Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3625/07.0TJCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ISABEL FONSECA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
ACIDENTE DE TRABALHO
SUBROGAÇÃO
SEGURADORA
INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 03/17/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 31 DA LEI 100/1997, DE 13/09 E 498º, Nº3 DO CÓD. CIVIL
Sumário: I. Em caso de acidente simultaneamente de viação e de trabalho, o direito que assiste à seguradora laboral e/ou entidade patronal, de ser reembolsada da indemnização que tiver pago – direito conferido pela Base XXXVII, nº4 da Lei 2127 de 03/08/1965 e, actualmente, pelo art. 31 da Lei 100/1997, de 13/09 – configura um caso de sub-rogação (legal) – art. 592º, nº1 do Cód. Civil – daqueles nos direitos do lesado contra o causador do acidente ou respectiva seguradora, na estrita medida do que foi pago a título indemnizatório e não perante hipótese de direito de regresso entre os responsáveis e no âmbito do regime de solidariedade;

II. O crédito por sub-rogação pressupõe o pagamento e só nasce com o pagamento, pelo que o prazo de prescrição deve contar-se a partir do cumprimento;

III. Agindo a autora/seguradora como sub-rogada nos direitos do lesado/sinistrado e tendo iniciado o pagamento da pensão em data anterior a 07/11/2001, pelo menos nessa data tomou conhecimento do direito que lhe competia, podendo livremente exercê-lo, pelo que se impunha accionar a ré, no máximo, no prazo de cinco anos – art. 498º, nº3 do Cód. Civil – a contar desse momento, sob pena de prescrição do direito (unitário) à pensão.

Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 1ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra

 

I. RELATÓRIO

A... ., com sede na ...., em ...., intentou a presente acção declarativa de condenação, com forma de processo sumário, contra a B... , com sede na ..., em ..., pedindo que esta seja condenada a pagar - lhe a quantia de € 5.276,75, e ainda os montantes que se vierem a liquidar em execução de sentença, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos desde a citação e até efectivo pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão invoca que:

Celebrou com C... um seguro do ramo acidentes de trabalho pelo qual esta transferiu para a autora a responsabilidade pelos encargos obrigatórios provenientes de acidentes de trabalho de D... , que sofreu um acidente qualificável como acidente de trabalho, no dia 4 de Novembro de 1998, ocasião em que foi atropelado ao atravessar uma passadeira.

Em consequência deste acidente o segurado sofreu lesões que determinaram que o Tribunal de Trabalho de Coimbra tenha condenado a autora a pagar-lhe a pensão anual e vitalícia de € 154,23, tendo a autora despendido até ao momento a quantia de € 5.276,75 a título de compensação pelos danos sofridos, bem como de despesas de transporte.

Tendo o acidente sido causado pelo condutor do veiculo que atropelou o segurado, e uma vez que a ré assumiu por contrato de seguro a responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária deste veículo, a autora tem direito a ser reembolsada, pela ré, das quantias já suportadas e que vier a suportar no futuro.

A ré contestou excepcionando a prescrição do crédito reclamado, em virtude de terem decorrido mais de 3 anos entre a data em que ocorreu o acidente e a data em que foi concretizada a sua citação. Impugnou ainda, em parte, a matéria de facto alegada pela autora. Invocou que na altura em que se deu o acidente o sinistrado estava de baixa médica, e não ao serviço da sociedade C...., e que por sentença proferida no âmbito do processo n° 2462/04.7 TJCBA da 1ª Secção da Vara Mista de Coimbra foi condenada a pagar ao sinistrado a quantia de 12.500,00 a titulo de indemnização pelos danos patrimoniais por este sofridos resultantes da incapacidade de que ficou a padecer em consequência do atropelamento ocorrido no dia 4 de Novembro de 1998, pelo que não pode ser condenada a pagar qualquer indemnização a esse título, sob pena de suportar duas vezes o mesmo dano.

Foi proferido despacho saneador, em que se conheceu da excepção de prescrição suscitada, concluindo-se nos seguintes termos:

“(…) No caso dos autos, é aceite que o prazo de prescrição aplicável será de cinco anos, em virtude de o facto originador da responsabilidade civil constituir simultaneamente crime de ofensa à integridade física, para o qual o art. 118°, n°1, al. c), do Código Penal estabelece este prazo mais longo de prescrição.

O decurso do prazo de prescrição ter-se-á iniciado, não na data em que se verificou o acidente, como defendido pela ré, mas com o pagamento da indemnização, como pretendido pela autora.

Desconhece-se, contudo, em que data terá sido efectuado o pagamento.

Com efeito, a ré não alegou qual a data em que terão sido efectuado os diversos pagamentos incluídos no montante global reclamado pela autora, tendo-se a este propósito limitado a indicar a data do seu início, de 7.11.2001, data esta que terá retirado dos recibos cuja cópia a autora juntou aos autos, e que, como resulta de uma análise mais atenta dos mesmos, corresponde tão só à data de emissão do bilhete de identidade do lesado, e não à data em que os recibos foram assinados.

Ora, de acordo com o art. 342°, n°2, do Código Civil, cabendo àquele que invocar um direito alegar e fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado, o ónus da alegação e prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito compete àquele contra quem a invocação é feita.

Consequentemente, se o réu se defende invocando a excepção peremptória da prescrição, deve alegar e provar o momento em que começou a correr o prazo de prescrição, tendo a falta de alegação (afirmação) de tal facto como consequência que a excepção peremptória de prescrição invocada seja decidida em sentido desfavorável ao réu (assim, o Ac. do 5TJ de 6.05.1999, BMJ, 487, pág. 277).

Acresce ser evidente que a quase totalidade dos pagamentos terá sido realizada nos cinco anos anteriores à data em que a ré foi citada para os termos da acção, de 17.10.2007, e em que se terá interrompido o prazo de prescrição em curso, já que respeitam a prestações relativas a períodos anteriores a 17.10.2002 - assim apenas não sucedendo com o pagamento a que se reporta o recibo de folhas 52, no montante de € 12,60, que respeita ao período de 01.07.2001 a 31.12.2001 (mas que se desconhece a data em que terá sido efectuado).

Pelo exposto, julgo improcedente a excepção de prescrição suscitada.

Foi ainda proferido despacho a fixar a factualidade assente e a levar à base instrutória, objecto de reclamação pela ré, parcialmente deferida.

Não se conformando, a ré apresentou recurso, que foi admitido como apelação, a subir a final.

Formula, em síntese, as seguintes conclusões:

“(…) Tendo em conta que o acidente ocorreu em 04/11/1998, que a recorrida começou a pagar as pensões ao lesado em 07/11/2001 e que a citação da ré para esta acção ocorreu em 17/10/2007, nenhuma dúvida resta quanto à prescrição do direito da autora.

3. Importa ter presente, tal como se refere no despacho recorrido, que o direito que a recorrida exerce neste pleito contra a ré, ora apelante, é um direito subrogado, nos termos da lei (artigo 441º do C Com) nos direitos do lesado no acidente dos autos. (…)

5. A recorrente alegou que a recorrida começou a pagar as pensões ao lesado em 07/11/2001, não tendo tal facto sido impugnado na réplica pela autora. (…)

7. O despacho recorrido não distingue a prescrição do direito unitário, da prescrição do direito singular a cada prestação, distinção que se impõe fazer numa situação de prestações periódicas.

8. É pacífico que, pelo menos a partir do momento em que começou a pagar as pensões em 07/11/2001, a recorrida tomou conhecimento do direito que lhe competia, cabendo-lhe exercê-lo contra a ré dentro do prazo prescricional que ela não podia deixar de conhecer que era, pelo menos, de 5 anos.

9. Não o fez, pois só em 17/10/2007, interrompeu aquele prazo que corria continuadamente, senão desde a data do acidente, pelo menos desde 07/11/2001, data em que começou a efectuar os pagamentos (note-se que a sentença do Tribunal de Trabalho de fls…. data de 22/03/2001.

10. Sendo assim, o seu direito unitário, como subrogada nos direitos do lesado está irremediavelmente prescrito na totalidade.”     

A recorrida apresentou contra alegações, alegando, em síntese, que:

O prazo de prescrição aplicável é de cinco anos em virtude de o facto originador da responsabilidade civil constituir simultaneamente crime de ofensa à integridade física por negligência do qual resultou ofensa à integridade física grave para o sinistrado.

É jurisprudência maioritária senão mesmo unânime que o decurso do prazo prescricional no âmbito do direito de regresso ou sub-rogação não se inicia na data em que se verificou o acidente mas sim com o pagamento da indemnização aos terceiros lesados por parte da apelada.

No caso em apreço, a apelada foi condenada por sentença proferida no Tribunal de Trabalho de Coimbra a pagar ao sinistrado uma pensão anual e vitalícia de 154,23€. A apelada pagou e continua a pagar na presente data a referida pensão, facto que impede a aplicação tout court do regime supra exposto.

A obrigação de indemnização da apelada assume um carácter global e unitário para o obrigado pois só quando pagar tudo se pode entender ter cumprido a sua obrigação, pelo que, continuando a apelada a pagar pensões ao sinistrado, o direito de sub-rogação não se encontra prescrito.

A não se considerar assim, entendendo-se que estamos perante uma obrigação cindível o prazo de prescrição do direito de regresso ou sub-rogação terá de ser contado desde a data de cada um dos pagamentos.

Compete ao apelante o ónus de alegação e prova dos factos impeditivos do direito da apelada e, no caso, a apelante não fez prova da data dos pagamentos, devendo  considerar-se  que o facto invocado pela apelante foi impugnado pela apelada porquanto está em oposição com a defesa no seu conjunto, pelo que a excepção peremptória tinha que improceder.       

A autora veio então ampliar o pedido formulado para a quantia de € 6.009,48, com fundamento em pagamentos posteriores à propositura da acção, ampliação que foi admitida.

Procedeu-se a audiência de julgamento e respondeu-se aos quesitos, sem reclamações.

Proferiu-se sentença, que concluiu da seguinte forma:

“Pelo exposto, julgo a presente acção procedente, por provada, e consequentemente: condeno a ré a pagar à autora a quantia de 6.009,48 (seis mil e nove euros e quarenta e oito cêntimos), e ainda os montantes que se vierem a liquidar em decisão ulterior, quantia acrescida de juros de mora à taxa legal vencidos desde a citação sobre o montante de € 5.276,75 (cinco mil duzentos e setenta e seis euros e setenta e cinco cêntimos) e vencidos desde a notificação para contestar a ampliação do pedido sobre o montante de 1 732,73 (setecentos e trinta e dois euros e setenta e três cêntimos), bem como os vincendos até integral pagamento.

Condeno ainda a ré no pagamento das custas da acção.

Notifique e registe”.

Não se conformando, a ré recorreu, formulando, em síntese, as seguintes conclusões:

“ 1. Estando demonstrado que a recorrida iniciou os pagamentos da pensão anual e vitalícia ao lesado, a que estava obrigada por força da sentença proferida no âmbito do processo que correu termos no Tribunal de Trabalho, em data anterior a 7/11/2001 (Ponto 14. da Fundamentação de Facto) forçosa se torna a conclusão de que o direito daquela se encontra prescrito.

2. Com efeito, tendo a recorrida reconhecido o seu direito em data anterior a 7/11/2001, deveria a recorrida ter exercido o seu direito contra a recorrente, dentro do prazo prescricional, que era, pelo menos, de 5 anos.

3. Não o fez, pois só em 17/10/2007 interrompeu aquele prazo que corria continuadamente desde data anterior a 07/11/2001.

4. Independentemente da decisão que venha a ser proferida em sede de recurso apresentado, oportunamente, pela ora recorrente que só agora, com este irá subir e cujas alegações, por uma questão de economia processual aqui se dão por reproduzidas, também à luz deste facto agora dado como demonstrado (Ponto 14. da Fundamentação de Facto), deverá o direito da recorrida ser considerado prescrito.

5. Por outro lado, entende a ora recorrente que a matéria de facto dada como provada no ponto da 16) da Fundamentação de Facto se encontra incorrectamente julgada.

6. Com efeito, a resposta a tal matéria assentou exclusivamente na informação resultante duma certidão junta aos autos a fls. 182 que enferma d eum vício, na medida em que está incorrecta.

7. Só com a notificação da sentença proferida nos presentes autos, é que a aqui recorrente se deu conta desse vício, consistente no facto de tal certidão atestar que as fotocópias dela constantes estão conforme o original de fls. 1 a 6 do processo em questão, quanto isso não corresponde à verdade, na medida em que da mesma apenas constam as frentes de fls. 1 a 6 e não o verso das mesmas.

8. A Meritíssima juiz, não obstante ter constatado tal falha, conforme se depreende da douta sentença, não notificou a ora recorrente para suprir esse lapso evidente da Secção Central de Varas Mistas de Coimbra. (…)

11. Resulta claramente da certidão que ora se junta que o único dano patrimonial reclamado pelo autor D. na acção que moveu contra a aqui recorrente, em virtude do mesmo acidente em questão nos presentes autos, é o decorrente da incapacidade parcial permanente de que aquele ficou afectado em consequência do acidente dos autos – vide artigos 25, 26, 27 e 28 da petição inicial.

12. Ora, foi esse dano patrimonial – prejuízo resultante da redução da capacidade de ganho –e, o único reclamado naquela acção, que a recorrente foi condenada a ressarcir na acção intentada por D., pelo que deverá o Ponto 16. da Fundamentação de Facto ser reformulado.

13. Nesse seguimento e atendendo a que ficou demonstrado ter a recorrente sido condenada a pagar a D. a quantia de 12.500,00€, com vista a ressarci-lo do prejuízo decorrente da perda de capacidade de ganho de que este ficou afectado, deverá a mesma ser absolvida do pedido, sob pena de estar a ser condenada a reparar duas vezes o mesmo dano”.                  

A autora apresentou contra alegações, propugnando pela manutenção da decisão. Alega, em síntese, que:

A junção da certidão não é admissível em face do disposto nos arts. 523º e 524º do Código do Processo Civil, tendo a recorrente o ónus de juntar os documentos até ao encerramento da discussão em 1ª instância, impendendo também sobre ela o dever de cuidado de verificar as condições dos documentos que junta, não podendo posteriormente aproveitar-se da sua falta de zelo e cuidado.

As indemnizações por acidente que seja simultaneamente de viação e de trabalho não são cumuláveis tendo o lesado que optar por uma delas.

Ou seja, é o lesado/sinistrado que tem de optar pela indemnização que prefere, e neste caso, ao que parece, foi o lesado/sinistrado que recebeu duas vezes pelo mesmo direito. Assim sendo, se a recorrente considera que pagou duas vezes terá de ir pedir o excedente desse pagamento ao sinistrado e nunca á ora recorrida que até ao momento pagou a indemnização descrita e ainda nada recebeu, sendo que tem direito a ser ressarcida.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar

II. FUNDAMENTOS DE FACTO

Relva a seguinte factualidade, que a 1ª instância deu por provada, aditando esta Relação elemento alusivo à data em que foi proferida a decisão enunciada sob os nºs 5 e 6, tendo em conta o documento de fls. 28 a 31 dos autos, que não se mostra impugnado pela ré:

1) A autora exerce a indústria de seguros em diversos ramos (alínea A) dos factos assentes).

2) Por escrito consubstanciado na apólice n° 94018976, a autora celebrou com a C... um contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho, mediante o qual esta sociedade declarou transferir para a autora, e esta declarou assumir, a responsabilidade pelos encargos obrigatórios provenientes de acidentes de trabalho do seu trabalhador D. (alínea B) dos factos assentes).

3) No dia 4 de Novembro de 1998, pelas 16 horas, D. encontrava-se em plena passadeira de peões, a atravessar a Avenida ....., no sentido "..." para a farmácia "....", acompanhado pela sua mulher, E... (alínea C) dos factos aventes).

4) Tendo sido então atropelado pelo veículo de matrícula SC-OO-OO, sob a direcção de F... , que seguia na faixa esquerda, no sentido ... — .... (alínea D) dos factos assentes).

5) Na sentença proferida na acção especial emergente de acidente de trabalho que, em virtude deste evento, correu termos no Tribunal de Trabalho de Coimbra, foi considerado provado ter a vítima ficado afectada de incapacidade permanente para o trabalho correspondente ao coeficiente de desvalorização funcional de 0.1292 (12,92%) (alínea E) dos fados assentes).

6) E condenada a autora a pagar ao segurado uma pensão anual e vitalícia no valor de €154,23, tendo essa sentença sido proferida em 22 de Março de 2001 (alínea F) dos factos assentes).

7) O condutor do veículo SC-OO-OO foi, em consequência do seu comportamento, condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência (alínea G) dos factos assentes).

8) A ré celebrou com o condutor do veículo SC -OO-OO um contrato de seguro do ramo automóvel, mediante o qual este declarou transferir para a ré, e esta declarou assumir, a responsabilidade civil emergente da circulação daquele veículo (alínea H) dos factos assentes).

9) D. deslocava-se na ocasião de uma consulta médica, realizada no Consultório dos Médicos Associados, com vista ao tratamento de um acidente de trabalho que sofrera no dia 2 de Junho de 1998 (resposta ao quesito 1°).

10) Encontrava-se na fase final da recuperação de um traumatismo crânio-encefálico (resposta ao quesito 2°).

11) Tendo sofrido novo traumatismo em consequência do atropelamento (resposta ao quesito 3 °).

12) Até à propositura da acção, a autora despendeu a quantia de € 5.276,75 a título de compensação pelos danos sofridos por D., bem como de despesas de transporte (resposta ao quesito 4°).

13) E constituiu uma provisão matemática para garantia das pensões vincendas (resposta ao quesito 5°).

14) A autora iniciou os pagamentos em data anterior a 7 de Novembro de 2001 (resposta ao quesito 6º).

15) Entre 1 de Julho de 2007 e 31 de Março de 2008 a autora despendeu ainda o montante de € 733,09 a título de pensões pagas ao sinistrado D... (resposta ao quesito 7°).

16) Por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n° 2462/04.8TJCBR da 1ª Secção da Vara Mista de Coimbra, instaurado por D. no dia 22 de Outubro de 2004, e onde este peticionava o ressarcimento dos prejuízos decorrentes do atropelamento ocorrido no dia 4 de Novembro de 1998, foi a ré condenada a pagar ao autor a quantia de € 12.500,00 a título de indemnização pelos danos patrimoniais por este sofridos (documento de folhas 182 e seguintes).

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

1. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do C.P.C. – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito –  art.º 664 do mesmo diploma.

Considerando a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, impõe-se apreciar:

- da natureza do direito conferido à seguradora laboral, em caso de acidente simultaneamente de viação e laboral: direito de regresso/sub rogação;

- da verificação da excepção de prescrição do direito da autora/apelada;

2. Nos termos da Base I da Lei 2127 de 3 de Agosto de 1965, com as alterações subsequentes – a aplicável ao caso, atenta a data do acidente – os trabalhadores e seus familiares têm direito à reparação dos danos resultantes de acidentes de trabalho nos termos previstos «na presente Lei».

A reparação desses danos prende-se, essencialmente, com o direito à integridade económica ou produtiva do trabalhador, não sendo reparáveis em regra e no âmbito dos processos laborais, os danos não patrimoniais.

No caso dos autos, está perfeitamente definido entre as partes que estamos perante um acidente simultaneamente de viação e de trabalho, pretendendo a autora, na qualidade de seguradora laboral, ser reembolsada pela ré, seguradora civil, das quantias que invoca ter pago ao trabalhador, D. – em sede de recurso a apelante não questionou a caracterização do acidente como sendo de trabalho, qualificação jurídica feita na sentença recorrida.

Como é unanimemente entendido, nestes casos há uma cumulação de responsabilidades, podendo o sinistrado demandar, em simultâneo, o responsável laboral e o responsável civil, com vista a que, arbitradas as indemnizações – “latu sensu” -, possa optar pela que mais lhe convenha, isto, obviamente, com referência aos danos cuja reparação é susceptível de efectivar-se nos dois níveis.

Efectivamente, os critérios pelos quais se pautam as indemnizações a fixar são diferentes, num foro e noutro, sendo também diferente o âmbito dos danos susceptíveis de valoração – refira-se, a título exemplificativo, os danos não patrimoniais, que só em casos muito pontuais podem ser relevados no foro laboral sendo que, mesmo relativamente aos danos patrimoniais, há um conjunto de prejuízos cuja cobertura escapa ao foro laboral e cuja ressarcibilidade no foro civil é inequívoca.

É esse o regime que resulta da Base XXXVII do referido diploma e que actualmente se mantém no art. 31º da Lei 100/97 de 13 de Setembro.

Em conclusão, dúvidas não há que as duas indemnizações se não podem somar ou cumular, sob pena de enriquecimento ilegítimo do beneficiário.

                                             *

Podemos distinguir, grosso modo, a sub-rogação e o direito de regresso considerando que “pela sub-rogação, transmite-se um direito de crédito existente, ao passo que o direito de regresso significa o nascimento de um direito novo na titularidade da pessoa que, no todo ou em parte, extinguiu uma anterior relação creditória (art. 524º) ou à custa de quem esta foi extinta (art. 533º)”. [ [i] ]

Ora, pese embora o nº 4 da Base XXXVII do referido diploma aluda ao “direito de regresso” que assiste à entidade patronal ou respectiva seguradora [ [ii] ], é entendimento largamente maioritário, cremos, que se impõe uma interpretação correctiva do preceito, devendo considerar-se que estamos, em bom rigor, perante um caso de sub-rogação (legal) – art. 592º, nº1 do Cód. Civil, diploma a que aludiremos quando não se fizer menção de origem – da entidade patronal ou seguradora nos direitos do lesado (sinistrado) contra o causador do acidente ou respectiva seguradora, na estrita medida do que lhe foi pago a título indemnizatório e não perante hipótese de direito de regresso, entre os responsáveis e no âmbito do regime de solidariedade. [ [iii] ]

Das diferentes perspectivas que se podem colocar quanto a esta questão deu conta o Assento 5/97 de 14/01/1997, publicado no DR de 27/03/1997 – actualmente com valor de Acórdão Uniformizador de Jurisprudência –, em que se decidiu uniformizar a jurisprudência nos seguintes termos:

“O Estado tem o direito de ser reembolsado, por via de sub-rogação legal, do total despendido em vencimentos a um seu funcionário ausente de serviço e impossibilitado da prestação de contrapartida laboral por doença resultante de acidente de viação e simultaneamente de serviço causado por culpa de terceiro”.

Tendo a apelante invocado a prescrição (de natureza extintiva) do direito da autora apelada, é à luz do que se deixou exposto que cumpre apreciar dessa excepção.

3. A ré/apelante insurgiu-se contra a decisão que, em sede de despacho saneador, conhecendo dessa excepção, concluiu pela improcedência da mesma.

Na apelação interposta da sentença proferida a ré volta a argumentar sobre essa matéria, agora com base no circunstancialismo apurado em audiência de julgamento. Vejamos.

A 1ª instância, pese embora tenha arrumado a questão aquando do saneamento do processo, confrontada com a reclamação da ré quanto à base instrutória, exactamente por via da omissão da inclusão, nessa peça processual, do facto invocado na contestação e concernente ao pagamento feito pela demandante ao sinistrado e data respectiva, deferiu parcialmente essa reclamação, como segue:

“A ré reclamou da selecção da matéria de facto assente, por deficiência, alegando que deveria ter sido considerado assente que a autora iniciou os pagamentos ao lesado em 7 de Novembro de 2001.

Respondeu a autora que este facto se deve considerar impugnado, por estar em contradição com a defesa considerada no seu conjunto.

A data em que tiveram início os pagamentos efectuados pela autora apenas poderia assumir relevo para apreciação da excepção peremptória da prescrição suscitada pela ré.

Sucede que esta matéria foi já objecto de decisão (não obstante não transitada em julgado) em sede de despacho saneador, sendo esse o motivo pelo qual não foi inserido na selecção dos factos assentes ou na base instrutória.

Ponderada agora a possibilidade de aquela decisão vir a ser revogada em sede de recurso, afigura-se efectivamente mais consentâneo com os princípios da economia processual fazer constar esse facto, desde já, da selecção da matéria de facto relevante para a decisão da causa (…)”.

Não pode deixar de se considerar que se trata de técnica notoriamente incorrecta, que nem sequer o princípio da economia processual torna admissível. No entanto, tem de reconhecer-se que o tribunal a quo foi previdente e a verdade é que, através do expediente utilizado, se adquiriu para o processo um conjunto de elementos factuais pertinentes, estando agora esta Relação habilitada a conhecer da aludida excepção, sendo certo que está em causa, afinal, em ambos os recursos, a análise da mesma questão, a saber, se ocorre a prescrição do direito de crédito da autora.

                                             *

Nos termos do art. 298º, nº 1 “estão sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição”.

Trata-se de instituto cujo fundamento “reside na negligência do titular do direito em exercitá-lo durante o período de tempo indicado na lei”, o que faz presumir que o titular renunciou ao direito, “ou pelo menos o torna (o titular) indigno de protecção jurídica”. [ [iv] ]       

Quanto ao prazo de prescrição aplicável, entendemos que releva o disposto no art. 498º, nº3, pelo que o prazo é de cinco anos: estamos perante acção que emerge e tem por fundamento a responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito e, por outro lado, a factualidade em causa integra, em abstracto, hipótese de ilícito criminal – no caso, aliás, o segurado da ré apelante foi condenado no âmbito de processo de natureza criminal, como consta da alínea G) dos factos assentes.  

O crédito por sub-rogação pressupõe o pagamento e só nasce com o pagamento – art. 593º, nº1 – [ [v] ], pelo que o prazo de prescrição deve contar-se a partir do cumprimento, ou seja, considerando a data em que a seguradora laboral ou a entidade patronal pagaram ao sinistrado os montantes devidos, a título de indemnização e/ou pensão – nos termos da Base referida a sub-rogação só ocorre relativamente àquele “que houver pago a indemnização”. Isto, aliás, à semelhança do que dispõe o art. 498º, nº2 e pela mesma ordem de razões, encontrando-se, nesse ponto particular, alguma similitude de regimes.[ [vi] ]

Antes do cumprimento, portanto, e na sequência do que se referiu, o direito não pode, sequer, ser exercido – salienta-se que, nos termos do art. 306º, nº1, o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido.

                                             *

No caso em apreço e retomando o que se disse supra, o tribunal a quo julgou improcedente a excepção invocada, argumentando como segue:

“O decurso do prazo de prescrição ter-se-á iniciado, não na data em que se verificou o acidente, como defendido pela ré, mas com o pagamento da indemnização, como pretendido pela autora.

Desconhece-se, contudo, em que data terá sido efectuado o pagamento.

Com efeito, a ré não alegou qual a data em que terão sido efectuado os diversos pagamentos incluídos no montante global reclamado pela autora, tendo-se a este propósito limitado a indicar a data do seu início, de 7.11.2001, data esta que terá retirado dos recibos cuja cópia a autora juntou aos autos, e que, como resulta de uma análise mais atenta dos mesmos, corresponde tão só à data de emissão do bilhete de identidade do lesado, e não à data em que os recibos foram assinados.

Ora, de acordo com o art. 342°, n°2, do Código Civil, cabendo àquele que invocar um direito alegar e fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado, o ónus da alegação e prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito compete àquele contra quem a invocação é feita.

Consequentemente, se o réu se defende invocando a excepção peremptória da prescrição, deve alegar e provar o momento em que começou a correr o prazo de prescrição, tendo a falta de alegação (afirmação) de tal facto como consequência que a excepção peremptória de prescrição invocada seja decidida em sentido desfavorável ao réu (assim, o Ac. do 5TJ de 6.05.1999, BMJ, 487, pág. 277).

Acresce ser evidente que a quase totalidade dos pagamentos terá sido realizada nos cinco anos anteriores à data em que a ré foi citada para os termos da acção, de 17.10.2007, e em que se terá interrompido o prazo de prescrição em curso, já que respeitam a prestações relativas a períodos anteriores a 17.10.2002 - assim apenas não sucedendo com o pagamento a que se reporta o recibo de folhas 52, no montante de € 12,60, que respeita ao período de 01.07.2001 a 31.12.2001 (mas que se desconhece a data em que terá sido efectuado).

Pelo exposto, julgo improcedente a excepção de prescrição suscitada”.

Entendemos que o raciocínio exposto foi prematuro, impondo-se perspectivar a questão em termos diferentes. Efectivamente, atenta a fase do processo (saneamento), o tribunal só podia (devia) conhecer de alguma excepção peremptória (como é o caso da prescrição) se o estado do processo o permitisse – ou seja, o tribunal deve abster-se de decidir nos casos em que há factualidade relevante que não pode ter-se por assente. Por outro lado, na fixação da factualidade assente e elaboração da base instrutória o tribunal devia ter ponderado as várias soluções plausíveis de direito – art. 510º, nº1, al) b e 511º do C.P.C.

É, exactamente, o caso dos autos. Assim, no art. 8º da contestação a ré invocou o seguinte:

“O mesmo se diga se, por hipótese académica, for tida em conta o início da contagem do prazo, não a data do acidente dos autos, mas a data em que a autora terá iniciado os pagamentos ao lesado, ou seja, 07/11/2001 (aliás, a sentença do Tribunal de Trabalho é de 22/03/2001), caso em que o referido direito estaria prescrito desde 07/11/2006”.      

É certo que a ré não invoca, especificamente, quais as quantias concretamente pagas ao longo do tempo, pela autora, nem as datas respectivas, delimitando no entanto o momento inicial do cumprimento, o que, na sua perspectiva – e na desta Relação, como se verá – é suficiente, porquanto reporta a essa data o momento juridicamente relevante para efeitos de cômputo do prazo prescricional.

Assim sendo, e concordando-se com a Sra. juiz quando refere, posteriormente, que deve ter-se por impugnada essa factualidade, ponderando o que a autora alegou na resposta à contestação e a defesa no seu conjunto – reconhecendo-se, no entanto, que estamos perante um caso limite – tem de concluir-se que se impunha relegar para final o conhecimento da excepção da prescrição invocada pela ré, incluindo-se na base instrutória a factualidade em causa, como afinal veio a ser feito, como já se salientou.

Procedem, pois, parcialmente, as conclusões de recurso, justificando-se a revogação da decisão proferida aquando da prolação do despacho saneador, que julgou improcedente a excepção.

Consequentemente, cumpre agora conhecer dessa excepção, uma vez que esta Relação tem os elementos necessários para tal e à semelhança do que dispõe o art. 715º, nº2 do C.P.C., sem necessidade de ouvir as partes quanto a essa matéria – nº3 do mesmo preceito –, porquanto estas já tiveram oportunidade de se pronunciar ao longo do processo.

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As quantias pagas pela autora ao sinistrado, no âmbito do processo de acidente de trabalho, reportam-se à pensão que foi fixada nesse processo, a favor daquele, pensão devida por força da I.P.P. subsequente às lesões decorrentes do acidente. Como consta da sentença a que aludem os nºs 5 e 6 da factualidade assente, trata-se de pensão que é fixada em montante anual – art. 51º do Regulamento, aprovado pelo Decreto nº 360/71 de 21 de Agosto –, e deve ser paga em duodécimos – art. 57º, nº1 do mesmo diploma.

Estamos, pois, perante uma prestação permanente sucessiva, [ [vii] ] pelo que há que distinguir entre o direito unitário e o direito a cada uma das prestações, valendo o disposto no art. 307º, nos termos do qual a prescrição do direito unitário corre desde a exigibilidade da primeira prestação que não for paga.

Considerando que, como supra se referiu, é característico da sub-rogação a colocação do sub-rogado ou solvens na posição do primitivo credor [ [viii] ], agindo a autora como sub-rogada nos direitos do lesado e tendo iniciado o pagamento da pensão em data anterior a 07/11/2001, pelo menos nessa data tomou conhecimento do direito que lhe competia, podendo livremente exercê-lo, pelo que se impunha accionar a ré, no máximo, no prazo de cinco anos a contar desse momento, o que não aconteceu, uma vez que a presente acção foi instaurada em 10/10/2007 e a ré foi citada em 17/10/2007.

E nem se diga, como a autora faz na resposta à contestação, que “não iria a autora elaborar uma acção, e consequentemente ir ampliando o pedido uma vez que tal era contra o princípio da economia processual, e do libertar os tribunais de actos processuais que desta forma se mostram inúteis” – art. 5º da resposta à contestação. A Autora parece olvidar que o mecanismo da notificação judicial avulsa, previsto no art. 323º, nº1, serve, exactamente, para dar a conhecer ao devedor a intenção de exercício do direito, assim se logrando obter efeito interruptivo da prescrição sem instaurar de imediato a acção judicial.

Também não é decisiva a argumentação de que incumbia à ré o ónus de alegação e prova da data em que a autora procedeu ao pagamento das quantias em causa, uma vez que a ré não omitiu por completo essa alegação, como já se referiu, tendo datado o início dos “pagamentos ao lesado” a 7 de Novembro de 2001. Não podemos deixar de notar que o pagamento em causa e data respectiva consubstancia um facto pessoal à autora, que esta, manifestamente, não pode ignorar, e que, no entanto, nunca carreou para o processo. [ [ix] ]

Concluímos, então, como a apelante pretende, que prescreveu o direito (unitário) da autora, podendo a ré opor-se, legitimamente, ao exercício do direito, como aconteceu – art. 304º.

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Conclusões

I. Em caso de acidente simultaneamente de viação e de trabalho, o direito que assiste à seguradora laboral e/ou entidade patronal, de ser reembolsada da indemnização que tiver pago – direito conferido pela Base XXXVII, nº4 da Lei 2127 de 03/08/1965 e, actualmente, pelo art. 31 da Lei 100/1997, de 13/09 – configura um caso de sub-rogação (legal) – art. 592º, nº1 do Cód. Civil – daqueles nos direitos do lesado contra o causador do acidente ou respectiva seguradora, na estrita medida do que foi pago a título indemnizatório e não perante hipótese de direito de regresso entre os responsáveis e no âmbito do regime de solidariedade;

II. O crédito por sub-rogação pressupõe o pagamento e só nasce com o pagamento, pelo que o prazo de prescrição deve contar-se a partir do cumprimento;

III. Agindo a autora/seguradora como sub-rogada nos direitos do lesado/sinistrado e tendo iniciado o pagamento da pensão em data anterior a 07/11/2001, pelo menos nessa data tomou conhecimento do direito que lhe competia, podendo livremente exercê-lo, pelo que se impunha accionar a ré, no máximo, no prazo de cinco anos – art. 498º, nº3 do Cód. Civil – a contar desse momento, sob pena de prescrição do direito (unitário) à pensão.

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Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogando-se a decisão proferida aquando do saneamento do processo e ainda a sentença recorrida, julga-se procedente a excepção de prescrição invocada pela ré e absolve-se a mesma do pedido contra si formulado.

Custas, em 1ª instância e nesta Relação, pela ré/apelada.

Notifique.


[i] Almeida Costa, Direito das Obrigações, Almedina, 11ª edição revista e actualizada, p.826; Galvão Teles, in Direito das Obrigações, Coimbra Editora, 3ª edição, p.223, refere que a sub-rogação, nesta modalidade, “supõe a existência de um cumprimento efectuado por um terceiro (ou com meios facultados por terceiro) que não faz extinguir a obrigação”.        

[ii] Dispõe a Base XXXVII, sob a epígrafe “Acidente originado por companheiros ou terceiros”, o seguinte:

1 - Quando o acidente for causado por companheiros da vítima ou terceiros, o direito à reparação não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos da lei geral.

2 - Se a vítima do acidente receber de companheiros ou de terceiros indemnização superior à devida pela entidade patronal ou seguradora, esta considerar-se-á desonerada da respectiva obrigação e terá direito a ser reembolsada pela vítima das quantias que tiver pago ou despendido.

3 -Se a indemnização arbitrada à vítima ou aos seus representantes for de montante te inferior ao dos benefícios conferidos em consequência do acidente ou da doença a desoneração da responsabilidade será limitada àquele montante.

4 - A entidade patronal ou a seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente terá o direito de regresso contra os responsáveis referidos no n.º 1, se a vítima não lhes houver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano, a contar da data do acidente. Também à entidade patronal ou seguradora assiste o direito de intervir como parte principal no processo em que a vítima exigir aos responsáveis a indemnização pelo acidente a que alude esta base.

[iii] Neste sentido, Ac. STJ de 17/04/2007, proferido no processo 07A679 (Relator: Sebastião Povoas) e ainda os Acs. de 27/06/2002, proferido no processo 02B1834 (Relator: Ferreira de Almeida) e de 21/09/2006, processo 06B2116 (Relator: Pires da Rosa), embora estes dois últimos sem se fazer o confronto com outras figuras, Ac. R.P. de 16/02/2006, processo 0533830 (Relator: Amaral Ferreira) e Acs. desta R. Coimbra, de 31/10/2006, processo 1208/05.8 (Relator: Jorge Arcanjo) e de 25/09/2007, processo 255/1999 (Relator: Távora Victor), todos acessíveis in www.dgsi.pt..   
[iv] Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Almedina, 7ª Reimpressão, Vol, II, p. 445.

[v] O Assento nº 2/78, proferido a 9-11-1977, D.R. I Série, de 22-3-1978, agora com valor de Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, decidiu que a “sub-rogação não se verifica em relação a prestações futuras”. Pode ler-se nesse acórdão:

“Reconheceu, pois, esse normativo o direito de as referidas entidades serem indemnizadas por terceiros nos termos em que, segundo a lei geral, estes são responsáveis, sub-rogando-os, contudo, nos direitos do lesado contra o terceiro responsável.

A sub-rogação assim criada em favor da entidade patronal ou da respectiva seguradora está sujeita às regras gerais do referido instituto, das quais se destacam, com especial relevo no caso sub specie, a que a faz depender do facto do pagamento.

Não há sub-rogação sem satisfação efectiva da prestação; o pagamento, como pressuposto daquela, é a condição e medida dos direitos do sub-rogado.

Daí que em princípio se tenha por indiscutível que a entidade patronal ou a seguradora só possam exigir do terceiro responsável pelo acidente o que houverem pago e não o que tenham a pagar no futuro.

Sempre, de resto, a doutrina concebeu a figura jurídica da sub-rogação como dependente do facto do pagamento, quer no domínio do Código Civil de 1867 (artigos 778.º e seguintes) – (…)-, quer na vigência do actual Código Civil (artigos 589.º e seguintes) (…)

Inviável será, pois, por falta de efectiva satisfação da prestação, o exercício de um direito sub-rogatório relativamente a prestações futuras”.

[vi] É essa a posição que, maioritariamente, a jurisprudência vem seguindo: Acs. STJ de 29/04/1992, processo 081776 (Relator: Cura Mariano), 24/10/2002, processo 02A2174 (Relator: Afonso Correia) e de 17/11/2005, processo 05B3061 (Relator: Oliveira Barros); a nível das Relações, Ac. R.L. de 29/11/2007, processo 9424/2007-8 (Relator: Salvador da Costa), R.P. de 10/04/2000, processo 0050262 (Relator: Couto Pereira), de 16/02/2006, processo nº 0533830 (Relator: Amaral Ferreira) e desta R. C. de 30/01/2001, processo 2999/2000 (Relator: Serra Baptista) e de 31/10/2006, supra referido, todos acessíveis in www.dgsi.pt. Em sentido diferente encontramos o Ac. STJ de 07/01/1986, processo 072891 (Relator Santos Carvalho) e o Ac. R.C. de 25/09/2007, supra referido.
 
[vii] Meneses Cordeiro in Direito das Obrigações, 1980, edição da AAFDL, 1º vol., p. 357, refere que a prestação é permanente (por confronto com as prestações instantâneas) quando o cumprimento se vai realizando durante certo espaço de tempo, sendo que a prestação permanente pode ainda ser contínua – quando exige uma actividade permanente –, ou sucessiva – quando se verifique com determinados intervalos –, sendo exemplo desta última, a prestação consubstanciada na renda perpétua. Sobre as modalidades da prestação e, mais concretamente, a prestação permanente sucessiva – que ora nos interessa – vide ainda Pessoa Jorge, Direito das Obrigações, 1975/76, edição da AAFDL, 1º vol. p. 85, que acrescenta que a prestação sucessiva é periódica quando o interesse do credor é satisfeito em intervalos regulares.       
[viii] Sobre a natureza jurídica do instituto da sub-rogação e as várias teses em confronto vide a súmula feita por Antunes Varela, in Ds Obrigações em Geral, Almedina, 3ª edição, vol. II, p. 316-321. 
[ix] A este propósito a autora indica, nas alegações de recurso, que “não tendo a ora agravante feito prova da data dos pagamentos não pode a excepção peremptória proceder, veja-se nesse sentido os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 26-10-99 e de 30-01-2001, ambos in www.dgsi.pt”. Ora, compulsando esses arestos e parecendo-nos que a autora se está a reportar aos acórdãos desta Relação de 26/10/1999, proferido no processo 1311/99 (Relator: Monteiro Casimiro) e de 30/01/2001, supra referido, acessíveis, em sumário, no loc. indicado, nada encontramos em sentido contrário ao que se expôs.