Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
98/07.0TBFAG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BARATEIRO MARTINS
Descritores: RESPOSTAS AOS QUESITOS
FUNDAMENTAÇÃO
BALDIOS
Data do Acordão: 04/28/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: FORNOS DE ALGODRES
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 712.º, N.º 5 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ARTIGO 18.º, N.º 1 DO DEC. LEI 39/76, DE 19/01; ARTIGO 36.º, N.º 1 DA LEI N.º 68/93, DE 04-09; ARTIGO 388.º DO CÓDIGO ADMINISTRATIVO DE 36; ARTIGO 1252.º, N.º 2 DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: 1. A aplicação do art. 712.º, n.º 5 do Código de Processo Civil significa que, suprida a insuficiência de fundamentação, os autos regressam à Relação para conhecimento do recurso – em que estará incluída, nos seus limites objectivos, a modificação da decisão de facto – antes interposto.

2. Os baldios são bens comunitários afectos à satisfação de necessidades primárias dos habitantes de uma circunscrição administrativa ou parte dela e cuja propriedade pertence à comunidade formada pelos utentes/compartes de tais terrenos.

3. Provado que um prédio é utilizado desde tempos imemoriais para apascentação de gados, produção e corte de matos lenhas e extracção de barro; que tal utilização vem ocorrendo de forma ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém; e que os autores de tal utilização imemorial são pessoas de certa freguesia, que a fazem com exclusão de outrem e na convicção de que tal prédio é explorado por outros habitantes da mesma freguesia, deve concluir-se que é baldio.

Decisão Texto Integral: Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório
A Freguesia de A...., no concelho de ...., intentou acção declarativa, na forma sumária, contra B....e C...., ali residentes, pedindo:

Que se declare “que o prédio identificado em 1º da PI pertence em propriedade comunitária plena e exclusiva às populações da freguesia de A....”; e

Que se condenem os RR. “ a demolir os muros referidos em 8º e 9º”, “ a remover a calha de ferro referida em 11º e a porteira de ferro referida em 12º”, “a repor o caminho público referido em 2º, 14º a 17º, conforme se encontrava anteriormente às obras por eles realizadas”, “a arrancar e remover todas as plantações referidas no artigo 20º” e “a pagar, a título de indemnização pelos prejuízos causados, quantia a liquidar em execução de sentença”.

Alegou, em resumo, que os povos da freguesia de A...., concelho de ...., utilizam colectivamente, desde tempos imemoriais, para apascentação de gados, para produção e corte de matos e lenhas e para extracção de barro, o terreno, composto por pinhal e mato, com a área de 15.844,67 m2, sito e denominado Baldio do D....; terreno cuja administração, não se encontrando constituída nem a assembleia de compartes nem o conselho directivo, vem sendo feita pela Junta de Freguesia.

Ora – continua a A. – confrontando tal terreno/prédio baldio pelo sul e poente com um prédio rústico dos RR., construíram estes na totalidade da estrema norte do prédio baldio um muro e, perpendicularmente à referida estrema norte, um outro muro, tendo, entre os topos dos muros, colocado uma porteira de ferro, assim tapando a totalidade da estrema norte do prédio baldio.

Mais referiu que, existindo no limite do prédio baldio um caminho público para passagem de pé e carro também para o baldio, os RR. arrancaram o seu leito numa extensão de 10 metros para nascente.

Os RR. contestaram, invocando a falta de personalidade da A; e negando ser “baldio” o terreno em que construíram os muros e ser público o caminho a que a A. se refere.

A A. respondeu à excepção.

Foi proferido despacho saneador – em que, sem censura, foi julgada improcedente a excepção dilatória invocada – organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa, instruído o processo e realizada a audiência, após o que o foi proferida sentença, em que se concluiu do seguinte modo:

“ (…) julgo a acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência:

a) reconhece-se que o terreno sito na freguesia de A...., concelho de ...., denominado Baldio do D...., (…) se encontra instituído como baldio a favor das populações da freguesia de A...., concelho de ....;

b) condena-se os réus a demolir os muros referidos em 13 e 14 dos factos provados;

c) condena-se os réus a remover a calha de ferro referida em 16 dos factos provados e a porteira de ferro identificada em 17 dos factos provados;

d) condena-se os réus a repor o caminho público referido em 6, 7, 19 a 26 dos factos provados repondo-o como estava antes da sua actuação referida em 25 dos factos provados;

e) condena-se os réus a arrancarem todas as plantações referidas em 27 e 28 dos factos provados.

No mais, julga-se a acção improcedente.

 (…)”

Inconformados com tal decisão, interpuseram os RR. recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que julgue a acção totalmente improcedente.

Terminam a sua alegação com as seguintes conclusões:

1 – Os baldios são terrenos possuídos e geridos por uma comunidade local formada pelo universo dos compartes, moradores numa ou mais freguesias, ou parte delas, que segundo os usos e costumes têm direito ao seu uso e fruição.

2 – Não se provou que o prédio identificado na al. A) dos Factos Assentes fosse usado e fruído pelas populações da freguesia das A.... nem colectivamente nem comunitariamente, nem com consciência ou ânimo do uso e fruição comunitários (resposta aos quesitos 5º, 7º D)).

Pelo que o prédio aludido não pode ser qualificado como baldio.

3 – Daí decorre que os pedidos sobre a demolição de muros, remoção do portão e acessórios ( calha e batentes), arranque de plantações – al. b), c) e e) da Decisão também não podem ser procedentes.

4 – O caminho (que não se provou compactado nem visível – resposta ao quesito 26º da Base Instrutória) não pode ser classificado de público.

Não resultaram provados factos demonstrativos de que desde tempos imemoriais estivesse no uso directo, imediato do público e servisse um fim público.

(Respostas ao dito quesito nº 26 (principalmente) e aos quesitos 7, 8, 26 a 30, 56 e 57 da Base Instrutória.

5 – A decisão violou, entre outros, os artigos 1º nº 1, 2 e 3 da lei 68/93 de 4.09 e jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça – Assentos de 19.04.1989, de 10.11.1993 e de 15.06.2000.

6 -Deverá ser substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente e sem custas, por a Autora Junta de Freguesia a ter configurado como de baldios – art.º 32º, nº 2 da citada Lei.

E só no caso das conclusões supra não serem procedentes:

7 – A fundamentação das respostas aos números da Base Instrutória não satisfaz a exigência do art.º 653º nº 2 do C. P.C.

8 – Pelo que os autos devem ser remetidos à 1ª instância nos termos e para os fins do art .º 712º, nº 5 do C.P.C.

A A. respondeu, sustentando, em síntese, que não violaram a fundamentação da decisão de facto e a sentença recorrida quaisquer normas adjectivas e substantivas, pelo que deve ser mantida a sentença nos seus precisos termos.

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.


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II – Fundamentação de Facto

1 – Na freguesia de A...., concelho de ...., existe um prédio denominado Baldio do D...., não inscrito na matriz predial respectiva, mas participado no Serviço de Finanças de ...., e não descrito na Conservatória do Registo Predial de .....

2 – No dia 19 de Junho de 1957, mediante escritura lavrada no Cartório Notarial de ...., E... e mulher F.... , venderam a G.... , casado, residente e natural de A...., que lhes comprou, entre outros, o seguinte prédio:

Uma terra de mato e centeio com oliveiras, no sítio do ...., limite da freguesia de A...., que confronta a nascente com o baldio, do norte com ...., do poente com o caminho e do sul com Herdeiros de D. .....

3 – Na escritura de partilhas da herança de G...., de 30-04-1993, outorgada no Cartório de ...., tal prédio dos réus foi identificado como “terra de batatas, com oliveiras, um pinhal, e uma pastagem, sito no ...., limite da dita freguesia de A...., com a área de dezassete mil duzentos e vinte metros quadrados, que confronta do sul com herdeiros de .... e do Poente com B”.

4 – O terreno referido em 1 confronta do norte com Estrada e ...., do sul com os réus e outro e do nascente com herdeiros de .... e outros e do poente com os réus e outros.

5 – Desde tempos imemoriais e há mais de 20, 30, 40, 50, e 100 anos, algumas pessoas da freguesia de A.... têm utilizado o prédio rústico identificado em 1.

6 – Para apascentação de gados, produção e corte de matos e lenhas, extracção de barro e por passagem em caminho nele existente, para passagem a pé e carro, de forma ininterrupta, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, com exclusão de outrem e na convicção de que tal terreno era explorado por outros habitantes da freguesia das A.....

7 – O caminho referido em 6, inicia-se na estrema norte, junto à Estrada Municipal, com o sentido norte-sul, numa extensão de várias centenas de metros até ao campo de futebol, entroncando noutro caminho que liga a Fonte ....à .....

8 – Não está constituída assembleia de compartes, nem conselho directivo quanto ao prédio referido em 1.

9 – A sua administração tem sido efectuada pela Junta de Freguesia de A.....

10 – O prédio rústico composto por terra de batata com oliveiras, pinhal e pastagem, sito ao ...., freguesia de A...., concelho e comarca de ...., que confronta do norte e nascente com o prédio identificado em 1, é pertença dos réus.

11 – Constando da matriz que confronta do norte com ...., do nascente com ...., do sul com herdeiros de .... e do poente com António Nunes, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo 493.

12 – Os réus efectuaram obras no seu prédio.

13 – Os réus, na estrema norte do prédio identificado em 1, paralelamente à estrada Municipal e no prédio que é “propriedade” das populações da freguesia de A...., Baldio do D...., construíram um muro de altura variável, sendo que na parte mais baixa tem cerca de um metro, e com um comprimento de 14 metros, nesse prédio e que continua em toda a extensão do prédio dos réus, na parte em que este confina com a Estrada Municipal e paralelo a esta.

14 – Perpendicularmente à estrada e também no prédio do Baldio do D...., situado a três metros do muro referido em 13, construíram um outro muro, no sentido norte-nascente, com uma altura variável, com cerca de 0,80m na parte mais alta e cerca de 0,40m na parte mais baixa e com um comprimento de cerca de 6 metros.

15 – No topo norte deste muro, na parte mais próxima da Estrada Municipal, os réus cravaram um ferro a toda a altura do muro a servir de batente.

16 – Paralelamente ao muro referido em 13 e cravado na parte virada para a Estrada Municipal, colocaram uma calha de ferro que se prolonga num comprimento de 3 metros, por cima da terra até ao muro referido em 14.

17 – Por cima da calha e com dois apoios cravados no muro identificado em 13 e com o batente em ferro colocado verticalmente no muro referido em 14 colocaram uma porteira de ferro, que desliza sobre a referida calha.

18 – Tapando com o muro referido em 13 e com a porteira a totalidade da estrema norte do prédio identificado em 1 numa extensão de 17 metros, paralela à estrada Municipal.

19 – Perpendicularmente à estrada Municipal e paralelamente ai muro referido em 14, iniciava-se o caminho referido em 6.

20 – O caminho referido em 6 era usado por alguns habitantes das populações de A.... há mais de 20, 30, 40, 50 e 100 anos.

21 – Por ali acedendo ao prédio referido em 1.

22 – Para aí conduzirem os gados para pastar, recolherem os matos e lenhas, bem como o saibro que retiravam do referido prédio.

23 – Para acederem ao campo de futebol antigo, situado para sul do início do caminho, para todos os proprietários de prédios que confinam com o prédio identificado em 1.

24 – Para quem pretendia aceder ao caminho público que vai da Fonte ....à .....

25 – Os réus arrancaram o leito do caminho referido em 6, para nascente do prédio referido em 1 e perpendicularmente à estrada Municipal, criando um desnível com cerca de 2 metros de altura.

26 – O caminho em causa encontra-se implantado no prédio referido em 1.

27 – Os réus plantaram a todo o comprimento do muro referido em 13 um muro de arbusto de buxo, com o comprimento de 14 metros e de altura superior àquele muro.

28 – Plantaram outras plantas e arbustos ornamentais e árvores.

29 – O prédio referido em 1 também confronta a norte com .....

30 – Os réus identificaram o prédio referido em 2 como descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº X.... a fls. 45 do Livro B – 8, donde consta o seguinte teor, datado de 21-05-1886: “Prédio rústico situado na freguesia das A...., consta d´uma terra de centeio, no sítio da Z...., que parte do poente com caminho, do nascente com terras do W...., de ...., pelo norte com olivas de Q... e pelo sul com olivas de Y..., ambos de A....”.

31 – O prédio referido em 1 confronta com ...., constando da escritura pública datada de 10-12-1971 que o prédio referido em 3 confronta com .... e do nascente com .....

32 – No terreno referido em 3, os réus construíram a sua casa de habitação e ajardinaram o espaço envolvente, ficando a restante parte do terreno a pinhal, mato e cultura de sequeiro.

33 – Entre o local onde hoje [em Julho de 2009] se situa a casa dos réus e o prédio vizinho de .... existia um pequeno largo de terreno normalmente pelado fronteiro à Capela da Nossa Z.....

34 – Durante alguns anos os mordomos das festas populares instalavam a barraca de comes e bebes.

35 – No alto da encosta e perto do caminho da .... – à Fonte ..., existiu um bocado de terreno pelado.

36 – Onde antes da construção do actual campo de futebol, há 25 anos atrás, os das A.... e da .... jogavam futebol.

37 – Para aceder quase em linha recta na rua pública fronteira ao prédio dos réus, a tal campo de futebol, os das A.... passavam a pé pelo prédio referido em 1.

38 – E junto à sua estrema do prédio dos réus com os prédios vizinhos de ...., Herdeiros de.... , Herdeiros da Família Matias e .....

39 – Há mais de 40 anos algum gado transitava por tal carreiro a pé para se dirigir ao terreno identificado em 1.

40 – Esta passagem era feita para encurtar distâncias, em cerca de 500 metros.

41 – Há cerca de 3 anos, a autora iniciou junto à estrema dos vizinhos referidos em 38 a abertura de um caminho com cerca de 2,5 metros de largura, que vem do auto da encosta e entra pelo prédio referido em 1.

42 – Os réus opuseram-se à continuação da abertura.

43 – Procederam à vedação do prédio referido em 1 com um portão.

44 – As populações de .... e A.... exploram barro em terreno propriedade dum antigo proprietário conhecido por Sr. Lúcio.


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III – Fundamentação de Direito

No centro do litígio – e do objecto da presente apelação – está a questão de saber se o terreno identificado pela A/apelada é um “baldio”.

Questão a que a sentença recorrida respondeu afirmativamente.

“Resposta” que os RR/apelantes querem ver revogada, apoiando-se, para tal, nas conclusões que extraem das respostas restritivas dadas aos quesitos 5.º e 7.º-D.

Efectivamente – trata-se de ponto que importa sublinhar – os RR/apelantes não pretendem introduzir qualquer alteração à decisão de facto; argumentando antes que os factos provados – maxime, por força das referidas respostas restritivas – não sustentam, em termos jurídicos, a sua qualificação como baldio.

Vem isto – este sublinhado inicial – a propósito da alegação constante das conclusões 7.ª e 8.ª, alegação designada pelos próprios RR/apelantes como meramente “supletiva”.

Alegam aí os RR/apelantes que a fundamentação das respostas à base instrutória não satisfaz a exigência do art.º 653º nº 2 do C. P.C., pelo que – caso as anteriores conclusões não sejam procedentes – devem os autos ser remetidos à 1ª instância nos termos e para os fins do art. 712º, nº 5 do C.P.C..

Sem prejuízo de concordarmos com a censura que os RR/apelantes fazem à fundamentação das respostas à base instrutória e embora consideremos, como a seguir explicaremos, as “anteriores conclusões” improcedentes, entendemos ser inútil, no caso, remeter os autos à 1.ª instância para os fins do art. 712.º, n.º 5, do CPC.

E é justamente inútil, no caso, por os RR/apelantes não estarem a impugnar a decisão de facto; e por já o não poderem vir a fazer após o despacho que, na 1.ª Instância, viesse a dar integral cumprimento ao disposto no art. 653.º, n.º 2, do CPC.

Mas vamos por partes:

Realmente – não pode nem deve omitir-se – os RR/apelantes têm toda a razão quando censuram o modo como a 1.ª Instância especificou os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.

O cumprimento do dever de fundamentação, reforçado na reforma processual de 95, impõe que, de acordo com as circunstâncias, se estabeleça e exteriorize o fio condutor entre a decisão e os concretos meios de prova, fazendo-se a apreciação crítica, nos seus aspectos mais relevantes, de tais concretos meios de prova.

“O tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente”[1].

É exactamente isto – convincente – que a fundamentação da decisão de facto não é.

Pouco acrescenta, salvo o devido respeito, à antiga forma tabelar – em que o tribunal se limitava a dizer que “formou a sua convicção nos documentos juntos, nos depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência e na inspecção judicial” – que se pretendeu erradicar, tendo em vista reforçar o auto-controlo do julgador e a transparência da justiça; quando muito, a fundamentação produzida é tal antiga forma tabelar em “formato perifrástico”.

Efectivamente, escreveu-se na fundamentação da decisão de facto tão só o seguinte:

“ (…)

Assim, teve-se em conta o depoimento das várias testemunhas arroladas pelas partes e ouvidas em sede de audiência de discussão e julgamento.

Note-se que quase todos os factos levados à Base Instrutória ficaram provados na sua totalidade.

Deste modo, não teve o Tribunal dúvidas em dar como provados os factos referentes aos artigos 5, 6 e 7, pois que do depoimento das testemunhas retirou-se que pelo menos algumas pessoas da freguesia das A.... utilizaram o terreno referido em A). No mais do que (não?) resultou provado, no entender do Tribunal, não foi feita prova clara, concreta e segura.

Note-se que quase todas as testemunhas referem, sendo que mesmo aquelas que referem o contrário, não são neste aspecto tão credíveis quanto as restantes, as quais estiveram nesta parte um discurso seguro e firme.

Quanto à matéria dada como não provada ou dada de forma restritiva diga-se que tal ficou a dever-se a, no entender do Tribunal, não se ter feito prova cabal sobre tais realidades, apesar das inúmeras testemunhas inquiridas.

Assim foram ouvidas várias testemunhas de ambas as partes, as quais mostraram todas um conhecimento directo sobre os factos, mas diferente no tocante a determinados pontos essenciais, e que o Tribunal na dúvida, decidiu não dar como provados, valorando contra a parte a quem os mesmos aproveitavam.

Diga-se que, neste aspecto, não teve o Tribunal elementos que permitissem valorar mais o depoimento das testemunhas apresentadas pelos RR., em detrimento das testemunhas apresentadas pelos AA. e vice – versa, não denotando nenhuma delas nada em especial que o permitisse ( o maior nervosismo) um discurso menos coerente e lógico ou outro sinal do género.

Como tal, e em suma, não houve elementos que nos possibilitassem mais crer numas do que noutras.

Por outro lado, foi ainda deveras importante a diligência de inspecção judicial realizada ao local, bem como todos os documentos pelas partes (…) ”.

Não se identificou – como resulta da integral transcrição da fundamentação – uma única testemunha ou um único e concreto meio de prova; não se mencionou um único elemento ou circunstância, fornecido por um concreto meio de prova, que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, tenha contribuído para a reconstituição do passado dado como provado; não se exteriorizou um único raciocínio que o caso – a apreciação dos concretos meios de prova do caso – haja suscitado.

Em suma, a fundamentação transcrita, pela sua falta de reporte e ligação ao concreto e ao particular, ajusta-se e serve – ou melhor, não serve – à decisão de facto de toda e qualquer base instrutória[2].

Mas, isto dito, corroborada tal razão de censura dos RR/apelantes, não significa, por a Senhora Juíza não ter fundamentado devidamente, que os RR/apelantes tenham ficado “sem saber onde apontar o erro do julgador e de chamar em seu socorro a prova que entendam contrariar ou sobrepor aquela que, afinal, o juiz não indicou.”.

As partes têm direito a que lhe sejam comunicados os motivos por que determinados factos foram dados como provados ou não provados, porém, só têm efectivo interesse no exercício de tal direito quando discordam do resultado da decisão de facto.

É em tal hipótese, tendo em vista mostrar (à 2.ª Instância) a inconsistência dos motivos duma decisão de facto que consideram incorrecta, que faz sentido e tem interesse a baixa dos autos à 1.ª Instância, onde, por uma 2.ª e última vez, se devem enunciar os fundamentos que serviram de alicerce à decisão de facto.

Agora, para saber se discordam ou não, tendo em vista a delimitação dum recurso a interpor, do resultado da decisão de facto, não podem as partes argumentar e invocar que tal só pode acontecer após o acesso a uma rigorosa fundamentação da decisão de facto; tanto mais que, antes mesmo da decisão de facto, são até as partes chamadas a dizer, em apreciação própria e autónoma, quais os factos que consideram provados – cfr. art. 652.º, n.º 5, do CPC[3]; tanto mais que podem, para dissipar dúvidas sobre a bondade da decisão de facto, caso a respectiva fundamentação não seja suficiente, logo ali, na leitura da decisão de facto, apresentar a devida reclamação (cfr. art. 653.º, n.º 4, do CPC).

É justamente por tudo isto que o art. 712.º, n.º 5, do CPC – traçado no pressuposto que se está perante uma situação em que a alteração da decisão de facto foi suscitada[4] e faz parte do objecto do recurso – se limita a determinar que os autos sejam remetidos à 1.ª Instância para cumprimento do dever de fundamentação da decisão de facto; não tocando nem anulando, com tal remessa, quaisquer peças processuais posteriores à fundamentação insuficiente.

Isto é, a aplicação do art. 712.º, n.º 5, significa que, suprida a insuficiência de fundamentação, os autos regressam à Relação para conhecimento do recurso – em que estará incluída, nos seus limites objectivos, a modificação da decisão de facto – antes interposto.

Enfim, é por tudo isto que reputamos inútil, no mínimo, remeter, no caso, os autos à 1.ª instância para os fins do art. 712.º, n.º 5, do CPC.

A decisão de facto – que os RR/apelantes não impugnam – tornou-se imutável, pelo que, a fundamentação que pudesse vir a ser produzida não traria qualquer contributo útil para a apreciação do objecto do recurso como está delimitado pelos RR/apelantes; ou, por outras palavras, independentemente da fundamentação que pudesse vir a ser produzida, sempre seria e será com os factos dados como provados, e apenas com estes, que se terá que construir a qualificação jurídica do terreno em causa.


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Ultrapassado este “prévio” obstáculo, debrucemo-nos pois sobre a questão, central, de saber se o terreno identificado pela A/apelada é ou não um “baldio”.

E começar-se-á por dizer que as mudanças que os “baldios” sofreram, em termos da sua concepção e natureza jurídicas, nos tempos mais recentes, não reflectem quaisquer mudanças ocorridas ao nível da realidade sócio-económica que os “baldios” representam e satisfazem.

Sempre se consideraram e denominaram “baldios” os terrenos, não individualmente apropriados, de que só podiam fazer uso os membros de determinada comunidade (um concelho, uma freguesia uma povoação), na sua qualidade de cidadãos – uti cives – pertencentes a essa colectividade de pessoas.

De facto, os baldios nasceram e mantiveram-se, em termos sócio-económicos, para permitir que os habitantes, principalmente os mais pobres, tivessem um terreno onde lançar os rebanhos ou cortar lenhas, os matos ou os fenos; os baldios nasceram, mantiveram-se e correspondem a formas de utilização promíscua de terrenos destinados a fornecimentos de lenhas e pastagens[5].

Daí que o art. 388.º do C. Administrativo de 36 diga serem baldios “ (…) os terrenos não individualmente apropriados, dos quais é permitido tirar proveito, guardados os regulamentos administrativos, aos indivíduos não residentes em certa circunscrição ou parte dela”; acrescentando, no art. 389.º, que se consideram baldios os “terrenos que há pelo menos 30 anos estejam no logradouro comum e exclusivo dos moradores na circunscrição municipal ou paroquial”, devendo entender-se por logradouro comum – cfr § único do mesmo art. 389.º – a “apascentação de gados, a produção e corte de matos (…)

Enfim, desde sempre os terrenos baldios[6] foram caracterizados por serem terrenos que estão afectos ao proveito directo da colectividade, mas que não são objecto de apropriação individual, tendo antes o carácter de bens em comunidade, em que todos os “vizinhos” (de determinado lugar) detêm direitos sem possibilidade de determinação de quota ideal – todos têm direito sobre o todo sem todavia nenhum deles o ter sobre qualquer quota parte[7] – direitos esses inalienáveis.

Caracterização esta – da realidade sócio-económica subjacente – que não divide ou separa as teses que, do ponto de vista jurídico, se criaram à volta da propriedade dos baldios; ou melhor, à volta da questão de saber a quem pertence a propriedade dos baldios.

Efectivamente:

Para uns, os baldios pertencem em propriedade (privada) às autarquias em cuja circunscrição territorial se situem, mas estão afectos às necessidades particulares dos indivíduos aí residentes, aos quais assistem sobre tais bens direitos privativos de uso ou fruição – verdadeiros direitos reais (menores) de usos cívicos; os baldios são “uma propriedade com afectação especial”, “constituem bens do património das autarquias sujeitos à afectação especial de suportar certas utilizações tradicionais pelos habitantes de uma dada circunscrição ou parte dela[8]

Para outros, os baldios pertencem aos próprios utentes ou compartes (é a propriedade colectiva ou de comunhão de mão comum do antigo direito germânico, onde não existe um direito individual de quota), mas trata-se dum domínio que, por virtude do fim a que os baldios se encontram adstritos, não se identifica com o regime da propriedade individual (concretamente, os compartes não podem alienar nem onerar o seu direito de participação no uso ou fruição dos bens, nem podem pedir a divisão destes).

Teses jurídicas estas que, verdadeiramente, se limitam a dar resposta às orientação legislativas em cada momento vigentes; correspondendo a primeira ao que era mister concluir do que sobre os baldios se dispunha (antes da Revolução de 1974) no C. Administrativo de 36; e surpreendendo a segunda a actual orientação legislativa vertida no DL n.º 39/76, de 19-01 (1.º Lei dos Baldios), na actual C. da República e na vigente Lei dos baldios (Lei n.º 68/93, de 04-09).

Significa isto que, no momento presente, se nos afigura inquestionável que os baldios são bens comunitários afectos à satisfação de necessidades primárias dos habitantes de uma circunscrição administrativa ou parte dela e cuja propriedade pertence à comunidade formada pelos utentes/compartes de tais terrenos.

É certo que nos referidos DL 39/76 e Lei 68/93 não se fala em propriedade, dizendo-se tão só, no primeiro diploma, que se consideram “baldios os terrenos comunitariamente usados e fruídos por moradores de determinada freguesia ou freguesias ou parte delas” e, no segundo, que “são baldios os terrenos possuídos e geridos por comunidades locais”; aludindo a CRP (art. 80.º, b)) – após declarar a existência dum sector cooperativo e social – aos “meios de produção comunitários, possuídos e geridos por comunidades locais”.

Em todo o caso, à luz de tais diplomas, não pode deixar de entender-se que a propriedade dos baldios pertence às comunidades locais, o mesmo é dizer, aos compartes.

De todo o modo – é o que aqui e agora importa realçar – as pessoas legitimadas para usar ou fruir os baldios, quando se aproveitam destes, estão, para qualquer uma das teses jurídicas em confronto, a exercer um direito – um verdadeiro direito real – e não apenas a beneficiar de uma acto de mera tolerância, seja de quem for.

Nos baldios – para ambas as teses jurídicas – o seu uso pelos particulares/utentes encontra-se subjectivada; isto é, o uso que cada um dos particulares/utentes faz do bem assenta num direito próprio, com características e consistência iguais às dos direitos de natureza real – direitos reais de uso para a primeira tese ou direitos de propriedade colectiva para a segunda tese (a agora inquestionavelmente vigente).

É exactamente por tudo isto – revertendo ao caso dos autos e do recurso – que não pode ser concedida razão aos RR/apelantes.

Sem prejuízo de se reconhecer e conceder que está bem tecida a argumentação desenvolvida na apelação.

Efectivamente:

Ao quesito 5.º, em que se perguntava se “desde tempos imemoriais e há mais de 20, 30, 40 e 50 e 100 anos, tem as populações da freguesia de A.... utilizado colectivamente o prédio rústico identificado em A)”, respondeu-se restritivamente que “desde tempos imemoriais e há mais de 20, 30, 40 e 50 e 100 anos, algumas pessoas da freguesia de A.... tem utilizado o prédio rústico referido em A)”; e

Ao quesito 7.º-D, em que se perguntava se “com exclusão de outrem e na convicção de se tratar de terreno comunitariamente explorado e possuído e que lhes pertence”, respondeu-se também restritivamente “ com exclusão de outrem, e na convicção de que tal terreno era explorado por outros habitantes da freguesia de A....”.

Não se deu pois como provado o termo “populações”, que se substituiu pela expressão “algumas pessoas”; e não se deram como provados quer o termo “colectivamente” quer o termo “comunitariamente”.

Daí que os RR/apelantes argumentem que “algumas pessoas não são a comunidade” e que não ficou provada “nem a posse comunitária, nem o ânimo de posse comunitária

Compreende-se a atracção dos RR/apelantes pelas expressões que as respostas restritivas implicitamente excluíram dos factos provados.

Tanto mais que se entende que uma boa e correcta apreensão da factualidade provada (dum qualquer processo) não pode/deve fechar os olhos ao que, estando também perguntado, foi considerado não provado.

Todavia, nunca ao ponto de inverter o raciocínio; nunca ao ponto de transformar o “relance”, sobre o que foi considerado como não provado, em critério decisivo e decisório.

Vale isto para dizer e realçar que, pese embora o teor das duas referidas respostas restritivas, ficou provado o seguinte:

 - que o prédio em causa é utilizado desde tempos imemoriais para apascentação de gados, produção e corte de matos lenhas e extracção de barro;

 - que tal utilização vem ocorrendo de forma ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém; e

 - que os autores de tal utilização imemorial são pessoas da freguesia de A...., que a fazem com exclusão de outrem e na convicção de que tal prédio é explorado por outros habitantes da freguesia das A.....

Repare-se que está provado que só – com exclusão de outrem – pessoas de freguesia de A.... utilizam o prédio desde tempos imemoriais; e que tal utilização é feita na convicção de que outros habitantes da mesma freguesia também o utilizam; o que aponta, em termos de recorte factual, para a “utilização promíscua” tão própria dos baldios.

“Utilização promíscua” essa que se exprime na apascentação de gados e na produção e corte de matos lenhas, que são nem mais nem menos que as utilizações características dos baldios[9][10].

Trata-se de factos – ajustados como uma luva à caracterização do prédio como baldio – com “força” suficiente para se sobrepor às ilações resultantes da não prova dos termos que as respostas restritivas excluíram dos factos provados.

É que tais factos provados – em linha com o que supra referimos sobre a natureza real do direito dos compartes – retratam poderes de facto concludentes e congruentes com um corpus de posse em termos de direito real dos compartes dum baldio; e o corpus, todos o sabemos, faz presumir o animus (art. 1252.º, n.º 2, do C. Civil).

Ademais – em idêntico sentido, da estar feita a prova do corpus e do animus da posse comunitáriaimporta não esquecer que não terá sido por certo por acaso ou por lapso que o prédio passou a ser denominado de “baldio do D....”; que, em 1957, o prédio dos RR/apelantes foi identificado como confrontando a nascente com o “baldio”; e que os RR/apelantes, no art. 28.º da contestação, deixaram escrito que “só reconhecem a existência do terreno dito baldio a nascente da linha delimitada pelas cruzes (…)”.

É quanto basta, a nosso ver, para se concluir que foi feita a prova do prédio identificado em A) ser um baldio pertencente à comunidade (da Freguesia) de A....

Baldio cuja administração se encontra delegada na Junta de Freguesia, aqui A/apelada, de acordo e nos termos dos art. 18.º, n.º 1, do DL 39/76 e 36, n.º 1, da Lei 68/93; razão pela qual assiste à A/apelada o direito a exigir o reconhecimento do direito da referida comunidade sobre o baldio (1311.º do C. Civil), com a consequente demolição dos muros, calha de ferro e porteira de ferro implantados pelos RR/apelantes no terreno do baldio (cfr. arts. 483.º e 562.º do C. Civil).


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Do mesmo modo quanto à questão relacionada com o caminho referido em 6.

Também aqui a força argumentativa dos RR/apelantes reside, fundamentalmente, na resposta restritiva dada ao quesito 26º da Base Instrutória, de que resulta, segundo os RR/apelantes, não poder o caminho ser classificado como público.

Resulta do Assento de 19-04-1989[11], hoje com valor de acórdão de uniformização de jurisprudência, que a dominialidade pública dum caminho deve revestir dois requisitos: o uso directo e imediato do mesmo pelo público e a imemorialidade de tal uso.

Assento esse que – é hoje pacífico – deve ser interpretado restritivamente[12], querendo como isto dizer-se que a publicidade dum caminho exige ainda a sua afectação à utilidade pública, ou seja, à satisfação de interesses colectivos de certo grau ou relevância.

Ao que logo se acrescenta que não cumpre esta última exigência/requisito o caminho que se destine apenas a fazer a ligação entre caminhos públicos por prédio particular, com vista a um encurtamento não significativo de distâncias; hipótese em que tal caminho deve ser classificado como mero atravessadouro e por isso considerado abolido de acordo com o art. 1.383º do C. Civil[13].

Isto presente – tendo-se provado que o caminho referido em 6 é utilizado, há mais de 100 anos, pelos habitantes da freguesia de A.... para a fruição do baldio, bem como, por quem quer que o pretendesse fazer, para acesso a um outro caminho público, para encurtar distâncias em cerca de 500 metros – ficaram preenchidos, salvo o devido respeito, a totalidade dos requisitos que a dominialidade pública dum caminho deve revestir.

Ficou provada a sua utilização por um número indiscriminado de pessoas – “por quem quer que o pretendesse fazer”.

Ficou provada a sua utilização desde um tempo em que o seu início se perde na recordação dos homens; “mais de 100 anos” é algo que um homem vivo não observou o seu princípio e que por isso preenche a imemorialidade.

Ficou finalmente provado que tal caminho, para além de ser utilizado pelos compartes para a fruição do baldio, encurta uma distância de 500 metros entre 2 caminhos públicos, o que não é um encurtamento insignificante e que, por isso, não permite classificá-lo como mero atravessadouro.

Por conseguinte, tendo os RR/apelantes praticado actos que obstruem e empatam a utilização de tal caminho – como resulta dos factos 25, 27 e 28 – e sendo aos compartes do baldio facultada a sua utilização, assiste à A/apelada (a quem a administração do baldio se encontra delegada) o direito de exigir a sua reposição no estado anterior[14].

Em conclusão, improcede tudo o que os RR/apelantes invocaram e concluíram na sua alegação recursiva, o que determina o completo naufrágio do recurso e a confirmação do sentenciado na 1ª instância, que não merece os reparos que se lhe apontam, nem viola qualquer uma das disposições indicadas.


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IV – Decisão

Nos termos expostos, decide-se julgar totalmente improcedente a apelação e confirma-se a sentença recorrida.

Custas pelos apelantes.


[1] Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2.ª ed., pág. 348.

[2] O que só por si evidencia a sua irregularidade, uma vez que, na actividade jurisdicional, a fundamentação da decisão de facto é por certo o que há de mais “artesanal” e irrepetível.
[3] Isto é, para saber se discordam ou não, basta que confrontem a apreciação que fizeram nas alegações (efectuadas no final da audiência) com o conteúdo da decisão de facto.
[4] Como aliás resulta da epígrafe do próprio 712.º do CPC – “Modificabilidade da decisão de facto”.

[5] São os logradouros dos povos no nosso direito primitivo.
[6] Cuja origem se “perde na noite nos tempos” – cfr. Rogério Soares, in RDES, 1967, pág. 263.

[7] Sem prejuízo de, noutros tempos, terem ocorrido momentos em que foi impulsionada a política de repartição dos baldios entre os moradores vizinhos.
[8] Rogério Soares, obra e local citados, pág. 303 e 308.
[9] Como, aliás, resulta do art. 3.º da Lei 68/93, de 04-09, em que se diz que “ os baldios constituem, em regra, logradouro comum, designadamente para efeitos de apascentação de gados, de recolha de lenhas ou de matos, de culturas ou outras fruições (…)

[10] Mas que já não é característica do antigo compáscuo – como pretendem os RR/apelantes – que consistia na desfrute conjunto nos pastos, apenas nos pastos, de prédios alheios ou pertencentes a diversos proprietários – cfr. art. 2262.º do C. Civil de Seabra.
[11] In Acórdãos Uniformizadores, Colectânea de Jurisprudência, pág. 115.
[12] Cfr., designadamente, Ac. STJ de 10/11/1993, in BMJ 431, pág. 300 e ss.; de 19/11/2002, in CJ Online Ref. 6683/2002, e de 13/03/2008, in CJ Online Ref. 1019/2008.
[13] Aliás, importa sublinhá-lo, a interpretação restritiva do Assento decorre da necessidade de estabelecer uma distinção, com critério, entre os caminhos públicos e os atravessadouros – cfr. Henrique Mesquita, in RLJ, n.º 3933 e 3934; decorre da necessidade de não transformar o art. 1383.º do C. Civil em “letra morta”.

[14] Em todo o caso, acrescenta-se ainda, o caminho, caso fosse um atravessadouro, não atravessaria o prédio dos RR/apelantes, pelo que a sua extinção apenas faria reverter o seu trato de terreno para o próprio baldio, o que, no que aqui revela, conduziria, do mesmo modo, à ilicitude do referido comportamento – da prática de actos de obstrução e empate na utilização do caminho ou, então, do respectivo trato de terreno – dos RR/apelantes.