Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
545/07.1TBOBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: GREGÓRIO SILVA JESUS
Descritores: REGULAMENTO (CE) Nº 44/2001
RECONHECIMENTO DE DECISÕES PROFERIDAS NOS ESTADOS-MEMBROS
MATERIA CIVIL E COMERCIAL
REGRAS A OBSERVAR NO ESTADO DE RECONHECIMENTO E EXECUÇÃO
Data do Acordão: 01/20/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE OLIVEIRA DO BAIRRO
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Legislação Nacional: -
Legislação Comunitária: REGULAMENTO (CE) Nº 44/2001 DO CONSELHO, DE 22/12/2000
Sumário: I – Com o Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22/12/2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões, em matéria civil e comercial, criou-se um instrumento normativo de direito comunitário que permitiu a unificação, no âmbito da sua aplicação, das normas de conflito de jurisdição em matéria civil e comercial, independentemente da natureza da jurisdição (artº 1º, nº 1), bem assim a simplificação das formalidades com vista ao reconhecimento e execução, rápidos e simples, das decisões proferidas sobre essas matérias nos Estados-Membros.

II – Como condição específica da declaração de executoriedade, o Regulamento apenas exige que a decisão tenha força executiva segundo o Direito do Estado de origem (artºs 38º, nº 1, e 53º), não sendo necessário que a força executiva seja definitiva.

III – A confiança recíproca na administração da justiça no seio da Comunidade exige a eficácia e a rapidez do procedimento para tornar executória num Estado-Membro uma decisão proferida noutro Estado-Membro.

IV – Para se alcançar este desiderato a declaração de executoriedade de uma decisão deve ser dada de forma quase automática, após um simples controlo formal dos documentos fornecidos, sem a possibilidade de o tribunal invocar por sua própria iniciativa qualquer dos fundamentos previstos pelo presente regulamento para uma decisão não ser executada.

V – No processo de reconhecimento e execução no Estado requerido, se o requerido interpuser recurso da decisão que confere força executiva à decisão proferida no Estado de origem, o tribunal que decide esse recurso pode ter que examinar um motivo de recusa de reconhecimento ou de execução como o previsto no artº 34º, nº 2, do Regulamento citado.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I— RELATÓRIO


           

No Processo Especial nº 545/07.1TBOBR que corre termos pelo Tribunal Judicial de Oliveira do Bairro, em que é requerente A..., sociedade comercial de direito italiano, com sede em Sassuolo – Modena, Itália, e requerida B..., com sede em Bustos, Oliveira do Bairro, agravou a requerida da decisão proferida pela Ex.ma Juiza que declarou executória a sentença proferida pelo Tribunal de Modena, Itália, que a condenou no pagamento da quantia de 1 198 636,17 €, da qual o montante de 120 940,19 € é relativo a juros de mora, além de outros aplicáveis ex vi art. 1283º CC, calculados desde a data de emissão do decreto de injunção até integral pagamento, e despesas do procedimento de injunção no montante de 3 451,00 €, além das despesas gerais de causa equivalentes a 12,50% e ónus fiscais, tudo como previsto na lei italiana.

 Termina a sua alegação com as seguintes conclusões:

1- O presente agravo vem da sentença prolatada a fls. dos autos acima identificados, que concedeu provimento à pretensão da Recorrida, declarando a executoriedade da decisão proferida pelo Tribunal Italiano de Modena.

2- No que tange à concedida executoriedade, afigura-se-nos que Recorrida, A... se encontra a fazer um uso abusivo de um direito, porquanto requereu a declaração de executoriedade de uma decisão meramente provisória.

3- Pois, fê-lo no decurso do prazo legal para a Recorrente se opor ao pedido deduzido junto do Tribunal de Modena, designadamente, para se opor à declaração de executoriedade do Decreto Injuntivo em apreço.

4- Bem sabendo que, com a oposição à intimação a decisão proferida pelo Tribunal de Modena, de acordo com a lei italiana, pode ser requerida a suspensão ou a revogação de tal decisão.

5- É que a decisão que conceda a suspensão do Decreto Injuntivo não é passível de recurso.

6- Ora, o abuso do direito, nas sábias palavras do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa “ abrange o exercício de qualquer direito por forma anormal, quanto à sua intensidade, ou à execução de modo a poder comprometer o gozo de direitos de terceiros e criar uma desproporção objectiva entre a utilidade do exercício do direito, por parte do seu titular, e as consequências que os outros têm de suportar” (RL, 2-2-1982:CJ 1982, 1º- l66, in Abílio Neto, Código de Processo Civil Anotado, 14ª Ed. Actualizada).

7- Na verdade, há uma manifesta desproporção entre a utilidade que a Recorrida visa obter – execução imediata de uma decisão provisória - e as consequências que a Recorrente tem de suportar e que, in extremis, podem por em causa a viabilidade financeira da Recorrente.

8- Donde, salvo melhor opinião, in casu, a Recorrida encontra-se a exercer um alegado direito, com manifesto excesso dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim económico e social do direito (art. 334.°do Código Civil).

9- É patente que, o pedido para que seja declarada a executoriedade de uma decisão meramente provisória, e ainda dependente de uma apreciação do mérito, ofende o sentimento jurídico socialmente dominante na ordem jurídica portuguesa.

10- Mesmo que assim se não entenda, o que expressamente se refuta e apenas por mero dever de patrocínio se conjectura, o reconhecimento da declaração de executoriedade do Decreto Injuntivo interposto pela Recorrida, ao abrigo da legislação italiana, é manifestamente contrário à ordem publica portuguesa na sua vertente processual, conforme prevenido no nº 1 do artigo 34.° do Regulamento n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000.

11- Porquanto, a declaração de executoriedade do crédito cujo pagamento se reclama, foi concedida em clara violação do principio do contraditório (artigos 3º e 3°- A do C.PC.

12- Uma vez que, o Tribunal Italiano de Modena concedeu a execução provisória do decreto de injunção com base em documentos juntos pela aqui Recorrida, e sem que a mesma tenha sido ouvida em momento anterior à decisão proferida pelo Tribunal de Modena.

13- Encontrando-se a executoriedade definitiva dependente do exercício do contraditório e da apreciação do mérito de uma acção pendente.

14- Com as consequências nefastas da execução de tal decisão, quer para o património da Recorrente quer para o exercício da justiça, mais concretamente, para o princípio da economia processual.

15- Com efeito, a execução da decisão proferida pelo Tribunal Italiano, implica a re legação para a acção executiva do conhecimento e definição dos direitos das partes, ao arrepio do estabelecido no Código de Processo Civil.

 16- Note-se que, conforme preceitua o artigo 3.° do Código de Processo  Civil, só nos casos excepcionais previstos  na lei se podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida, nem o juiz  pode decidir quaisquer questões de direito ou de facto sem que as partes tenham tido oportunidade de se pronunciar.

17- Saliente-se ainda que, a declaração de executoriedade do Decreto Injuntivo viola ainda o princípio da igualdade das partes ínsito no artigo 3º do Código de Processo Civil, que mais não é que uma decorrência do principio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei.

18- Face ao exposto, deve a decisão recorrida ser revogada, por ser manifestamente contrária à ordem pública portuguesa, tanto na vertente dos princípios de direito substantivo, designadamente por consubstanciar uma actuação em manifesto abuso de direito, como na perspectiva do direito adjectivo, porquanto ofende os princípios do contraditório e da igualdade das partes.

19- A estrita observância, e respeito pelos princípios de direito processual civil português, impõe que se aguarde pela discussão do mérito da acção que se encontra pendente em Modena, dando assim cumprimento dos aludidos preceitos normativos.

20- Ademais, encontrando-se a executoriedade definitiva do Decreto Injuntivo sujeita a apreciação judicial, a requerimento da Recorrente e, na eventualidade de tal decisão ser desfavorável à Recorrente, a decisão proferida é ainda susceptível de recurso.

21- Face ao exposto cumpre requerer, ao abrigo do disposto no artigo 46º do aludido Regulamento, que seja decretada a suspensão da instância até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida pelo Tribunal de Modena, ou,

22- Caso assim não se entenda, requer-se que seja decretada a suspensão da instância até à pronúncia, pelo referido Tribunal, de decisão de mérito que declare a executoriedade definitiva ao Decreto Injuntivo.

Foram apresentadas contra-alegações pugnando pela manutenção da decisão recorrida e não suspensão da instância.

Estão colhidos os vistos. Cumpre conhecer e decidir.



O objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 684º, nºs 3 e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil.

São duas as questões suscitadas pela agravante e que se reconduzem a saber:

1- Se há razões para ser negado o reconhecimento da sentença do Tribunal de Modena, Itália, conferindo-lhe força executiva, por a declaração de executoriedade ser manifestamente contrária à ordem pública Portuguesa;

2- Se se justifica suspender a instância ao abrigo da faculdade concedida pelo art. 46º, nº1, do Regulamento44/2001 do Conselho de 22/12/2000.



                                             II-FUNDAMENTAÇÃO

DE FACTO

Com interesse para a decisão a proferir importa alinhar o seguinte quadro factual:

1.Em 8/06/2007, no Tribunal Judicial da Comarca de Oliveira do Bairro, veio A..., sociedade comercial de direito italiano, com sede em Sassuolo – Modena, Itália, ao abrigo do disposto no Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22.12.2000, requerer contra B..., com sede em Bustos, Oliveira do Bairro, a Declaração de Executoriedade da sentença proferida em 17/04/.2007, pelo Tribunal de Modena, em Itália, que condenou a requerida a pagar à requerente as quantias na sentença discriminadas.

Juntou certidão daquela decisão condenatória e respectiva tradução, bem assim procuração forense;

2. Nessa sentença de Modena foi concedida à requerente a sua execução provisória de acordo com o estabelecido no art. 642, II parágrafo do CPC italiano;

3. Assim como se advertiu a devedora/ recorrente que de acordo com o art. 641, II parágrafo do CPC, no prazo de 50 dias decorrentes da notificação do requerido e da decisão poderia deduzir oposição e na falta desta a decisão tornar-se ia definitiva;

4. A requerida B..., foi notificada da decisão do Tribunal de Modena através de carta registada, com aviso de recepção, expedida em 18/05/07, de acordo com o estabelecido no art. 14º do Regulamento CE nº 1384/2000, para pagar a quantia em que foi condenada, da sua executoriedade provisória, e da cominação de que se não deduzisse oposição no prazo de 50 dias aquela decisão se tornava definitiva;

5. A decisão é exequível em Itália.

6. Conclusos os autos, foi proferida a sentença de fls. 60 a 66, pela qual foi decidido declarar executória a sentença do aludido Tribunal de Itália.

7. A recorrente juntou cópia, com a respectiva tradução, da Oposição ao Decreto Injuntivo apresentada em 17/07/07 no Tribunal de Modena, na qual peticiona, entre outros pedidos, a suspensão bem como a revogação daquele Decreto e, em via reconvencional, a declaração de ser credora da recorrida no montante de 136.270,38€.

8. A apreciação destes pedidos encontra-se pendente da decisão final que o Tribunal de Modena venha a proferir, estando a audiência de julgamento designada para 31/01/2010.

9. Daquela decisão final cabe recurso ordinário.

DE DIREITO

1. Se a declaração de executoriedade é manifestamente contrária à ordem pública Portuguesa

Sustenta a agravante que o reconhecimento da declaração de executoriedade do Decreto Injuntivo interposto pela Recorrida, ao abrigo da legislação italiana, é manifestamente contrário à ordem pública portuguesa na sua vertente processual, porquanto a declaração de executoriedade do crédito cujo pagamento se reclama foi concedida em clara violação do principio do contraditório, e substantiva porque se encontra a fazer um uso abusivo de um direito.

Vejamos, de per si, cada uma das referidas sub-questões.      

Com o Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22/12/2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões, em matéria civil e comercial[1] criou-se um instrumento normativo de direito comunitário que permitiu a unificação, no âmbito da sua aplicação, das normas de conflito de jurisdição em matéria civil e comercial, independentemente da natureza da jurisdição (artigo 1º, nº 1), bem assim a simplificação das formalidades com vista ao reconhecimento e execução, rápidos e simples, das decisões proferidas sobre essas matérias nos Estados-Membros.

O referido Regulamento, (publicado no J.O.C., nº L 12, de 16/01/2001), entrou em vigor em 1 de Março de 2002, substituindo entre os Estados Membros da União Europeia, com excepção da Dinamarca, a Convenção de Bruxelas de 1968, aplica-se às acções judiciais intentadas posteriormente à sua entrada em vigor, é obrigatório em todos os seus elementos e é directamente aplicável em todos os Estados-Membros, em conformidade com o Tratado que institui a Comunidade Europeia (artigos 1º, 68º e 76º).

Como condição específica da declaração de executoriedade, o Regulamento apenas exige que a decisão tenha força executiva segundo o Direito do Estado de origem (arts 38º, nº1, e 53º).

Não é necessário que a força executiva seja definitiva, visto que se admite a atribuição de força executiva a providências provisórias[2]

Por sua vez, dispõe o art.º 45º, nos seus nºs 1 e 2, que o tribunal onde foi interposto recurso da decisão sobre o pedido de declaração de executoriedade ao abrigo dos art.ºs 43º ou 44º apenas recusará ou revogará a declaração de executoriedade por um dos motivos especificados nos art.ºs 34º e 35º, não podendo a decisão estrangeira “ em caso algum, ser objecto de revisão de mérito”.[3]

Estatui, então, o art.º 34º:

“ Uma decisão não será reconhecida:

1. Se o reconhecimento for manifestamente contrário à ordem pública do Estado-Membro requerido;

2. Se o acto que iniciou a instância, ou acto equivalente, não tiver sido comunicado ou notificado ao requerido revel, em tempo útil e de modo a permitir-lhe a defesa, a menos que o requerido não tenha interposto recurso contra a decisão embora tendo a possibilidade de o fazer;

3. Se for inconciliável com outra decisão proferida quanto às mesmas partes no Estado-Membro requerido;

4. Se for inconciliável com outra anteriormente proferida noutro Estado-Membro ou num Estado terceiro entre as mesmas partes, em acção com o mesmo pedido e a mesma causa de pedir, desde que a decisão proferida anteriormente reúna as condições necessárias para ser reconhecida no Estado-Membro requerido.”

O art.º 35 impõe que se respeitem as normas relativas à competência judiciária quanto a seguros, contratos celebrados por consumidores e competências exclusivas e acordos anteriores ao Regulamento, previsões que ao caso não importam.

Resulta, assim, destes normativos que observadas as regras de competência judiciária os únicos fundamentos de recusa da decisão de executoriedade são apenas aqueles.

Nessa conformidade, sustenta a recorrente que a declaração de executoriedade é manifestamente contrária à ordem pública Portuguesa, pelas seguintes razões:

a) A declaração de executoriedade foi concedida em violação do princípio do contraditório e do princípio da igualdade das partes.

b) A decisão do Tribunal de Modena é uma medida provisória, pelo que a sua execução excede os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim económico e social desse direito (abuso de direito).

Resulta dos seus considerandos segundo, sexto, décimo sexto e décimo sétimo que o Regulamento (CE) Nº 44/2001 do Conselho de 22/12/2000 pretende alcançar o objectivo da livre circulação das decisões dos Estados-Membros em matéria civil e comercial, simplificando as formalidades para que o respectivo reconhecimento e execução sejam rápidos e simples.

A confiança recíproca na administração da justiça no seio da Comunidade exige a eficácia e a rapidez do procedimento para tornar executória num Estado-Membro uma decisão proferida noutro Estado-Membro. Para se alcançar este desiderato a declaração de executoriedade de uma decisão “deve ser dada de forma quase automática, após um simples controlo formal dos documentos fornecidos, sem a possibilidade de o tribunal invocar por sua própria iniciativa qualquer dos fundamentos previstos pelo presente regulamento para uma decisão não ser executada” (nº 17 do preâmbulo do Regulamento).

 Esse objectivo não pode, todavia, ser alcançado à custa de um enfraquecimento, seja qual for a forma que assuma, dos direitos de defesa, como o Tribunal de Justiça decidiu a propósito do artigo 27.°, n.° 2, da Convenção de Bruxelas (v., nomeadamente, acórdãos de 11 de Junho de 1985, Debaecker e Plouvier, 49/84, Recueil, p. 1779, n.° 10; de 13 de Outubro de 2005, Scania Finance France, C-522/03, Colect., p. I-8639, n.° 15; e de 16 de Fevereiro de 2006, Verdoliva, C-3/05, Colect., p. I-1579, n.° 26).

 Esta mesma exigência resulta do décimo oitavo considerando do Regulamento, nos termos do qual o respeito pelos direitos de defesa impõe que o requerido possa interpor recurso, examinado de forma contraditória, contra a declaração de executoriedade de uma decisão, se entender que é aplicável qualquer fundamento para a não execução.

 Segundo jurisprudência assente, os direitos fundamentais são efectivamente parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça (v., nomeadamente, parecer 2/94, de 28 de Março de 1996, Colect., p. I-1759, n.° 33). Para este efeito, o Tribunal de Justiça inspira-se nas tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, bem como nas indicações fornecidas pelos instrumentos internacionais relativos à protecção dos direitos do Homem em que os Estados-Membros colaboraram ou a que aderiram. A Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (a seguir «CEDH») reveste-se, neste contexto, de um significado particular (v., nomeadamente, acórdãos de 15 de Maio de 1986, Johnston, 222/84, Colect., p. 1651, n.° 18, e de 28 de Março de 2000, Krombach, C-7/98, Colect., p. I-1935, n.° 25).

 Ora, resulta da CEDH, tal como interpretada pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que os direitos de defesa, que decorrem do direito a um processo equitativo consagrado no artigo 6.° dessa Convenção, impõem uma protecção concreta e eficaz, adequada a garantir o exercício efectivo dos direitos do demandado (v. TEDH, acórdãos Artico e Itália de 13 de Maio de 1980, série A, n.° 37, § 33, e T. e Itália de 12 de Outubro de 1992, série A, n.° 245 C, § 28)[4].

No que diz respeito ao sistema instituído pelo Regulamento n.° 44/2001 em matéria de reconhecimento e execução, importa referir que o respeito pelos direitos do requerido revel é garantido por uma dupla fiscalização:

 -- No processo inicial no Estado de origem, resulta efectivamente da aplicação conjugada dos artigos 26.°, n.° 2, do Regulamento n.° 44/2001 e 19.°, n. 1, do Regulamento n.° 1348/2000 que o juiz deve sobrestar na decisão enquanto não se verificar que o requerido revel teve oportunidade de receber o acto que determinou o início da instância ou acto equivalente em tempo útil para apresentar a sua defesa ou que foram feitas todas as diligências nesse sentido.

 -- No processo de reconhecimento e execução no Estado requerido, se o requerido interpuser recurso da decisão que confere força executiva à decisão proferida no Estado de origem, o tribunal que decide esse recurso pode ter que examinar um motivo de recusa de reconhecimento ou de execução como o previsto no artigo 34.°, n.° 2, do Regulamento n.° 44/2001, acima transcrito.

À luz destas considerações qual é a realidade vazada nos autos?

A recorrida A..., requereu o exequatur de um “Decreto ingiuntivo” que não é mais do que a decisão de um procedimento de injunção ( procedimento di ingiunzione), a que se refere o Capítulo I, do Título I, do Livro IV do  Código de Processo Civil Italiano, regulado nos arts. 633º a 659º[5], que permite ao credor, mediante requerimento inicialmente não notificado à parte contrária, obter um título executivo contra o devedor.

Proferida a decisão sumária é então notificado o requerido da mesma, e essa notificação constitui o acto que inicia a instância (art. 643º, III parágrafo[6]). A partir desta notificação, é que o requerido pode deduzir oposição até ao termo do prazo que lhe foi fixado, em conformidade com o artigo 641.º, para voluntariamente cumprir a obrigação.

            É nesta observância processual que a requerida A... foi notificada da decisão do Tribunal de Modena através de carta registada, com aviso de recepção, expedida em 18/05/07. O mesmo é dizer, que à requerida foi concedida a oportunidade de receber o acto que determinou o início da instância em tempo útil para apresentar a sua defesa.[7]

            Consequentemente, não há motivo justificativo da não execução da decisão com fundamento no nº 2 do art. 34º do Regulamento.

O Tribunal italiano de Modena concedeu a execução provisória ao decreto de injunção, ao abrigo do disposto no artigo 642.º, parágrafos II e III, do Código Processo Civil Italiano.

Trata-se de uma realidade jurídica que o ordenamento jurídico português não desconhece, onde se encontra paralelo com o que sucede com a execução material das sentenças que deferem procedimentos cautelares[8].

Ao nosso sistema processual civil repugnam as decisões judiciais tomadas à revelia de um dos interessados, por isso se consagrou nos arts. 3º e 3º-A os princípios do contraditório e da igualdade das partes, os quais foram desenvolvidos noutras disposições, e tão grande relevo se quis imprimir ao primeiro que se determinou a excepcionalidade dos casos em que se “ podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida” ( nº 2 do art. 3º).

Tais excepções praticamente só são admitidas, por razões de eficácia e celeridade e ainda assim sem restringir de forma intolerável o direito de defesa, no âmbito de alguns procedimentos cautelares em que facultou ao requerido a possibilidade de se defender após o decretamento da providência decretada ( arts 385º, nº 5, 388º, 394º, 408º, nº 1 do CPC)[9].

No caso em apreço, estamos perante uma executoriedade provisória concedida ao abrigo artigo 642.º II parágrafo do Código Processo Civil Italiano, por o Tribunal italiano ter entendido ocorrer risco de prejuízo grave para a requerente em caso de atraso no pagamento, em que a declaração de executoriedade não foi concedida em violação do princípio do contraditório e do princípio da igualdade das partes, uma vez que a partir da sua notificação a requerida pode deduzir oposição até ao termo do prazo que lhe foi fixado para pagar, tal como alega já ter feito.

Se o devedor deduzir oposição à injunção, segue-se o processo cível contraditório de direito comum – cfr. artigo 645.º do Código de Processo Civil Italiano.

Portanto, nos termos da lei processual italiana, e no caso vertente, o momento oportuno para o devedor se pronunciar surge posteriormente à decisão, nada que repugne à ordem pública Portuguesa, à semelhança do que acontece com os procedimentos cautelares sem audição da parte contrária e processo executivo em que é dispensada a citação prévia do executado.

A noção de ordem pública é variável com os tempos, sendo definida por Mota Pinto, (Teoria Geral Dir. Civil, 3ª ed., pag. 551) como “o conjunto dos princípios fundamentais, subjacentes ao sistema jurídico, que o Estado e a sociedade estão substancialmente interessados em que prevaleçam e que têm uma acuidade tão forte que devem prevalecer sobre as convenções privadas”.[10]

Manuel de Andrade, refere que, pela dificuldade em definir tal noção, se faz apelo aos interesses fundamentais que o nosso sistema jurídico procura tutelar e aos princípios correspondentes que constituem como que um substrato desse sistema[11].

Tendo, então, em conta os interesses prevalecentes que o nosso sistema jurídico procura tutelar e os princípios correspondentes que o enformam é manifesto que a decisão recorrida não se revela contrária à ordem pública portuguesa na perspectiva do direito adjectivo. Isto é, a execução da decisão do tribunal italiano não importa um resultado intolerável, quer do ponto de vista do sentimento ético-jurídico, quer do ponto de vista dos princípios fundamentais do direito português, não é inconciliável com as concepções jurídicas que alicerçam o sistema jurídico português.[12]

Da mesma forma, não descortinamos onde esteja a requerente/apelada a abusar de direito por ter requerido a declaração de executoriedade de uma decisão meramente provisória.

O abuso do direito, como flui da norma do artigo 334.º do Código Civil, traduz-se no exercício ilegítimo de um direito, resultando essa ilegitimidade do facto de o seu titular, ao exercê-lo, exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.

Não basta, pois, que o titular do direito exceda os limites referidos naquele preceito, é necessário que esse excesso seja manifesto e gravemente atentatório da boa fé, dos bons costumes ou do fim social ou económico do direito que é exercido.

Por outro lado, não se exige que o titular do direito tenha consciência de que o seu procedimento é abusivo, ou seja, não é necessário que tenha a consciência de que, ao exercer o direito, está a exceder os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social ou económico do direito, basta que na realidade (objectivamente) esses limites tenham sido excedidos de forma nítida e intolerável, pois, como é sabido, o nosso ordenamento jurídico acolheu a concepção objectiva do abuso do direito.[13]

O artigo 334.º do Código Civil acolhe a expressão boa fé com um sentido vincadamente ético, o qual se reconduz às exigências fundamentais da ética jurídica, «que se exprimem na virtude de manter a palavra dada e a confiança, de cada uma das partes proceder honesta e lealmente, segundo uma consciência razoável, para com a outra parte, interessando as valorações do círculo social considerado, que determinam expectativas dos sujeitos jurídicos»[14]

A formulação legal compreende não só o exercício emulativo como o exercício de qualquer direito “por forma anormal, quanto à sua intensidade ou à sua execução, de modo a comprometer o gozo dos direitos de terceiros e a criar uma desproporção objectiva entre a utilidade do exercício do direito por parte do seu titular, e as consequências que os outros têm de suportar[15]

Revertendo ao caso em apreço, se analisarmos atentamente os factos coligidos e os valorarmos juridicamente à luz dos normativos e princípios expostos, constatamos que não se verificam os pressupostos do abuso do direito. Efectivamente, a apelada limita-se a fazer valer os seus direitos, na leitura que faz do dito Regulamento44/2001.

Na doutrina, Lima Pinheiro defende que os Tribunais Portugueses estão, em princípio, obrigados a reconhecer e executar, ao abrigo dos artigos 33º e segs., e 38.º e segs., as providências provisórias decretadas por tribunais competentes com base nas regras de competência do Regulamento, desde que não se verifiquem fundamentos de recusa de reconhecimento, assim como «Não é necessário que a força executiva seja definitiva, visto que se admite a atribuição de força executiva a providências provisórias...».[16]

2. Suspensão da Instância

Requer a agravante, ao abrigo do disposto no artigo 46º do aludido Regulamento, que seja decretada a suspensão da instância até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida pelo Tribunal de Modena, ou, caso assim não se entenda, que seja decretada a suspensão da instância até à pronúncia, pelo referido Tribunal, de decisão de mérito que declare a executoriedade definitiva ao Decreto Injuntivo.

O facto do “Decreto ingiuntivo” constituir, face ao ordenamento jurídico italiano, um título executivo provisório, de acordo com o disposto no artigo 642.º, parágrafos II e III, do Código de Processo Civil, tal não é obstáculo ao seu reconhecimento no nosso país, uma vez que, como já referimos, como condição específica da declaração de executoriedade, o Regulamento apenas exige que a decisão tenha força executiva segundo o Direito do Estado de origem (arts 38º, nº1, e 53º), não sendo necessário que a força executiva seja definitiva, visto que se admite a atribuição de força executiva a providências provisórias, para além de que as decisões estrangeiras não podem “ em caso algum, ser objecto de revisão de mérito” (art.º 45º, nº 2).

Não há qualquer dúvida de que o Regulamento44/2001 do Conselho não exige o trânsito em julgado da decisão estrangeira como condição da sua eficácia no Estado do exequatur, tal como já acontecia com a Convenção de Bruxelas onde se traduziu numa das suas inovações de maior relevo, ditada pelo objectivo de facilitar e incrementar a livre circulação das decisões. Conforme referem Miguel Teixeira de Sousa e Dario Moura Vicente no Comentário à Convenção de Bruxelas, pág. 52, “tal como acontece quanto ao reconhecimento, também a concessão do exequatur não depende da eficácia de caso julgado da decisão: também é admissível uma execução provisória, excepto se uma tal execução for excluída pela própria lei do Estado de origem da decisão”[17].

Reconhecendo, porém, os riscos advenientes de uma sistemática execução de decisões não transitadas em julgado, o Regulamento faculta ao tribunal do Estado requerido a possibilidade de suspender o processo sempre que essa decisão no Estado de origem “for objecto de recurso ordinário[18].

Assim, dispõe o artigo 46º do Regulamento no seu nº 1 que:

O tribunal onde foi interposto recurso ao abrigo dos artigos 43º ou 44º, pode, a pedido da parte contra a qual a execução é promovida, suspender a instância, se a decisão estrangeira for, no Estado-Membro de origem, objecto de recurso ordinário ou se o prazo para o interpor não tiver expirado; neste caso, o tribunal pode fixar um prazo para a interposição desse recurso”.[19]

Claramente resulta dos seus termos que se trata de uma faculdade e não de uma imposição e que a suspensão é possível se a decisão estrangeira for, no Estado-Membro de origem, objecto de recurso ordinário ou se o prazo para o interpor não tiver expirado.

Acontece que no caso vertente, a agravante deduziu Oposição ao Decreto Injuntivo que apresentou em 17/07/07 no Tribunal de Modena, na qual peticiona, entre outras coisas, a suspensão bem como a revogação daquele Decreto e, em via reconvencional, a declaração de ser credora da recorrida no montante de 136.270,38€.

Não se está, assim, na presença da interposição de recurso ordinário mas perante a dedução de oposição ao Decreto Injuntivo, o meio processual idóneo para reagir permitido pelo Código Processual Civil Italiano (Opposizione - art. 645º). Parece, pois, estar-se fora da previsão do art. 46º.

A aplicação dos elementos hermenêuticos a este preceito levam, contudo, à conclusão de que a situação sub judice está incluída no espírito da sua previsão[20]. Como ensinou Francisco Ferrara “ Entender uma lei, portanto, não é somente aferrar de um modo mecânico o sentido aparente e imediato que resulta da conexão verbal; é indagar com profundeza o pensamento legislativo, descer da superfície verbal ao conceito íntimo que o texto encerra e desenvolvê-lo em todas as suas direcções possíveis[21].

O meio de reacção imediata permitido pelo Código de Processo Civil Italiano, como dissemos, foi o da Opposizione ao Decreto, instrumento que a agravante apresentou no tribunal italiano em 17/07/07, ou seja, corre termos neste momento no Tribunal do Estado de origem uma acção que virá a culminar com a confirmação ou revogação do dito “Decreto ingiuntivo”.

Não foi ainda proferida a decisão final, irá haver julgamento 31/01/2010[22], e daquela cabe recurso ordinário, mas se, porventura, a decisão for no sentido da suspensão da executoriedade então será irrecorrível.

Como acima expressamos, o disposto no nº1 do art. 42º tem em vista prevenir a consumação da execução de uma decisão posteriormente revogada ou alterada no Estado de origem por força do recurso ordinário interposto.

Risco que pode precisamente vir a acontecer no caso em apreço, sabido que da decisão a proferir sobre a oposição deduzida a parte prejudicada pode interpor recurso ordinário.

O elemento teleológico de interpretação aponta, pois, no sentido da inserção desta situação no espírito da previsão daquela norma.

Mas também o elemento sistemático.

Constata-se do cotejo dos arts. 37º e 46º que quanto aos requisitos da suspensão da instância este último relativo à execução é menos exigente, permitindo-a com a mera possibilidade de interposição de recurso, do que o primeiro referente ao reconhecimento, o que se justifica “ por a execução prematura de uma decisão estrangeira assumir maior gravidade do que o seu simples reconhecimento”[23].

Resulta do exposto que os elementos interpretativos referidos conduzem à conclusão de que a letra do texto da lei fica aquém do seu espírito. Isto é, “ ainda que se entenda que a situação não está expressamente abrangida pela letra da norma, é a mesma subsumível à intencionalidade da previsão do art. 38º da Convenção de Bruxelas[24], desde que interpretada extensivamente[25].

Deste modo, não havendo sido ainda proferida decisão definitiva no Tribunal do Estado de origem, tendo de haver julgamento, podendo a parte prejudicada ainda dela interpor recurso ordinário, prevendo-se a prolação dessa decisão definitiva para data bem longínqua se tivermos em conta que a audiência de julgamento está designada só para 31/01/2010, distanciamento que potencializa de modo particularmente grave os inconvenientes que para a agravante seguramente advirão para a sua saúde financeira, desenvolvendo-se o processo executivo com normalidade durante esse espaço temporal para obtenção de um valor que é muito elevado.

 Por outras palavras: para data bem longínqua se antevê a decisão que reconhecerá, ou não, razão à agravante, mas quando tal vier a acontecer danos de ordem económica e financeira, porventura irreversíveis, se terão produzido na actividade da agravante atento o elevado valor em causa.

Deste modo, é razoável utilizar a faculdade concedida pelo art. 46º, nº 1, do Regulamento, de suspender a instância até que no Tribunal de origem, no processo ali a correr termos, o “Decreto ingiuntivo” seja confirmado ou revogado pela sentença a proferir, ou ainda suspensa a execução provisória (art. 649º do Código de processo Italiano).

Até porque, como o dispositivo do art. 47º, nº 3, evidencia, há uma preocupação de nesta fase do exequatur se assegurar um equilíbrio entre os direitos e interesses das partes. Essas medidas cautelares “ não devem ser irreversíveis, porque o recurso da declaração de executoriedade ainda é possível ou está pendente”[26].


III-DECISÃO

Donde, concluindo, acorda-se em julgar parcialmente procedente o recurso interposto e, em consequência:

a) Declarar-se não ser a declaração de executoriedade manifestamente contrária à ordem pública Portuguesa;

b) Suspender a instância ao abrigo do disposto no artigo 46º, nº 1, do Regulamento44/2001, até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida pelo Tribunal de Modena.

Custas do recurso pela agravante e agravada em partes iguais.

Coimbra,


[1] São excluídos da sua aplicação: a) O estado e a capacidade de pessoas singulares, os regimes matrimoniais, os testamentos e as sucessões; b) As falências, as concordatas e os processos análogos; c) A segurança social; d) A arbitragem (art. 2º do Regulamento).
[2] Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, vol. III, pag. 281.
[3] Expressa este normativo uma regra estruturante do sistema do regulamento, baseada no reconhecimento da mútua confiança entre as jurisdições dos Estados-Membros, pedra angular que justifica a livre circulação das decisões judiciais, no espaço da Comunidade como se tratasse de um espaço judiciário único. Considerada a 5ª liberdade dos Tratados. (5ª, porque acresce às quatro liberdades económicas fundamentais dos três Tratados comunitários), conforme se dá conta no Ac. do STJ de 7/10/04 no sitio do ITIJ.
 Daí que a vontade do juiz nacional quanto ao fundo da matéria, não possa ser substituída pela vontade do juiz estrangeiro.
[4] Veja-se o Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades (Primeira Secção) de 14 de Dezembro de 2006, versando «Competência judiciária, reconhecimento e execução de decisões em matéria civil e comercial – Regulamento (CE) n.º 44/2001 – Reconhecimento e execução – Artigo 34.°, n.º 2 – Decisão proferida à revelia – Motivo de recusa – Conceito de requerido revel que tem ‘a possibilidade’ de interpor recurso da decisão – Falta de comunicação e de notificação da decisão», no processo C-283/05, onde se foram buscar as referências jurisprudenciais acima mencionadas.
[5] A requerente e recorrida teve a amabilidade de juntar o teor dos artigos 633º a 656º do Código de Processo Civil Italiano que nos viabilizou a necessária consulta.
[6]La notficazione determina la pendenza della lite
[7] É neste sentido a decisão do Acórdão do TJCE (terceira secção) de 13/07/95, de que a recorrida juntou cópia aos autos, devendo entender-se que a referência feita ao artigo 27.º n.º 2 da Convenção de Bruxelas é válida igualmente para o artigo 34.º n.º 2 do Regulamento 44/2001. O "decreto ingiuntivo" a que se refere o Livro IV do Código de Processo Civil italiano (artigos 633.º - 656.º), acompanhado do requerimento que determinou o início da instância, deve ser considerado um "acto que determinou o início da instância, ou acto equivalente", na acepção do artigo 27.º, n.º 2, da Convenção…”.
[8] Alguma similitude se encontra também no processo executivo nos casos de dispensa da citação prévia em que o executado pode opor-se à execução e à penhora só depois de efectuada a penhora, ou seja, depois de desapossado dos bens ou direitos penhorados (arts 812º-B e 813º nº 2 do CPC).
[9] Noutros casos colocou-se nas mãos do juiz a opção entre o exercício e a dispensa do contraditório (ex. embargo de obra nova e o arrolamento).
[10] Galvão Telles, in Dir. das Obrigações, 5ª ed., 44, diz que a ordem pública é representada pelos superiores interesses da comunidade.
[11] In Teoria Geral da Relação Jurídica págs 334-335.
[12] Ainda que houvesse violação da ordem pública, a fim de respeitar a proibição de revisão de mérito da decisão estrangeira, ela deveria constituir uma violação inaceitável, manifesta, de uma regra de Direito essencial ou Direito fundamental na ordem jurídica do Estado requerido. Assim decidiu o Tribunal de Justiça das Comunidades nos casos Krombach (28/03/02) e Renault (11/05/00) anotados por Lima Pinheiro na ob. cit., pag. 298.
[13] Cf., por todos, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª ed., p. 298 e segs.

[14] Almeida Costa, Direito das Obrigações, 9.ª edição, Almedina, pags.104-105.
[15] Cons. Rodrigues Bastos, in “Das Relações Jurídicas”, V-10.
[16]  “Direito Internacional Privado” vol. III, págs. 161 e 281.
[17] No mesmo sentido Lima Pinheiro, ob.cit., pag.308.
[18] Esta faculdade também já era concedida na Convenção de Bruxelas nos seus artigos 30º (Reconhecimento) e 38º (Execução).
[19] Igualmente o art. 37º, nº1, relativo ao Reconhecimento, dispõe que: “ A autoridade judicial de um Estado-Membro, perante o qual se invocar o reconhecimento de uma decisão proferida noutro Estado-Membro, pode suspender a instância se essa decisão for objecto de recurso ordinário”.
[20] Na tarefa de interpretação da lei o intérprete deve socorrer-se de diversos subsídios apontando a doutrina elementos de natureza gramatical, racional ou teleológico, sistemático e histórico – P.Lima e A.Varela, Noções Fundamentais de Direito Civil, vol I, pag.158 e sgs, 6ª ed..
[21]  Interpretação e Aplicação das Leis, tradução de Manuel de Andrade, pag. 128, 2ª ed., Arménio Amado, Editor, Sucessor-Coimbra.
[22] O documento relativo à decisão do tribunal italiano, a fls.534 assim o indica.
[23] Miguel Teixeira de Sousa e Dario Moura Vicente, loc.cit., pág. 52, ainda aqui com total cabimento dada a manutenção da conformidade dos textos legais a este propósito.
[24] Com redacção no que importa coincidente com o art. 46º, nº 1, do Regulamento44/2001.
[25] Ac. do STJ de 11/07/2000, na CJ 2000-II-158.
[26] Lima Pinheiro, ob.cit., pag. 290.