respectiva apresentação n.º 1006 de 2018/07/05, por “adjudicação em venda judicial” no âmbito do Processo n.º 346/14...., que correu termos no Juízo de Execução ... do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria. 
i) O prédio rústico identificado na alínea a) encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...92 como prédio rústico situado em ..., freguesia ..., concelho ..., composto por terra de cultura com oliveiras, com a área de 600 m2, a confrontar do norte com estrada, do nascente com II, do sul com estrada e do poente com II, estando inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...18. 
j) A aquisição deste prédio esteve registada a favor de GG, mediante a respectiva apresentação n.º ...92, por “sucessão hereditária, deferida em inventário por óbito de II”, abrangendo 3 prédios. 
l) A aquisição desse prédio esteve também registada a favor de DD e
EE, mediante a respectiva apresentação n.º ...92, por “compra”, abrangendo 2 prédios. 
Apelações em processo comum e especial (2013)
m) A aquisição desse prédio encontra-se registada a favor de EE, mediante a respectiva apresentação n.º ...26, por “partilha consequente a divórcio com DD”. 
n) No dia 7 de Agosto de 1992, no Cartório Notarial ..., foi outorgada a escritura a que se reporta o documento de fls. 25 a 26 dos autos, com o título “compra e venda”, da qual consta, além do mais, que pelo primeiro outorgante GG foi declarado que “pelo preço de um milhão de escudos, que já recebeu, vende ao segundo outorgante…”, o Réu BB, que declarou aceitar, “…o prédio urbano sito em ..., dita freguesia ..., composto de casa de habitação de rés-do-chão, com a superfície coberta de setenta e dois metros quadrados, terreno anexo com quinhentos metros quadrados, inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo número ...06 (…), descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...”. 
o) Este prédio esteve descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...92 como prédio urbano situado em ..., freguesia ..., concelho ..., composto por casa de habitação de rés-do-chão, com a área de 72 m2 de superfície coberta e terreno anexo com a área de 500 m2, a confrontar do norte e sul com caminho, do nascente com JJ e do poente com KK, tendo estado inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...06. 
p) A aquisição deste prédio esteve registada a favor de GG, mediante a respectiva apresentação n.º ...92, por “sucessão hereditária, deferida em inventário por óbito de II”, abrangendo 3 prédios. 
q) A aquisição desse prédio esteve também registada a favor dos Réus BB e CC, mediante a respectiva apresentação n.º ...92, por “compra”. 
r) Mediante a respectiva apresentação n.º ...93, foi feito um primeiro averbamento à descrição desse prédio, desta tendo passado a constar que “o artigo urbano ...06 foi eliminado por demolição – passando a rústico – parcela de terreno destinada a construção urbana – 572 m2, encontrando-se em construção uma moradia de cave e rés do chão” com uma superfície coberta de 236 m2. 
Apelações em processo comum e especial (2013)
s) Mediante a respectiva apresentação n.º ...95, foi feito um segundo averbamento à descrição desse prédio, desta tendo passado a constar “concluída a construção – casa de habitação de cave, rés do chão e quintal”, com a superfície coberta de 236 m2 e com a superfície descoberta de 336 m2, omissa na matriz. 
t) Actualmente, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o mesmo n.º ...17 um prédio urbano situado em ..., freguesia ..., concelho ..., composto por casa de habitação de cave, rés-do-chão e quintal, com a área coberta de 236 m2 e descoberta de 336 m2, num total de 572 m2, a confrontar do norte e sul com caminho, do nascente com DD e do poente com NN, estando inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...16. 
u) A aquisição deste prédio encontra-se registada a favor dos Réus, mediante a respectiva apresentação n.º 10 de 1992/08/17, por “compra” a GG. 
v) A casa de habitação identificada na alínea g) foi construída por DD e EE no ano de 1995. 
x) Tendo sido construída e licenciada através do projecto de construção aprovado pela Câmara Municipal ... e ao qual foi atribuído o n.º ...2. 
z) As casas a implantar por DD e pelo Réu BB receberam igual desenho arquitectónico.  aa) DD e o Réu BB, de comum acordo, deram os projectos e respectivos desenhos arquitectónicos ao gabinete “B...”, sito na Rua ..., em .... 

bb) Elaborados os respectivos projectos de construção, aos Réus foi-lhes atribuído o n.º ...2 e a DD e EE o n.º 909/92. 

cc) Em Março e Abril de 1995, foram entregues as telas finais, tendo os processos de construção sido aprovados em 12 de Maio de 1995. 

dd) Finda a edificação da moradia, DD e EE passaram a habitá-la. 

ee) Tendo ambos construído e custeado um anexo/churrasqueira e mandado fazer um furo artesiano próximo da casa de habitação identificada em g), este para abastecer de água tal moradia. 

Apelações em processo comum e especial (2013)

ff) DD mandou também edificar um passeio em calçada nesse espaço, tendo suportado os respectivos custos. 

gg) Após a escritura identificada em a), DD e EE passaram a cortar a vegetação composta de arbustos e a limpar o terreno, tendo em vista a edificação da casa mencionada na alínea g).  hh) O que fizeram com exclusão de outrem.  ii) E que repetiram posteriormente, ano após ano, sempre que entenderam e quiseram. 
jj) Sem qualquer intervalo de tempo até 2002 quanto a DD e até 2003 quanto a EE.  ll) À vista da generalidade das pessoas do lugar e imediações, inclusivamente dos Réus.  mm) Sem oposição. 

nn) Agindo DD e EE como donos dos prédios identificados nas alíneas g) e i). 

oo) Os Réus construíram um muro a nascente do prédio identificado em t), tendo aí colocado ainda marcos e uma linha divisória em cordel, no sentido nascente/poente, com o comprimento de 15 metros, sob a forma de um triângulo, com o seu lado norte com o comprimento de 17,50 metros, o seu lado sul com 15 metros e o lado poente com 15 metros. pp) Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...12 um prédio rústico situado em ..., freguesia ..., concelho ..., composto por terra de cultura com oliveiras, com a área de 880 m2, a confrontar do norte e do sul com estrada, do nascente com OO e do poente com herdeiros de PP, estando inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...19.  qq) A aquisição deste prédio encontra-se registada a favor dos Réus, mediante a respectiva apresentação n.º ... de 2001/11/11, por “compra” a GG. 

rr) O projecto para construção da casa mencionada na alínea t) foi submetido à Câmara Municipal ... e obteve o n.º de processo 646/...3 e o n.º 480/95 de licença de obras ou alvará de construção. 

ss) Desde 1995 que os Réus confeccionam refeições na área da churrasqueira identificada em ee), que depois são servidas na sala da moradia identificada em t) ou tomadas ao ar livre junto a tal churrasqueira. 

Apelações em processo comum e especial (2013)

tt) No espaço de acesso até à churrasqueira, existe uma zona afecta à circulação pedonal, que desde 1995 é usada pelos Réus e os seus convidados para acederem à churrasqueira e à zona de arrecadação adjacente a esta. 

uu) Desde 1995 que os Réus retiram água do furo ou poço mencionado em ee) para utilização nas zonas de jardim e na pequena horta que têm no logradouro do prédio identificado na alínea t). 

vv) Os factos enunciados nas alíneas ss), tt) e uu) ocorreram aos fins-de-semana, no Natal e na Páscoa até ao ano de 2000/2002 e posteriormente de modo continuado.  xx) À vista de todos. 

zz) Sem oposição até ao ano de 2004, porquanto tiveram autorização para o uso da churrasqueira, do furo e da zona de circulação pedonal por parte de DD e EE. 

aaa) Os Réus têm reparado a bomba de captação de água e as condutas de água do furo ou poço. 

bbb) E no espaço do prédio identificado em t) que não tem construção ou jardim, os Réus têm mantido uma horta na qual cultivam produtos hortícolas, nomeadamente couves que depois consomem. 


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Por sua vez, não resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa: 
a) Os prédios identificados nas alíneas a) e n) dos factos provados perfaziam uma unidade predial cujo terreno possuía na totalidade mais de 2.000 m2 de área. 
b) Tendo DD e EE acedido em dividir esse terreno com os Réus BB e CC de modo a permitirem a construção no local de duas habitações. 
c) Tendo sido em consequência desse acordo de divisão de áreas que foram submetidos na Câmara Municipal ... os mapas de arquitectura e implantação de fls. 30 e 33 dos autos. 
d) O prédio identificado na alínea g) dos factos provados tem a área de 997 m2. 
Apelações em processo comum e especial (2013)
e) O anexo/churrasqueira identificado na alínea ee) dos factos provados tem a área de 7,5 m2.
f) Os Réus procederam à demolição de um muro, no sentido sul/norte, que separava os prédios identificados nas alíneas g) e t) da matéria de facto provada, em cerca de 6 metros de comprimento e 1 metro de altura, mandado edificar por DD.
g) Com a construção mencionada na alínea oo) dos factos provados, os Réus avançaram 1,20 metros para o prédio ali identificado em g), tendo aquela construção abarcado uma área de 7,20 m2 de uma área total de cerca de 248 m2 desse prédio identificado na alínea g) dos factos provados. 
h) Aquando da adjudicação em venda judicial mencionada na alínea h) dos factos provados, o Autor AA dirigiu-se aos Réus dizendo que iria proceder à limpeza do quintal, tendo os Réus referido que a parcela de cerca de 248 m2 constituía parte do quintal do prédio identificado na alínea t) dos factos provados, que haviam adquirido no processo judicial interposto em 2004. 
i) Com a actuação dos Réus dada como provada na alínea oo), o Autor tem vindo a ter privações do sono e alterações anímicas. 
j) Para a reconstrução do muro com o comprimento de 6 metros e com a altura de 1 metro, serão necessários cerca de 60 blocos de cimento (no valor de 300 €), dois dias de mãodeobra de pedreiro e servente (no montante de 400 €), cimento e areia (no valor de 100 €), transportes e deslocações (no valor de 200 €). 
l) Os actos enunciados na alínea gg) dos factos provados foram praticados numa extensão de 997 m2. 
m)O projecto identificado na alínea rr) dos factos provados foi submetido à Câmara Municipal ... com uma área total de 1.452 m2. 
n) O projecto identificado na alínea x) dos factos provados foi submetido à Câmara Municipal ... com uma área total de 1.199 m2. 
o) Para alargamento das vias que contornam a nascente e a sul o prédio identificado em g) dos factos provados, foram cedidos mais de 250 m2. 
p) As demais áreas cedidas para a construção da rua e para o alargamento do caminho existente a poente são, pelo menos, de 60 a 70 m2. 
Apelações em processo comum e especial (2013)
q) A casa e logradouro identificados na alínea t) dos factos provados tem um total de cerca de
1.100 m2. 
r) Os Réus-reconvintes custearam a churrasqueira, o furo ou poço de captação de água e o empedrado identificados nas alíneas ee) e ff) da matéria provada. 
s) Os Réus-reconvintes são os únicos que desde 2003/2004 usufruem da água captada no furo ou poço. 
t) A parcela de terreno que abarca a churrasqueira, o furo ou poço, a zona afecta à circulação pedonal identificada na alínea tt) dos factos provados e a horta identificada na alínea bbb) dos factos provados tem uma área de cerca de 200 m2. 
u) Tendo sido os Réus-reconvintes a adquirir e a custear o portão de acesso a tal espaço. 
v) Os factos enunciados nas alíneas ss), tt) e uu) da matéria provada provados foram praticados pelos Réus-reconvintes sem oposição a partir de 2004. 
x) A churrasqueira, o furo ou poço e o empedrado afecto à circulação pedonal têm um valor superior ao solo onde se encontram implantados.”
 
***
 

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Pretende o apelante que se declare procedente a acção, com fundamento em erro na apreciação da prova, devendo ser considerados provados as alíneas, a), b), c), d) e e) da matéria de facto não provada e por violação do princípio do inquisitório, por negação da audição de uma testemunha, importante porque anterior locatário do prédio do R, por negação da inspecção judicial e por limitação da tomada de declarações de parte (deficit de prova), que poderiam conduzir à prova das alíneas e) a l) (ou d) a l) como também consta das alegações e conclusões do recorrente).
  Em primeiro lugar há que referir que do despacho que rejeita um meio de prova, cabe sempre recurso de apelação autónoma (conforme resulta do teor do artº 644, nº2 d) do C.P.C., pelo que se o recorrente não impugnou um despacho que indeferiu um meio de prova, esse despacho transitou.
Apelações em processo comum e especial (2013)
Em segundo lugar ainda que assim não fosse, o recorrente tem de explicitamente indicar o objecto do seu recurso e indicar concretamente as razões fáctico-jurídicas da sua discordância. Visando o recurso a impugnação destes despachos, se admissível essa impugnação, caberia ao recorrente delimitar o seu objecto, indicando em concreto a decisão de que recorre, o que não faz. Os recursos não se destinam a “queixas genéricas” da parte quanto aos despachos e decisões tomadas no tribunal recorrido.
Em terceiro lugar, a impugnação da matéria de facto, para ser admissível, obedece a ónus específicos previstos no artº 640 do C.P.C. 
Relativamente aos requisitos de admissibilidade do recurso quanto à reapreciação da matéria de facto pelo tribunal “ad quem”, versa o artº 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, o qual dispõe que: 
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: 
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto
impugnadas.”
Contém este preceito, no seu número 1, um ónus principal imposto ao recorrente, de delimitar o âmbito do seu recurso, indicando os pontos concretos que reputa mal julgados, os concretos meios probatórios que deveriam ser considerados para cada ponto de facto impugnado e a resposta concreta que lhes haveria de ser dada. 
Assim, “O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640º do Novo CPC.
A saber: 
- A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados;
- A especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente imponham uma solução diversa;
Apelações em processo comum e especial (2013)
- E a decisão alternativa que é pretendida.”[1] 
Para cumprimento desse ónus principal imposto ao recorrente, não basta fazer uma impugnação genérica da matéria de facto, com remissão para meios de prova igualmente genéricos e sem os delimitar em relação a cada facto. As exigências contidas neste preceito impõem que “esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos”.[2]
Ocorre que, nem na alegação, nem nas conclusões o A. cumpre este ónus principal de indicar concretamente os meios de prova que impunham uma decisão diversa.
Não basta igualmente referir passagens da gravação de testemunhas ouvidas nos autos. É necessário concluir em relação a cada facto pela pertinência desse depoimento para aqueles concretos factos. Invocada prova documental é igualmente necessário indicar e conjugar estes diferentes meios de prova, de molde a sustentar a sua impugnação.  
Como se refere no Ac. do STJ de 02/02/2022, constituem estes “ónus primários previstos nas als. a), b) e c) do (nº1 do) art. 640.º do CPC (…) indispensáveis à reapreciação pela Relação da impugnação da decisão da matéria de facto.” 
O recorrente quer na indicação do objecto do recurso, quer nas suas conclusões, tem de definir em concreto aquilo que pretende ver reapreciado, expondo as razões da sua discordância, indicando ainda os concretos factos que pretende ver modificados ou aditados, uma vez que o tribunal da relação se encontra delimitado quer pelo objecto indicado ao recurso, quer pelo âmbito das conclusões (que delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem).
Nas conclusões deve ser incluída a questão atinente à impugnação da matéria de facto, ou seja, aí deve introduzir-se, sinteticamente “os fundamentos por que pede a alteração (ou anulação) da decisão” (art. 639º nº 1), o que servirá para o recorrente afirmar que matéria de facto pretende ver reapreciada, indicando os pontos concretos que considera como
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incorrectamente julgados, face aos meios probatórios que indica nas alegações e a resposta que em seu entender lhes haveria de ser dada.
Não cumprindo as alegações e conclusões do recorrente este ónus, manifestando afinal o recorrente um inconformismo genérico e não delimitado, em relação á actuação do tribunal recorrido e à apreciação da prova, não é esta omissão passível de despacho de aperfeiçoamento.
Conforme refere Abrantes Geraldes[3], “A comparação que necessariamente tem que ser feita com o disposto no artº 639º e, além disso, a observação dos antecedentes legislativos levam-me a concluir que não existe, quanto ao recurso da decisão da matéria de facto, despacho de aperfeiçoamento. Resultado que é comprovado pelo teor do art. 652º, nº1, al. a), na medida em que limita os poderes do relator ao despacho de aperfeiçoamento “das conclusões das alegações, nos termos do nº3 do artº 639.”   
Efectivamente, pretendeu-se com este regime legal, ao possibilitar a ampliação dos poderes da relação relativamente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, a imposição de regras muito precisas, sem a observância das quais o recurso deve ser liminarmente rejeitado. 
É esta aliás jurisprudência assente no nosso STJ no sentido de que o “incumprimento de qualquer um desses ónus (primários) implica a imediata rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões.” (AC. do STJ de 02-02-2022, cit.)[4][5]
Assim sendo, por não resultar cumprido o ónus de alegação previsto no artº 640 do C.P.C., não conheço da impugnação da matéria de facto.
Baseando-se este recurso na impugnação, embora genérica da decisão de facto e não sendo elencado um único fundamento jurídico que cumprisse reapreciar, a apelação improcede in totum.
  
Apelações em processo comum e especial (2013)

***
 
DECISÃO 

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta relação, em não conhecer da impugnação da matéria de facto e em julgar improcedente o recurso interposto pelo A. ***
 
As custas do recurso fixam-se pelo A. (artº 527 nº1 do C.P.C.)
 
Coimbra 02/05/2023
 
 
 
 


[1] Ac. STJ. de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, proc. nº 861/13.3TTVIS.C1.S

[2] Ac. do STJ de 05/09/18, relator Gonçalves Rocha, proc. nº 15787/15.8T8PRT.P1.S2; no mesmo sentido vide Ac. do S.T.J. de 27/09/18, relator Sousa Lameira, proc. nº 2611/12.2TBSTS.L1.S1, todos em www.dgsi.pt.

[3] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 4ª ed., pág. 157.

[4] Neste sentido, vide ainda Ac. do STJ de 09-12-2021, proferido no proc. nº 9296/18.0T8SNT.L1.S1 - 2.ª Secção – de que foi relator Rijo Ferreira e o Ac. do STJ de 18-01-2022, proferido no proc. nº  243/18.0T8PFR.P1.S1 -
[5] .ª Secção – de que foi relatora Maria Clara Sottomayor, defendendo que “uma total omissão, nas conclusões do recurso, da referência à impugnação da matéria de facto não pode ser suprida pela circunstância de no corpo das alegações constarem alegadamente os elementos exigidos pelo art. 640.º do CPC.