Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3944/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: TÁVORA VITOR
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS
SUBEMPREITADA
FORMA
NULIDADE
COMISSÃO
Data do Acordão: 01/31/2006
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE TORRES NOVAS
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS Nº 2 DO ARTIGO 255º DO DL 599/99; E 1213.º DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: 1. O contrato de subempreitada de obras públicas, deve constar de documento particular outorgado pelas partes contratantes – nº 2 do artigo 255º do DL 599/99.
2. Sendo nulo, por falta de forma, o contrato de subempreitada que não constar de documento outorgado pelas partes, não pode ele ser reconduzido a uma relação de comissão, na medida em que o subempreiteiro tem autonomia no tocante ao empreiteiro, estando apenas adstrito a uma obrigação de resultado, enquanto na comissão se verifica uma subordinação técnico-jurídica do comissário ao comitente.

3. Em tais circunstâncias mantém-se a responsabilidade do empreiteiro pelos danos causados por outrem, a quem incumbiu a execução dos trabalhos.

Decisão Texto Integral: Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra.
1. RELATÓRIO.

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra.
A... instaurou a presente Acção de condenação na forma sumária, contra a B..., pedindo que a R. seja condenada a pagar-lhe a quantia global de 5.068,91 euros, por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos desde a citação até integral pagamento.
Alegou em síntese, que quando conduzia o seu veículo automóvel e se desviou de um buraco fundo e de grandes dimensões, sem qualquer tipo de sinalização, embateu com o fundo do mesmo numa tampa de esgoto. A referida tampa encontrava-se saliente, em plena via pública, sem qualquer tipo de sinalização, e totalmente coberta de água, na medida em que chovia torrencialmente. O veículo automóvel da A. imobilizou-se alguns metros mais à frente, devido ao facto do cárter do mesmo ter rebentado na sequência do embate na anilha, ter perdido todo o óleo, o que levou, por sua vez, a que o motor gripasse. A estrada por onde circulava o veículo da A. estava em obras que haviam sido adjudicadas à R.. Esta terá tido a culpa no acidente, na medida em que não procedeu à sinalização do local, como lhe competia. A A. teve danos em resultado da situação descrita; designadamente teve de arcar com o custo da substituição do motor do veículo. Teve ainda incómodos pela impossibilidade de utilização do veículo, nomeadamente pela impossibilidade de utilizar o mesmo para as deslocações para o seu trabalho. Teve despesas com a utilização de transportes alternativos e teve ainda danos morais na sequência desta situação.
A R. veio contestar, impugnando alguns dos factos alegados pela A. Vem alegar igualmente que quem realizou a obra em causa na estrada por onde circulava o veículo conduzido pela A., não foi ela, mas sim a firma C..., na sequência de um contrato de subempreitada que com ela celebrou e era ao subempreiteiro que competia sinalizar convenientemente a obra. Enquanto a obra decorreu encontrou-se sempre colocada nos locais adequados sinalização apropriada.
Termina solicitando que a acção seja julgada não provada e improcedente e a R. absolvida do pedido. Veio ainda deduzir o incidente de intervenção acessória provocada do referido C..., o qual veio a ser admitido.
Citado para o efeito, veio o chamado C... apresentar a sua contestação. Nela excepcionou a sua ilegitimidade para a presente acção, na medida em que alega ter celebrado um contrato de seguro com D.... Logo deveria ser esta a intervir na lide e não o chamado. Veio ainda impugnar os factos alegados pela A. na P.I. Alega em síntese que o local onde terá ocorrido o acidente se encontrava devidamente sinalizado. O acidente será da responsabilidade da A. que circulava no meio da estrada e em velocidade excessiva para o local. Termina pedindo que a excepção de ilegitimidade por si deduzida seja declarada procedente e que o chamado C... seja absolvido da instância. Solicita ainda que a presente acção seja declarada improcedente, por não provada, e o chamado absolvido do pedido. O chamado veio ainda deduzir o incidente de intervenção acessória provocada da D..., que veio a ser deferido.
A chamada D... apresentou a sua contestação, em que impugna alguns dos factos alegados na P.I. Refere, em síntese, que os trabalhos realizados pelo chamado C... encontravam-se devidamente sinalizados na rua onde terá ocorrido o acidente. Este acidente terá ficado a dever-se ao facto de a A. circular em velocidade excessiva para as condições do local. Termina solicitando que a chamada D... seja absolvida do pedido.
No saneador conheceu-se da validade e regularidade da instância declarando-se improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade do chamado C... que foi por ele deduzida. Elencaram-se de seguida os factos assentes e elaborou-se a Base Instrutória.
Procedeu-se a julgamento e acabou por ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência,
1) Condenou a R. B..., a pagar à A. uma indemnização correspondente ao valor dos danos patrimoniais por ela sofridos, que foram considerados provados e de que aquela será responsável, e que consistem:
- No montante de 102 euros, que ela despendeu em deslocações para o local de trabalho em veículos de aluguer e transportes públicos;
- No montante de 1.261,51 euros, referente ao valor despendido pela A. com a reparação do seu veículo de matrícula 44-49-JE;
- No montante de 698,25 euros, correspondente ao valor do dano de privação de uso do veículo 44-49-JE, durante o período de 133 dias em que o mesmo esteve imobilizado para ser reparado, e calculado à razão de 7 euros diários.
- No valor dos juros de mora vencidos calculados sobre os montantes da indemnização descritos nas alíneas a), b) e c), contados desde a citação da R. para a presente acção, à taxa legal de 7% até 30 de Abril de 2003, e de 4% desde a entrada em vigor da Portaria nº 291/2003, ocorrida em 1 de Maio de 2003, sendo que é esta que se encontra actualmente em vigor.
- Aos juros que entretanto se vencerem até integral pagamento, à taxa legal que vigorar.
2) Condenou ainda a R., a pagar à A. uma indemnização correspondente ao valor dos danos não patrimoniais por ela sofridos, que foram considerados provados, que aquela será responsável, e que consistem:
- No montante de 262,50 euros.
- No valor dos juros de mora que se vencerem, calculados sobre o montante referido na alínea anterior desde a data em que a R. for notificada da presente sentença, à taxa legal que vigorar, e que se encontra fixada em 4% desde a entrada em vigor da Portaria nº 291/2003, ocorrida em 1 de Maio de 2003, e até integral pagamento.
Decidiu ainda declarar improcedentes por não provados os pedidos de indemnização formulados igualmente pela A. para ressarcimento dos restantes danos patrimoniais e não patrimoniais, que ela alegava ter igualmente sofrido em consequência da situação em causa nos autos. Consequentemente, absolveu a R. destes pedidos de indemnização.
De acordo com o disposto no artigo 332º, nº 4, do Código de Processo Civil, determinou-se ainda que a sentença ora em crise constitua caso julgado quanto aos chamados C... e D..., nos termos do artigo 341º, do Código de Processo Civil, relativamente às questões de que dependa o direito de regresso dos autores do chamamento, ou seja da R. e do chamado C....
Daí o presente recurso de apelação interposto pela Ré B..., a qual no termo da sua alegação pediu que se revogue a sentença substituindo-se a mesma por Acórdão que julgue a acção improcedente, absolvendo-se a Ré do pedido.
Foram para tanto apresentadas as seguintes,

Conclusões.

1) O presente recurso de apelação vem interposto da sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a Ré, ora Apelante, a pagar à Autora a quantia de € 2.342,26 acrescida de juros vencidos e vincendos até integral pagamento.
2) Tal decisão, para além de violar a lei substantiva, baseou-se numa errada apreciação da prova produzida em Juízo.
3) A matéria de facto que a Apelante em concreto considera incorrectamente julgada, e com tal fundamento impugna, são os factos que constituem resposta aos pontos 37, 41 e 42 da base instrutória, ou seja na sentença factos 34, 38 e 39.
4) Ora, face à prova testemunhal produzida em Juízo, designadamente do depoimento da testemunha Fernando Júlio Monteiro Lopes (depoimento gravado em dois suportes áudio da volta 3297 do lado A, à volta 1457 do Lado B 1º cassete na audiência de Julgamento de 26 de Novembro de 2004) a resposta ao ponto 37 da base instrutória (facto 34 da sentença) impunha decisão diversa da vertida na sentença ora recorrida devendo tal facto ser considerado provado.
5) Perante a prova produzida em Juízo impunha-se considerar provado o facto em apreço, ou seja, não obstante a falta de forma escrita do contrato, está provado nos autos que a Recorrente e o Chamado C..., acordaram preços e datas para a celebração da obra e que a execução desta ficava a cargo do Chamado.
6) Sendo o Chamado C... responsável pela realização da obra, a responsabilidade pela sua má ou deficiente execução tem de ser atribuída a este, mesmo em sede de responsabilidade extra-contratual.
7) Com base na prova testemunhal produzida em Juízo, designadamente no depoimento do chamado C... (depoimento gravado em dois suportes áudio da volta 0434 à volta 1432 do Lado A – 1º cassete na audiência de julgamento de 25 de Outubro de 2004) e no depoimento da testemunha Fernando Júlio Monteiro Lopes (depoimento gravado em dois suportes áudio da volta 3297 do lado A, à volta 1457 do Lado B 1º cassete na audiência de Julgamento de 26 de Novembro de 2004), impugna-se também a resposta aos factos 41 e 42 da base instrutora.
8) Em face da prova produzida em Juízo não se vislumbra possível determinar, com o mínimo rigor, ou sequer com alguma precisão, qual o estado da obra à data do sinistro, ou seja, quais os trabalhos que se encontravam a decorrer no local do sinistro a 7 de Abril de 2002.
9) Ora face à prova produzida em Juízo e na consideração do artº 516º do CPC, os factos 41 e 42 com na resposta da base instrutória (factos 38 e 39) deverão ser considerados não provados.
10) Na presente acção o Sr. Juiz a quo apenas e só, tomou em análise a preterição da forma escrita do contrato de subempreitada.
11) Acontece porém, que na interpretação do artº 266 nº2 do Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas e face à factualidade provada nos autos, o Sr. Juiz a quo deveria ter considerado em termos de responsabilidade extra-contratual a posição do chamado C....
12) Não obstante se conclua que o contrato que foi celebrado entre a ora Apelante e o Chamado não poderá ser de subempreitada à luz do R.J.E.O.P., nenhuma das partes põe em causa a existência de um contrato, do qual resultam direitos e obrigações recíprocas entre as partes.
13) Com efeito, o Chamado C... realizou uma actividade, ou serviço, por conta de outrem, no caso sub iudice, por conta da Apelante, a título oneroso, o que traduz entre os dois, uma relação de comissão, nos termos do artº 500º do Código Civil.
14) Nestes termos, a ter sido feita uma melhor aplicação do direito por parte do Tribunal a quo, ter-se-ia, necessariamente concluído que o facto ilícito e culposo praticado – deficiente sinalização da obra - era subjectivamente imputável ao Chamado e necessariamente o dever de indemnizar, a título de responsabilidade objectiva, caberia também à ora Apelante, num regime de necessária solidariedade.
15) O comitente, não suportará, em definitivo, o peso da indemnização, já que goza, em princípio e relativamente ao caso sub iudice, de direito de regresso contra o comissário, ora Chamado, porquanto não há culpa da sua parte, para se ressarcir de tudo quanto houver pago, pois o regime em análise faz recair a título de responsabilidade objectiva do comitente a obrigação de indemnizar e este só assume perante o terceiro, uma posição de garante.
16) Por todo o exposto e fazendo uma correcta aplicação do direito, deverá o contrato em causa produzir os seus efeitos, e ser o chamado C... obrigado a indemnizar a recorrida a título extra-contratual, por factos ilícitos, solidariamente com a ora recorrente, à qual cabe, por via do contrato de comissão, direito de regresso.
17) A sentença viola por erro de interpretação e aplicação as normas já citadas.
Contra-alegaram os apelados, pugnando pela confirmação da sentença.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
*
2. FUNDAMENTOS.

O Tribunal deu como provados os seguintes,

2.1. Factos.

2.1.1. A R. B... celebrou com a Câmara Municipal de Torres Novas, em 6 de Setembro de 2001, um contrato denominado de: “contrato para a execução da empreitada da obra: Saneamento de Cabeço do Soudo e Carvalhal do Ponto” onde consta a adjudicação de uma Obra de Via Pública, cujo teor se encontra junto de fls. 19 a 25 e que aqui se dá por reproduzido.
2.1.2. Através do contrato referido em A) a R. ficou com a obrigação de realizar a obra referente à rede de esgotos do Carvalhal do Pombo.
2.1.3. O chamado C... celebrou com a chamada D... um contrato de seguro, titulado pela apólice nº 424036007, denominado de responsabilidade civil geral, através do qual transferiu a responsabilidade pelos danos que provocasse a terceiros pelas obras que efectuasse.
2.1.4. No dia 07 de Abril de 2002 pelas 21 horas e 20 minutos, a A. conduzia o veículo automóvel, sua propriedade, de marca Fiat, modelo Punto, de cor cinzenta com a matrícula 44-49-JE (com base na resposta ao Ponto 1) da Base Instrutória).
2.1.5. Circulando pela Rua Principal, em Carvalhal do Pombo, no sentido Carvalhal do Pombo – Estrada Nacional nº 349 (com base na resposta ao Ponto 2) da Base Instrutória).
2.1.6. O veículo conduzido pela A. circulava a uma velocidade de cerca de 30/40 km/hora (com base na resposta ao Ponto 3) da Base Instrutória).
2.1.7. Chovia torrencialmente e a estrada estava alagada de água (com base na resposta ao Ponto 4) da Base Instrutória).
2.1.8. Cerca de 200 metros mais à frente, após ter deixado a Sociedade Recreativa daquela aldeia de Carvalhal do Pombo, a A. avistou na estrada, do seu lado direito, face ao seu sentido de marcha, uma poça de água larga (com base na resposta ao Ponto 5) da Base Instrutória).
2.1.9. Junto à poça referida em 8) não havia qualquer sinalização (com base na resposta ao Ponto 6) da Base Instrutória).
2.1.10. Para se desviar da poça, a A. virou o veículo por si conduzido para a sua esquerda, ficando assim a circular no meio da faixa de rodagem (com base na resposta ao Ponto 7) da Base Instrutória).
2.1.11. Nesse mesmo momento, o veículo automóvel que a A. conduzia, embateu numa anilha (tampa de esgotos) (com base na resposta ao Ponto 8) da Base Instrutória).
2.1.12. A referida anilha encontrava-se saliente, em plena via pública, sem qualquer tipo de sinalização (com base na resposta ao Ponto 9) da Base Instrutória).
2.1.13. A tampa de esgoto referida em 11) estava rodeada de água, em virtude de existir uma depressão junto à mesma, por ter abatido parcialmente o tout venant que tinha sido colocado na estrada em causa (com base na resposta ao Ponto 10) da Base Instrutória).
2.1.14. A A. ao sentir o forte embate continuou, bastante devagar, a sua marcha (com base na resposta ao Ponto 11) da Base Instrutória).
2.1.15. Uns 200 metros mais à frente, já em cima da primeira curva, acendeu-se a luz do óleo (com base na resposta ao Ponto 12) da Base Instrutória).
2.1.16. Um pouco mais adiante (cinco ou seis metros) o veículo automóvel parou totalmente. sem dar qualquer sinal de vida (com base na resposta ao Ponto 13) da Base Instrutória).
2.1.17. A A. ainda tentou pôr o mesmo a trabalhar, mas em vão, pois o veículo ficou totalmente imobilizado (com base na resposta ao Ponto 14) da Base Instrutória).
2.1.18. O veículo 44-49-JE permaneceu toda a noite no local para onde o empurraram a A. e o sr. Nuno Filipe César Fernandes (com base na resposta ao Ponto 15) da Base Instrutória).
2.1.19. No dia seguinte foi necessário chamar um reboque para o levar a uma oficina (com base na resposta ao Ponto 16) da Base Instrutória).
2.1.20. Com o embate na anilha, o cárter do veículo 44-49-JE rebentou (com base na resposta ao Ponto 17) da Base Instrutória).
2.1.21. Tendo perdido todo o seu óleo (com base na resposta ao Ponto 18) da Base Instrutória).
2.1.22. O que fez com o motor gripasse (com base na resposta ao Ponto 19) da Base Instrutória).
2.1.23. A A. despendeu a quantia de 1.682,01 euros na aquisição de um motor reconstruído (com base na resposta ao Ponto 20) da Base Instrutória).
2.1.24. A reparação do motor gripado foi orçada no valor de 2.127,68 euros (com base na resposta ao Ponto 21) da Base Instrutória).
2.1.25. À data do sinistro, a A. estava grávida de 3 meses (com base na resposta ao Ponto 22) da Base Instrutória).
2.1.26. A A. é repositora de profissão (com base na resposta ao Ponto 23) da Base Instrutória).
2.1.27. Na altura referida em 1), a A. trabalhava em 4 sítios distintos, a saber: a) Ex-Torrental, em Torres Novas; b) Recheio no Botequim; c) Modelo em Torres Novas; d) E. Leclerc, no Entroncamento (com base na resposta ao Ponto 24) da Base Instrutória).
2.1.28. Necessita do seu veículo automóvel para se deslocar para esses locais, a fim de exercer a sua actividade profissional (com base na resposta ao Ponto 25) da Base Instrutória).
2.1.29. A A. ficou impossibilitada de utilizar a viatura 44-49-JE, desde a data referida em 1), até ao dia 19-8-2002 (com base na resposta ao Ponto 26) da Base Instrutória).
2.1.30. Durante o período referido em 29) a A. recorreu a veículos de aluguer e transportes públicos (com base na resposta ao Ponto 28) da Base Instrutória).
2.1.31. Com o que despendeu a quantia de 136,90 euros (com base na resposta ao Ponto 29) da Base Instrutória).
2.1.32. Por vezes, a A. deslocou-se a pé para o seu local de trabalho (com base na resposta ao Ponto 30) da Base Instrutória).
2.1.33. A A. ficou nervosa devido à situação descrita (com base na resposta ao Ponto 33) da Base Instrutória).
2.1.34. Após o sinistro e durante um longo período de tempo, a A. sentiu ansiedade (com base na resposta ao Ponto 34) da Base Instrutória).
2.1.35. A R. celebrou com o chamado C... um contrato verbal denominado de “subempreitada”, através do qual este se obrigou para com a R. a realizar a obra contratada pela Câmara Municipal e descrita no contrato referido em A), designadamente a abertura de valas, a colocação de tubagens e o fecho das valas, com excepção da colocação do pavimento de alcatrão, que ficou reservado para a R. (com base na resposta ao Ponto 35) da Base Instrutória).
2.1.36. Todos os trabalhos referidos em 35), executados no âmbito da mencionada obra, foram realizados pelo chamado C... ou por pessoas a seu cargo, ao abrigo do contrato referido em 35) (com base na resposta ao Ponto 36) da Base Instrutória).
2.1.37. Foi estabelecido no contrato mencionado em 35) que competia ao chamado C... proceder à adequada colocação das tampas de esgoto (com base na resposta ao Ponto 37) da Base Instrutória).
2.1.38. Enquanto a obra esteve em execução, encontravam-se colocados sinais no local onde estavam a ser executados os trabalhos e ainda um placar no início da obra com a indicação que a mesma estava adjudicada à R. (com base na resposta ao Ponto 38) da Base Instrutória).
2.1.39. Em 7 de Abril de 2002 a obra estava ainda em curso (com base na resposta ao Ponto 39) da Base Instrutória).
2.1.40. O chamado C... procedeu à abertura longitudinal ao centro e ao longo da via de uma vala para colocação da canalização necessária aos esgotos (com base na resposta ao Ponto 40) da Base Instrutória).
2.1.41. Quando ocorreu o sinistro toda a canalização já se encontrava no local e a respectiva vala tapada com tout venant (com base na resposta ao Ponto 41) da Base Instrutória).
2.1.42. Apenas se encontrando por colocar a última camada de “desgaste” (com base na resposta ao Ponto 42) da Base Instrutória).
2.1.43. No local onde estavam a trabalhar as pessoas ao serviço do chamado C... e onde estavam a ser executadas actividades específicas da obra em causa, existia um sinal de “trabalhos na via” (com base na resposta ao Ponto 43) da Base Instrutória).
2.1.44. No mesmo local referido em 43) existia outro sinal indicativo de “passagem estreita” (com base na resposta ao Ponto 44) da Base Instrutória).
2.1.45. No mesmo local referido em 40) existia outro sinal indicativo de: “outros perigos” (com base na resposta ao Ponto 45) da Base Instrutória).
2.1.46. Para se desviar da poça referida, a A. virou o veículo por si conduzido para a sua esquerda, ficando assim a circular no meio da faixa de rodagem (com base na resposta ao Ponto 46) da Base Instrutória).
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2.2. Reapreciação da matéria de facto.

Vem requerida a reapreciação da matéria de facto.
Previamente à análise desta questão, nunca será de mais salientar que o pedido de reapreciação da matéria de facto não conduz a um novo julgamento, nem pode supri-lo. Na verdade, a prova gravada ou transcrita nunca poderá suprir a abundância de pormenores que a imediação proporciona ao Juiz quando aprecia a matéria de facto; o modo como a testemunha depõe, as suas reac-ções, as suas reticências e a sua mímica, são factos decisivos na formação de uma convicção final e que não podem ser captados pela frieza de meios mecânicos. Assim o Juiz da 1ª instância que julga de facto, goza de ampla liberdade de movimentos ao erigir os meios de que se serve na fixação dos factos provados, de harmo-nia com o princípio da livre convicção e apreciação da prova; as provas são livremente valoradas pelo Juiz sem obediência a regras pré-fixadas – artº 655º do Código de Processo Civil. E essa liberdade de apreciação com base no conjunto do material probatório recolhido pela percepção global é insindicável por esta Relação. Nesta conformidade, o Tribunal de recurso só em casos excepcionais de manifesto erro de apreciação da prova poderá alterar o decidido em 1ª instância; será o caso de o depoimento de uma testemu-nha ter um sentido diame-tralmente oposto ao que foi considerado na sen-tença conjugado ou não com qualquer documento em que se não tenha atentado devidamente e pouco mais.
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Insurgem-se os RR. quanto às respostas conferidas aos quesitos 37º, 41º e 42º da Base Instrutória.
Perguntava-se nos aludidos quesitos respectivamente o seguinte:

Quesito 37º: Foi estabelecido no contrato mencionado em 35º que competia ao chamado C... sinalizar convenientemente a obra, bem como proceder à adequada colocação das tampas de esgoto?

Quesito 41º: Quando ocorreu o sinistro toda a canalização já se encontrava no local e a respectiva vala tapada com tout venant?

Quesito 42º: Apenas se encontrando por colocar a última camada de desgaste?

O Tribunal respondeu afirmativamente aos quesitos 41º e 42º.

Ao quesito 37º foi respondido “provado apenas e com esclarecimento que foi estabelecido no contrato mencionado em 35º que competia ao chamado C... proceder à adequada colocação das tampas de esgoto”.
Entendem os apelantes que deveria ter sido conferida resposta negativa aos quesitos em análise.
Decidindo:
- No que toca ao quesito 37º, a prova produzida não permite, em nosso entender, ir mais além do que do que foi entendido em primeira instância. Inexiste contrato escrito sendo por isso os elementos colhidos dos informes das testemunhas, nomeadamente Fernando Júlio Monteiro Lopes e Lino Filipe da Silva que não permitem que se tirem outras ilações.
Quesitos 41º e 42º: Entende este Tribunal que a resposta que lhes foi conferida em 1º instância é adequada à prova que sobre o mesmo foi produzida. A testemunha Fernando Lopes e mormente Lino da Silva referem que o trabalho estava pronto, que “aquilo ficou muito tempo sem ser alcatroado” e que “à volta da manilha havia um buraco”.
Nenhuma das restantes testemunhas apontou com credibilidade algo que pudesse por em causa a conclusão a que se chegou.
Nestes termos nada há a alterar à resposta aos quesitos 41º e 42º.
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2.3. O Direito.

Nos termos do precei-tuado nos artsº 660º nº 2, 684º nº 3 e 690º nº 1 do Código de Pro-cesso Civil, e sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, as conclusões da alegação de recurso deli-mitam os poderes de cognição deste Tribunal.
Nesta conformi-dade e conside-rando também a natureza jurídica da maté-ria versada, cumpre focar os seguintes pontos:
- Existia vínculo jurídico entre a apelante Ré B... e o chamado C...?
- Reflexos quanto ao dever de indemnizar a Autora.
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2.3.1. Existia vínculo jurídico entre a apelante Ré B... e o chamado C...?

A sentença apelada limitou-se na presente acção e no que concerne aos chamados C... e D... a declarar, nos termos do disposto no artigo 332º nº 4 do Código de Processo Civil, que o aresto constitui caso julgado quanto aos mesmos, nos termos do artigo 341º do citado Diploma Legal, relativamente às questões de que dependa o direito de regresso dos autores do chamamento, ou seja da Ré e do chamado C....
Discordando desta posição, entende a Ré que deverá ser condenado o chamado C... a indemnizar a Autora em virtude de na execução dos trabalhos que lhe cabia efectuar, não ter tomado as necessárias precauções em ordem a evitar o acidente.
A solução a dar a esta controvérsia não pode prescindir da análise e configuração do vínculo contratual existente entre a ora apelante e o chamado, considerando nomeadamente o respectivo enquadramento no âmbito do regime da empreitada de obras públicas regulado pelo DL 59/99 de 2 de Março.
De harmonia com o disposto no artigo 2º do Diploma citado, entende-se por “empreitada de obras públicas” o contrato administrativo O que não significa necessariamente, como sustenta alguma Jurisprudência, que a execução de um contrato de empreitada de obras públicas se traduza num acto de gestão pública; cfr. Intervenção de terceiros na Acção de responsabilidade civil da Administração” in “Cadernos de Justiça Administrativa”, nº 53 e Jurisprudência aí citada; em sentido contrário Alexandra Leitão “A Protecção Judicial dos Terceiros nos Contratos da Administração Pública Almedina, Coimbra 2002, pags. 438 ss. , celebrado mediante o pagamento de um preço, independentemente da sua forma, entre um dono de obra pública e um empreiteiro de obras públicas e que tenha por objecto quer a execução quer conjuntamente a concepção e a execução das obras mencionadas no nº 1 do artigo 1º, bem como das obras ou trabalhos que se enquadrem nas subcategorias previstas no diploma que estabelece o regime do acesso e permanência na actividade de empreiteiro de obras públicas, realizados seja por que meio for e que satisfaçam as necessidades indicadas pelo dono da obra.
Tal como no direito civil também aqui o empreiteiro pode socorrer-se de auxiliares bem como lançar mão do contrato de subempreitada – artigo 1 213º do Código Civil – em que um terceiro se obriga a realizar perante o primeiro a obra a que se aquele se encontra vinculado ou parte dela. Nas relações internas figura o empreiteiro no âmbito do subcontrato como sendo o dono da obra sendo o subempreiteiro o empreiteiro daquele Cfr. desde logo o Ac. STJ de 24-10-2002 in Col. de Jur., 2002, S III, 116. . O contrato de subempreitada, comum no direito civil onde não carece de forma especial, já a exige ao nível das empreitadas de obras públicas, devendo constar de documento particular outorgado pelas partes contratantes – nº 2 do artigo 255º do DL 599/99. Esta exigência, cuja inobservância a lei comina com a nulidade – nº 4 do citado normativo legal – compreende-se na medida em que a forma escrita é praticamente o único meio que a entidade pública tem de pedir responsabilidades pela evolução da obra. No caso vertente não foi celebrado por escrito qualquer contrato de subempreitada entre a B... e o chamado C..., o que acarretaria sempre a nulidade do mesmo. Todavia entende a empreiteira que a responsabilização do aludido C... se efectiva de harmonia com o vínculo comitente/comissário gerado entre ambos.
Em nossa óptica a tese da apelante é redutora e contraditória. No seu entender, não podendo valer-se do contrato de subempreitada, nulo por falta de forma, pretende aquela reconduzi-lo a uma hipótese de comissão. A tal pretensão adiantaremos à partida, que esboçada a tese da subempreitada, ainda que nula, tal figura é inteiramente incompatível com a relação comitente/comissário por serem antagónicos os respectivos elementos integradores. Na verdade o subempreiteiro tem autonomia no tocante ao empreiteiro, estando apenas adstrito a uma obrigação de resultado Cfr. Pedro Romano Martínez “O Subcontrato”, Almedina, Coimbra, 1989, pag. 41. Enneccerus Lehmann “Tratado de Derecho Civil” Bosch, II, I pags. 433 ss. ; tal não sucede na comissão onde se verifica uma subordinação técnico-jurídica ao comitente. Por aqui se vê que o contrato de subempreitada nulo apenas por falta de forma é insusceptível de enquadramento na comissão. É bem certo que o Juiz não está, na aplicação do direito, subordinado à qualificação que as partes dão a uma determinada relação jurídica e assim não estaria impedido de enquadrar a vertente num esquema de subsunção não indicado pelas partes, nomeadamente o de comitente/comissário. Contudo, para que tal pudesse suceder, seria necessário que os elementos integradores da figura estivessem devidamente alegados e provados. Não é isso contudo o que se verifica. Como pode ler-se da contestação – cfr. fls. 52 s – a tese da ora apelante é clara no sentido de haver celebrado um contrato de subempreitada com C..., tendo sido nessa base que requereu a intervenção provocada do mesmo.
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2.3.2. Reflexos quanto ao dever de indemnizar a Autora.

Nesta conformidade nula a subempreitada, não se configurando entre a apelante e o C... o vínculo comitente/comissário não temos elementos para apurar com precisão a que título decorreu a sua intervenção na obra… Mas também não é premente tal qualificação nesta sede, onde releva especialmente o vínculo de responsabilidade extracontratual para com a Autora, por via do deficiente cumprimento do contrato administrativo de empreitada celebrado entre o Estado e a Ré. Esta última, que por lei é demandada directamente pelo lesado, perfila-se como a única interlocutora válida da relação extracontratual surgida, desde logo pelo não cumprimento por parte da empreiteira dos “deveres de protecção” inerentes ao exercício da sua actividade, nomeadamente acautelando os utentes da estrada dos efeitos laterais nefastos que a efectivação das obras não convenientemente sinalizadas, podia acarretar. Também a mobilização de terceiros por parte da Ré introduzindo-os no âmbito do cumprimento da relação administrativa obrigacional contraída com o Estado, vem a onerá-la face aos prejuízos sofridos pela Autora Podem ler-se algumas considerações pertinentes em Manuel Carneiro da Frada “Contrato e Deveres de Protecção”, Coimbra 1994, pags. 143 ss. Separata do BFD..
Nesta conformidade nada há a alterar ao decidido, tendo a sentença agido correctamente ao responsabilizar apenas a Ré B..., pelos danos sofridos pela Autora.
Tal circunstância dita a improcedência da apelação.
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3. DECISÃO.

Pelo exposto acorda-se em julgar a apelação improcedente e confirma-se a sentença apelada.
Custas pela apelante.