Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
207/08.2GCACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ISABEL VALONGO
Descritores: CONDUÇÃO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
PENA ACESSÓRIA
PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE
Data do Acordão: 12/03/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 2º JUÍZO DO TRIBUNAL JUDICIAL DE ALCOBAÇA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA.
Legislação Nacional: ARTIGOS 69.º, N.º1 E 71.º DO C.P.
Sumário: I. - No crime de condução de veículo em estado de embriaguez, como crime de perigo abstracto, as exigências de prevenção geral são determinantes na fixação da medida concreta da pena, para aquietação da comunidade e afirmação de valores essenciais afectados por comportamentos que, antes e para além de causarem efectivos danos, são aptos a colocar em perigo bens jurídicos essenciais, como sejam a segurança rodoviária e indirectamente bens pessoais, como seja a vida, de indiscutível valor supremo.
II. - A determinação da medida da pena acessória deve operar-se mediante recurso aos critérios gerais constantes do art. 71º do CP, com a ressalva de que a finalidade a atingir pela pena acessória é mais restrita, na medida em que a sanção acessória tem em vista sobretudo prevenir a perigosidade do agente, ainda que se lhe assinale também um efeito de prevenção geral.
III. - o princípio da proporcionalidade – ou da proibição do excesso – “tem como escopo evitar resultados desproporcionais e injustos, baseado em valores fundamentais conflitantes, ou seja, o reconhecimento e a aplicação do princípio permitem vislumbrar a circunstância de que o propósito constitucional de proteger determinados valores fundamentais deve ceder quando a observância intransigente de tal orientação importar a violação de outro direito fundamental mais valorado.”
Decisão Texto Integral:
Relatório.
Pelo Tribunal Judicial da Comarca da Nazaré, sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento em processo sumário, o arguido …, filho de ... e de ..., natural da freguesia da Benedita, concelho de Alcobaça, nascido a 10/07/1964, casado, pedreiro, residente na Rua ..., nº ..., Moita do Gavião, Benedita imputando-se-lhe, em autoria material e sob a forma consumada, um crime de condução de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292.º n.º 1 e 69.º n.º 1, al a), do Código Penal – cfr fls 11.
Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Singular, por sentença proferida a 26 de Maio de 2008, decidiu julgar a acusação procedente por provada e, em consequência:
- Condenar o arguido ... pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art.º 292º do Código Penal:
a) na pena de 85 (oitenta e cinco) dias de multa, à taxa de € 6,00 (seis euros) por dia, o que perfaz a multa de € 510,00 (quinhentos e dez euros);
b) na pena acessória de inibição de conduzir pelo período de 8 (oito) meses, prevista no art.º 69º, n.º 1, alínea a) do Código Penal.
Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o Ministério Público, concluindo a sua motivação do modo seguinte:
“A - a sanção de inibição de conduzir deve ser fixada em período não inferior a 11 meses;
B - foram violadas as normas dos arts 69º e 71º ambos do CPenal;
C - a aplicação do art 69º tem de se articular com o disposto no art 71º do CP;
D - em obediência ao disposto no art 71º do CP a medida da sanção acessória tem de se fundamentar devidamente na culpa, nas exigências de prevenção e no grau de ilicitude e na intensidade do dolo.
Termos em que, deve conceder-se provimento ao presente recurso devendo ser revogada a sentença e substituída por outra que condene o arguido na inibição de conduzir veículos a motor por período nunca inferior a 11 meses.”
O arguido não respondeu ao recurso interposto pelo Ministério Público.
O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.
Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
A matéria de facto apurada e respectiva motivação constante da sentença recorrida é a seguinte:
1. O arguido no dia 24 de Maio de 2008, cerca das 23h31m, no I.C. 2, em Moita do Gavião, conduzia o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula 45-82-CI, quando foi submetido a uma acção de fiscalização por parte de elementos da G.N.R..
2. Ao ser submetido ao exame de pesquisa de álcool, pelo método de ar expirado, acusou uma taxa de álcool no sangue de 3,61 g/l.
3. O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que após a ingestão de bebidas alcoólicas não poderia conduzir qualquer tipo de veículos na via pública ou equiparada e que tal conduta não lhe era permitida por lei.
4. O arguido trabalha como pedreiro e no transporte de pessoal para obras, por conta da empresa “F... Construções, Ldª”, auferindo o vencimento mensal de € 500,00 (quinhentos euros).
5. Vive em casa própria com a esposa que é operária fabril e dois filhos com 18 (dezoito) e 14 (catorze) anos de idade.
6. Paga mensalmente a quantia de € 260,00 (duzentos e sessenta euros) para amortização de um crédito para realização de obras.
7. Tem como habilitações literárias o 6º ano de escolaridade.
8. O arguido não tem antecedentes criminais.
9. Confessou integralmente os factos tal como se provaram e mostra-se arrependido.
Motivação da decisão de facto
- depoimento do arguido que confessou os factos integralmente e sem reservas.
- valoração das declarações do arguido no que respeita à sua situação sócio-económica.
- valoração dos documentos junto a fls. 8 e 18 e o CRC junto aos autos a fls. 13.
Cumpre conhecer do recurso.
Constitui entendimento pacífico que são as conclusões das alegações dos recursos que delimitam o respectivo objecto e o seu âmbito, sem prejuízo das questões que são de conhecimento oficioso. É no quadro assim delimitado que o tribunal deve resolver as questões que lhe sejam submetidas a apreciação, obviamente com excepção das que tenham ficado prejudicadas pela solução de outras.
É também entendimento pacífico que “As questões que são submetidas ao tribunal constituem o thema decidendum, como complexo de problemas concretos sobre que é chamado a pronunciar-se, os quais devem constituir as questões específicas que o tribunal deve, como tal, abordar e resolver, e não razões, no sentido de argumentos, opiniões e doutrinas expostas pelos interessados na apresentação das respectivas posições (cf., entre outros, Acs. do STJ de 30-11-2005, Proc. n.º 2237/05, de 21-12-2005, Proc. n.º 4642/02, e de 27-04-2006, Proc. n.º 1287/06).” – Ac STJ de 16-09-2008.
Está em causa no recurso apenas a determinação da medida da sanção acessória de inibição de conduzir veículos automóveis.
Segundo o disposto no art. 69.º, n.º1, alínea a) do Código Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 77/2001, de 13 de Julho, quem for punido por crime previsto nos artigos 291.º e 292.º, do CP, é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos.
Da reforma operada pelo DL 48/95 de 15.03 e pela referida Lei 77/2001 de 13.07, resulta que esta sanção inibitória tem natureza de pena acessória, tal como propunha, de lege ferenda, Figueiredo Dias, in Consequências Jurídicas do Crime, cit., §§ 205 e 793. O que aliás resulta claramente do texto do mencionado art. 69.º, da sua inserção sistemática e do elemento histórico (Actas da Comissão de Revisão do Código Penal, n.ºs 5, 8, 10 e 41), traduzindo-se numa censura adicional pelo crime praticado.
O Prof. Figueiredo Dias entende que esta pena acessória tem por pressuposto material “ a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável.” (...) “Por isso, à proibição de conduzir deve também assinalar-se (e pedir-se) um efeito de prevenção geral de intimidação, que não terá em si nada de ilegítimo porque só pode funcionar dentro do limite da culpa. Por fim, mas não por último, deve esperar-se desta pena acessória que contribua, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano.” - “Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime”, Notícias Editorial, § 205.
Ponto assente é que quer à pena principal, quer à acessória, subjaz um juízo de censura global pelo crime praticado e daí que para a determinação da medida concreta de uma e outra se imponha o recurso aos critérios estabelecidos no art. 71.º do Código Penal. Consequentemente, na graduação da sanção acessória o Tribunal deve atender à culpa do agente e às exigências de prevenção, bem como a todas as circunstâncias que depuserem a favor ou contra este.
O artigo 40° do Código Penal dispõe que «a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade» - n° 1, e que «em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa» - n° 2.
Esclarecedor o Ac do STJ de 12 de Setembro de 2007 em que se realça o programa político criminal sobre a função e os fins das penas: “A norma do artigo 40° condensa, assim, em três proposições fundamentais o programa político criminal sobre a função e os fins das penas: protecção de bens jurídicos e socialização do agente do crime, sendo a culpa o limite da pena mas não seu fundamento.
Neste programa de política criminal, a culpa tem uma função que não é a de modelar previamente ou de justificar a pena, numa perspectiva de retribuição, mas a de «antagonista por excelência da prevenção», em intervenção de irredutível contraposição à lógica do utilitarismo preventivo (cfr. idem, ibidem).
O modelo do Código Penal é, pois, de prevenção, em que a pena é determinada pela necessidade de protecção de bens jurídicos e não de retribuição da culpa e do facto. A fórmula impositiva do artigo 40° determina, por isso, que os critérios do artigo 71° e os diversos elementos de construção da medida da pena que prevê sejam interpretados e aplicados em correspondência com o programa assumido na disposição sobre as finalidades da punição; no (actual) programa político criminal do Código Penal, e de acordo com as claras indicações normativas da referida disposição, não está pensada uma relação bilateral entre culpa e pena, em aproximação de retribuição ou expiação.” O modelo de prevenção - porque de protecção de bens jurídicos - acolhido determina, assim, que a pena deva ser encontrada numa moldura de prevenção geral positiva e que seja definida e concretamente estabelecida também em função das exigências de prevenção especial ou de socialização, não podendo, porém, na feição utilitarista preventiva, ultrapassar em caso algum a medida da culpa.”
Assim sendo, dentro na moldura penal correspondente ao crime o juiz, face à ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentem, fixará o quantum concretamente adequado de protecção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa.
E a finalidade de reintegração do agente na sociedade há-de ser, em cada caso, prosseguida pela imposição de uma pena cuja espécie e medida, determinada por critérios derivados das exigências de prevenção especial, se mostre adequada e seja exigida pelas necessidades de ressocialização do agente, ou pela intensidade da advertência que se revele suficiente para realizar tais finalidades.
Na prossecução das finalidades da punição e na determinação em concreto da pena, o juiz deve orientar-se pelos critérios do artigo 71° do Código Penal que lhe fornecem módulos de vinculação na escolha da medida da pena, de forma a alcançar a medida adequada à finalidade de prevenção geral - a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores -, e o nível das exigências de prevenção especial (circunstâncias pessoais do agente; a idade, a confissão; o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.
No crime de condução de veículo em estado de embriaguez, como crime de perigo abstracto, as exigências de prevenção geral são determinantes na fixação da medida concreta da pena, para aquietação da comunidade e afirmação de valores essenciais afectados por comportamentos que, antes e para além de causarem efectivos danos, são aptos a colocar em perigo bens jurídicos essenciais, como sejam a segurança rodoviária e indirectamente bens pessoais, como seja a vida, de indiscutível valor supremo.
Reportando-nos ao caso concreto, as exigências de prevenção especial de socialização, não são, no caso, significativas, quando considerado o percurso pessoal do arguido, sem antecedentes criminais, a significar respeito pelos valores comunitários com tutela penal, revelado pelo comportamento anterior num período de 28 anos (a sua idade é de 44 anos, sendo os menores de 16 anos inimputáveis – art 19º do CP). Acresce que o arguido está integrado social, familiar e profissionalmente, confessou integralmente e sem reserva os factos (atitude natural, de valor relativo, dada a detenção em flagrante delito e a certificação da TAS em talão, a fls 3) e mostrou-se arrependido. De ponderar ainda que os factos ocorreram a 24 de Maio de 2008, portanto num Sábado, pelas 23h31, o que impede se agrave a censura pelo arguido trabalhar também no transporte de pessoal para as obras.
Resumindo, o grau de culpa, - dolo na forma directa - é mediano – e a taxa por ser elevada acentua o grau de ilicitude que resulta da condução com uma T.A.S. de 3,61 g/l.
Segundo a ciência médica três fases sucessivas descrevem o estado de embriaguez: a euforia, que provoca uma sensação de desinibição total (0,7 a 1,8 gramas de álcool por litro de sangue), a descoordenação, que é a fase mais perigosa, e o coma (a partir dos 3 gramas por litro). O que aliado aos seguintes dados, explica a sucessão trágica do aumento de acidentes mortais nas estradas de Portugal:
Efeitos Psico-Fisiológicos e Taxas de Alcoolemia (em gramas por litro de sangue)
• 0,15 g/l - diminuição dos reflexos
• 0,3 g/l - perturbação dos movimentos
• 0,5 a 0,8 g/l - aumento dos tempos de reacção, percepção errada da velocidade, reacções motoras alteradas e estado de euforia
• 0,8 a 1,5 g/l - reflexos cada vez mais alterados, embriaguez mais ou menos ligeira, condução perigosa devido a possibilidades de sonolência, fadiga e problemas de visão
• 1,5 a 3 g/l - perturbação da marcha, diplopia, embriaguez nítida
• 3 a 5g/l - estado de embriaguez profunda, condução impossível
• Acima dos 5g/l - Coma que pode levar à morte
E justifica a seguinte relação entre o grau de alcoolemia e o risco agravado de acidente:
0,5 - Duas vezes mais
0,8 - Cinco vezes mais
1,2 - Vinte vezes mais
2,0 - Oitenta vezes mais
Resulta óbvio que o risco de acidentes de viação relacionados com o álcool aumenta com a taxa de alcoolemia do condutor.
Assim, não obstante o crime ser de perigo abstracto, impõe-se ponderar o efeito dramático da expressão numérica da taxa de alcoolemia - 3,61g/l, - que corresponde necessariamente a maior potenciação do perigo, pois por ser elevada a taxa, mais compromete a segurança na condução.
Pretende o recorrente que a determinação da medida concreta da pena acessória se realize de acordo com os critérios gerais utilizados para a fixação da pena principal, de forma a que se verifique proporcionalidade entre a multa e a sanção acessória, embora não deixe de assinalar que a correspondência não é obrigatória ( cfr fls 65).
E efectivamente não é. Claro que pressupondo a pena acessória a aplicação de uma pena principal, e sendo a determinação da respectiva medida concreta efectuada de acordo com os critérios gerais utilizados para a fixação daquela, de acordo com os princípios do art. 71º do C. Penal – cfr. Germano Marques da Silva, Crimes Rodoviários, Universidade Católica, p. 28 e Maia Gonçalves, C. Penal Anotado, 15ª ed., p. 237 - a respectiva definição conduz em regra a uma certa proporcionalidade entre a pena e a sanção acessória.
Mas não existe na Constituição qualquer preceito ou princípio que imponha que as medidas da sanção principal e da sanção acessória aplicáveis a certo comportamento tenham a mesma dimensão quantitativa.
Como se decidiu no Ac. T. Constitucional n.º 667/94 de 14.12, BMJ 446º - suplemento, p. 102, “a ampla margem de discricionalidade facultada ao juiz na graduação da sanção de inibição de conduzir, permite-lhe perfeitamente fixá-la, em concreto, segundo as circunstâncias do caso, desde logo as conexionadas com o grau de culpa do agente, nada na Lei Fundamental exigindo que as penas acessórias tenham que ter, no que respeita à sua duração, correspondência com as penas principais”.
Também neste sentido o colectivo liderado por Bravo Serra defende que “ …mesmo confrontando a medida abstracta da pena principal com aqueloutra fixada para a pena acessória, ainda assim os mencionados princípios se não mostram violados, já que, e para além do mais, ainda que se tenha em mente só o seu limite máximo, e seguro, por um lado, que na Constituição inexiste qualquer normativo que aponte ou imponha que as penas acessórias tenham de ter correspondência com as penas principais e, por outro, que, tendo em conta os perigos que, notoriamente, advém da condução sob a influencia do álcool, e perfeitamente ajustada uma sanção cujos limites mínimo e máximo se postam como adequados a perigosidade demonstrada por um agente que se coloque na previsão do ilícito em apreço” Acórdão da Relação de 21-02-95.
Não estabelecendo a lei regimes distintos para a respectiva quantificação, há então que indagar de novo a finalidade específica da pena acessória.
Concluindo, a determinação da medida da pena acessória deve operar-se mediante recurso aos critérios gerais constantes do art. 71º do CP, com a ressalva de que a finalidade a atingir pela pena acessória é mais restrita, na medida em que a sanção acessória tem em vista sobretudo prevenir a perigosidade do agente, ainda que se lhe assinale também um efeito de prevenção geral – cfr. entre outros Ac. RC de 07.11.1996, na CJ/1996, t. 5, p. 47; Ac. RC de 18.12.1996, na CJ/1996, t. 5, p. 62; e Ac. RC de 17.01.2001, CJ/2001, t. 1, p. 51.
No que respeita à medida da sanção, a moldura abstracta varia entre o limite mínimo de 3 meses e o limite máximo de 3 anos.
Verifica-se no caso que o grau da taxa de álcool no sangue, já sancionado como crime, se revela elevado, traduzindo falha de sensibilidade do arguido aos valores tutelados pela norma. Porém é de atribuir relevo à falta de antecedentes atenta a idade do arguido, que significa ter alcançado a maturidade num processo pautado pelo respeito das regras e valores comunitários. A seu favor tem pois o arguido a circunstância de ser primário, com a consequente e forte expectativa de que a sanção surta o efeito preventivo, por constituir o primeiro confronto com os órgãos repressivos, evitando a prática de novas condutas semelhantes.
É, assim, elevada a prevenção geral.
E deve ser igualmente relevada a quantidade de álcool com que o arguido conduzia, considerada bastante elevada em termos comparativos com o legalmente permitido.
Considerando os limites, mínimo e máximo, assinalados no tipo legal, afigura-se justo e equilibrado condenar o arguido na inibição de conduzir pelo período de 11 (onze) meses.
Com efeito, o princípio da proporcionalidade – da proibição do excesso – sendo um princípio constitucional implícito (apesar de derivar da Constituição, não consta nela expressamente), não pode resumir-se a uma mera operação matemática, a uma regra de três simples, processo prático para resolver problemas que envolvam quatro valores dos quais conhecemos três deles.
Este princípio “tem como escopo evitar resultados desproporcionais e injustos, baseado em valores fundamentais conflitantes, ou seja, o reconhecimento e a aplicação do princípio permitem vislumbrar a circunstância de que o propósito constitucional de proteger determinados valores fundamentais deve ceder quando a observância intransigente de tal orientação importar a violação de outro direito fundamental mais valorado.”
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Decisão.
Por todo o exposto, decide-se conceder provimento ao recurso do Ministério Público e, consequentemente, condena-se agora o arguido ... na pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 11 (onze) meses, prevista no art.º 69º, n.º 1, alínea a) do Código Penal.