Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
906/07.6TAMGR-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALICE SANTOS
Descritores: RECUSA
Data do Acordão: 06/17/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE MARINHA GRANDE – 1º J
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: INDEFERIDA
Legislação Nacional: ARTIGO 43º DO CPP
Sumário: Inexiste qualquer motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade quando o juiz apreciou já um outro processo em que as partes são idênticas, mas não o objecto ou quando há várias irregularidades e nulidades em todo o processado, que não foram objecto de apreciação.
Decisão Texto Integral: Nos autos de Processo Comum (Tribunal Singular) registados sob o nº 906/07.6TAMGR veio o assistente F…, deduzir o incidente de recusa contra a Mma Juiz do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande por entender que esta tendo presidido à audiência de julgamento no Processo nº 285/00.2TAMGR no qual o requerente também era assistente, sendo arguidos C…, L… e A…, agora testemunhas nestes autos, e tendo tais arguidos sido absolvidos, por sentença ainda não transitada em julgado, tendo sido interposto recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, seria pouco crível que a mesma fosse isenta e imparcial.
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Respondeu a Sra Juiz sustentando que não resulta dos autos qualquer facto que possa levar à sua suspeição, ou colocar em causa a sua isenção e imparcialidade no exercício das suas funções.


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Foram cumpridas as formalidades legais e o Ilustre Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de não ser concedida a requerida recusa.

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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:­

Nos termos do preceituado no art. 43°, nºs 1 e 2, do CPP, “a intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade”.

A recusa pode ser requerida pelo MP, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis (nº 3 do mesmo preceito).

Com os institutos de recusa e escusa de juiz, por suspeição, pretende-se salvaguardar a independência do Julgador.

Ora,..." É extremamente difícil definir em que consiste a independência do juiz, até por se tratar de um conceito de definição negativa, cujo âmbito é dado em forma negativa ( não estar sujeito a...) e com grande amplitude.

Porém, parece que uma das mais válidas definições foi dada pelo Prof. Castro Mendes, de que...a independência dos juizes é a situação que se verifica quando, no momento da decisão, não pesam sobre o decidente outros factores que não os juridicamente adequados a conduzir à legalidade, à justiça da mesma decisão.

Concomitantemente, o art. 4° n° 1, da LOTJ determina (na senda do estatuído n art. 216°, da CRP ) que os juizes julgam, apenas, segundo a Constituição e a Lei; a sua independência é assegurada por um órgão privativo de gestão e disciplina da magistratura judicial.

No caso vertente, a questão a analisar, é tão só de suspeição.

Entende o requerente que no processo em que figura como arguido a Sra Juiz não está a actuar com a devida isenção e imparcialidade. Sustenta que há várias irregularidades e nulidades em todo o processado, que não foram objecto de apreciação. “Constitui, por isso, nos termos da lei motivo sério e grave, gerador de desconfiança e suspeita aos olhos do cidadão médio”.

Ora, o principio norteador do instituto da suspeição é o de que a intervenção do juiz só corre o risco de ser considerada suspeita, caso ocorra motivo, sério e grave adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.

A seriedade e gravidade dos motivos causadores do sentimento de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz, só são susceptíveis de conduzir à recusa ou escusa do juiz quando objectivamente consideradas. Não basta um convencimento subjectivo por parte do Ministério Público, arguido, assistente ou parte civil ou do próprio juiz, para que tenhamos a ocorrência de suspeição.

Por outro lado, o motivo invocado tem que ser sério e grave.

A lei não define nem caracteriza a gravidade e seriedade dos motivos pelo que será a partir do senso e experiências comuns que tais circunstâncias serão apreciadas.

Ora, analisando as circunstâncias alegadas pelo requerente, a partir das quais entende existir motivo gerador de desconfiança sobre a imparcialidade da Sra Juiz, dir-se-á que as mesmas não permitem concluir estarmos perante uma situação em que a intervenção do julgador corre o risco de ser considerada suspeita.

Na verdade, estamos perante a tramitação normal de um processo em que o assistente coloca a sua suspeição sobre a Sra Juiz por entender que a Sra. juiz ao ter apreciado já um outro processo em que as partes são idênticas, mas não o objecto, na opinião do requerente já não vai ser imparcial. Ora, se o assistente entende que há diligências feridas de nulidades ou irregularidades só tem que as arguir nos termos legais. Tal só por si não é suficiente para que se possa colocar minimamente em causa a actuação da Magistrada, na direcção dos autos. O facto de a Sra. Juiz ter tido intervenção noutro processo, em que as partes são idênticas não lhe retira credibilidade e isenção.

Inexiste qualquer motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade da Sra Juiz em ordem a que este Tribunal conclua no sentido de que a sua intervenção corre o risco de ser considerada suspeita.

Ao contrário, verifica-se que o pedido de recusa é manifestamente infundado

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Termos em que se acorda não conceder a requerida escusa.

O requerente pagará 9 ucs de taxa de justiça.


Coimbra,


Alice Santos


Belmiro Andrade