Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
664/08.7TACTB-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: OBRIGAÇÃO DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO
CRIMES SEXUAIS
Data do Acordão: 01/28/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE CASTELO BRANCO – 1º J
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 201º E 202º DO CPP
Sumário: A medida de coacção, obrigação de permanência na habitação, revela-se insuficiente e inadequada nos crimes de natureza sexual, visto poder ser cometido aliciando crianças a vir a sua casa, dado que normalmente as vítimas são amigos, vizinhos, conhecidos ou até familiares.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.
No processo supra identificado foi proferido despacho no qual se validou a detenção do arguido e se aplicou a medida de coacção, prisão preventiva.
Inconformado vem, de tal despacho, interpor recurso, o arguido CM..., formulando as seguintes conclusões:
A) Não consta dos autos qualquer fundamento que permita concluir que exista perigo de fuga;
B) A situação de OPH, dada a sua natureza privativa da liberdade é garantia suficiente de que não ocorre com a sua aplicação, perigo de perturbação do inquérito, ou de continuação da actividade criminosa;
C) Estão presentes todas as condições referentes à habitação do arguido que permitem a implementação da OPHVE, bem como a autorização da pessoa que com ele vive;
D) O arguido é servente e a companheira com quem vive, encontra-se a cuidar da filha de 4 meses;
E) A prisão preventiva tem carácter excepcional, nunca devendo ser utilizada como forma de punir;
F) A medida de coação OPH com vigilância electrónica, mostra-se adequada e suficiente;
G) Foram violados os arts. 18°, 28°, nº 2 da CRP, e os arts. 191°, 193°. e 201, nº 1 do CPP.
H) Deveria ter sido aplicado o art. 201° do CPP, com o que seria respeitado o art. 18°, da CRP;
Respondeu o Magistrado do Mº Pº, concluindo:
1- Dispõe o art. 202° nº 1 al. a) do C.P.P. que "Se considerar inadequadas ou insuficientes, no caso, as medidas referidas nos artigos anteriores, o juiz pode impor ao arguido prisão preventiva quando:
a) Houver fortes indícios da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos ...";
2- Nos autos existem fortes indícios, da prática pelo arguido, pelo menos, de um crime de abuso sexual de crianças, na forma agravada, p. e p. pelos artigos 171°, nº 1 e 2 e 177 nº 4 do Código Penal, conforme foi considerado no douto despacho recorrido;
3- E, por outro lado, atendendo às exigências cautelares evidenciadas no caso em apreço relativamente ao arguido, a única medida de coacção que se mostra adequada é a prisão preventiva;
4- Na verdade, considerou o Mmº Juiz a quo que, para além do perigo de continuação da actividade criminosa, existe ainda o perigo de perturbação do inquérito;
5- Ora, no caso em apreço, não se revelava adequada a aplicação da obrigação de permanência na habitação para satisfazer tais exigências cautelares uma vez que não existiam manifestamente condições, conforme realçou o Mmº Juiz, para tomar exequível tal medida. Com efeito, o arguido, atendendo ao teor das suas próprias declarações, vive na sua residência com a companheira no limiar da indigência;
6- No entanto, sempre se dirá ainda que não poderia o Tribunal permitir e muito menos proferir decisão que implique que o arguido continue a residir, em condições análogas às dos cônjuges, com a sua companheira, conforme é defendido nas suas alegações de recurso, sob pena de levar ao cometimento do ilícito previsto e punido no art. 172° do Código Penal.- sendo que não se pode afastar a hipótese de o arguido ainda poder vir a ser perseguido criminalmente por tal ilícito;
7- Na verdade, a companheira do arguido tem, de acordo com o arguido, 16 anos e com ele mantém relações sexuais desde os 14 anos, das quais resultou, quando aquela tinha 15 anos, igualmente uma gravidez!
7- (repetida) Assim, é forçoso concluir que, para além de ser a única medida de coacção adequada, a prisão preventiva mostra-se mesmo necessária para responder às exigências cautelares suscitadas no caso em apreço, revelando-se insuficiente qualquer outra medida das legalmente previstas;
8- Em suma, o despacho que aplicou a medida de coacção de prisão preventiva obedeceu totalmente ao disposto nos artigos 192°, 193° e 204°, al. b) e c) do Código de Processo Penal, bem como à Constituição da República, designadamente ao invocado art. 18° de tal diploma;
9- Acresce que tal medida é proporcional à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas, também conforme salientado pelo Mmº Juiz no douto despacho recorrido, sendo certo que o ilícito referido é punível com pena de prisão de 4 anos e 6 meses a 15 anos;
10- Pelo exposto, entendemos que o despacho que decretou a aplicação ao arguido da medida de prisão preventiva deve ser mantido na íntegra.
Nesta instância, o Ex.mo Procurador Geral-Adjunto, em parecer emitido, sustenta o improvimento do recurso.
Foram colhidos os vistos legais.
Realizada a conferência, cumpre decidir.
***
É do seguinte teor o despacho recorrido, no que releva para a apreciação deste recurso:
Resulta fortemente indiciado dos autos o seguinte:
O arguido CM… nasceu no dia 17/02/1985 contando com 23 anos de idade. A SM... nasceu dia 09/0671995 e, em 05/06/2008 contava com 12 anos de idade.
O arguido vive em união de facto com uma menor de 16 anos de idade da qual tem um filho com 3 meses.
Conheceu-a quando ela tinha pouco mais de 13 anos de idade, começou a relacionar-se com ela sexualmente com 14 anos de idade de onde resultou, quando ela tinha 15 anos de idade a gravidez que gerou a sua filha.
Resulta que a menor SM... é prima da sua actual companheira e os pais daquela são padrinhos de baptismo desta. Do depoimento do arguido resulta que as famílias da SM... e da sua actual companheira mantinham uma grande proximidade existencial sendo que a irmã mais nova daquela, a Inês com 6 anos de idade, era visita de casa dos pais da actual companheira do arguido.
Gozando da confiança inerente a esta proximidade existencial, e da proximidade com a própria SM..., o arguido começou por lhe enviar mensagens escritas via MMS utilizando o telemóvel da sua companheira, e dessa forma atraindo a atenção da SM... convidando-a para se encontrar com ele.
De certo levada pela experiência dos seus, apenas, 12 anos de idade a SM... correspondeu-lhe com outras mensagens até que o arguido levou a que ambos se encontrassem e, desses encontros até à prática de relações sexuais com cópula completa, foi um passo que o arguido deu, pelo menos, por 3 vezes sendo uma delas seguramente no dia 05/06/2008 de onde resultou a gravidez da SM....
E isto foi assim não obstante o arguido ter conhecimento da idade da menor e que isso lhe poderia trazer problemas, da mesma forma que o sabia quando iniciou o trato sexual com a sua actual companheira.
Resulta daqui que o arguido, não obstante ter conhecimento da idade da menor, e que por causa dessa mesma idade não poderia manter com ela actos sexuais, designadamente cópula, e bem assim que dessa mesma cópula poderia resultar a gravidez inopinada da menor, pois que já isso tinha sucedido com a sua companheira, movendo-se de forma voluntária, livre, consciente e levado pelos seus instintos libidinosos decidiu praticar com ela tais actos assumindo a possibilidade de a gravidez suceder.
Assim, a conduta do arguido é passível de ser subsumida na prática de um crime de abuso sexual de criança na forma agravada, p. e p. pelos art.°s. 171, n.º 1 e 2 e 177, n.º 4 ambos do C.Penal.
Estes factos são fortemente indiciados pelas declarações de fls. 15 e seguintes, pelo relatório de urgência de fls. 22 a 28; pela informação clínica de fls. 35; pelo relatório de investigação de paternidade de fls. 50 a 53 e pelas regras da experiência e normalidade do acontecer quando relacionadas com as versões dos factos apresentados pelo arguido no âmbito da presente diligência.
Tendo presente que o arguido sabia que a sua conduta apreciada nos autos era proibida e punida por lei;
tendo presente que o arguido, com 23 anos de idade, sabedor da idade da vitima, tinha conhecimento de que a esta, tal como sucedera com a sua companheira, poderia sobrevir uma gravidez;
tendo presente que o arguido tinha conhecimento "da maldade da sua acção";
e ainda assim, tendo tudo isto presente, o arguido decidiu praticar os factos, revela este, em razão da sua personalidade neles manifestada uma pulsão sexual relativamente aos menores susceptível de criar o perigo de continuação da actividade criminosa.
Por outro lado, o arguido procurou, até onde lhe era possível negar a evidência dos factos, criando para isso versões inverosímeis do sucedido e, sem nunca os admitir, constata-se que este não assumiu essa maldade da sua acção estando por isso em condições de poder perpetuar essa mesma actuação.
Por outro lado, o arguido vive em grande proximidade existencial com a família da vitima o que, associado ao facto de ser do sexo masculino e ter em relação àquela uma diferença para mais de 10 anos de idade, confere-lhe sobre a mesma um ascendente susceptível de criar perturbações no decurso do inquérito, designadamente quanto ao apuramento da verdade dos factos que rodearam os actos de cópula e iniludivelmente demonstrados nos autos.
Verificados que estão os perigos a que aludem as als. b) e c) do art.º 204º do C.P. Penal verificamos que, de acordo com um principio de adequação, só uma medida de coacção que prive a liberdade do arguido será susceptível de responder aos referidos perigos.
Sendo duas as medidas adequadas a privar a liberdade do arguido em termos necessários a responder aos referidos perigos, e impondo o art.º 193, n.º 3 do C.P.Penal a prevalência da obrigação de permanência na habitação (art.º 201 do C.P.P), verificamos que atentas as condições de vida do arguido e do seu agregado familiar esta é inexequível.
O arguido não exerce qualquer actividade profissional, não se sabe quando o virá a fazer, a sua companheira está desempregada, vivem no limiar da indigência com o auxilio monetário e alimentar de familiares e amigos e ambos têm uma filha de 3 meses de idade com o que tudo isso significa em termos de despesas.
A própria renda de casa é paga com o recurso ao abono da menor e com auxílio económico da mãe da companheira.
Assim sendo, em face dessa inexequibilidade entendemos que só a privação de liberdade em estabelecimento prisional nos termos do art. 202 do C.P. Penal será adequada e, em face dos aspectos mencionados anteriormente necessária para responder às exigências cautelares do processo.
Por outro lado essa medida revela-se ainda proporcional à extrema gravidade da pena aplicável ao ilícito que lhe é imputado e à pena que presumivelmente lhe virá a ser aplicada, sendo certo que em situações similares o S.T.J. vem definindo como pena proporcional e justa uma que andará entre os 7 e 8 anos de prisão.
Ponderando tudo isto, decide-se:
O arguido aguardará os ulteriores termos do processo sujeito a T.I.R. ( art.º 196 do C.P.P); e, em prisão preventiva ( art.º 202 do C.P.P.).
***
Conhecendo:
A questão suscitada no recurso respeita à errada apreciação dos elementos dos autos e que levaram à aplicação da medida de coacção –prisão preventiva- do arguido/recorrente CM….
*
Ao arguido recorrente foi aplicada a medida de coacção, ouvido em primeiro interrogatório, prisão preventiva.
Do despacho que lhe aplicou a medida de coacção de prisão preventiva, recorre o arguido.
As medidas de coacção e de garantia patrimonial “são meios processuais de limitação da liberdade pessoal ou patrimonial dos arguidos e outros eventuais responsáveis por prestações patrimoniais, que têm por fim acautelar a eficácia do procedimento, quer quanto ao seu desenvolvimento, quer quanto à execução das decisões condenatórias" (Germano Marques da Silva Curso de Processo Penal III).
Estabelece a nossa lei o princípio da legalidade das medidas de coacção e de garantia patrimonial querendo isto dizer que estas medidas são apenas aquelas que na lei estão enumeradas taxativamente.
A aplicação destas medidas obedece a certos princípios tais como os da necessidade, proporcionalidade e adequação. Ou seja "as medidas de coacção e de garantia patrimonial a aplicar em concreto devem ser adequadas às exigências cautelares que o caso requerer e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas" (art 193 n° 1 do CPP).
Para a aplicação de uma das medidas de coacção, com excepção do termo de identidade e residência deve verificar-se a existência de pelo menos um dos requisitos estabelecidos no art. 204 do Código Processo Penal e, também, um dos requisitos de que depende a aplicação de cada uma das referidas medidas.
A prisão preventiva tem natureza excepcional, uma vez que não pode ser decretada nem mantida sempre que possa ser aplicada caução ou outra medida mais favorável prevista na lei – art. 28 nº 2 da Constituição, ou seja, só deve ser aplicada quando as restantes medidas de coacção forem consideradas inadequadas ou insuficientes.
Neste seguimento, dispõe o nº 2 do art. 193 que a prisão preventiva só pode ser aplicada quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coacção. Portanto, para se aplicar uma medida de coacção há que ponderar a gravidade do crime praticado, a personalidade do delinquente e a necessidade daquela medida de coacção ao caso concreto, tendo em vista o fim pretendido.
Resulta, também, do art. 202 do Código Processo Penal, que a prisão preventiva, sendo a medida de coacção mais gravosa para o arguido, em princípio a mesma só deverá ser aplicada excepcionalmente, ou seja, apenas quando se considerarem inadequadas ou insuficientes as restantes medidas de coacção previstas no Código Processo Penal.
É pois perante a verificação dos pressupostos enunciados nos arts. 202 e 204 do CPP, que a medida de coacção prisão preventiva, pode ser aplicada ou mantida.
A prisão preventiva nunca pode ser vista como instrumento de investigação e nunca se deve prender para investigar. Deve-se investigar, e é face aos indícios que se verifica se se deve prender (deter), caso se verifiquem os requisitos respectivos (se outra medida se revelar inadequada ou insuficiente).
Assim, há que analisar se se verifica algum dos pressupostos, há que fundamentar a decisão (verificação dos requisitos de aplicação da prisão preventiva), como preceitua o art. 97 nº 4 do CPP.
Apesar de a prisão preventiva ser a mais grave das medidas de coacção previstas na lei, e só podendo ser aplicada quando as restantes medidas de coacção forem consideradas inadequadas ou insuficientes (natureza subsidiária e excepcional da prisão preventiva –art. 28 da Constituição), in casu justifica-se plenamente a aplicação de tal medida de coacção.
São fortes os indícios (exame de averiguação da paternidade) de o arguido ter praticado (pelo menos) um crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos.
E, não basta o arguido negar a prática dos factos, "inventando" histórias mirabolantes como a da piscina, ou desconhecimento onde deixou o preservativo depois de ter relações sexuais com a companheira, as quais não podem ser aceites pelo senso comum.
In casu há a prova do delito, a gravidez da ofendida menor, à altura com 13 anos de idade.
Relativamente aos requisitos de aplicação da medida de coação prisão preventiva:
Os requisitos, ou condições de aplicação de medidas de coacção, nomeadamente prisão preventiva, elencados no art. 204, são alternativos (cfr. anotação do Cons. Maia Gonçalves ao art. 204).
Verificando-se um desses requisitos, fica legitimada a aplicação da medida.
No despacho recorrido para justificar a aplicação desta medida de coacção, é indicado e justificado (essencialmente) o requisito (perturbação do inquérito) como se constata do próprio despacho supra transcrito, devido ao ascendente que o arguido exercerá sobre a ofendida dada a diferença de idades.
Podendo também relevar neste aspecto o meio social onde os arguido e ofendida e respectivas famílias se inserem. A "maldade da acção" do arguido, como refere o despacho recorrido e o seu não assumir dos factos acarretaria que o mesmo tentasse influenciar a investigação.
Mas também há perigo concreto de continuação da actividade criminosa. O que manifestamente acontece nos crimes de natureza sexual em que o arguido com o "tempo livre" que passaria a ter e a influência que podia exercer sobre crianças, tendo em conta os novos meios tecnológicos, mesmo aplicando a medida de coacção OPHVE.
Neste tipo de crimes, os agentes sempre arranjam maneira de se desculparem das suas condutas, chegando ao ponto, como o arguido de dizer que foi seduzido pela menor então com 12 anos, quando ele já tinha 22. O distúrbio da personalidade a isso leva, bem como à repetição das condutas, se tal se propiciar, mas tudo fazendo para que tal aconteça.
Uma das características mais evidentes dos agressores sexuais, condenados e detidos nas cadeias portuguesas, é a sua «insinceridade», revela um estudo elaborado pelo investigador e psicólogo Armando Coutinho Pereira, qual refere, «É impressionante a percentagem de agressores sexuais que negam ou minimizam o seu comportamento. São uma espécie de analfabetos emocionais, com grande incapacidade para sentir o sofrimento do outro».
Agressor sexual é lobo em pele de cordeiro.
O que manifestamente torna insuficiente e inadequada qualquer outra medida de coacção que não seja a prisão preventiva.
Até a medida de coacção, obrigação de permanência na habitação, mesmo com meios técnicos de controle à distância se revela insuficiente e inadequada face ao tipo de crime, visto poder ser cometido aliciando crianças a vir a sua casa, dado que normalmente as vítimas são amigos, vizinhos, conhecidos ou até familiares.
É certo que a prisão preventiva é a última medida a adoptar (a liberdade é a regra, a prisão preventiva a excepção –arts. 27 e 28 da Constituição). Citando Fernando Fabião, in Prisão Preventiva, pág. 5, “o homem tem a liberdade na massa do sangue, de tal sorte que, onde ela não existe, não pode falar-se de homens. Ser livre é da essência da natureza histórica do homem. Milénios de história o documentam, testemunhando a progressiva libertação do homem das forças contrárias às múltiplas manifestações desse impulso básico, fundamental que é a liberdade”.
No caso em apreço, existe o concreto perigo de perturbação do inquérito e de continuação da actividade criminosa (disso sendo indício os factos passados com a companheira e a idade desta quando se juntaram) mesmo que se aplicasse a prisão domiciliária com vigilância electrónica, e os indícios confirmam a relevância jurídico-processual, e a necessidade de medida de coacção gravosa.
Do exposto resulta a correcção do despacho recorrido, apesar do dever de se recorrer à prisão preventiva apenas como extrema ratio, isto é, só quando as demais medidas se revelarem inadequadas ou insuficientes e houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos.
Como refere Teresa Beleza, "em princípio, qualquer medida de coacção e, sobretudo a mais, gravosa de todas que é a prisão preventiva, só deve ser aplicada para fins relativos àquele processo e àquela pessoa em concreto e fundamentalmente, devem ter, neste sentido, fins de segurança, isto é, a prisão preventiva não deve, ao contrário do que acontecerá na realidade, funcionar como uma medida punitiva adiantada, mas deve funcionar, como qualquer medida de coacção....como uma garantia de segurança no sentido de que o arguido não se eximirá a estar presente no processo e não irá perturbar o decurso das investigações, destruindo a actividade na suspeita da qual ele está a ser sujeito a um processo crime" (cfr. Apontamentos de Direito Processo Penal, AAFDL, n, pp. 125 e 126).
Porém, nem a prisão preventiva nem qualquer outra medida de coacção (com excepção do termo de identidade e residência) poderão ser aplicadas se, em concreto, se não verificar (art. 204° CPP):
a) Fuga ou perigo de fuga;
b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição conservação ou veracidade da prova;
c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas ou de continuação da actividade criminosa.
Como se disse, estes requisitos ou condições gerais são alternativas, bastando a existência de um deles para, conjuntamente com os especiais de cada medida, legitimar a aplicação desta.
Ora no caso sub judice entendeu-se e fundadamente, existirem esses requisitos e com consistência.
Tal perigo decorre claramente como já referimos.
A prisão preventiva não é desproporcionada, face à gravidade do (dos) crimes, bem expresso na moldura penal que lhe corresponde e a sanção que previsivelmente lhe virá a ser aplicada.
Deste modo, atento o disposto nos arts. 202 n° 1 a), 204° b) e c) e 193° CPP, o Exmº juiz não podia deixar de aplicar a medida de coacção e decretar a prisão preventiva ao recorrente.
Face aos fundamentos do despacho recorrido e face ao supra exposto, temos que o despacho recorrido não nos merece qualquer censura.
É pois de concluir que a prisão preventiva aplicada se deve manter.
Não foi violada nenhuma norma legal, nem as indicadas pelo recorrente, nem foram postos em crise os princípios que sempre devem ser tidos em conta no processo penal.
Daí que o recurso deve ser julgado improcedente.
***
Decisão:
Pelo que exposto ficou, acordam em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido CM…, confirmando-se o despacho recorrido.
Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 (sete) Ucs.
Coimbra,
____________________

____________________