Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1.565/06.9 TACBR-A. C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BRÍZIDA MARTINS
Descritores: PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL
REMESSA TRIBUNAIS CIVIS
Data do Acordão: 12/10/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE COIMBRA – 3º J
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 82º, 3 CPP
Sumário: O convite ao demandante no sentido de indicar as normas legais e juntar aos autos elementos tidos por necessários à apreciação da (in) admissibilidade do pedido por si deduzido não constitui fundamentos para que seja ordenada a remessa das partes para os meios civis relativamente ao correspectivo pedido formulado.
Decisão Texto Integral: I – Relatório.
1.1. AJ...; SC... e J.R.L., S...., todos com os demais sinais nos autos, foram acusados pelo Ministério Público do alegado cometimento, em co-autoria material, a sociedade arguida nos termos do artigo 7.º e os arguidos nos termos do artigo 6.º, n.ºs 1 e 2 do RJIFNA (constante do Decreto-Lei [DL] n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, com a redacção introduzida através do DL n.º 394/93, de 24 de Novembro) e do RGIT (aprovado através da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho), de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido (à data dos primeiros factos) pelos artigos 27.º-B, n.º 1 e 24.º, n.º 1, ambos do RJIFNA, ou, na sucessão normativa, pelos artigos 105.º, n.º 1 e 107.º, n.º 1, ambos do RGIT, e conforme se apurar concretamente mais favorável para os mesmos.
O Centro Distrital de Segurança Social de Coimbra [CDSSC], alegando conforme consta da certificação de folhas 8/9, formulou, em 5 de Dezembro de 2007, tempestivo pedido de indemnização civil pretendendo obter a solidária condenação dos arguidos a solverem-lhe cotizações em dívida, no montante de € 26.850,81, acrescidas dos respectivos juros de mora, calculados de acordo com a legislação especial por dívidas ao Estado, computados como vencidos no montante de € 20.440,92, bem como dos vincendos desde então e até efectivo e integral pagamento.
1.2. Recebida a acusação, designada data para realização de audiência de julgamento, aberta tal diligência, o M.mo Juiz que a ela presidia, proferiu, em 5 de Maio de 2008, o despacho ora certificado a folhas 22, cujo tem o teor seguinte:
“Não se mostram juntos aos autos todos os elementos que permitam aferir a admissibilidade do pedido de indemnização apresentado pela Segurança Social, sendo certo que tal impossibilitaria a realização do julgamento também quanto a tal pedido.
A espera desse elementos e o tempo necessário para a, eventual, notificação a que alude o art.º 78.º do Código de Processo Penal provocaria um intolerável atraso no processo penal sem quaisquer vantagens para os diversos sujeitos processuais.
Assim sendo, remeto as partes para os competentes meios declarativos, nos termos do art.º 82.º, n.º 3 do Código de Processo Penal.
Notifique.”
1.3. Dissentido com o assim decidido, recorre o demandante CDSSC, visando obter a revogação do despacho recorrido.
Notificados, responderam os arguidos, sufragando a manutenção do decidido, isto é, o improvimento da impugnação.
1.4. Admitido o recurso, e remetidos os autos a esta instância, no exame preliminar a que alude o n.º 6 do artigo 417.º do CPP, consignou-se nada obstar ao conhecimento de meritis.
Como assim, determinou-se a recolha dos vistos devidos, o que sucedeu, bem como a submissão dos autos à presente conferência.
Cabe agora apreciar e decidir.
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II – Fundamentação.
3.1. Como é consabido, salvo emergência de questões que assumam carácter de conhecimento oficioso (e que, adiantamos, se não antolha subsistirem no caso vertente), o âmbito do recurso é-nos fornecido através das conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação (cfr. artigos 403.º, n.º 1 e 412.º, n.º 1, ambos do CPP).
Deste modo, in casu, a questão a dirimir consiste em verificarmos se era facultado ao M.mo Juiz a quo remeter, como o fez, as partes para os meios declarativos relativamente ao pedido de indemnização formulado pelo recorrente CDSSC.
3.2. Inciso legal convocado ao efeito, o constante do artigo 82.º, n.º 3 que é como segue:
«O tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento, remeter as partes para os tribunais civis quando as questões suscitadas pelo pedido de indemnização civil inviabilizarem uma decisão rigorosa ou forem susceptíveis de gerar incidentes que retardem intoleravelmente o processo penal.»
Consistindo regra geral no processo penal o princípio da adesão Artigo 71.º: «O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.», além da previsão inserta no n.º 1 do mencionado artigo 82.º (ausência de elementos para que se possa fixar o quantum indemnizatório), este n.º 3 integra a segunda hipótese de sustação da indemnização no processo penal.
Nela o tribunal penal não chega a conhecer do pedido, ficando-se pela apreciação das questões que a formulação respectiva levantou, chegando à conclusão de que elas não permitem uma decisão rigorosa quanto a ele ou conduzem a um atraso injustificável (intolerável) do processo criminal.
Nessa hipótese o tribunal – por sua iniciativa ou a requerimento de qualquer uma das partes civis – remeterá ou reenviará as partes para os meios comuns (tribunal civil), onde o pedido poderá encontrar melhores condições para vingar e em tempo oportuno para os interessados, sem os custos de protelamento do processo penal – cfr. S. Santos e Leal Henriques, in Código de Processo Penal, Anotado, Rei dos Livros, 2.ª edição, pág. 434 –.
3.3. As incidências processuais reflectidas nos autos até ao momento da prolação do despacho em crise, susceptíveis de interessarem à decisão reclamada, são as seguintes:
- Deduzida a dita acusação, cumprido relativamente ao CDSSC o disposto no artigo 77.º, n.º 2, do CPP, veio o mesmo ofertar o pedido de indemnização certificado a folhas 8/9.
- Remetidos os autos a juízo, proferindo o despacho a que se reporta o artigo 311.º do CPP, o M.mo Juiz consignou nele o convite ao demandante CDSSC no sentido em que indicasse normas legais e juntasse aos autos elementos tidos por necessários à apreciação da (in) admissibilidade do pedido por si deduzido /fls. 17, in fine).
- O que sucedeu (folhas 26 e segs.) e determinou novo convite do M.mo Juiz a quo (fls. 19).
- A data em que foi proferido o despacho recorrido era a primeira data aprazada para realização da audiência. Decorria ainda o prazo concedido ao demandante para se pronunciar ut fls. 19 o qual, aliás, terminaria no dia 9 de Maio de 2008. O dia 12 deste mês e ano era a 2.ª data aprazada para julgamento (fls. 17).
3.4. Decorre do normativo convocado pelo M.mo Juiz a quo que pressuposto à quebra do princípio geral do artigo 72.º há de ser uma razão que determine uma delonga injustificável do processo penal.
No despacho controvertido o M.mo Juiz não a menciona por qualquer forma expressa.
Implicitamente, reporta-se, pensamos, ao iter que descrevemos supra em 3.3.
Mas, sendo o caso, resulta que corria ainda, inclusive, um prazo concedido ao recorrente. Na verdade, relembra-se, era seu terminus o dia 9 de Maio.
Nesta singeleza, e sem mais, não se descortina onde a emergência de um protelar injustificado do processo criminal e a necessidade de o prosseguir de imediato, mesmo com preclusão da possibilidade de pronúncia do recorrente.
Isto é, não concorriam de facto fundamentos para que com base no normativo coligido fosse ordenada a remessa das partes para os meios civis relativamente ao correspectivo pedido formulado.
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III – Decisão.
São termos em que se revoga o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que decida sobre a (in) admissibilidade do pedido civil em causa.
Sem custas.
Notifique.
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Coimbra, 10 de Dezembro de 2008