Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1601/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: GARCIA CALEJO
Descritores: TAXA DE JUSTIÇA
PLURALIDADE DE SUJEITOS PROCESSUAIS
Data do Acordão: 05/31/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE CONDEIXA-A-NOVA
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 18º, Nº 1, AL. A), E 19º, DA LEI Nº 30-E/2000, DE 20/12; 13º, NºS 3 E 4, E 28º, ESTES DO CCJ .
Sumário: I – Em caso de pluralidade activa ( ou passiva ) de sujeitos processuais, cada conjunto composto por mais de um autor ( ou réu ) é considerado, para efeitos de pagamento de taxa de justiça, mesmo quando lhes correspondam articulados distintos, como uma única parte, sendo os respectivos sujeitos processuais solidariamente responsáveis pelo pagamento da totalidade da taxa de justiça da parte que integram .

II – O apoio judiciário, pela sua própria natureza, só pode abranger aquele que o solicita.

III – A secretaria judicial deve recusar o recebimento da petição inicial quando não tenha sido junto o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial – artº 474º, al. f), do CPC .

IV – Caso assim não aconteça há que dar a possibilidade aos autores de pagarem a taxa de justiça em falta e, assim, de poderem juntar o documento respectivo, nos termos do artº 476º do CPC, para o que deverão ser notificados .

Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I- Relatório:
1-1- A... e B..., residentes em Atadôa, Condeixa-a-Nova, propõem contra a Herança aberta por óbito de C..., que foi residente em Atadôa, Condeixa-a-Nova e em que é cabeça de casal D..., residente em Atadôa, Condeixa-a-Nova, Lisboa, a presente acção declarativa de condenação com processo sumário.
1-2- Com a petição inicial, juntaram documento comprovativo de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento da taxa de justiça ( documento de fls. 11 a 13 ).
1-3- O processo iniciou-se e prosseguiu com a citação e contestação da R. e resposta dos AA., até que, por despacho judicial de 3-12-2004, foi a instância julgada extinta, por inutilidade superveniente da lide, com a absolvição dos RR. da instância.
1-4- Não se conformando com esta decisão, dela vieram recorrer os AA., recurso que foi admitido como agravo, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
1-5- Os RR. alegaram, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões úteis:
1ª- O pedido de apoio judiciário foi instruído e deferido, tendo em atenção os rendimentos de ambos os cônjuges.
2ª- Pelo que os AA. entenderam o deferimento do pedido como a concessão da apoio judiciário a ambos os AA.
3ª- Mesmo que assim se não entendesse, o tribunal deveria aplicar, o que não fez, o disposto no art. 13º nº 3 e nº 4 do C.C.Judiciais, já que ao A. marido foi concedido o apoio judiciário.
4ª- Mas mesmo que assim se não se entendesse, sempre a A. mulher teria o direito de beneficiar do prazo previsto no art. 476º do C.P.Civil, para juntar a taxa de justiça devida, ou o documento comprovativo de concessão do apoio judiciário, já que os actos ou omissões praticados pela secretaria judicial, não podem, em qualquer caso, prejudicar, as partes.
5ª- A A. nunca foi notificada nos termos e para os efeitos do artigo supra referido.
6ª- Além disso, a extinção da instância nunca poderia abranger o A. marido, pois quanto a este encontram-se preenchidos, ab initio, todos os requisitos legais da petição inicial, nos termos do art. 467º do C.P.Civil.
1-6- A parte contrária não respondeu a estas alegações.
1-7- A Mª Juíza sustentou a sua decisão.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:
II- Fundamentação:
2-1- No despacho recorrido e para o que aqui importa, considerou-se que os AA. não juntaram o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial. Encontra-se nos autos a decisão de deferimento do apoio judiciário concedido ao A. A..., na modalidade de dispensa total do pagamento da taxa de justiça e demais encargos. Contudo, esse apoio judiciário não é extensível à A. B..., pelo que não está dispensada do pagamento da taxa de justiça inicial. Assim, a petição inicial deveria ter sido recusada, de acordo com o disposto no art. 474º al. f) do C.P.Civil. Entendeu-se depois que a secção deveria ter dado cumprimento ao disposto no art. 28º da C.C.Judiciais, na redacção anterior ao Dec-Lei 324/2003 de 27/12. Tal artigo foi alterado por este diploma e remete, actualmente, para a lei do processo, a previsão das consequências da omissão do pagamento da taxa de justiça inicial e subsequente. O C.P.Civil não prevê, expressamente, qual deva ser a consequência da falta de junção de documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial com a petição inicial (fora dos casos previstos nos nºs 3 e 4 do art. 467º do C.P.Civil ), quando tal articulado não seja recusado pela secretaria. Salvador da Costa propõe a seguinte solução: Deve, no caso referido, a secção de processos apresentar a petição ou requerimento inicial ao juiz, nos termos do nº 2 do art. 166º do C.P.C., o qual despachará no sentido da devolução ao autor ou requerente. No caso presente, tendo a petição sido recebida na secretaria, não obstante a falta apontada, deve-se determinar o seu desentranhamento e a sua entrega à parte. Concluiu-se depois dizendo-se que “uma vez que sem petição, a manutenção da instância se mostra impossível, por inexistência de objecto, julgo-a extinta, por impossibilidade superveniente, absolvo os réus da instância e determino o oportuno arquivamento dos autos”.
Quer isto dizer que, a Mª Juíza considerou que o apoio judiciário concedido ao A. marido, não aproveita à A. mulher. Por isso, esta deveria juntar o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial. Não o tendo feito, a petição inicial deveria ter sido recusada. O C.P.Civil ( para onde remete hoje o C.C.Judiciais ) não prevê, expressamente, qual deva ser a consequência da falta de junção de documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial com a petição inicial, pelo que, segundo o entendimento que referiu, a secção de processos teria que apresentar a petição ou requerimento inicial ao juiz, que deveria despachar no sentido da sua devolução ao autor ou requerente. Como, no caso dos autos, a petição acabou por ser recebida pela secretaria, determinou a Mª Juíza, o seu desentranhamento e a sua entrega à parte, julgando extinta a instância por impossibilidade superveniente, absolvendo os RR. da instância.
Para a apreciação do recurso, damos como assentes as seguintes circunstâncias factuais:
a) A petição inicial deu entrada no Tribunal Judicial de Condeixa-a-Nova em 29-9-2004.
b) Sem qualquer intervenção da Mª Juíza, a Secretaria Judicial procedeu à citação da R..
c) Com a petição inicial, os AA. juntaram um documento, que comprova que ao A. marido havia sido concedido o apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento da taxa de justiça e demais encargos.
d) Por esse documento, se verifica que foi ( apenas ) requerente do apoio judiciário o A. marido, sendo certo porém, que na apreciação do pedido foram considerados além dos seus rendimentos, os proventos da A. mulher.
e) A A. mulher, não juntou com a petição inicial, documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça.----------
2-2- A primeira questão que nos é colocada será a de saber se o apoio judiciário deduzido pelo A. marido, se comunica à A. mulher.
Somos em crer, que a resposta à questão não poderá deixar de ser negativa, visto que o apoio judiciário, pela sua própria natureza, só poderá abranger aquele que o solicita ( o interessado ou requerente na formulação legal - arts. 18º nº 1 al. a) e 19º da Lei 30-E/2000 de 20/12 -). Claro que esta afirmação não é contrariada pelo facto de na apreciação do pedido do marido, serem contabilizados os rendimentos da mulher, visto que nessa análise deve fazer-se, necessariamente, a ponderação de todos os rendimentos do agregado familiar em que o requerente está inserido e portanto, também dos dela.
Significa isto que não podendo beneficiar do apoio judiciário de que goza o A. marido, a A. mulher teria que pagar a taxa de justiça que competia.
O certo é que não a pagou, não tendo junto aos autos o documento comprovativo.
Estabelece o art. 13º nº 3 do C.C.Judiciais que “em caso de pluralidade activa ou passiva de sujeitos processuais, cada conjunto composto por mais de um autor ... é considerado, mesmo quando lhe correspondam petições, oposições ou articulados distintos, como uma única parte para efeitos do disposto nos números anteriores”. Acrescenta o nº 4 da mesma disposição que “havendo, nos termos do número anterior, pluralidade subjectiva, os respectivos sujeitos processuais são solidariamente responsáveis pelo pagamento da totalidade da taxa de justiça da parte que integram”.
Estabelecem pois estas normas e para o que aqui interessa, que, em caso de pluralidade activa ( ou passiva ) de sujeitos processuais, cada conjunto composto por mais de um autor (ou réu ) é considerado, para efeitos de pagamento de taxa de justiça mesmo quando lhe correspondam articulados distintos, como uma única parte, sendo os respectivos sujeitos processuais solidariamente responsáveis pelo pagamento da totalidade da taxa de justiça da parte que integram. Em relação a esta parte, de sublinhar que, como refere Salvador da Costa ( in Código das Custas, 7ª edição, 2004, pág. 148 ), “aos sujeitos processuais do lado activo ou do lado passivo, conforme os casos, é exigível o pagamento da taxa de justiça que não seja paga pela co-parte por ela responsável”.
Daqui resulta, que não tendo, a A. mulher, pago a taxa de justiça, o A. marido ficou responsável, solidariamente, por esse pagamento ( total ).
Mas isto constitui problema adjacente ao cerne da questão que nos é proposta para apreciação.
Nos termos do art. 28º do C.C.Judiciais, a omissão do pagamento da taxa de justiça inicial ( e subsequente ), dá lugar à aplicação das cominações previstas na lei do processo.
Remete, pois, esta norma, para as normas processuais civis, a aplicação de penalidades pela falta de tal pagamento.
Estabelece, a este propósito, o art. 467º nº 3 do C.P.Civil que o autor deve juntar à petição inicial documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial. Deveria pois, face a esta disposição, a A. mulher juntar este documento ( o A. marido estava dispensado de o fazer, porque beneficiou do apoio judiciário, na modalidade de isenção do pagamento de taxa de justiça ). Não o fez, sendo também certo que nunca o poderia juntar, já que não efectuou o respectivo pagamento.
E qual, então, a consequência desta omissão ?
Como se sabe, à Secretaria incumbe, hoje, promover, oficiosamente, sem necessidade de despacho prévio, as diligências adequadas à efectivação da regular citação pessoal dos RR. ( art. 234º nº 1 do C.P.Civil ). Foi por isso, que, no caso vertente, se procedeu à citação dos RR., por iniciativa da Secretaria e sem que o juiz tivesse tido qualquer interferência na realização do acto.
Todavia, de harmonia com o disposto no art. 474º al. f) do mesmo código, a Secretaria deve recusar o recebimento da petição inicial ( indicando por escrito o fundamento da rejeição ) quando não tenha sido junto o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial.
Nesta conformidade, ao invés de ter diligenciado no sentido da citação dos RR., a Secretaria deveria ter recusado o recebimento da petição, por falta de junção do dito documento.
No caso de recusa da Secretaria por esta falta, o art. 476º, ainda do C.P. Civil, concede ao autor, a possibilidade de juntar tal documento, dentro de 10 dias subsequentes à recusa do recebimento da petição.
Ao não ter recusado ( como devia ) o dito recebimento, a Secretaria inviabilizou o uso do benefício concedido aos AA. de juntar o documento em causa, no aludido prazo de 10 dias.
Existiu, pois, uma omissão por banda da secretaria, que acabou por ter incidência e repercussão na decisão ( desfavorável aos AA. ), proferida pela Mª Juíza a quo.
Nos termos do art. 161º nº 6, ainda do C.P.Civil, os erros e omissões da Secretaria judicial, não podem, em caso algum, prejudicar as partes.
A decisão que se tomou, prejudicou, como é bom de ver, os AA. (absolveu a R. da instância ), sendo certo que essa mesma decisão fez tábua rasa da falta da Secretaria.
Por conseguinte, fácil será concluir que a dita omissão acabou por prejudicar os AA., em evidente violação do disposto no dito nº 6 do art. 161º.
Haverá, por conseguinte, suprir essa falta, dando possibilidade aos AA. de pagarem a taxa de justiça em causa e, assim, poderem juntar o documento respectivo, nos termos do dito art. 476º, para o que deverão ser notificados.
O agravo, se bem que por estas razões, merecerá provimento.
III- Decisão:
Por tudo o exposto, dá-se provimento ao agravo, revoga-se a decisão recorrida que deverá ser substituída por despacho ordenando a notificação dos AA. para pagarem a taxa de justiça inicial.
Sem custas.