Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1210/05.0TTLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: SERRA LEITÃO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
REQUISITOS
INCUMPRIMENTO
Data do Acordão: 09/12/2007
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DE LEIRIA – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 41º, Nº 1, AL. H), E 42º, Nº 1, AL. E), DO D.L.Nº 64-A/89,DE 27/02; E 3º, Nº 1, DA LEI Nº 38/96, DE 31/08
Sumário: I – Quando o fundamento para a celebração de um contrato a termo certo consiste em o trabalhador ser um desempregado de longa duração, não tem qualquer relevo o saber-se se a actividade que o trabalhador vai exercer tem ou não a ver com necessidades definitivas ou transitórias de pessoal, por parte do empregador.

II – Todavia, para que um contrato de trabalho assim celebrado seja válido é necessário que o seu fundamento corresponda à realidade e que obedeça aos restantes requisitos formais e substanciais que a lei impõe a este tipo de contratação.

III – Não se pode olvidar que a adenda aposta a um contrato a termo, no sentido da sua prorrogação, tem que respeitar igualmente os ditos requisitos formais e substanciais.

IV – Nos termos do artº 3º, nº 1, da Lei nº 38/96, de 31/08, a indicação do motivo justificativo da celebração do contrato a termo, em conformidade com o nº 1 do artº 41º e com a al. e) do nº 1 do artº 42º do D. L. nº 64-A/89, de 27/02, só é atendível se mencionar concretamente os factos e as circunstâncias que integram esse motivo, cabendo ao empregador o ónus da prova dos factos que fundamentam a celebração de um contrato a termo.

V – Havendo incumprimento ou falta de requisitos formais num contrato de trabalho a termo o dito converte-se em contrato sem termo.

Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes da Secção Social do T. Relação de Coimbra

A... intentou acção emergente de contrato individual de trabalho contra B... , pedindo que
a) Seja declarada nula a estipulação do termo aposto no contrato de Trabalho a Termo Certo, Adenda, celebrado em 3 de Novembro de 2003 entre autor e réu;
b) Seja o mesmo havido como contrato de trabalho sem termo, desde o dia 3 de Novembro de 2003;
c) Seja declarado ilícito o despedimento de que o autor foi alvo;
d) Se condene a Ré a reintegrá-lo ao seu serviço, com a categoria profissional de carteiro;
e) Se condene a ré a pagar-lhe o valor das retribuições que este deixou de auferir desde 28 de Setembro de 2005 (incluindo férias, subsídio de férias e de natal) e até à data em que transitar em julgado a decisão que confirme a ilicitude do despedimento, a liquidar em execução de sentença.
Alegou o seguinte:
(………………………………)

Realizada a audiência de partes a mesma foi infrutífera.

A ré contestou da seguinte forma:
Invocou a prescrição dos créditos laborais provenientes dos três primeiros contratos, ao abrigo do disposto no artigo 38º do DL nº 49408, de 24/11/69.
Alegou ainda que todos os requisitos legalmente exigidos para a celebração dos mencionados contratos forma observados, nomeadamente a indicação dos motivos.
Quanto ao último contrato, que foi objecto de uma adenda, também se verificam os motivos, já que foi celebrado ao abrigo da alínea h) do artigo 41º do DL nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro, ou seja, por ser desempregado de longa duração.

O autor respondeu dizendo que não ocorreu qualquer prescrição.
Prosseguindo o processo seus regulares termos veio a final a ser proferida decisão que:
a) declarou nula a estipulação do termo aposto no contrato de trabalho a termo certo e Adenda, celebrado em 4/2 e 3/11 de 2003 entre A e Ré
b) b) declarou tal trabalho como contrato de trabalho sem termo desde 4/11/02
c) declarou ilícito o despedimento de que o A foi alvo
d) Condenou a Ré a reintegrar o A ao seu serviço, com a categoria profissional de carteiro
e) Condenou a Ré a pagar ao A o valor das retribuições que este deixou de auferir desde 28/9/05 até á data da sentença, no que vier a ser liquidado.
Discordando apelou a Ré alegando e concluído:
(……………………………..)
Não houve contra alegações
Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, tendo o Ex. mo Sr. PGA nesta relação emitido douto parecer, no sentido da respectiva improcedência, cumpre decidir

Dos Factos
É a seguinte a factualidade a ter em conta
(……………………)

Do Direito
Sabe-se que é pelas conclusões das alegações, que se delimita o âmbito da impugnação - artºs 684 nº 3 e 690 nº1 ambos do CPC.-.
Pelo que no caso em apreço a única questão a resolver consiste em determinar se a declaração de caducidade emitida pela Ré relativa ao contrato a termo certo, Adenda, que celebrou com o A constitui ou não um despedimento ilícito.
Na 1ª instância decidiu-se pela afirmativa.
E cremos que bem.
Na verdade e para que ao caso importa - temos como provado que em 4/11/02 A e Ré celebraram um contrato a termo certo por um período de 12 meses, tendo como fundamento o facto de o A ser um desempregado de longa duração.
E como se sabe quando o fundamento do termo é este facto, não tem qualquer relevo o saber-se se a actividade que o trabalhador vai exercer, tem ou não a ver com necessidades definitivas ou transitórias de pessoal, por parte do empregador, pois que o dito motivo (bem como o da contratação de trabalhadores á procura de primeiro emprego) tem em vista, como aliás resulta do próprio texto legal (artº 41º nº 1 h) do D.L. 64-A/89 de 27/2), o combate ao desemprego, optando o legislador por um mal menor entre o facto de alguém estar desempregado, ou estar vinculado ainda que precariamente através de um contrato de trabalho.
Todavia, para que um contrato assim celebrado seja válido é necessário que o seu fundamento corresponda á realidade e que obedece aos restantes requisitos formais e substanciais que a lei impõe a este tipo de contratação, que deve ser excepcional, dado o princípio constitucional de segurança no emprego (posto evidentemente em crise pela contratação a termo), plasmado no artº 53º da CRP:
Por outro lado, não se pode olvidar que a adenda aposta a um contrato a termo, no sentido da sua prorrogação, tem que respeitar igualmente os ditos requisitos formais e substanciais.
Ora no caso em apreço e de acordo com a p. inicial o A apenas põe em crise a dita “ Adenda” que celebrou com a Ré em 3/11/03 e que prolongava o prazo do contrato celebrado em 4/11/02 (e cujo fim deveria ocorrer em 3/11/03) por mais 12 meses, entendendo que a declaração de caducidade contratual emitida pela Ré configura um despedimento ilícito, pelo que – como peticiona e não pode este tribunal ir além do pedido, pois que tendo terminado a relação laboral estamos perante direitos disponíveis - deve a dita “ adenda ser considerada como contrato de trabalho sem termo, a partir de 3/11.
E se se analisar o dito contrato de trabalho a termo certo “ Adenda” verificamos desde logo que ele não cumpre desde logo, o requisito formal exigido pelo artº 42º nº 1 e) que ordena que no contrato a prazo se indique o motivo justificativo do termo.
E na tal adenda apenas se faz referência à alínea h) do dito artº 41, quando ali estão previstas várias situações (desempregados de longa duração, trabalhadores á procura do primeiro emprego etc.)
Ou seja: do conteúdo formal desse convénio não é possível concluir-se qual é efectivamente o fundamento do termo.
E daí desde logo, a sua transformação em contrato sem termo (artº 42 citado seu nº 3).
E a isso não obsta o facto de ali ter ficado consignado que “ as partes acordam em renovar o contrato a termo celebrado em 4/11/02 por um período de 12 meses, em virtude do segundo outorgante não ter ainda por motivo alheio à sua vontade encontrado emprego compatível com a sua formação profissional e expectativas profissionais, encontrando-se disponível por um período de 6 meses”
É que daqui também se não infere que o A fosse um desempregado de longa duração ou um trabalhador á procura do primeiro emprego ou se encontrasse em qualquer outra situação prevista em legislação especial de política de emprego.
Vale isto dizer- repete-se- que o tal contrato de trabalho a termo” adenda” não contém o fundamento da aposição do termo.
E não se pode olvidar que nos termos do artº 3º nº 1 da L. 38/96 de 31/8, a indicação do motivo justificativo da celebração do contrato a termo, em conformidade com o nº 1 do artº 41º e com a alínea e) do nº 1 do artº 42º da LCCT, só é atendível se mencionar concretamente os factos e as circunstâncias que integram esse motivo, cabendo ao empregador o ónus da prova dos factos que fundamentam a celebração de um contrato a termo (artº 41º nº 4 da LCCT- redacção da L. 18/01 de 3/7).
Temos assim e por tudo o que se explicitou que por falta de requisitos formais o contrato a termo” adenda” em análise se converteu em contrato sem termo.
Porém mesmo que se entenda que tratando-se de uma adenda a um contrato já celebrado e constando deste expressamente o motivo do termo (tratar-se o trabalhador de desempregado de longa duração) e portanto não ser necessário repetir na “ adenda” o motivo justificativo de tal tipo de contratação, mesmo assim, a solução, em nosso modesto entender, não pode deixar de ser a de considerar que o contrato se converteu em contrato sem termo.
É que e segundo a Portaria 196-A/01 de 10/3 é considerado desempregado de longa duração todo o trabalhador que se encontre inscrito nos centros de emprego há mais de 12 meses, independentemente de terem celebrado contratos de trabalho a termo, cuja duração conjunta seguida ou interpolada, não ultrapasse os 12 meses.
Ora e no caso concreto, é certo que como ficou provado, aquando da celebração do contrato de 4/11/02 o A estava inscrito há mais de 12 meses no centro de emprego.
Mas não é menos verdade que esteve ao serviço da Ré- e portanto ela não podia desconhecer tal facto – ininterruptamente através de vários contratos a prazo desde 2/2/99 até 4/11/01.
Logo por mais de 2 anos.
O que significa que não se podia considerar mesmo nessa data 4/11/02 como desempregado de longa duração.
E muito menos o seria na altura em que celebraram o tal contrato a termo” adenda” (3/11/03, porque aí o A nem sequer estava inscrito (como se provou) em qualquer centro de emprego.
Vale isto dizer que o motivo invocado, não é verdadeiro, o que equivale à ausência da indicação do motivo do termo e torna nula a estipulação do termo (logo no contrato de 2002, o que acarreta inevitavelmente a nulidade da estipulação do termo- a admitir-se que a havia- do contrato de trabalho “ adenda” outorgado em 3/11/03 com a consequente conversão do contrato em contrato sem termo. (cfr. artºs 41º nº 2 e 42 nº 1 e) e 3 ambos do D.L. 64-A/89 de 27/2.
Mas esta conversão opera-se apenas a partir de 3/11/03.
E mesmo que ocorresse antes era esta a data a ser considerada, pois, como já referimos estamos perante direitos disponíveis e o A restringiu o seu pedido, à conversão do contrato de trabalho “ adenda” em contrato sem termo, a partir dessa data.
Estando nós perante um contrato sem termo, a declaração de caducidade do mesmo emitida pela Ré e oportunamente mencionada configura um verdadeiro despedimento ilícito, desde logo porque não precedido de qualquer procedimento disciplinar (artº 12º nº 1 a) da LCCT), com as consequências previstas no artº 13º do mesmo diploma.
É pois – salvo o devido respeito por entendimento diverso e porventura mais esclarecido – caso de confirmação da sentença recorrida, salvo na parte em que declarou o citado contrato de trabalho, como contrato sem termo a partir de 4/11/02 e pelo que a propósito sobre este ponto se explanou.

Termos em que e concluído, julgando-se parcialmente procedente a apelação decide-se:
1) Declarar nula a estipulação do termo aposto no contrato celebrado em 4/11/02 e consequentemente - a aceitar que ela existia - da estipulação do termo referente ao contrato de trabalho adenda, celebrado em 3/11/03
2) Ser o dito contrato de trabalho a termo” adenda” feito em 3/11/03 considerado como contrato sem termo a partir desta data ( 3 /11/03)
3) Determinar que a declaração de caducidade de tal convénio operada pela Ré, constitui um despedimento ilícito
4) Condenar a ré a reintegrar o A ao seu serviço com a categoria profissional de carteiro conforme o pedido
5) Condenar a Ré a pagar ao A o valor das retribuições que este deixou de auferir até à data desta decisão e no que vier a ser liquidado em execução de sentença.

Custas por A e Ré provisoriamente em partes iguais, fazendo-se o respectivo rateio conforme o vencimento na liquidação.