Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
612/03
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR. JOÃO TRINDADE
Descritores: REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA PENA
CONDENAÇÃO POR OUTRO CRIME
Data do Acordão: 05/07/2003
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: FERREIRA DO ZÊZERE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Área Temática: CÓDIGO PENAL
Legislação Nacional: ART.º S N.º 44.°E 56. ° DO C.P., ART. 495.° DO C.P.P.
Sumário:
I - Na perspectiva da alínea b) do art.º 56.° do C.P. independentemente da obrigatoriedade da audição prévia do condenado, deve o tribunal antes de ordenar a revogação da suspensão, proceder a diligências tendentes a averiguar das razões ou motivos que levam o condenado a delinquir novamente.
II - A não revogação automática, implica algo mais que uma simples notificação ao arguido para justificar o não cumprimento da obrigações que lhe foram impostas. É necessário que o Juiz reúna os elementos necessários para, em consciência, tomar uma decisão que vai afectar a liberdade do condenado, já que a prisão é um mal que deve reduzir-se ao mínimo necessário.
III - O tribunal cumpre todas as obrigações processuais criando a condições necessárias para proferir despacho de apreciação no termos do art.º 56.° do C.P. se enceta várias diligências tendentes tomar declarações ao arguido e este não é encontrado, não só na morada que consta dos autos como em outras obtidas junto da autoridades.
Decisão Texto Integral: Recurso n.º 612/03-5

Comarca de Ferreira do Zêzere

Acordam na Secção Criminal desta Relação:

Por acórdão proferido em 15 de Abril de 1993,transitado em julgado, foi o arguido António ..., melhor identificado nos autos, condenado , como autor material de um crime de furto qualificado p. e p. pelos art.ºs 296º e 297º, n.º 1 al. a) e alíneas l) e h) do CP na sua versão originária, na pena de 18 meses de prisão , suspensa na sua execução pelo período de três anos , com as condições aí consignadas (cfr. fls. 131 a 136).

Por despacho de 30 de Junho de 2002 , decidiu-se a suspensão definitiva da pena de prisão determinada ao arguido (cfr. fls. 176).

Dos relatórios do IRS datados de 19-3-96 (cfr. fls. 232) e 8-5-98 ( cfr. fls. 241) , resulta que desde 20-13-94 , arguido não voltou a contactar os técnicos daquele Instituto , inviabilizando o cumprimento da medida , sendo desconhecido o seu paradeiro.

Por despacho de 24 de Março de 1999 , e com vista a permitir a formulação do juízo a que alude o art.º 56º, n.º 1 al. b) do CP , foi deprecada a inquirição do arguido relativamente aos aspectos ai elencados , a qual não chegou a ter lugar por , não obstante as inúmeras tentativas levadas a cabo para o efeito , não se ter logrado obter a sua localização.( fls. 312).

De acordo com o teor da certidão de fls. 306 a 309 , o arguido foi condenado no Processo n.º 118/95 (NUIPC 906/94.4 PSLSB), da 3ª Vara Criminal do Tribunal da Comarca de Lisboa , por acórdão de 20 de Outubro de 1998 , pela prática , em 18 de Maio de 1994 portanto no decurso do prazo da suspensão de um crime de furto qualificado . p. e p. pelos art.ºs 296º e 297º, n.º 2 al.s c), d) e h) do CP na sua versão originária , actualmente pelos art.ºs 203º e 204, n.º 2 al. e).

Em 9 de Outubro de 2002 , foi proferido o despacho recorrido , onde se determinou a revogação da suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido nos presentes autos , a aplicação do perdão previsto no art.º 1º da Lei n.º 29/99 de 12 de Maio ao crime pela qual o arguido foi condenado nestes autos e se ordenou a passagem de mandados de detenção a fim de o mesmo cumprir dois meses e dois dias de prisão.

Consignou-se neste despacho, além do mais, que o arguido incorreu na prática de um crime da mesma natureza daquele em que foi condenado nos presentes autos , razão pela qual deve ser revogada a suspensão da pena aplicada art.º 56º, n.º 1 al. b) do CP.

Inconformado, recorreu o arguido, concluindo a sua motivação do seguinte modo:
1. Vem o presente recurso interposto da douta decisão de fls. que revogou ao recorrente a suspensão da execução da pena de prisão em virtude deste ter sido condenado por factos praticados no decurso da suspensão , sem previamente ter procedido à sua audição , nem , tão pouco, ter fundamentado devidamente de facto e de direito que as finalidades que estiveram na base da suspensão não puderam , por meio dela ser alcançados.
2. Pelo exposto , a decisão recorrida erra por violação da lei , ao não ter considerado a legislação vigente , entre o plano das normas e princípios constitucionais , entre o plano das normas e princípios constitucionais e o da aplicação concreta, violando , entre outras do douto suprimento desse Tribunal da Relação ,normas contidas nos art.ºs 208º, n.º 1 da CRP, 97º, n.º 4 e 495º, n.º 2 do CPP, 44º e 56º do CP.
3. Termos em deve o presente agravo ser reparado, o que desde já se requer , ou caso o douto despacho seja sustentado , ser admitida a sua subida imediata ao Tribunal da Relação, para suprimento das deficiências invocadas no presente e , consequentemente , ser revogado pura e simplesmente ou substituído por outro que mantenha a suspensão da execução da pena aplicada ou,em alternativa anulada tal decisão e o processo devolvido ao Tribunal recorrido a fim de se proceder à audição do recorrente , seguindo os autos seus ulteriores termos até final ou, ainda, a pena de 2 meses e 2 dias substituído por multa.

O Mº Pº na comarca respondeu pugnando pela improcedência do recurso para tal concluindo:
1. Face á alegação do recorrente e á letra da lei sobre as questões suscitadas e tendo em conta os elementos constantes dos autos, o recurso interposto não deverá , quanto a nós ser conhecido, de acordo com o disposto no mencionado art.º 420º, n.º 1 , 1ª parte ., do CPP, por manifesta improcedência.
2. Sem proceder quanto à questão prévia suscitada , sempre se dirá que a suspensão da pena de prisão concretamente aplicada ao arguido foi revogada com fundamento na alínea a), mas na alínea b) do mencionado art.º 56º , pelo que não se exija a audição do mesmo, nos termos do preceituado no art.º 495º, n.º 2 do CPP.
3. Tendo o arguido sido condenado em 18 meses de prisão nunca poderia ter aplicação no caso em apreço o regime decorrente da multa de substituição.

Nesta Relação o Exmo. Procurador Geral Adjunto emite parecer no qual acompanhando a resposta á motivação entende que o recurso está condenado á improcedência.

Parecer que notificado não mereceu resposta.

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Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência há que decidir :

O âmbito dos recursos afere-se e delimita-se através das conclusões formuladas na respectiva motivação conforme jurisprudência constante e pacífica desta Relação,bem como dos demais tribunais superiores, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

As questões a resolver são as seguintes:
A. Nulidade do despacho por falta de fundamentação.
B. Revogação da suspensão da pena.
C. Substituição da pena residual de prisão por multa.

A- Nulidade do despacho por falta de fundamentação

Argumenta o recorrente que o despacho recorrido não se encontra fundamentado devidamente de facto e de direito que as finalidades que estiveram na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.

Decidindo:

A necessidade de fundamentação constitui imperativo constitucional, como resulta do art.º 205º,nº 1 do CRP: As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.

Deste modo a lei fundamental deixou para o legislador ordinário a determinação dos casos e termos em que as decisões dos tribunais deverão ser fundamentadas.

Assim quanto às sentenças dispõe o art.º 374º,nº 2 do CPP que hão - de ser sempre fundamentadas.

Para outras decisões o art.º 97º,nº 4 do CPP :Os actos decisórios são sempre fundamentados devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão.

Não restam dúvidas ,pois, que o despacho ora em apreciação é um despacho judicial decisório e como tal deve ser fundamentado. Mais, diremos nós, temos considerado que este despacho de apreciação da violação dos deveres impostos embora não seja parte integrante da sentença é um complemento desta e como tal nele devem ser respeitados os princípios na qual esta se norteia.

A necessidade de fundamentação dos actos decisórios destina-se a conferir força pública e inequívoca aos mesmos e a permitir a sua impugnação quando esta for legalmente admissível.( - Simas Santos e leal Henriques, CPP Anotado, I, pag. 427)

A fundamentação do despacho permite o controlo da actividade jurisdicional, por uma parte, e serve para convencer da sua correcção e justiça, por outra parte. A exigência de fundamentação actua também como meio de autocontrole do próprio juiz, pela necessidade de justificar a ocorrência das condições legais de aplicação da medida.

A razão da sanção para a violação deste dever de fundamentar as decisões está presente no que o Prof. Alberto Reis, assim resume : Uma decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas ; é uma peça sem base.

Debruçando-nos sobre o caso em apreço a crítica principal do recorrente prende-se com o facto da Mª Juiz a quo ter omitido a obrigação de fundamentar a sua decisão.

Afigura-se-nos que o despacho recorrido, cumpre o espírito que subjaz á referida necessidade imposta por aquele normativo. Embora entendendo que a fundamentação, pudesse ser mais extensa e específica, afigura-se-nos como suficiente, inexistindo violação do artº 97º do CPP . Podemos considerar assim que o mesmo não enferma do vício de falta de fundamentação, ela existe embora possa pecar por ser escassa.

Apesar de tudo, nele são abordados as questões de facto de direito que permitem revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo do seu autor.

Nele pode-se concluir que o julgador ponderou os motivos de facto e de direito da sua decisão, isto é não agiu discricionariamente.( - Ac. da Rel. Lisboa de 22-3-94- Col. XIX, 2, 144-)

Mas para os que assim não entendem, certo é que não estamos perante a nulidade invocada pelo recorrente.

Na verdade em processo penal, nulidades insanáveis ou absolutas são tão somente as enumeradas no art.º 119º do CPP , ou as que forem cominadas como tal noutro preceito legal do Código. De igual modo, apenas constituem nulidades sanáveis ou relativas as que como tal vêm indicadas em qualquer disposição da lei de processo penal, nomeadamente as que elencadas se encontram no art.º 120º .

Todas as demais omissões ou violações das disposições da lei do processo penal constituem irregularidade ( art.º 118º e 123º do CPP).

Ora, do exame e análise do art.º 119º,bem como das demais disposições legais constantes do Código, verifica-se que o alegado vício não constituiu nulidade insanável.

Tal situação, a ter ocorrido, nem sequer constitui nulidade relativa , uma vez que não consta sequer do art.º 120º do CPP , nem em qualquer outra disposição da lei de processo penal.

Assim tal omissão, a verificar-se configuraria mera irregularidade ,( pelo que não tendo atempadamente arguida, nos três dias seguintes a contar daquele em que dele tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto nele praticado.(artº 123º do CPP)

Concluímos, também, e pelo exposto que o despacho respeita integralmente as normas constitucionais.

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B- Revogação da suspensão da pena

Diz o recorrente que não foi ouvido previamente conforme impõe o disposto no art.º 495º, n.º 2 do CPP.

Decidindo:

O que está (directamente ) em causa é, tão só, a questão de saber se a revogação da suspensão ( da execução) da pena pode ou não ser determinada sem audição prévia do condenado.

Em relação ao fundamento de revogação previsto na alínea a) do art.º 56º do CP a nossa jurisprudência é unânime no sentido da obrigatoriedade da audição.

No que respeita ao fundamento da alínea b) constatamos algumas divergências. A não audição do arguido, pelo juiz, antes de ordenar a revogação da suspensão da execução da pena, nos termos do art.º 56º, n.º 1 a) e b) do CP , importa a verificação da nulidade insanável , prevista no art.º 119º c) do CPP. ( - Ac. Rel. de Lisboa de 5-7-01 no processo n.º 0041479. No mesmo sentido Ac. da relação de Lisboa de 24-8-98 no processo 0048005)

O juiz não tem que ouvir o arguido antes de revogar a suspensão da execução da pena , se o seu fundamento for o da alínea b) do n.º 1 do art.º 56º do CP.( - Ac. da Relação do Porto de 3-5-00 no processo n.º 0010291. No memso sentido Ac. da relação do Porto de 24-10-96 no recurso n.º 9911303)

Questão que também pode e deve ser suscitada, na perspectiva desta alínea b) é a de saber se, independentemente da eventual obrigatoriedade da audição prévia do condenado , deve ou não o tribunal antes de ordenar a revogação da suspensão , proceder a diligências tendentes a averiguar das razões ou motivos que levam o condenado a delinquir novamente.

Vejamos o nosso entendimento:

Começar-se-á por assinalar que o preceito do art.º 56º, n.º 1 do CP , com destaque para a sua alínea b) , dispositivo este que regula a revogação da suspensão da execução da pena de prisão em caso do cometimento de outro crime , foi objecto de algumas observações e reparos no seio da Comissão Revisora do Código Penal , designadamente por parte do Conselheiro Manso Preto , bem como do Procurador-Geral da república . Face às observações e críticas formuladas , designadamente a propósito da falta de clareza do respectivo texto legal , o qual segundo referiu o Conselheiro Manso Preto pode originar no espírito do intérprete a dúvida sobre se basta o cometimento de qualquer crime ou se , pelo contrário , a exigência se refere a um crime com especial significado, certo é que o Professor Figueiredo Dias acentuou que agora , a questão (da revogação) centra-se no especial impacto do crime na obtenção das finalidades que estavam na base da suspensão, tendo esclarecido que o conteúdo da alínea em causa estabelece uma condição comum às duas alínea a) e b) , isto é , vale para ambas , tendo ainda referido que através da expressão e revelar , se institui carácter não automático dos elementos constantes das alíneas.( - Cfr. Actas n.ºs 6,8 e 41 , realizadas em 3 de Abril de 1989 , 17 de Abril de 1989 e 22 de Outubro de 1990, respectivamente.)

Ora , perante os esclarecimentos produzidos no seio da Comissão Revisora do Código Penal pelo autor do Projecto , primeira conclusão que se pode e deve extrair é a de que a posterior condenação por crime , não ocasiona automaticamente , em caso algum, a revogação da suspensão da execução da pena de prisão , isto é , a lei substantiva penal não permite a revogação da suspensão por mero efeito de posterior condenação por crime. A revogação da suspensão não é, pois , um acto meramente formal.

Segunda observação é a de que a revogação da suspensão depende , ainda , da circunstância de o condenado revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela , ser alcançadas, isto é, constitui requisito da revogação a demonstração de que as finalidades de punição não puderam ser realizadas.

Com efeito , consabido que a suspensão da execução da pena é um meio autónomo de reacção jurídico-penal , isto é uma pena (autónoma) e não meramente substitutiva, dúvidas não há de que o texto legal ao aludir ás finalidades que estavam na base da suspensão , pretende referir-se às finalidades da punição , quais sejam a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do condenado na sociedade ( art.º 40º, n.º 2 do CP) . Na realidade , na suspensão da pena , pune-se o juízo de desvalor ético-social contido na sentença penal , com apelo á própria vontade do condenado para se reintegrar.

Daqui decorre que a revogação da suspensão da pena , constitui, ao fim e ao cabo , a aplicação e cominação de outra pena , conquanto esta pena esteja já determinada , constituindo , por isso , um apelo e um aviso ao condenado , consubstanciado na ameaça da sua aplicação/execução futura.

Quer na vigência do CP de 1982 , quer actualmente , a suspensão da execução da pena constitui um meio autónomo de reacção jurídico-penal , isto é, uma pena(autónoma) e não meramente subsidiária.

Ora , constituindo a revogação da suspensão ( da execução) da pena , a aplicação e cominação de outra pena , conquanto já determinada , a actividade jurisdicional correspondente , isto é , de revogação da suspensão , ter-se-á de processar de acordo com os princípios gerais que presidem ao processo penal. Designadamente os que consagrados se encontram em sede constitucionalmente , com destaque para o consignado no n.º 1 do art.º 32º , segundo o qual o processo criminal assegura todas as garantias de defesa.

Certo é que um dos direitos (elementar) de defesa , se traduz na observância do princípio do contraditório , princípio que se consubstancia no dever/direito do juiz as razões do arguido e demais sujeitos processuais , em relação a questões e assuntos sobre os quais tenha de proferir uma decisão , bem como no direito do arguido de intervir no processo e de se pronunciar e contraditar todos os elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo, direito que abrange todos os actos susceptíveis de afectar a sua posição.( - Cfr. C. Canotilho /V. Moreira , Constituição da República Anotada, 206.)

Destarte, estando em causa a revogação da suspensão ( da execução) da pena , acto jurisdicional que contende com a liberdade do arguido , dúvidas não há de que se trata de acto que afecta a posição daquele , a significar que, no cumprimento dos princípios de matriz constitucional acabados de referir , o recorrente podia e devia ter sido concedido o direito de intervir e de se pronunciar, ( - Ac. desta Relação proferido no recurso 210/98)sendo que a tal não obsta o facto de se encontrar ausente em parte incerta , já que representado está por defensor, como é imposto por lei.

Aliás , consabido que o tribunal no exercício daquela sua actividade deve averiguar se as finalidades se encontram ou não comprometidas , sendo certo que tal averiguação passa, necessariamente , pela indagação dos motivos que conduziram a delinquir novamente, indagação que , acentue-se , deve ser cuidada e criteriosa , atenta a ultima ratio da sanção que daí pode advir , termos por certo também que o tribunal pode e deve , em princípio proceder oficiosamente ás diligências necessárias tendo em vista a demonstração de que as finalidades que subjazem á suspensão não puderam, por meio dela ser alcançadas.( - Ac. desta Relação de Coimbra no Recurso 127/98)

A evolução e a intenção do legislador, aliás em consonância com a jurisprudência dos nossos tribunais, tem sido no sentido de apertar as malhas da revogação.

A revogação não é automática.

A não revogação automática, implica algo mais que uma simples notificação ao arguido para justificar o não cumprimento das obrigações que lhe foram impostas.

É necessário que o juiz reuna os elementos necessários para, em consciência, tomar uma decisão que vai afectar a liberdade do condenado, já que a prisão é um mal que deve reduzir-se ao mínimo necessário.

A violação dos deveres tem de assumir certa gravidade. Compreende-se, por isso que a lei, ponha como um dos pressupostos da intervenção judicial que prevê no preceito em referência uma violação culposa.

É necessário que fique demonstrado que o condenado não cumpriu, falhou, por vontade própria, é necessário apreciar a sua culpa.

Daqui decorre que se impõe um poder-dever ao julgador , aliás como acontece em sede de julgamento, de procurar reunir todos os elementos para aquilatar da situação que determinou o incumprimento e tomar uma das medidas do artº 55º ou 56º do CP. Não se pode olvidar esse poder-dever imposto pelo artº 340º, nº 1 do CPP, isto é ordenar a produção de todos os meios com vista à boa decisão da causa.

Entende-se, assim, que não é sobre o condenado que recai o ónus de promover a justificação dos factos que o impossibilitem de cumprir, embora tal não o isente de colaborar. Em processo penal não existe, em rigor qualquer ónus da prova, cabendo ao juiz, oficiosamente, o dever de indagar e esclarecer o feito sujeito a julgamento.( - Ac. Rel. Coimbra 16-6-88, BMJ 378-805)

Postas estas considerações vejamos se o Tribunal a quo cumpriu quer as obrigações processuais quer as substanciais acabadas de referir.

Em 24 de Março de 1999 o M.º Juiz a quo(fls. 312) considerando que a revogação da suspensão não é automática considerando relevante conhecer do percurso de vida actual do arguido deprecou as suas declarações à comarca de Loures. Aí se consignou(fls. 322) que o notificando encontra-se algures para o norte, em local desconhecido e por tempo indeterminado

Em 29-6-99 foi então solicitado aos serviços de Identificação Civil cópia do BI , á Direcção dos Serviços de Finanças informação sobre o domicílio fiscal e à Direcção dos Serviços Prisionais informação sobre o arguido se encontra detido. (fls. 324)

Da cópia do BI (fls. 328) resulta que o mesmo tem a residência na Alemanha.

Foi então em 22 de Setembro de 1999(fls. 331) solicitado ás entidades policiais , nomeadamente á PJ, informação sobre o paradeiro do arguido.

Foi de novo deprecado a Loures as declarações o arguido mas mais uma vz em vão.

Em 21 de Maio de 2001 foram solicitadas as declarações ao Consulado Geral de Portugal em Hamburgo(fls. 368).Por este foi enviada carta registada com aviso de recepção porém a mesma veio devolvida com a indicação de que o destinatário não é conhecido na morada indicada.

Foi novamente solicitada cópia do BI e remetido novo pedido de declarações desta feita à Secção do Consulado da Embaixada de Portugal em Berlim tendo sido devolvida a carta para a notificação do arguido com menção de endereço não identificado(fls. 383)

Esta saga , levada quase á exaustão e durante três anos, permite-nos concluir que o tribunal cumpriu todas as obrigações processuais criando as condições necessárias para se proferir despacho de apreciação nos termos do artº 56º do CP .

Consideramos pois, que não assiste a mínima razão ao recorrente. Na verdade ao arguido não assistem apenas direitos ,mas também deveres, nomeadamente os que resultam da do n.º 3 do art.º 61º do CPP, entendendo estes e na perspectiva do caso em apreço como a obrigação de comunicar ao Tribunal qualquer mudança de residência.

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C- Substituição da pena residual de prisão por multa

Pede o recorrente que a pena de 2 meses e 2 dias de prisão seja substituída por multa.

Decidindo:

À pretensão do recorrente opõe-se o disposto no art.º 44º do CP já que o uso da expressão aplicada em medida clarifica que o limite de 6 meses respeita à pena de prisão concretamente aplicada, não á pena residual (resultante da aplicação de um perdão). ( - Leal Henriques e Simas Santos, CP Anotado I Vol. Pag. 404.)

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Nestes termos se decide:
- Julgar por não provido o recurso .

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O recorrente pagará 8(oito) Ucs de taxa de justiça

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Coimbra, 2003-05-07