Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | JORGE ARCANJO | ||
Descritores: | AVAL CAMBIÁRIO RELAÇÃO DOS CO-AVALISTAS COM O PORTADOR DO TÍTULO E ENTRE SI TÍTULO EXECUTIVO | ||
Data do Acordão: | 06/24/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DE LEIRIA - 5º JUÍZO CÍVEL | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTºS 45º E 46º, AL. C), DO CPC; 30º, 32º, 43º E 77º DA LULL | ||
Sumário: | I – No aval colectivo ao mesmo devedor configuram-se dois níveis de relações jurídicas: a relação dos co-avalistas com o portador e a relação dos avalistas entre si.
II – Nas relações dos co-avalistas com o portador ou nas relações com o avalizado e obrigados precedentes os direitos, obrigações e pressupostos da acção são os definidos para o aval singular, sendo a obrigação da natureza estritamente cambiária. Caso um dos co-avalistas pague a letra ou livrança, pode exercer acção cambiária contra o avalizado e obrigados precedentes – artºs 32º, §3, e 43º, da LULL. III – Na relação dos co-avalistas entre si não há nexo cambiário e a obrigação é regulada pelo direito comum, podendo aplicar-se o regime da fiança – artº 650º do C. Civ. IV – Se um dos co-avalistas pagar a letra ou livrança, não pode executar os demais co-avalistas, erigindo como título executivo a letra ou livrança avalizadas, quer como título de crédito quer como quirógrafo. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO 1.1. - Os exequentes - A... e B... – instauraram na Comarca de Leiria acção executiva, para pagamento de quantia certa, com forma de processo comum, contra os executados - C... e D.... Com fundamento em duas livranças ( fls.177 e 178 ), que erigiram como títulos executivos, reclamaram o pagamento da quantia de € 81.460,04. 1.2. – Os executados deduziram oposição à execução, alegando, em resumo, a inexequibilidade dos títulos, visto que os exequentes sendo co-avalista não podem socorrer-se da acção cambiária, mas apenas da acção comum, e a inexigibilidade parcial do crédito, por somente lhes assistir o direito na medida da quota da responsabilidade de cada um. 1.3. – Contestaram os exequentes/opoídos dizendo que os títulos executivos dados à execução são condição bastante e suficiente da acção executiva intentada contra os executados/opoentes e reduziram o pedido para a quantia de €40.730,02. 1.4. – No saneador-sentença julgou-se procedente a oposição à execução, declarando-se a extinção da instância executiva. 1.5. – Inconformados, os exequentes recorreram de apelação, com as seguintes conclusões: […] II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. – O Objecto do recurso: As questões submetidas a recurso, cujo objecto é delimitado pelas conclusões ( arts.684 nº2 e 690 nº1 do CPC,) são as seguintes: (1ª) Ampliação da matéria de facto; (2ª) Saber se tendo um dos co-avalistas pago as livranças, pode executar os demais co-avalistas, com base nas livranças avalizadas. 2.2. - 1ª QUESTÃO […] 2.4. – 2ª QUESTÃO2.4.1. - Nos termos do art.45 do CPC, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam os fins e os limites da acção executiva. Os exequentes erigiram como títulos executivos, duas livranças de crédito ( fls.177 e 178 ) subscritas pela sociedade E..., uma em 8/9/06, no valor de € 30.859,58, e outra em 20/10/06 , no valor de € 50.000,00, e ambas avalizadas por eles ( exequentes) e pelos executados. Alegando terem pago a totalidade das livranças ao BPI, beneficiário, reclamam dos executados, enquanto co-avalistas, o montante de €40.730,02. Ao pagamento coercivo, opuseram-se os executados através de oposição à execução, funcionando como uma contra-acção do devedor contra o credor para impedir a execução ou destruir os efeitos do título executivo. Dado o disposto no art.816 CPC, se a execução se não baseia em sentença condenatória, além dos fundamentos de oposição especificados no art.814, na parte em que sejam aplicáveis ( e não o são os fundamentos das alíneas b), d), f) e g) ), pode invocar-se quaisquer outros que seria lícito deduzirem-se como defesa no processo de declaração. Os executados invocaram, desde logo, a inexequibilidade dos títulos ( art.814 a) do CPC ), porquanto entre co-avalistas inexiste acção cambiária, mas sim relações de direito comum, e, por outro lado, as livranças não podem valer como quirógrafos, pela ausência de obrigação ou reconhecimento da dívida. A sentença julgou procedente a oposição, sufragando a tese dos executados/opoentes. Em contrapartida, insistem os exequentes/apelantes na exequibilidade, com fundamento nos arts.32, 47 e 77 da LULL e art.46 nº1 c) do CPC, sendo que as relações entre co-avalistas só deve regular-se pelo direito comum enquanto um deles não se tornar o legítimo portador da letra pelo seu pagamento. Coloca-se, pois, a questão de saber se tendo um dos co-avalistas pago uma letra de câmbio ou livrança, pode reclamar dos demais co-avalistas o pagamento, com base nas letras ou livranças avalizadas. 2.4.2. -Segundo o art.30 da LULL, o pagamento de uma letra de câmbio ou de uma livrança ( art.77 ) pode ser em todo ou em parte garantido por aval, configurando-se a obrigação do avalista como uma obrigação de garantia autónoma, cuja extensão e conteúdo se afere pela obrigação do avalizado (arts.7 e 32 LULL). Com efeito, dada a natureza jurídica do aval, quer o mesmo seja havido como uma “ fiança com regime jurídico especial ”, quer se lhe atribua o carácter de uma “ garantia objectiva ”, sempre se trata de uma garantia autónoma, distinta de qualquer outra obrigação cambiária. E o facto do avalista responder da mesma maneira que o avalizado ( art.32 LULL), apenas pretende significar que o conteúdo da obrigação do avalista é o mesmo que a da obrigação do avalizado. Daqui resulta que muito embora a obrigação do avalista seja igual à do avalizado, não assume a mesma figura cambiária deste. Por outro lado, a autonomia da obrigação do avalista mantém-se mesmo que seja nula a obrigação do avalizado, salvo se a nulidade proceder de vício de forma (art.32 §2º LULL), respeitante aos requisitos externos da obrigação cambiária do aceitante ou subscritor da livrança. Pelo aval constituem-se dois grupos de relações: os do portador com o avalista e as do avalista com o avalizado e obrigados precedentes. A lei não proíbe a pluralidade de avales, designadamente o aval colectivo, também designado de co-aval. Como já se expendeu no Ac RC de 19/2/04, proc. nº 401903 ( do mesmo relator), e disponível na base de dados em www dgsi.pt, na situação de aval colectivo ao mesmo devedor, configuram-se dois níveis de relações jurídicas: por um lado, a relação dos co-avalistas com o portador e, por outro, a relação dos avalistas entre si. Nas relações dos co-avalistas com o portador ou nas relações com o avalizado e obrigados precedentes, os direitos, obrigações e pressupostos da acção, são os definidos para o aval singular, como garantia autónoma, não subsidiária ou acessória, mas cumulativa. A obrigação é de natureza estritamente cambiária, logo o co-avalista que pague a letra tem acção cambiária ( arts.32 §3º, 43 da LULL) contra o avalizado e obrigados precedentes. Na relação dos co-avalistas entre si, não há nexo cambiário, a obrigação é regulada pelo direito comum. Com efeito, no aval colectivo ao mesmo devedor não existe qualquer nexo cambiário entre os avalistas, tal como propusera a delegação italiana à Conferência de Genebra e que ficou a constar do relatório da LU a explicitar os arts.31 e 47 a seguinte consideração ( nº75 ): 2. – Nas relações dos co-avalistas com o portador ou nas relações com o avalizado e obrigados precedentes, os direitos, obrigações e pressupostos da acção, são os definidos para o aval singular, sendo a obrigação de natureza estritamente cambiária. Caso um dos co-avalistas pague a letra ou livrança, pode exercer acção cambiária contra o avalizado e obrigados precedentes ( arts.32 §3º, 43 da LULL) 3. - Na relação dos co-avalistas entre si, não há nexo cambiário e a obrigação é regulada pelo direito comum, podendo aplicar-se o regime da fiança ( art.650 do CC ). 4. - Se um dos co-avalistas pagar a letra ou livrança, não pode executar os demais co-avalistas, erigindo como título executivo a letra ou livrança avalizadas. III – DECISÃO Pelo exposto, decidem: 1) Julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.2) Condenar os apelantes nas custas.+++ Coimbra, 24 de Junho de 2008. |