Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2037/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: SERAFIM ALEXANDRE
Descritores: EFEITOS DA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO NA PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 10/20/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DO FUNDÃO
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 414º, N.º 2 E 420º, N.º 1, DO C. P. PENAL
Sumário: Face ao limite máximo legalmente previsto para a prescrição, a interposição de recurso, mesmo que rejeitado, desde que o tenha por manifesta improcedência, não deixa de relevar para efeitos daquela prescrição e, consequentemente, de ter a eficácia de evitar a execução da sanção.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Criminal da Relação de Coimbra:

Proferido o acórdão de fols. 224/225, veio arguido-recorrente, A..., requerer que se julgue extinto o procedimento contra-ordenacional que nos presentes autos se fez valer contra si.
O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu (resumindo) o seguinte parecer:
- tendo em conta que o acórdão desta Relação rejeitou por manifesta improcedência o recurso interposto da decisão da 1ª instância, proferida em 2003.12.11, esta terá transitado em julgado, devendo ser indeferida a pretensão do recorrente;
- se se entender que o trânsito só ocorre com o trânsito do referido acórdão, então deverá ser extinto o procedimento contra-ordenacional.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:
O que ocorre nos presenteses autos é:
- os factos ocorreram no dia 19 de Setembro de 2002;
- ao arguido foi imputada a contra-ordenação ao art.º 27º, n.º 1, do C. da Estrada, punível, nos termos do n.º 2, do mesmo artigo, com a coima de 120 a 600 euros e, nos termos do art.º 146º, al. b), do mesmo diploma legal, com inibição de conduzir de 1 a 12 meses;
- notificado, por carta de 19-9-2002, o arguido apresentou a sua defesa em 11-10-2002;
- e efectuou voluntariamente o pagamento da coima
- foi proferida decisão, pela Direcção Geral de viação, em 5 de Março de 2003, que aplicou ao arguido a sanção de inibição de conduzir pelo período de 60 dias;
- impugnada a decisão, em 11 de Abril de 2003, veio a realizar-se o julgamento em 9 de Dezembro de 2003, sem a comparência do arguido, depois de se adiar, a primeira vez, por falta de notificação deste e, segunda vez, por requerimento do seu advogado;
- a decisão foi proferida no dia 11 de Dezembro de 2003;
- o arguido veio pedir a aclaração da mesma em 5 de Janeiro de 2004;
- indeferida, em 27 de Janeiro de 2004, veio o arguido recorrer em 18 de Fevereiro de 2004;
- não lhe foi admitido o recurso, por extemporâneo;
- reclamou o arguido em 11 de Março de 2003;
- foi reparada a decisão de não admissão do recurso, em 20 de Abril de 2004, sendo então admitido;
- os autos deram entrada nesta Relação no dia 12 de Maio de 2004, sendo distribuídos em 19 do mesmo mês;
- no dia 20 foi emitido parecer pelo Ex.mo Procurador-Geral Adjunto;
- dado cumprimento ao disposto no art.º 417º, n.º 2, do C. P. Penal, foram os autos conclusos ao Relator no dia 14 de Junho de 2004;
- nesse mesmo dia foi proferido despacho preliminar;
- colhidos os vistos, a Conferência teve lugar no dia 30 de Junho de 2004;
- o recurso foi rejeitado por manifesta improcedência;
- no dia 5 de Julho foi o arguido notificado;
- apresentou o referido requerimento no dia 20 de Setembro.
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O requerente tem razão no que alega:
- que, nos termos do artigo 27º, c) do D. L. 433/82 (redacção da Lei 109/2001), a prescrição é de um ano;
- que, nos termos do art.º 28º, n.º 3 e 27º-A, n.º 2, daquele diploma, o prazo máximo (independentemente das interrupções e suspensões havidas) da prescrição é de 2 anos;
- que o trânsito do acórdão ocorreria no dia 22 de Setembro de 2004.
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A questão está, pois, em saber se o facto de o recurso ter sido rejeitado por manifesta improcedência faz retroagir a trânsito da decisão à data do trânsito da decisão em 1ª instância.
Se o recurso não tivesse sido admitido, mesmo nesta Relação, nomeadamente pelos motivos referidos no artigo 414º, n.º 2, tendo em conta o art.º 414º, n.º 3, do CPP, não teríamos grandes dúvidas de que a resposta seria afirmativa.
E, consequentemente, se o recurso tivesse sido rejeitado por qualquer dessas causas (art.º 420º, n.º 1, segunda parte, do CPP) também não.
Mas não é o caso. O recurso foi rejeitado por manifesta improcedência.
As decisões penais condenatórias só são exequíveis após trânsito em julgado da decisão (art.º 467º, n.º 1, do CPP) e a prescrição ocorre desde o dia em que o facto se tiver consumado (art. 119º, n.º 1, do C. Penal). Ou seja, a prescrição é aplicável até ao trânsito em julgado da decisão. E a decisão só transita quando já não for possível recorrer, sendo certo que a própria interposição do recurso (ordinário) é facto impeditivo ou paralisador do trânsito.
Quer o recurso tenha efeito devolutivo (isto é, que devolva ao tribunal ad quem o conhecimento da questão), quer tenha efeito suspensivo do processo (suspende o prosseguimento da marcha do processo), quer tenha efeito suspensivo da decisão recorrida (suspende só a própria decisão recorrida) a decisão proferida não pode ser executada sem prévia decisão do recurso. (Exceptuam-se os casos das als. a) a d), do art.º 214º, do CPP).
E uma decisão de rejeição do recurso por manifesta improcedência não deixa de ser uma decisão do recurso. “A manifesta improcedência do recurso, como fundamento da sua rejeição, não é no CPP um requisito da sua admissibilidade, mas um juízo sobre a sua improcedência a formular pelo tribunal ad quem, nesta fase do processo” (como diz Germano M. da Silva, in Curso de Processo Penal, III, 1994, pág. 340), acrescentando: Trata-se de uma simplificação determinada por meras razões de economia processual.
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Em resumo:
Independentemente de no processado se procurar, eventualmente, atingir tal desiderato, face ao limite máximo legalmente previsto para a prescrição, o recurso, mesmo rejeitado, desde que o tenha sido por manifesta improcedência, não deixa de relevar para aquela e, consequentemente, de ter a eficácia de evitar a execução da sanção.
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Nestes termos, por ter decorrido o respectivo prazo da prescrição, se declara extinto o procedimento contra-ordenacional pelos factos constantes dos presentes autos.
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Sem tributação.
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Coimbra: