Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1017/15.6T8CBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: RAMALHO PINTO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
REPARAÇÃO
LEI APLICÁVEL
ATUALIZAÇÃO DAS PENSÕES
Data do Acordão: 03/06/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA - JUIZO DO TRABALHO DE COIMBRA – JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Legislação Nacional: LEI Nº 2127, DE 3/08/1965; LEI Nº 100/97, DE 13/09; LEI 99/2009, DE 4/09.
Sumário: I - Tendo o acidente de trabalho ocorrido na vigência da Lei nº 2127, de 3 de Agosto de1965, regulamentada pelo Decreto n.º 360/71, de 21 Agosto, é este o regime legal aplicável.

II - Com a entrada em vigor da Lei 100/97, de 13/9, as pensões emergentes de acidente de trabalho continuaram a ser susceptíveis de atualização apenas para os casos de incapacidade permanente (fosse ela parcial com coeficiente de desvalorização igual ou superior a 30%, fosse ela absoluta ou fosse absoluta para o trabalho habitual), ou por morte – artº 39º, nº 2, mas agora nos termos em que o fossem as pensões do regime geral de segurança social, como dispõe o artº 6º do DL 142/99, de 30/04.

III - Depois, a Lei 99/2009, de 4/09 – que regula o atual regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais (NLAT), veio revogar a Lei 100/97 e o respectivo regulamento (DL 143/99), mas não afectou o DL 142/99, de 30/04, que não foi revogado (expressa ou tacitamente), nem tão pouco alterado para se adequar ao novo regime de pensões actualizáveis, pelo que é este diploma que continua a reger as actualizações das pensões devidas por acidentes de trabalho.

Decisão Texto Integral:    









                 Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

                    Nesta acção emergente de acidente de trabalho, em que é beneficiária M..., patrocinada pelo MºPº, e entidade responsável A...- COMPANHIA DE SEGUROS, SA,  a seguradora apresentou o seguinte requerimento...

                    Na sequencia de promoção do MºPº, foi proferido o seguinte despacho:

                        “Requerimento refª :

                        Alegando nos termos melhor expostos no requerimento em apreço, informa a Seguradora ter procedido aos acertos devidos, na pensão da beneficiária, M..., dado a mesma ter atingido os 66 anos em 29/04/2018, indicando o valor de €2.209,44 para a atualização desde 01/01/2019.

                        Em Vista que se determinou pronunciou-se o Ministério Público, nos termos melhor constantes da douta promoção que antecede, que se dá, por integralmente reproduzida, indicando o valor de €1.940,38, para a mesma pensão.

                        Compulsados os autos constata-se que o acidente neles em causa e que vitimou o sinistrado, J..., ocorreu em 01 de maio de 1989, pelo que se regia pela Lei 2127 de 3 de Agosto de 1965, cuja, no que ora releva e na Base XIX estatuía ” Se do acidente resultar a morte, os familiares da vítima receberão as seguintes pensões anuais: a) Viúva, se tiver casado antes do acidente: 30 por cento da retribuição-base da vítima até perfazer 65 anos, e 40 por cento a partir desta idade (…)”

                        Assim e com base no normativo supracitado e caso não tivesse havido alteração do mesmo, teria sido aos 65 anos de idade, que a pensão da beneficiária - viúva do sinistrado – se teria de ter alterado.

                        Porém e conforme resulta da Lei 22/92 de 14/08, publicada no Diário da Republica n. º 187/1992, Série I-A de 1992-08-14, foi a aludida Base XIX, alterada, no que aqui releva para:

                        “1 - Se do acidente de trabalho ou da doença profissional resultar a morte, os familiares da vítima receberão as seguintes pensões anuais:

                        a) Cônjuge - 30% da remuneração base da vítima até perfazer a idade de reforma por velhice e 40% a partir daquela idade ou no caso de doença física ou mental que afete sensivelmente a sua capacidade de trabalho;” (negritos nossos).

                        Assim, passou a ser de se atender, à idade da reforma por velhice, para alteração, da pensão da beneficiária, cuja, em 2018, era de 66 anos e 4 meses conforme Portaria 99/2017, de 7 de março.

                        Ora, não tendo havido qualquer remição a levar em conta e tendo presente que a atualização ocorrida em 01/01/2018, fixava a pensão em €1.736,20 –  vd. Informação da Seguradora de folhas 86 com confirmação do Mº. Pº. de folhas 87 e validação judicial a folhas 88 - e tendo a beneficiária atingido os 66 anos e 4 meses de idade, em 29/08/2018, afigura-se-nos que os valores a considerar serão de:

                        A partir de 29/08/2018, €2.314,93  - 1.736,20:0,30X0,40.

                        A partir de 01/01/2019, €2.351,97 –  Portaria nº 24/2019, de 17 de janeiro (Pensão de 2018 x 1,016 = Pensão de 2019 ).

                        Uma vez que os valores apresentados não correspondem ao cálculo ora efetuado notifique-se a Seguradora e abra-se Vista ao Ministério Público, para que informem o que tiverem por conveniente”.

                    Na sequência da respetiva notificação, veio a seguradora apresentar o seguinte requerimento:

                    ...

                    Face ao que foi proferido o seguinte despacho:

                        “Conforme já referimos no nosso despacho datado de 08/07/19, que aqui damos por integralmente reproduzido, a beneficiária, M..., atingiu a idade da reforma em 29/08/2018.

                        Assim e como também já referimos no despacho a que supra aludo, não tendo havido qualquer remição a levar em conta e tendo presente que a atualização ocorrida em 01/01/2018, fixava a pensão em €1.736,20 – vd. informação da Seguradora de folhas 86 com confirmação do Mº. Pº. de folhas 87 e validação judicial a folhas 88 - e tendo a beneficiária atingido os 66 anos e 4 meses de idade, em 29/08/2018, atualizo a sua pensão nos seguintes termos:

                        A partir de 29/08/2018, para €2.314,93 - 1.736,20:0,30X0,40.

                        A partir de 01/01/2019, para €2.351,97 – Portaria nº 24/2019, de 17 de janeiro (Pensão de 2018 x 1,016 = Pensão de 2019).

                        Com cópia do despacho de 08/07/2018, notifique, sendo a Seguradora, para proceder em conformidade, juntando comprovativo do pagamento aos autos”.

                                                           x
                    Inconformada com o decidido, veio a Ré - seguradora interpor recurso de apelação, onde formulou as seguintes conclusões:

                    1ª- Os presentes autos de acidente de trabalho têm origem no acidente ocorrido em 1 Maio 1989 e do qual resultou a morte do sinistrado J... Atendendo à referida data, o seu regime de reparação é o constante da Lei 2127, de 3 Agosto 1965, regulamentada pelo Decreto n.º 360/71, de 21 Agosto.

                        2ª- De acordo com o disposto na Base XIX da referida Lei 2127, na redação que a mesma apresentava em vigor em 29 Novembro 1990 (data da realização da Tentativa de Conciliação), “Se do acidente resultar a morte, os familiares da vítima receberão as seguintes pensões anuais: a) Viúva, se tiver casado antes do acidente: 30 por cento da retribuição-base da vítima até perfazer 65 anos, e 40 por cento a partir desta idade (…)”

                        3ª- Do auto de conciliação, homologado por sentença, consta que à viúva do sinistrado é fixada “a pensão anual, no montante de 122.400.00, até perfazer a idade de 65 anos e a pensão anual de 163.200.00, a partir dos 65 anos, a partir do dia 30 de maio de 1989”.

                        4ª- A Lei n.º 22/92, de 14 de Agosto alterou a Base XIX da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, com efeitos desde 6 de Outubro de 1988, passando a mesma a determinar, no seu número 1, que “Se do acidente de trabalho ou da doença profissional resultar a morte, os familiares da vítima receberão as seguintes pensões anuais: a) Cônjuge - 30% da remuneração base da vítima até perfazer a idade de reforma por velhice e 40% a partir daquela idade ou no caso de doença física ou mental que afecte sensivelmente a sua capacidade de trabalho;”

                        5ª- Face a este quadro legal, a beneficiária M..., viúva do sinistrado, tem direito a receber uma pensão actualizada a partir da idade de reforma por velhice, actualmente, fixada nos 66 anos e 4 meses (Portaria 99/2017, de 7 de março).

                        6ª- A referida beneficiária atingiu, em 29 Agosto 2019, a idade de reforma por velhice. Por isso, a partir dessa data, tem direito a receber, de acordo com a referida Base, uma pensão de valor diferente daquela que vem recebendo desde a morte do sinistrado, por aplicação da percentagem de 40%.

                        7ª- Interpretando a norma legal, de acordo com as regras hermenêuticas expressas no Art.º 9º do Código Civil, a percentagem de 40% tem, necessariamente, de se referir à “remuneração base da vítima”.

                        8ª- Não tem o mínimo de correspondência no texto da lei o cálculo da pensão efectuado pelo Tribunal a quo, com base na tese de que essa percentagem se reporta ao próprio valor da pensão.

                        9ª- Por outro lado, não há fundamento material bastante para distinguir os cônjuges dos sinistrados que já tivessem atingido a idade da reforma à data da fixação da pensão dos demais, com distintas formas de cálculo da pensão.

                        10ª- De acordo com a perspectiva do Tribunal a quo, na hipótese de o cônjuge ter já a idade da reforma à data do acidente, e não se reportando a referida percentagem de 40% ao valor da retribuição mas ao valor da pensão, seria necessário, num primeiro momento, calcularmos uma pensão com base em 30% da retribuição e, num segundo momento, perante a mesma, aplicar a percentagem de 40%.

                        11ª- A exegese mais consonante com a letra da lei e com o princípio da unidade do sistema jurídico é no sentido de que a percentagem de 40% a que alude a Base XIX da Lei 2127, com a redação que lhe foi dada pelo Lei 22/92, se reporta à retribuição do sinistrado referida na primeira parte do preceito e, por isso, o legislador não viu necessidade de a repetir novamente.

                        12ª- Para determinarmos o valor devido à data em que a beneficiária atinge a idade da reforma, a nova pensão deve ser incrementada de modo a fazer face à desvalorização da moeda e consequente aumento do custo de vida, aplicando-se ao valor correspondente a 40% da retribuição base auferida pelo sinistrado todas as actualizações que seriam devidas desde a data inicial da fixação da pensão nos termos do artigo 6.°, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 Abril.

                        13ª- Em respeito pelas normas legais invocadas, a ora Recorrente calculou o valor da pensão à data da morte do sinistrado (€ 814,08) e actualizou-a, de acordo com os sucessivos coeficientes publicados para o efeito.

                        14ª- A pensão anual, calculada com base em 40% da retribuição base do sinistrado, sucessivamente actualizada, em 29 Agosto 2018 (data em que passou a ser devida por ser a data em que a beneficiária legal atingiu a idade da reforma por velhice) ascende ao valor de € 2.174,65, e em 1 Janeiro 2019 cifra-se em € 2.209,44, valores que se reputam correctos.

                        15ª- O Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, violou o preceituado na Base XIX da Lei 2127, de 3 Agosto 1965, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 22/92, de 14 de Agosto, e no Art.º 9º do Código Civil.

                        TERMOS EM QUE

                        Deve o Despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que actualize a pensão anual da beneficiária M..., à data em que esta completa 66 anos e 4 meses de idade (29 Agosto 2018), para o valor de € 2.174,65 e, em 1 Janeiro 2019, para € 2.209,44.

                    O MºPº contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido.

                    Foram colhidos os vistos legais.

                    Definindo-se o âmbito do recurso  pelas suas conclusões, temos, como única questão a apreciar, a de saber se, aquando da alteração da pensão da viúva de 30% para 40% por ter perfeito a idade de reforma, a mesma deve ser actualizada com referência à data desde a qual era devida a pensão, embora devida apenas a partir da data em que atinge a idade de reforma.
                    Como factualidade relevante temos a descrita no relatório do presente acórdão.

                    O direito:

                    O despacho recorrido actualizou a pensão, aplicando os coeficientes legais ao valor da pensão a que a beneficiária, viúva do sinistrado, teria direito, tendo em conta a data em que mesma atingiu a idade legal da reforma em  29 de Agosto de 2019, ou seja, a partir de 29/08/2018, € 2.314,93   (1.736,20 : 0,30 x 0,40), e, a partir de 01/01/2019, € 2.351,97 (pensão de 2018 x 1,016 = Pensão de 2019 ).

                    Com este critério não concorda a recorrente-seguradora, entendendo que se deve aplicar ao valor correspondente a 40% da retribuição base auferida pelo sinistrado todas as actualizações que seriam devidas desde a data inicial da fixação da pensão, nos termos do artigo 6°, nº 1, do Decreto-Lei nº 142/99, de 30 Abril, a que o despacho recorrido não atendeu.

                    Salvo melhor opinião, afigura-se-nos que assiste razão à apelante.

                    Tendo o acidente de trabalho ocorrido na vigência da Lei nº  2127, de 3 de Agosto de1965, regulamentada pelo Decreto n.º 360/71, de 21 Agosto, é este o regime legal aplicável.

                    Como  refere o acórdão da Relação de Lisboa de 18/05/2016 (proc. 82/10.7TTSTB.L1.4, in www.dgsi.pt), o regime da actualização das pensões devidas por acidente de trabalho – ou por doença profissional – foi introduzido na ordem jurídica portuguesa por via do DL 668/75, de 24/11, motivado pela “desvalorização da moeda e consequente aumento do custo de vida”, como se lê no seu preâmbulo. Essa actualização estava condicionada a determinados critérios legais – valor anual da retribuição que, sendo indexado ao valor da retribuição mínima mensal legalmente fixada para o sector em que o trabalhador exercesse a sua actividade e para o território onde a exercesse, não poderia ser superior àquela remuneração mínima mensal, e o grau de incapacidade permanente, necessariamente igual ou superior a 30%.

          Depois, com a entrada em vigor da Lei 100/97, de 13/9, as pensões emergentes de acidente de trabalho continuaram a ser susceptíveis de actualização apenas para os casos de incapacidade permanente (fosse ela parcial com coeficiente de desvalorização igual ou superior a 30%, fosse ela absoluta ou fosse absoluta para o trabalho habitual), ou por morte – artº 39º, nº 2, mas agora nos termos em que o fossem as pensões do regime geral de segurança social, como dispõe o artº 6º do DL 142/99, de 30/04.

          Depois, a Lei 99/2009, de 4/09 – que regula o actual regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais (NLAT), veio revogar a Lei 100/97 e o respectivo regulamento (DL 143/99), mas não afectou o DL 142/99, de 30/04, que não foi revogado (expressa ou tacitamente), nem tão pouco alterado para se adequar ao novo regime de pensões actualizáveis, pelo que é este diploma que continua a reger as actualizações das pensões devidas por acidentes de trabalho.

                    Os presentes autos de acidente de trabalho tiveram a sua origem no acidente ocorrido em 1 de Maio de 1989, e do qual resultou a morte do sinistrado J...

                    No auto de conciliação datado de 29 de Novembro de 1990, devidamente homologado, à viúva do sinistrado foi fixada “a pensão anual, no montante de 122.400$00, até perfazer a idade de 65 anos e a pensão anual de 163.200$00, a partir dos 65 anos, a partir do dia 30 de Maio de 1989”.

                    Convertendo os referidos valores para a nossa moeda actual, a pensão foi fixada em €610,53 até perfazer 65 anos e em €814,04 após essa idade.

                    Dispõe a base XIX da Lei nº 2.127, no seu nº 1:

                    “Pensões por morte

                    1. Se do acidente resultar a morte, os familiares da vítima receberão as seguintes pensões anuais:

                    a) Viúva, se tiver casado antes do acidente: 30 por cento da retribuição-base da vítima até perfazer 65 anos, e 40 por cento a partir desta idade ou no caso de doença física ou mental que afete sensivelmente a sua capacidade de trabalho; (...)”.

                    A Lei nº 22/92, de 14 de Agosto, veio alterar  esta Base XIX da Lei nº 2.127, com efeitos reportados a 6 de Outubro de 1988, passando a mesma a determinar, no seu número 1, que:

                     “1. Se do acidente de trabalho ou da doença profissional resultar a morte, os familiares da vítima receberão as seguintes pensões anuais:

                    a) Cônjuge - 30% da remuneração base da vítima até perfazer a idade de reforma por velhice e 40% a partir daquela idade ou no caso de doença física ou mental que afecte sensivelmente a sua capacidade de trabalho;(...)”.

                    Ou seja, no caso presente, a beneficiária tem direito a receber uma pensão actualizada – 40% da retribuição base do sinistrado -  a partir da idade de reforma por velhice, actualmente fixada nos 66 anos e 4 meses, conforme disposto na Portaria nº 99/2017, de 7 de Março, ou seja, a partir de 29 de Agosto de 2018.

                    Como se refere no Ac. da Relação de Guimarães de 17/05/2018, proc. 4077/16.9T8VCT.12.G1, que merece a nossa inteira concordância, “Não se trata de uma nova pensão, o facto constitutivo do direito é o mesmo e a data a que se reporta o direito à pensão, a pensão por óbito de cônjuge em sinistro laboral, é o que a lei refere, o dia seguinte ao do falecimento (artigo 56º do D.L. 360/71).

                    Do que se trata não é de fixar uma nova pensão, mas antes de fixar a pensão devida para o mesmo “direito”, com base em critério diverso, em função de circunstância relevada pela lei como motivo bastante para justificar um montante indemnizatório mais elevado. A al. a) da base refere como se calcula a “pensão” da viúva, não aludindo a direito a “pensões”. A pensão é a mesma, o seu valor é que diverge a partir da idade de reforma.

                   A pensão fixada agora com base em 40% não é uma atualização da anterior pensão, mas sim a mesma pensão calculada de forma diversa (pelas razões já expendidas), ocorre uma alteração do valor indemnizatório. Tal pensão deve ser atualizada, tendo em conta a data do vencimento do direito, até data a partir da qual a beneficiária passará a recebê-la, sob pena de o valor nominal a entregar não corresponder ao valor real, em virtude da desvalorização da moeda.

                    Note-se que se á data do óbito a viúva já tiver atingido a idade de reforma, a pensão será desde logo fixada com base em 40% da retribuição base da vítima, o mesmo acontecendo se sofrer de doença física ou mental que afete sensivelmente a sua capacidade de trabalho.

                    A reforma estava associada ao termo do período ativo da pessoa, podendo ocorrer uma quebra nos rendimentos próprios, e acréscimo de necessidades designadamente ao nível da saúde, o que justifica a majoração da pensão da viúva. Veja-se ainda a segunda hipótese prevista na lei para a fixação da pensão desde logo em 40%, relacionada com uma diminuição de capacidade de por si angariar meios de subsistência.

                    A atualização da pensão visa ajustar o valor tendo em consideração a desvalorização do valor da moeda, de forma a que a pensão a atribuir em cada ano corresponda ao seu valor real e efetivo, em termos de “bens” a que a quantia correspondia, tendo em conta a data a considerar para a sua fixação, pois só assim o direito não se degrada. Visa-se pois a manutenção do valor real inicial.

                    Tendo em vista tal finalidade a lei estabelece a atualização, fixando com a periodicidade adequada o valor de atualização, valor que vale para o período a que se destina, não podendo falar-se em revogação.

                    A lei refere 40% da retribuição base. Deve ser esse o valor a atribuir. Mas em termos reais, ou seja o valor que a esta data corresponde àqueles 40%. A não ser assim estaremos a cortar na pensão que a lei refere.

                    À pensão alterada, devem aplicar-se todas as atualizações que teria sofrido se fosse devida desde início, embora apenas seja devida apenas a partir do momento em que a beneficiária atinge a idade de reforma.

                    Quanto à atualização refere o artº 6.º do D.L. 142/99:

                    Atualização anual

                    1 - O valor das pensões de acidentes de trabalho é atualizado anualmente com efeitos a 1 de janeiro de cada ano, tendo em conta os seguintes indicadores de referência:

                    4 - A atualização anual das pensões consta de portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e do trabalho e da solidariedade social.

                    5 - A taxa de atualização é arredondada até à primeira casa decimal.

                    (Anteriormente o D.L. 39/81 e despacho normativo nº 180/81).

                    O objetivo sempre foi o da manutenção do valor real inicial.
Para se encontrar o valor final correspondente em termos reais a 40% retribuição-base da vítima à data do decesso, a pensão alterada deve ser atualizada por forma a fazer face à desvalorização da moeda.

                    Adicionar ao valor calculado com base em 40% o valor correspondente à atualização ou atualizações que foi sofrendo a pensão calculada com base em 30% carece de sentido, autonomizando a atualização em relação ao valor de referência, e por outro daria origem a desigualdades entre beneficiários já “reformados”, em idêntica condição, variando apenas a idade em que haviam atingido aquela idade de reforma” (negritos nossos).

                    Neste sentido, embora com a referencia à pensão objecto de revisão, mas tendo em conta que o raciocínio, a razão de ser e os fundamentos legais são os mesmos, vejam-se o acórdão desta Relação de Coimbra proferido no processo 700/10.7TTVIS.1.C1, o acórdão da Relação do Porto de 11/10/2018, processo 596/14.0T8VFR.10.P1, bem como o acórdão do STJ de 3/3/2010 (proc. 14/05.4TTVIS.C2.S1, in www.dgsi.pt), que indicou que, se a pensão revista deve ser calculada do mesmo modo que o foi a pensão inicial, então os coeficientes de actualização devem sobre a mesma incidir como se estivesse a ser fixada desde o início, não obstante apenas ser devida desde a data de entrada do requerimento que deu início ao incidente de revisão.

                    Assim, há que dar razão à seguradora-apelante quando afirma que à pensão a que a viúva tem direito, em virtude de sinistro laboral, aquando da alteração de 30% para 40%, por ter atingido a idade legal de reforma, devem aplicar-se todas as actualizações que teria sofrido se fosse devida desde o início, embora apenas seja devida a partir do momento em que a beneficiária atinge a idade de reforma.

                    Posto isto, e dado que os cálculos para as sucessivas actualizações da pensão, vertidos no corpo da alegação de recuso, se mostram correctamente efectuados, procede integralmente a apelação.

                    Decisão:

                    Nos termos expostos, acorda-se em julgar procedente a apelação, alterando-se a decisão recorrida, no sentido de que os montantes actualizados da pensão deverão ser de €2.174,65, a partir de 29/08/2018, e de €2.209,44, a partir de 01/01/2019, devendo ter-se em conta as futuras actualizações legais, de harmonia com os critérios enunciados.

                    Sem custas o recurso.

                                                 Coimbra, 06/03/2020