Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
27/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: GARCIA CALEJO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL
MANDATÁRIO JUDICIAL
Data do Acordão: 04/26/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COVILHÃ - 2º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTº 83º DO E. O. A. ( DL 84/84 ) .
Sumário: I - Nos termos do artº 83º, nº 1, al. d), do E.O.A. ( DL 84/84, de 16/03, em vigor à data dos factos), ao advogado (constituído mandatário forense) compete estudar, com cuidado, e tratar com zelo a questão de que é incumbido, utilizando, para o efeito, todos os recursos da sua experiência, saber e actividade .
II – A junção de um documento a um dado processo, pelo advogado, do qual consta a factualidade relevante para a apreciação da causa, e a não mencionação dessa factualidade em sede de articulados processuais, revela uma conduta negligente por parte do causídico, já que daí resulta que não estudou, com zelo e competência, a respectiva causa, pelo que agiu com culpa .

III – A não interposição de recurso por parte do advogado pode não constituir um acto omissivo reprovável, desde que não se demonstre que agiu em sentido contrário à vontade e instruções do seu cliente na acção .

Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I- Relatório:
1-1- A..., residente na Urbanização Belozêzere, Lote 134, Tortosendo, Covilhã, propõe contra B..., com domicílio profissional no Edifício Fidelidade, 2º, Covilhã, a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário pedindo que o R. seja condenado a pagar-lhe, a quantia a quantia de 17.685,07 euros, acrescida dos juros legais à taxa de 7% ao ano que se vencerem sobre aquela quantia, após citação e até ao seu pagamento, o montante dos juros de mora sobre a quantia 17.545,66 euros, montante este das dívidas de capital à segurança social, que terá de pagar desde 1984 no Processo de Execução Fiscal nº 0612-91/060027.0 e Apensos da 1ª Repartição de Finanças da Covilhã, a liquidar em execução de sentença, por desconhecer ainda o seu montante, mas que calcula que não será inferior a algumas dezenas de milhares de euros, acrescido dos juros de mora à taxa legal a partir do seu pagamento em tal processo de execução fiscal e a quantia de 2.500,00 euros a título de danos morais por si sofridos, acrescida dos juros legais que se vencerem após a citação e até integral pagamento, e ainda dos danos morais futuros a sofrer, estes a liquidar em execução de sentença.
Fundamenta este seu pedido, em síntese, em virtude de ter mandatado o R., por mandato forense escrito, para o patrocinar no processo de execução fiscal que identifica, sendo certo que a conduta do R. nesse processo foi, negligente e omissiva na defesa dos seus interesses, razão porque se quer ver ressarcido dos prejuízos que sofreu e que referencia.
1-2- A R. contestou sustentando, também em síntese, que não ocorreu da sua parte a mencionada conduta negligente e omissiva, sustentando ainda que o A. não sofreu qualquer dano, quer de natureza patrimonial, quer não patrimonial, pelo menos, certo e não hipotético, de forma causal, pela sua conduta.
Termina pedindo a improcedência da acção.
1-3- Deduziu o R. o pedido de intervenção principal da Seguradora Axa Portugal, Companhia de Seguros S.A., com sede na Rua Gonçalo Sampaio, 39, Porto, com o fundamento de que contratara seguro com ela que cobria o risco derivado do exercício da sua actividade profissional.
1-4- A chamada Axa Portugal fez sua a contestação do R..
1-5- O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido despacho saneador, fixado os factos assentes e a base instrutória, realizado a audiência de discussão e julgamento e respondido ao questionário, após o que foi proferida a sentença.
1-6- Nesta considerou-se a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência, condenou-se o R. a pagar ao A. o valor equivalente a Esc. 50 000$00, no âmbito da indemnização, da responsabilidade da interveniente Axa Portugal companhia de Seguros S.A..
No mais foi o R. absolvido.
1-7- Não se conformando com esta sentença, dela vieram recorrer o A. e a Seguradora e também o R., este subordinadamente, recursos que foram admitidos como apelação e com efeito devolutivo.
1-8- O A. alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões que se resumem:
1ª- Deve ser a sentença revogada e o recorrido, Francisco Jorge, ser condenado no pedido.
2ª- Igualmente deve ser condenada até ao montante de 10.000.000$00, com uma franquia de 50.000$00, a interveniente Seguradora.
3ª Provou-se a culpa, por omissão do recorrido, em razão da falta de alegação de factos relativos ao afastamento da gerência do recorrente, da firma Elfila, no período entre 1982 e 1985, como constava no documento de renúncia, razão por que veio a ser condenado na quantia devida à Segurança Social do ano de 1984, no montante de 3.517.590$00 e juros, havendo a sentença recorrido entendido e bem, que o recorrido é responsável.
4ª- O recorrido também não alegou ( omitiu ), em sede de petição inicial da posição fiscal, a prescrição das dívidas peticionadas do recorrente na execução fiscal e a prescrição dos juros, sabendo ele que as dívidas à Segurança Social prescrevem no prazo de 10 anos, não podendo aceitar-se que o Mº Juiz tributário conheceu da prescrição da dívida, embora telegraficamente na sentença.
5ª- Deverá também o recorrido ser condenado a pagar ao recorrente, a quantia de 2.500 euros a título de danos não patrimoniais e respectivos juros, nos termos dos arts. 496º e 559º do C.Civil, que a sentença violou por erro de interpretação e aplicação.
6ª- Quanto a estes danos a decisão recorrida não ponderou devidamente ao facto de ter ficado provado que o recorrente ( autor ) ficou preocupado, com a perspectiva de ter de pagar as quantias em dívida no processo de execução fiscal nº 0612-91-060027.0.
7ª- Absteve-se a sentença recorrida de condenar a Seguradora, apesar da intervenção principal a que o recorrente se não opôs, com o fundamento de não ter sido deduzido qualquer pedido contra aquela, não obstante ter deixado exarado na acta que esta tem também, contra aquela, valor de caso julgado, nos termos do art. 328º nº 1 do C.P.Civil e nos termos do art. 57º do mesmo Código e possa aquela recorrida ser executada, mas era necessário deduzir contra a Axa, mercê da aceitação da intervenção a que foi chamada.
8ª- Se se entender que o recorrido, mercê da transferência da responsabilidade civil para a Axa, só deve pagar a quantia de 50.000$00 e respectivos juros, deve ainda a sentença ser revogada, condenando-se a Axa a pagar as restantes quantias pedidas, ao recorrente.
1-9- A chamada Seguradora alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:
1ª- Está provado que o próprio A. no processo de contra-ordenação 127/92 da 1ª Repartição de Finanças da Covilhã, declarou que desde Abril de 1985 abandonou a empresa e esta ficou entregue aos seus três outros sócios gerentes, desconhecendo desde então a forma como a empresa foi gerida e se foram pagos os impostos e as restantes obrigações, atento o facto de desde esse ano não exercer de facto a gerência da empresa.
2ª- A douta decisão presumiu inadmissivelmente que o A. deu ao seu advogado informações diferentes de tais declarações.
3ª- São pressupostos da responsabilidade civil, nos termos do art. 83º nº 1 al. d) do EOA, conjugada com o disposto no art. 483º do C.Civil, o facto voluntário e culposo do advogado com a violação dos deveres deontológicos, o dano e a ocorrência de nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano.
4ª- O procedimento do advogado tem que ser culposo, no sentido de merecer censura deontológica, de constituir um indesculpável erro de ofício.
5ª- Já que não exige ao advogado que seja infalível, sendo certo que a admitir-se, em mera hipótese, uma culpa levíssima do R. advogado, tal culpa não pode ser fundamento de responsabilidade civil.
6ª- Porque a decisão recorrida violou as disposições citadas e ainda o disposto no art. 76º nºs 1 e 2 do EOA, deve ser revogada, julgando-se totalmente a acção improcedente.
1-10- O R. alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:
1ª- Embora nos termos do art. 799º do C.C. o ónus da prova da culpa recaia sobre o devedor, é ao credor que incumbe a prova do facto ilícito do não cumprimento ou, tratando-se de defeito, a prova do defeito verificado.
2ª- No caso ao A. cabia o ónus de provar que o advogado alegou factos diferentes dos que ele, A., lhe forneceu ou comunicou.
3ª- Certo é que está provado que o próprio A. no processo de contra-ordenação 127/92 da 1ª Repartição de Finanças da Covilhã, declarou que desde Abril de 1985 abandonou a empresa e esta ficou entregue aos seus três outros sócios gerentes, desconhecendo desde então a forma como a empresa foi gerida e se foram pagos os impostos e as restantes obrigações, atento o facto de desde esse ano não exercer de facto a gerência da empresa.
4ª- A douta decisão presumiu inadmissivelmente que o A. deu ao seu advogado informações diferentes de tais declarações.
5ª- São pressupostos da responsabilidade civil, nos termos do art. 83º nº 1 al. d) do EOA, conjugada com o disposto no art. 483º do C.Civil, o facto voluntário e culposo do advogado com a violação dos deveres deontológicos, o dano e a ocorrência de nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano.
6ª- O procedimento do advogado tem que ser culposo, no sentido de merecer censura deontológica, de constituir um indesculpável erro de ofício.
7ª- Já que não exige ao advogado que seja infalível, sendo certo que a admitir-se, em mera hipótese, uma culpa levíssima do R. advogado, tal culpa não pode ser fundamento de responsabilidade civil.
8ª- Porque a decisão recorrida violou as disposições citadas e ainda o disposto no art. 76º nºs 1 e 2 do EOA, para além de ter feito errada interpretação do nº 1 do art. 799º do C.C., deve ser revogada, julgando-se totalmente a acção improcedente.
1-11- O A. respondeu às alegações da Seguradora e do R. sustentando o não provimento dos recursos.
1-12- Igualmente a Seguradora Axa respondeu às alegações do A. sustentando o não provimento do recurso.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:
II- Fundamentação:
2-1- Uma vez que o âmbito objectivos dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos apenas as questões que ali foram enunciadas ( arts. 690º nº1 e 684º nº 3 do C.P.Civil ).
2-2- Após a resposta à Base Instrutória, fixou-se a seguinte matéria de facto:
1. O R. é advogado de profissão, regularmente inscrito na Ordem dos Advogados desde há 20 anos, com escritório na Covilhã.
2. O A. mandatou o R. mediante mandato forense escrito conferido em 03 de Novembro de 1998, para o patrocinar no processo de oposição fiscal que correu os seus termos no Tribunal Tributário de 1ª Instância de Castelo Branco sob o nº 94/98, por apenso ao Processo de Execução Fiscal nº 0612/91/060027.0 e apensos da 1ª Repartição de Finanças da Covilhã, em que aquele é executado, por reversão contra si, pelo facto de ser sócio e, em determinada altura, gerente da firma Elfila - Electricidade e Fibras, Lda., com sede no Teixoso, tendo entregue ao R. o duplicado da citação e ainda o duplicado da carta de renúncia à gerência daquela firma e junta a fls. 48.
3. E no exercício de tal mandato, minutou e entregou o R. a respectiva oposição fiscal, tempestivamente em 10 de Novembro de 1998, alegando a matéria constante da petição inicial, cuja certidão se encontra junta a fls. 27 a 36.
4. Na referida Execução Fiscal 0612-91/060027.0 e apensos foi o A. citado em 3 de Novembro de 1998 e eram pedidas ao A., por reversão, dívidas, entre outras, referentes à Segurança Social dos meses de Janeiro a Dezembro de 1984, no montante total de 3.517.590$00.
5. O R. não alegou, em sede de petição inicial na oposição fiscal supra referida, que o A. se tinha afastado totalmente de facto da gerência de Elfila Lda., desde o ano de 1982, apesar de ter junto a carta de renúncia junta a fls. 48 dos autos.
6. O Tribunal Tributário de 1ª Instância de Castelo Branco, por sentença, veio a considerar apenas parcialmente procedente a referida oposição fiscal, julgando improcedente a oposição fiscal no tocante às dividas exigidas na Execução Fiscal 0612-91/060027.0 e apensos, à Segurança Social, dos meses de Janeiro a Outubro de 1984 no montante de 2.995.264$00, de Novembro de 1984 no montante de 361.557$00 e de Dezembro de 1984 no montante de 200.769$00.
7. Na referida petição de oposição fiscal no dito processo de execução fiscal nº 0612-91/060027.0 e apensos o R. não invocou a prescrição das dívidas à Segurança Social relativas ao ano de 1984 e os juros vencidos sobre as mesmas.
8. Acresce que a sentença proferida na Oposição Fiscal nº 94/98 foi omissa no tocante à questão alegada pelo R. em sede de articulado artigos 29, 30, 31, 32 e 33 da petição inicial - quanto à suspensão das execuções fiscais pendentes contra Elfila Lda. e consequente suspensão também da contagem de juros sobre as dívidas naquelas exigidas, o que implicará o pagamento por parte do A. dos referidos juros, dependente ainda de apreciação pelas autoridades fiscais.
9. O R. não interpôs recurso da referida decisão.
10. O R. já havia patrocinado o A. noutros processos de oposição fiscal, cujos resultados foram totalmente favoráveis ao A.
11. O A. pagou, em 22 de Outubro de 2001, na 1ª Repartição de Finanças da Covilhã a quantia referente às dividas à Segurança Social de Janeiro a Dezembro de 1984, no montante de 3.517.590$00, correspondentes a 17.545,66 euros, além das custas do processo, no montante de 27.950$00, 139.41 euros, estas liquidadas em 27 de Março de 2001, faltando pagar os juros de mora vencidos sobre cada uma das quantias peticionadas na execução fiscal, por dívidas à Segurança Social, de cada dos meses do ano de 1984 - Janeiro até Dezembro -, desde 1984 até 22.10.12001, juros ainda não liquidados, cujo montante será oportunamente objecto de liquidação no Processo de Execução Fiscal nº 0612-91,10620027.0 e apensos, em virtude do retardamento no apuramento motivado pelos requerimentos - exposições feitas pelo A. ao Sr. Chefe da 1ª Repartição de Finanças da Covilhã e ainda ao Sr. Director Distrital de Finanças de Castelo Branco, aguardando, por ora, despacho.
12. As certidões de dívida emitidas pelo Centro Regional da Segurança Social foram recebidas na 1ª Repartição de Finanças da Covilhã em 26 de Julho de 1991 e a empresa -Elfila, Lda. foi citada em 30 de Julho de 1991, tendo esta solicitado por carta enviada em 16 de Junho de 1985 um acordo de pagamento em prestações que foi aceite pelo credor Segurança Social em 12 de Julho de 1985.
13. Em 1 de Outubro de 1991 a referida firma - Elfila, Lda. requereu de novo o pagamento em prestações de toda a dívida, o qual foi deferido, sendo autorizado o pagamento em sessenta prestações, por despacho de 08 de Outubro de 1992.
14. O R. celebrou contrato de seguro cobrindo os prejuízos resultantes para terceiros, designadamente os seus constituintes, da sua actividade profissional de advogado, titulado pela apólice RC-809/99139, com a agora denominada Axa Portugal, Companhia de Seguros.
15. O limite do capital seguro é de Esc. 10.000.000$00, com uma franquia a cargo do réu de 25% por sinistro, no máximo de 50.000$00.
16. O A. no primeiro trimestre de 1982, passou a prestar os seus serviços de técnico têxtil a outras firmas têxteis, como trabalhador, mediante a celebração de contrato de trabalho, inicialmente, em 1982, para a firma Alberto Alves Nogueira & Filhos Lda., com sede em Vales do Rio e depois, ainda no ano de 1982, passou a trabalhar, durante cerca de três anos, para a firma José Esteves Fiadeiro, Lda., com sede na Covilhã, de seguida, durante 7 anos, para firma Textilana Lda., com sede em Seia e posteriormente, para a firma Têxteis Evaristo & Sampaio Lda., com sede na freguesia dos Trinta, concelho da Guarda e, finalmente, desde há cerca de três anos para a firma Fitcom Lda., com sede no Tortosendo, concelho da Covilhã, ao serviço da qual ainda se mantém.
17. Desde aquela data que o A. deixou de acompanhar directamente o desenvolvimento da firma, deixou de prestar o seu contributo profissional e estava totalmente alheio dos negócios e da actividade da firma.
18. O A. subscreveu o documento junto a fls. 48, datado de 15.4.95, onde declara renunciar à gerência de Elfila, Electricidade e Fibras, Lda.
19. No Tribunal Tributário de 1ª instância de Castelo Branco, foi proferida a decisão a que se alude em f) dos factos assentes ( aqui em 6. ).
20. Na oposição fiscal, não foi alegada a prescrição da dívida à Segurança Social.
21. Na sequência da sentença proferida na oposição fiscal 94/98, o A. ficou preocupado, com a perspectiva de ter que pagar as quantias em dívida, no processo de execução fiscal 0612-91-060027.0
22. O R. deu conhecimento ao A. da decisão referida em f) dos factos assentes.
23. O R. elaborou o doc. de fls. 99 a 101.
24. O A. subscreveu os documentos de fls. 56 e 57, respectivamente datados de 22.10 e de 3.4.2001, dirigidos ao Chefe da Repartição de Finanças da Covilhã e à Direcção Geral de Contribuições e Impostos, com vista ao pagamento do capital em dívida e perdão de juros e custas.
25. O próprio A. no processo de contra-ordenação 127/92 da 1ª Repartição de Finanças da Covilhã, declarou que desde Abril de 1985 abandonou a empresa e esta ficou entregue aos seus três outros sócios gerentes, desconhecendo desde então a forma como a empresa foi gerida e se foram pagos os impostos e as restantes obrigações, atento o facto de desde esse ano não exercer de facto a gerência da empresa.--------------------------------------
2-3- Na douta sentença recorrida entendeu-se, em síntese, que a pretensão do A. está estruturada em três motivos de crítica e censura à actuação do R, a saber: A omissão da alegação na oposição fiscal, do facto de o A. desde 1982, não exercer de facto a gerência da devedora, estando desde aí, afastado da actividade desta, a omissão da invocação da excepção da prescrição e o facto de não ter interposto recurso da decisão final ali proferida. Tudo isto em relação ao processo de oposição fiscal que correu os seus termos no Tribunal Tributário de 1ª Instância de Castelo Branco sob o nº 94/98, por apenso ao Processo de Execução Fiscal nº 0612/91/060027.0 e apensos da 1ª Repartição de Finanças da Covilhã, para o que o A. passou procuração forense ao R.. Considerou-se depois que a questão da falta de alegação da prescrição, não teve qualquer repercussão na decisão final do processo, dado que a mesma foi abordada, ainda que telegraficamente, nessa decisão, sendo que em processos daquela natureza, é tal matéria do conhecimento oficioso, tendo sido conhecida e afastada. Quanto à questão do recurso, não foi sequer alegado que a actuação do R. foi em sentido diverso da vontade e instrução do A., resultando até, dos factos provados, que o não terá sido, dado que o próprio A. ter-se-á dirigido, logo ao fim de cerca de dois meses sobre a decisão, à administração tributária, para pela 1ª vez tentar resolver a questão em que estava envolvido e que resultava da obrigação de pagar as quantias em dívida à Segurança Social, relativas ao ano de 1984 e, então, juros de mora, o que indicia que actuou por sua livre espontânea e esclarecida vontade, depois de o R. lhe ter dado conhecimento da decisão final, da oposição fiscal. De resto, nesta matéria, sempre incumbia ao A., provar que o recurso era a actuação que se impunha, segundo a legis artis e que o mesmo teria o efeito de modificar a decisão da 1ª instância. Como o não o fez concluiu-se, não pode agora censurar o advogado, por não ter interposto recurso. No que toca à questão da falta de alegação do afastamento desde 1982 dos destinos da devedora, o que no caso, se afigurava, logo à partida, como essencial e decisivo, para o êxito da oposição, o que se veio a confirmar, aliás, pelo sentido concreto da decisão final, limitando-se, o A. a alegar o afastamento de facto da condução dos destinos da devedora, a partir do ano de 1985, ao contrário do que constava do documento que, na mesma ocasião, juntou subscrito pelo A. a documentar, que tal se verificava desde 1982, quando o que se pretendia impugnar era dívidas que tinham o seu âmbito temporal delimitado, nos anos de 1984 e continuavam nos anos seguintes, redundou, em que fosse julgada, parcialmente procedente a oposição, apenas quanto aos anos de 1985 em diante. Ou seja, foi acolhida, na totalidade, a tese da oposição, tendo-se julgado como provado que o A. deixou de exercer de facto a gerência da devedora, desde a data alegada, 1985 e, improcedente, como não podia deixar de ser, em face da alegação não abranger o ano de 1984, quanto às dívidas deste ano. É claro que o R. como advogado com mais de 20 anos de inscrição na Ordem dos Advogados, não desconhecia a essencialidade do que estava em questão e consequentemente do dever alegar o afastamento de facto do R. (aqui A. ) da condução dos destinos da devedora, a partir de 1982. Por isso, poder-se-á dizer que o R. agiu sem a diligência que lhe era exigida e de que era capaz, no caso concreto, sendo certo que tendo juntado um documento, que servia de elemento de prova, omitiu a alegação de um facto relevante, nuclear, essencial e decisivo, para o sucesso da pretensão do A., dedução que se poderá retirar, em termos de causalidade adequada, dado o fundamento concreto da decisão, na parte que julgou, parcialmente, procedente a pretensão do A.. Isto é, o mesmo fundamento concreto de absolvição do A., igualmente se verificaria se se tivesse alegado e submetido à apreciação do Tribunal a circunstância omitida. Acrescentou-se ainda que para a responsabilização do R. se exige ainda o dolo ou a negligência, verificando-se esta última, incontornável e inquestionavelmente, no caso, dada a presunção de culpa do artigo 799º C. Civil, que impende sobre o devedor. Conclui-se depois que se verificavam os pressupostos da responsabilidade contratual, pelo que o R. se constituiu na obrigação de indemnizar o A. pelos danos causados. Entendeu-se após que não se apurou, que o A. haja sofrido danos de natureza não patrimonial, pelo menos daqueles que pela sua gravidade merecem a tutela do direito, como exige o artigo 496º C. Civil. Quanto aos danos patrimoniais entendeu-se que se o A. tivesse alargado o campo, a amplitude, a abrangência da alegação de facto de 1985, retroagindo-a a 1982, concerteza, outra seria a solução do litígio e o A. não se veria confrontado com o decaimento, parcial, com a sua responsabilização pela dívida do ano de 1984, nem, em consequência do decaimento, com as custas, que veio a pagar, dívida de capital e custas, que ascende a 17 546.66 + 139.41 euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo ressarcimento, de 7% até 30.4.2003 e daí em diante, de 4%. Em relação à questão dos juros de mora peticionados, visto que o A. pagou o capital em dívida, beneficiando do perdão dos mesmos, em termos processuais verifica-se a inutilidade superveniente da lide, naturalmente por razão, que se não pode imputar, nem ao A. nem ao R., antes resulta, de forma automática, de opção legislativa, com a publicação do Dec. Lei 248-A/02 de 14.11, no âmbito do qual o A. se enquadrou, por via do pagamento do capital em dívida. Isto é, não teve ( nem terá ) o A. de pagar juros de mora. Porém, tudo o dito, em termos de estar o R. constituído na obrigação de indemnizar o A., está prejudicado, pelo facto de aquele haver transferido para uma entidade seguradora a responsabilidade civil emergente do exercício da sua actividade como advogado, até ao limite de 10 000 000$00, com uma franquia a cargo do R., de 25% por sinistro, no máximo de 50 000$00. Assim a responsabilidade é da Seguradora, na parte que excede os 50 000$00, sendo este o montante que ficará a cargo do R. segurado. O A., em vez de demandar a Seguradora ou demandar Seguradora e segurado, como a existência do contrato de seguro e as “as boas práticas” impunham que fizesse, apenas demandou o segurado. Foi este que invocando a existência do contrato de seguro, deduziu o incidente da intervenção principal da Seguradora. Como contra esta não foi deduzido qualquer pedido ( e podia tê-lo sido, na réplica ), não pode ser condenada. Aqui, aprecia-se apenas a sua posição em face do litígio, que forma caso julgado, artigo 328º/1 C. C.P.Civil, que a vincula, não podendo o direito voltar a ser discutido, noutra sede, com as mesmas partes, lesado, segurado e Seguradora, sendo que, nos termos do artigo 57º C. C.P.Civil, se pode executar a sentença, não só contra o devedor, mas, também, contra as pessoas em relação às quais a sentença tenha força de caso julgado. Em consequência, julgou-se parcialmente procedente a pretensão do A., condenando-se o R., a pagar ao A. o valor equivalente a Esc. 50 000$00 no âmbito da indemnização, da responsabilidade da interveniente Axa Portugal.
Apelações do A., da Seguradora e do R.:
2-4- Como o objecto das apelações é coincidente, optamos por as conhecer em conjunto.
Pretende o A. através desta acção ressarcir-se civilmente, dos prejuízos que teve em resultado da actuação do R. em processos de execução fiscal que menciona, para os qual o mandatou, por procuração forense escrita, sendo certo que a conduta do R. nesse processo foi, negligente e omissiva na defesa dos seus interesses.
O A. fundamenta a acção em três actos, no seu entender, omissivos e lesivos do seu interesse, praticados pelo R.:
Em primeiro lugar, a omissão da alegação na oposição fiscal, do facto de o A. desde 1982, não exercer de facto a gerência da devedora, estando desde aí, afastado da actividade desta.
Em segundo lugar, a omissão da invocação da excepção da prescrição em relação à divida.
Por último, o facto de não ter interposto recurso da decisão final proferida no processo.
Já se viu a posição que o tribunal de 1ª instância assumiu em relação às três causas. Recorde-se que excluiu de qualquer responsabilidade o R. em relação às duas últimas causas, no que toca à prescrição porque o tribunal tributário conheceu da questão, se bem que de modo telegráfico e no que concerne à falta de interposição de recurso, porque não foi alegado que a actuação do R. foi em sentido diverso da vontade e instrução do A. e também porque incumbia ao A., provar que o recurso era a actuação que se impunha, segundo a legis artis e que o mesmo teria o efeito de modificar a decisão da 1ª instância, o que este não fez. Já quanto à primeira causa entendeu que a conduta do R. foi negligente já que se afigurava, logo à partida, como essencial e decisivo, para o êxito da oposição ( o que se veio a confirmar, pelo sentido concreto da decisão final ), a alegação de que o R. não exercia de facto desde 1982, a gerência da devedora.
Nos recursos, o A. sustenta a verificação, em concreto, de duas das indicadas omissões, impondo-se, no seu prisma, a condenação do R., conforme o pedido. Por sua vez a seguradora interveniente e o R., defendem que não está demonstrado que o R. tenha praticado qualquer omissão e como tal, sustentam que a acção deve ser julgada improcedente.
Nos termos do art. 83º nº 1 al. d) do E.O.A. ( Dec-Lei 84/84 de 16/3, em vigor à data dos factos ), ao R., como advogado, competia estudar com cuidado e tratar com zelo a questão de que foi incumbido, utilizando, para o efeito, todos os recursos da sua experiência, saber e actividade.
Daqui resulta que ao advogado, mandatado para deduzir uma oposição ao processo tributário acima mencionado, cabia dedicar-se ao estudo da questão com empenho, de forma a conseguir um resultado positivo para o seu mandante. Evidentemente que no cumprimento de um mandato judicial, não compete ao mandatário garantir ao seu mandante o êxito da acção. Mas isso, não o exime a fazer todos os esforços no sentido de lograr esse sucesso, estudando com zelo e proficientemente a acção, tanto do ponto de vista factual como jurídico.
Segundo cremos, sob este aspecto teórico da questão nenhuma dúvida se coloca, remetendo-se para o mais que sobre isso se refere na douta sentença recorrida.
Vejamos agora o teor da sentença que decidiu da oposição fiscal deduzida pelo R., mandatado pelo A., acção em que aquele terá praticado os actos omissivos que fundamentam esta acção.
Assim e para além do mais exarou-se:
... Factos provados ... corre termos contra o oponente ( aqui A. ) na 1ª Repartição de Finanças ...- no que foi abrangido por reversão- cobrança coerciva de contribuições para a segurança social ( entre 1984 e 1990),... sociedade onde o oponente exerceu gerência, até que em Abril de 1985 renunciou; e desde então deixou de cuidar do negócio da dita sociedade ...”. Depois de se terem definido as questões a resolver, mencionou-se: “Pode sobre o oponente recair responsabilidade?. Sucedem-se no tempo dois regimes ... Distintos. Porém, nota comum, em ambos só poderá existir responsabilidade no período que esteja em causa se tal for tempo do exercício da gerência. Assim, a quem ainda que designado para tanto, dela estiver afastado, não podem ser assacadas responsabilidades. No caso do oponente, este exerceu a gerência, até que Abril de 1985 a ela renunciou e desde então deixou de cuidar no negócio da aludida sociedade... Sobre si recai apenas ( art. 165º do CPCI ) ( a responsabilidade ) a que se refere a uma das partes das contribuições para a segurança social em execução: as contribuições dos meses de Janeiro a Outubro de 1984 ... e Novembro ... e Dezembro ... de 1984 - ... que viram a sua prescrição interrompida”. Em consequência condenou-se o oponente, apenas, no pagamento das contribuições para a segurança social de Janeiro a Dezembro de 1984.
Quer isto dizer e para o que aqui importa que o tribunal tributário, considerou relevante para excluir a responsabilidade do oponente, o facto de ele estar afastado da gerência da sociedade devedora.
Claro que se na acção de oposição tivesse sido alegado e provado que ele, oponente, estava afastado da gerência da sociedade desde de 1982, face à posição assumida pela sentença, seria absolvido do pagamento das contribuições de Janeiro a Dezembro de 1984, em relação às quais foi condenado.
A questão coloca-se pois, se seria obrigação do R., alegar essa factualidade e se não o tendo feito incorreu em omissão culposa, desencadeadora da obrigação de indemnizar.
A resposta à questão não poderia deixar positiva, se se tivesse provado que o A. expressamente lhe havia referido essa circunstância para que fosse mencionada.
Mas não foi isso que se provou, nem sequer foi isso alegado pelo A.. Segundo este, o R. tinha conhecimento da situação de abandono das funções de gerência da sociedade, desde 1982, já que tinha redigido a carta de renúncia a essas mesmas funções, em 14 de Abril de 1985 ( vide art. 11º da p.i. )11 Expressamente o A. alegou que “porque o Réu tratou da redacção da carta de renúncia pelo Autor à gerência da firma Elfila Ldª em 15 de Abril de 1985, em que nela expressamente se referia que este já não exercia as funções de facto desde 1982, estava a par, tinha conhecimento da situação deste, quanto ao abandono de facto de gerente de tal sociedade, desde este ano”. . Ora, não se provou que tenha sido o R. quem redigiu tal carta ( vide ponto 4º da base instrutória e respectiva resposta), pelo que também através da posição do A. sobre o assunto, não se poderá sustentar que o A. conhecesse a dita factualidade. Mesmo que assim não fosse, consideramos altamente arrojado que, tendo redigido um documento em 1985, se pudesse dizer que, em Novembro de 1998, isto é mais 13 anos depois, o R. ( ainda ) estava ciente do facto constante desse documento.
Porém, na douta sentença recorrida, encontrou-se a obrigação do R. em alegar a factualidade em causa, em virtude de ter juntado um documento, como elemento de prova, em que tal circunstância factual, se referenciava. Trata-se do documento de fls. 48 que, na realidade, foi junto pelo R. aos autos de oposição fiscal ( facto provado sob o nº 2) e em que, para além do mais, refere o subscritor ( o A. ) dirigindo-se à firma Eleila que “a razão desta minha renúncia é do vosso inteiro conhecimento e deve-se ao facto de há três anos a esta parte não exercer de facto as funções de gerência”.
Portanto a pergunta que neste contexto e agora haverá a fazer, será a de saber se seria obrigação do R., conhecer a circunstância em causa, já que constava do documento que juntou.
Evidentemente que constando de tal documento essa factualidade, o A. não poderia dizer que a desconhecia. Mesmo que tal pudesse suceder, sempre se poderia dizer que era sua obrigação conhecê-la, já que não seria admissível um advogado ( ainda por cima experiente ) juntar um documento a um processo sem estar ciente do respectivo conteúdo.
Temos pois que o R. conhecia ou deveria conhecer o seu conteúdo.
Questão diferente será ainda a de se saber se seria obrigação do R., mencionar tal factualidade. É que poderia colocar-se a hipótese de tal não ter sido alegado, por se considerar, à partida, irrelevante, sob o ponto de vista jurídico. Claro que, na sentença recorrida, ao invés dessas circunstâncias factuais serem consideradas irrelevantes, foram antes determinantes para uma exclusão de responsabilidade por banda do oponente, aqui A.. Mas isto foi num momento posterior. O R. poderia pensar, por exemplo, que relevante para a exclusão de responsabilidade por banda do demandado, seria apenas o momento da renúncia à gerência da sociedade e já não o momento real em que deixou a gerência. Todavia, o R. nada alegou ou referiu nesse sentido, pelo que esta hipótese não passa de mera especulação.
Tendo conhecimento, ou pelo menos, não podendo desconhecer os factos em causa, o R., no nosso ponto de vista, seria obrigado a referi-los na oposição. É que essas circunstâncias eram essenciais ( e assim se deviam apresentar logo de início ) para produzir os efeitos pretendidos com a oposição que deduziu, a absolvição do demandado.
Ao juntar o documento, onde constava a factualidade em causa e ao não mencionar as respectivas circunstâncias, o R. agiu sem a diligência que lhe era exigida e de que deveria ser capaz, o que é o mesmo que dizer-se que não estudou, com zelo e proficientemente a acção, tanto do ponto de vista factual como jurídico, pelo que violou o referenciado art. 83º nº 1 al. d) do EOA.
Agiu pois o R. com culpa, culpa aliás que se presume de harmonia com o disposto no art. 799º do C.Civil.
Em virtude da conduta omissiva e culposa do R., o A. sofreu prejuízos que se concretizaram na condenação que sofreu ( pagamento de dividas à Segurança Social dos meses de Janeiro a Dezembro de 1984, no montante total de 3.517.590$00, correspondentes a 17.545,66 euros e custas do processo, no montante de 27.950$00, correspondentes a 139.41 euros ), prejuízos de que terá que ser ressarcido.
Diga-se aqui que o A. pede ainda o pagamento de juros sobre a dívida do capital ( que teria também que pagar - pedido referenciado sob a al. b) da p.i.- ), mas como reconheceu na audiência de julgamento ( fls. 367 e também nas suas alegações de recurso ), o pedido desses juros deixou de fazer sentido, face ao Dec-Lei 248A/02 de 14/11 ( que os extinguiu ), tese aliás aceite na douta sentença recorrida que, por isso, se absteve de proferir decisão ( condenatória ) sobre esses juros.
O apelante A. sustenta ainda que também ocorre o acto omissivo do R., decorrente da falta de invocação da excepção da prescrição em relação à divida.
Na douta sentença recorrida, como já se disse, em relação a esta causa, referiu-se que o tribunal tributário conheceu da questão, se bem que de modo telegráfico, excluindo-se assim a responsabilidade do R. em relação a este fundamento.
O recorrente na apelação diz que na sentença do tribunal tributário não se acha referência a tal prescrição, razão por que mantém que o R. deve ser responsabilizado por essa omissão.
Não tem razão o apelante, visto que, na realidade, e como se vê no extracto da sentença que exarámos acima, o Mº Juiz referiu que as contribuições para a segurança social em causa ( meses de Janeiro a Dezembro. de 1984 ) viram a sua prescrição interrompida, donde se deduz que a excepção foi apreciada, mas não procedeu, em virtude da dita interrupção. Ou seja, a falta de invocação da prescrição, não determinou que a excepção não fosse conhecida, razão por que o acto omissivo não foi de molde a agravar a posição do demandado naquela acção.
A posição de 1ª instância foi pois correcta.
O apelante A. alega também que ocorre o acto omissivo do R., decorrente do facto de não ter interposto recurso da decisão final proferida, no processo tributário.
O tribunal recorrido afastou esta causa, em virtude de não ter sido alegado que a actuação do R. foi em sentido diverso da vontade e instrução do A. e também porque incumbia ao A., provar que o recurso era a actuação que se impunha, segundo a legis artis e que o mesmo teria o efeito de modificar a decisão da 1ª instância, o que este não fez.
Como não foi tal questão introduzida nas conclusões produzidas, a mesma, de harmonia com o disposto nos supramencionados arts. 690º nº1 e 684º nº 3 do C.P.Civil, está fora do objecto do recurso. Aliás, no próprio corpo das alegações, também o apelante nada sustenta em contrário do entendido na douta sentença recorrida.
Sustenta depois o apelante A. que deverá também o recorrido ser condenado a pagar ao recorrente, a quantia de 2.500 euros a título de danos não patrimoniais e respectivos juros, nos termos dos arts. 496º e 559º do C.Civil, que a sentença violou por erro de interpretação e aplicação. É que, quanto a estes danos a decisão recorrida não ponderou devidamente no facto de ter ficado provado que o recorrente ( autor ) ficou preocupado, com a perspectiva de ter de pagar as quantias em dívida no processo de execução fiscal nº 0612-91-060027.0..
Sobre o assunto na douta sentença recorrida, considerou-se, em síntese, que não se provou que o A. haja sofrido danos de natureza não patrimonial que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, como exige o art. 496º do C.Civil.
Com pertinência com a questão provou-se que o A., na sequência da sentença proferida na oposição fiscal, ficou preocupado, com a perspectiva de ter que pagar as quantias em dívida, no processo de execução fiscal.
A obrigação de indemnização neste âmbito decorre do disposto no mencionado art. 496º nº 1 que estabelece que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela dos direitos ”. Não se concretiza na disposição legal os casos de danos não patrimoniais que justifiquem uma indemnização. Refere-se tão só que esses danos, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Significa isto que cabe ao tribunal, no caso concreto, dizer se o dano merece ou a tutela do direito. Assente está, jurisprudencional e doutrinariamente, que simples contrariedades e incómodos não justificam a indemnização por danos não patrimoniais.
No caso vertente, apenas se provou que, em consequência da dita condenação, o A. ficou preocupado.
É evidente que desconhece em que consistiu essa preocupação e concretamente se ela assumiu um grau de gravidade suficiente, susceptível de fazer desencadear o dispositivo legal em observação.
Somos em crer que, como o apelante aceitará, só com outros elementos factuais que pudessem traduzir de forma mais precisa o estado de espírito inerente à indiciada preocupação, é que poderíamos decidir se esse estado teria ( ou não ) a gravidade suficiente que demandasse a tutela do direito.
Quer isto dizer que, também aqui, a posição do apelante é insubsistente.
O apelante A. sustenta ainda que a sentença recorrida se absteve de condenar a Seguradora ( apesar da intervenção principal a que o recorrente se não opôs), com o fundamento de não ter sido deduzido qualquer pedido contra aquela, não obstante ter deixado exarado na acta que esta tem também, contra aquela, valor de caso julgado, nos termos do art. 328º nº 1 do C.P.Civil e nos termos do art. 57º do mesmo Código e possa aquela recorrida ser executada, mas era necessário deduzir contra a Axa, mercê da aceitação da intervenção a que foi chamada. Acrescentou que se se entender que o recorrido, mercê da transferência da responsabilidade civil para a Axa, só deve pagar a quantia de 50.000$00 e respectivos juros, deve ainda a sentença ser revogada, condenando-se a Axa a pagar as restantes quantias pedidas, ao recorrente.
Na douta sentença recorrida sobre o assunto referiu-se que, em relação ao facto de o R. se ter constituído na obrigação de indemnizar o A., esta obrigação está prejudicada, pelo facto de aquele haver transferido para uma entidade seguradora a responsabilidade civil emergente do exercício da sua actividade como advogado, até ao limite de 10 000 000$00, com uma franquia a cargo do R., de 25% por sinistro, no máximo de 50 000$00. Assim a responsabilidade é da Seguradora, na parte que excede os 50 000$00, sendo este o montante que ficará a cargo do R. segurado. O A., em vez de demandar a Seguradora ou demandar Seguradora e segurado, como a existência do contrato de seguro e as “as boas práticas” impunham que fizesse, apenas demandou o segurado. Foi este que invocando a existência do contrato de seguro, deduziu o incidente da intervenção principal da Seguradora. Como contra esta não foi deduzido qualquer pedido ( e podia tê-lo sido, na réplica ), não pode ser condenada. Aqui, aprecia-se apenas a sua posição em face do litígio, que forma caso julgado, artigo 328º/1 C. C.P.Civil, que a vincula, não podendo o direito voltar a ser discutido, noutra sede, com as mesmas partes, lesado, segurado e Seguradora, sendo que, nos termos do artigo 57º C. C.P.Civil, se pode executar a sentença, não só contra o devedor, mas, também, contra as pessoas em relação às quais a sentença tenha força de caso julgado. Em consequência, julgou-se parcialmente procedente a pretensão do A., condenando-se o R., a pagar ao A. o valor equivalente a 50.000$00 no âmbito da indemnização, da responsabilidade da interveniente Axa Portugal.
É certo que a Seguradora foi chamada aos autos pelo R., através do incidente de intervenção provocada ( em virtude do contrato de seguro que celebrou com ela e que cobria o risco derivado do exercício da sua actividade profissional ) e que ela aceitou o chamamento, fazendo seus os articulados do R..
É certo também que o A. não deduziu qualquer pedido contra a R..
Nos termos do art. 328º nº 1 do C.P.Civil, dado que a chamada interveio no processo, a sentença apreciará o seu direito e constituirá caso julgado em relação a ela.
Já se viu que o R., em virtude da sua mencionada conduta omissiva e culposa e porque o A. sofreu prejuízos derivados dessa atitude, terá que ressarcir este pelos danos que sofreu.
O R., em razão do contrato de seguro que celebrou com Seguradora, transferiu para esta o risco derivado do exercício da sua actividade profissional ( com a franquia mencionada ).
Como conciliar estas realidades ?
Dado que o A. não deduziu qualquer pedido contra a Seguradora, como bem refere o Mº Juiz, esta não poderá ser condenada na acção.
Nesta conformidade e dada a responsabilidade civil do R., terá este que ser condenado no pedido. O A. é absolutamente alheio ao contrato de seguro e às relações entre o R. e a sua Seguradora.
Evidentemente que não se desconhece que deverá ser, em última análise, a Seguradora que irá pagar o quantitativo do pedido ( descontada a franquia ). Mas isso é questão que diz respeito ao R. e à própria Seguradora.
O efeito prático do chamamento da Seguradora aos autos, é precisamente ( e só ) poder constituir a sentença caso julgado em relação a ela.
Por tudo nos parece que não poderá deixar de se condenar o R. no pedido, pese embora se reconheça que, em virtude do contrato de seguro que celebrou com a Companhia de Seguros, só irá, na realidade, ter que pagar o valor da franquia.
Nesta parte o recurso será procedente.
O R. terá pois que pagar ao A. as quantias de 3.517.590$00 e de 27.950$00, correspondentes respectivamente a 17.545,66 e 139,41 euros, isto é a importância global de 17.685.07 euros.
O A. pede ainda juros moratórios à taxa legal sobre esta quantia, após a citação e até integral pagamento ( vide pedido mencionado sob a al. a) da p.i. ).
A sentença não condenou o demandado nessa parte do pedido.
No presente recurso, o A. sustenta que tal condenação se justifica, sublinhando que a sentença é omissa quanto ao assunto.
Estamos perante uma indemnização de teve por base uma responsabilidade contratual ( derivada de cumprimento incorrecto do mandato judicial ). Nos termos do art. 805º nº 1 do C.Civil o devedor fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente para cumprir.
Desconhecendo-se no caso dos autos, qualquer interpelação extrajudicial, temos que o R. se constitui em mora a partir da citação ( interpelação judicial ).
A mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao devedor ( art. 804º nº 1 do mesmo Código ).
De harmonia com o art. 806º nºs 1 e 2 ainda do mesmo diploma legal, na obrigação pecuniária, a indemnização corresponde ao juros a contar da constituição em mora, sendo estes os legais, salvo se antes da mora for devido juro mais elevado ou as partes hajam convencionados outros.
Quer isto tudo dizer que o R. terá que pagar ao A. os juros moratórios legais ( sobre a quantia de 17.685.07 euros ), desde a data da citação e até integral e efectivo pagamento. Os juros moratórios legais serão de 7% desde da data da citação e até 1-5-03 e de 4% a partir desta data ( Portarias 263/99 de 12/4 e 291/2003 de 8/4 ).
Nesta parte o pedido também procede, o mesmo sucedendo à presente apelação.
Por fim e em relação às apelações do R. e da Seguradora, diremos que as questões levantadas, que no fundo se reduzem a saber se o A. terá ou não praticado os actos omissivos que fundamentam esta acção, já acima respondemos.
Entendemos acrescentar, de forma muito sucinta, que pelo facto de se ter provado que o próprio A. declarou, no processo de contra-ordenação 127/92 da 1ª Repartição de Finanças da Covilhã, que desde Abril de 1985 abandonou a empresa e esta ficou entregue aos seus três outros sócios gerentes, tal não contradiz o que acima se disse em relação ao conhecimento do conteúdo do documento de fls. 48 e à necessidade de alegar a factualidade dele constante, dada que eram essenciais ( como se verificou posteriormente através da sentença proferida no processo ) para produzir os efeitos pretendidos com a oposição que deduziu, a absolvição ( total ) do demandado, no processo tributário.
Nesta conformidade, irrelevante se tornou o saber-se ou não se o A. deu ao R., seu advogado, a informação em causa ( de que estava afastado da gerência da firma desde 1982 ).
III- Decisão:
Por tudo o exposto, revoga-se parcialmente a douta sentença recorrida e, em consequência:
Condena-se o R. a pagar ao A. a quantia de 17.685.07 euros, acrescida de juros moratórios, às taxas legais de 7% desde da data da citação e até 1-5-2003 e de 4% a partir desta data e até integral e efectivo pagamento.
Isto, sem prejuízo se reconheça que, em virtude do contrato de seguro que o R. celebrou com a Companhia de Seguros Axa, esta se comprometeu ao pagamento dos prejuízos resultantes para terceiros, designadamente para os seus constituintes, da sua actividade profissional de advogado ( até ao limite 10.000.000$00, com uma franquia a cargo do réu de 25% por sinistro, no máximo de 50.000$00 ).
No mais confirma-se a douta sentença recorrida.
Nega-se provimento às apelações da Seguradora e do R..
Custas na acção, pelo A. e R. na proporção dos respectivos vencimentos.
Custas nas apelações pelos apelantes, igualmente na proporção dos respectivos vencimentos.