Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1571/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARDOSO ALBUQUERQUE
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS PATRIMONIAIS FUTUROS
EQUIDADE
ALIMENTOS
Data do Acordão: 06/15/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Legislação Nacional: ARTIGOS 493ºNº3 ; 495º,Nº3 E 566º DO CÓDIGO CIVIL DO CÓDIGO CIVIL E ARTIGOS 495ºNº3 , 496º, 564º,Nº2 DO CC E 659º,Nº2 DO CPC
Sumário: 1 – A notificação judicial avulsa da R antes de proposta acção de indemnização estradal pelos lesados comunicando essa intenção, com a devida identificação do acidente e seus intervenientes e dos danos causados, bem como dos fundamentos da sua legitimidade para reclamar o seu ressarcimento da notificada, como seguradotra do veículo que lhe deu causa é meio idóneo para interromper a prescrição
2 – Constando dos autos que o veículo da vítima ficou totalmente inutilizado e posto na sucata, em Itália de onde provinha, aquando do acidente em Portugal, o preço por que havia sido comprado no estado de novo e o período de meros seis meses de uso, tais elementos bastam para em termos de equidade ser definido, com base na sua presumível desvalorização, a indemnização dessa perda patrimonial
3 – Sendo apurado que a vítima, de nacionalidade italiana, solteiro, de 36 anos de idade e empregado vivia em economia comum com a mãe já idosa e titular de uma pensão de viuvez e de um irmão, também solteiro de 33 anos incapacitado para o trabalho por doença e toxico dependência, sem outras fontes de rendimento, justifica-se a atribuição a este de uma indemnização por danos patrimoniais futuros, privado que ficou do direito de reclamar da mesma alimentos a que tería jus nos termos da lei interna italiana.
Decisão Texto Integral: I - No Tribunal Judicial da Guarda, A, B, C e mulher D, E, F, G e H de nacionalidade italiana e residentes no seu país, intentaram acção ordinária para efectivação da responsabilidade civil estradal contra a Companhia de Seguros TRANQUILIDADE S.A pedindo a condenação desta a pagar-lhes a quantia de Esc. 39.903.904$00, acrescida de juros de mora a contar da citação.
Fundamentam o pedido no facto de ter ocorrido um acidente de viação na IP 5 em 1995 entre o veículo em que seguiam os seus familiares Andrea Santaniello e Saveria Radice e um outro, seguro na R, por culpa exclusiva do condutor deste que circulava em sentido inverso e saíra da sua mão de trânsito, tendo do embate resultado a morte dos mesmos, o que foi causa de danos patrimoniais e não patrimoniais que descreveram, justificando a quantificação das correspondentes verbas.
A R contestou, afirmando, em suma, que o direito já prescrevera e que o acidente se ficou a dever à condução ilícita e culposa de um terceiro veículo desconhecido que circulando em sentido inverso ao do por si seguro e que saindo da sua mão de trânsito nele embatera, causando o seu descontrole.
Ainda invocou que os falecidos não traziam cinto de segurança, contribuindo para a produção e agravamento dos danos.
Por fim impugnou a matéria dos danos, taxando de exagerados e irrealistas os montantes peticionados.
Os AA replicaram , batendo-se pela improcedência da excepção da prescrição, negando a versão do acidente trazida pela R e dizendo que as vítimas usavam cinto de segurança.
E também os AA Lucetta e Gianfranco deduziram incidente de apoio judiciário na modalidade de dispensa total de custas e preparos que lhes foi concedido, após ponderação dos documentos juntos e dificuldade em obter adequados informes das entidades policiais italianas.
Por despacho de fls 177 a 181, foi julgada improcedente aquela excepção e o processo saneado, a que se seguiu a selecção dos factos assentes e a elaboração da base instrutória.
A R recorreu de apelação do despacho que apreciou a excepção peremptória da prescrição, recurso que foi recebido como apelação e devidamente minutado e contraminutado.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença minuciosamente fundamentada na qual e na procedência parcial da acção, decidiu o Mmo Juiz, condenar a R a pagar :
A) à A Lucetta Zamboni in Santaniello:
- A quantia de € 9.975,96, acrescida de juros de mora, contados desde a data da citação (22/09/1999) até integral pagamento, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por si sofridos em consequência da morte de Andrea Santaniello;
- A quantia de € 30,68, acrescida também de juros nos termos já referidos, a título de indemnização do dano patrimonial suportado pela destruição em sucata dos salvados de veículo do falecido Andrea;
- E a quantia de €3775,92, também acrescida de juros, nos mesmos termos a título de indemnização pelas despesas de funeral do infeliz Andrea.
B) Aos AA Lucetta e Gianfranco, em partes iguais e em regime de solidariedade passiva:
- A quantia de € 29.927,87, acrescida de juros desde a data da citação, a título de indemnização pelo dano morte de Andrea Santaniello:
- A quantia de € 1.500,00 acrescida de juros desde a data da sentença a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelo mesmo Andrea nos momentos que antecederam a sua morte;
- E a quantia de € 8.500, 00, acrescida de juros desde a citação a título de indemnização pelo dano decorrente da perda do veículo pertencente o falecido.
C) Aos AA Mario , Bruna , Mauro , Maria Paola e Rosangela em partes iguais e solidariamente:
- A quantia de € 29.927, 87, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, a título de indemnização pelo dano morte de Saveria Radice.
D) Ao A Mario Radice :
- A quantia de € 2.472,28, acrescida de juros nas condições da anterior , a título de indemnização pelas despesas suportadas com o funeral de Saveria Radice, absolvendo-a quanto ao mais pedido
Inconformada com este desfecho, recorreram de apelação os AA Lucetta e Gianfranco e, subordinadamente, a R Tranquilidade.
Nas conclusões da peça alegatória , disseram os AA Lucetta e Gianfranco, o seguinte :
1) Ficou provado que a vítima Andrea sofreu o pânico da aproximação de um veículo desgovernado e da inevitabilidade com que anteviu a própria morte.
2) Este circunstancialismo constitui um dano moral indemnizável;
3) O valor peticionado pelos recorrentes está manifestamente aquém dos valores praticados no nosso país;
4) A jurisprudência considera já como adequado para compensar estes danos , o de €10.000,00;
5) A indemnização peticionada pelos AA relativamente aos danos patrimoniais sofridos pela infeliz vítima está , por isso, dentro dos valores praticados pelos nossos tribunais ;
6) Os depoimentos prestados por carta rogatória demonstram claramente ter ficado provada a matéria constante dos quesitos 24º e 28º;
7) Ficou demonstrado que era o malogrado Andrea quem assegurava o sustento da família;
8) Os recorrentes residem em Itália, onde o custo de vida á largamente superior ao de Portugal;
9) Ficou provado que a A Lucetta apenas dispõe de um fraca pensão de reforma o que implica que não seja capaz de suportar as despesas inerentes ao próprio sustento e do seu outro filho;
10) Ficou demonstrado que o irmão do falecido porque sofre de doença , não trabalha , nem nunca trabalhou;
11) Ficou demonstrado que os recorrentes têm necessidade de receber os alimentos ;
12) Ficou provado que o falecido podia prestar esses alimentos;
13) Do artº 495º,nº3 do CC resulta um direito à indemnização pela perda de alimentos , independentemente de estes serem ou não prestados pelo falecido aos lesados ou de estes precisarem ou não de os receber;
14) Para a aplicação do artº 493ºnº3 do CC, é suficiente a condição abstracta de ser titular de direito a alimentos;
15) A indemnização do quantum da indemnização pela perda de alimentos poderá ser feita quer com recurso à equidade, quer relegando-se a sua liquidação para execução de sentença;
16) A douta sentença recorrida violou o disposto nos artºs 495ºnº3 , 496º, 564º,nº2 do CC e 659º,nº2 do CPC.
Por sua vez , a R Tranquilidade concluiu as minutas dos seus recursos do despacho que desatendeu a excepção da prescrição do direito e da sentença final, nos termos seguintes:
Recurso do despacho saneador
1 – Ainda que o prazo prescricional do procedimento criminal pelo homicidio negligente seja de 5 anos , não é esse necessariamente , o aplicável ao caso;
2 – Redundando a questão da culpa na produção do acidente num non liquet o prazo aplicável é de três anos ;
3 – A excepção de prescrição oportunamente invocada pelo ora recorrente deverá pois ser apreciada a final;
4 – A notificação judicial avulsa, porque mais não é do que o anúncio da intenção de exercer o direito e não de um acto que o exprima, não tem efeito interruptivo da prescrição;
5 – Foram violados os artºs 323º e 498º do CC
Recurso da sentença final
1 – Não existem no processo elementos suficientes para que se decida nos termos constantes da douta sentença ;
2 – O juízo de equidade neste caso afasta a necessária prova quanto ao estado da viatura no momento do acidente, sua marca e modelo e em espacial , a sua antiguidade e extensão de uso
3 – Dito de outro modo, os factos provados são, salvo o devido respeito, insuficientes para que se possa decidir com base na equidade, tanto mais que não se provou o valor efectivo da viatura, mas apenas a quantia de que o malogrado Andrea pagou por ele (factos que não são sucedâneos )
4 – E toda essa matéria de facto indispensável à boa decisão da causa só em liquidação em execução de sentença poderá ser devidamente averiguada
5 – Ainda que assim se não entendesse, sempre se mostraria sobre valorizada a verba cometida aos AA, não devendo exorbitar os €5.000,00.
6 - Foi violado o disposto no artº 566º do CC.
Tanto os AA recorrentes , como a R contralegaram, sustentando a manutenção do decidido, na partes censuradas, dispensando-nos de transcrever as concernentes conclusões para não alongarmos em demasia o teor deste acórdão.

II – Foram, depois de lavrado despacho liminar do Relator, colhidos os vistos legais.
Cumpre, portanto , decidir.

III – Vejamos , antes de mais, os factos a ter em conta para a apreciação do recurso de apelação do despacho saneador, o primeiro que nos cabe apreciar, por precedência lógica e cronológica aos interpostas da sentença final:
1 – A R foi citada para a presente acção de efectivação da responsabilidade civil por acidente de trânsito duplamente mortal, ocorrido na IP 5 ao Km 161,4, área da Comarca da Guarda em 22 de Junho de 1995, através de carta recebida em 21 de Setembro de 1999.
2 – Por tal motivo, deduziu ela na contestação, a excepção da prescrição por ter decorrido mais de três anos e por os AA, herdeiros das vítimas terem logo sabido da morte destas em consequência do acidente.
3 – Entretanto documentaram as AA com a petição inicial a notificação judicial avulsa da R, operada em 18 de junho de 1998 da sua intenção de proporem a presente acção para ressarcimento de todos danos decorrentes daquelas mortes que atribuiram a culpa exclusiva do condutor do veículo por ela seguro, indicando a data e local do acidente, com junção da cópia da participação e justificando a sua qualidade de titulares da indemnização.
3 – Por isso e na réplica, vieram contrariar a excepção dizendo ter sido interrompido aquele prazo , além de que apenas em 16/12/1997 fora arquivado o inquérito atinente ao acidente, só podendo contar-se o prazo a partir dessa data.
4 – Os AA não chegaram a juntar, nem tal lhes foi exigido, certidão comprovativa do arquivamento do processo de inquérito, visto o Mmo Juiz ter considerado no seu despacho que e excepção não podia proceder, por ter havido interrupção do prazo normal de prescrição de três anos mesmo contado a partir da data do acidente, uns dias antes de findar o prazo com a notificação judicial avulsa da R da intenção de propositura da acção.

Cifra-se o objecto deste recurso em saber, independentemente do prazo eventualmente aplicável ser o de cinco anos, por o acidente configurar, conforme a descrição dos AA um crime de duplo homicídio por negligência, o que determinaria que se relegasse a apreciação dessa questão para final, dada a posição da R que impugnou a culpa e independentemente também da alegada pendência de um inquérito, apenas arquivado em 1997, se foi correcta e adequada a decisão proferida.
Decisão a que a lei processual, por ela incidir sobre uma excepção peremptória, como é prescrição do direito de indemnização no âmbito da responsabilidade civil regulada no artº 498º do CC, atribui a força de uma decisão de mérito, recte o valor de sentença – artº 691ºnº1 e 2 , conjugada com o artºs 510ºnº1 , aln b)e 3 e 493º,nºs 1 e 3, todos do CPC.
Diremos , desde já, que a recorrente não tem qualquer razão.
Como bem sublinha o Mmo Juiz, não curando de saber se ao caso era aplicável o prazo mais longo de cinco anos, por a facto ilícito e culposo imputável ao segurado da R constituir um duplo crime de homicídio por negligência,(nº3 do artº 498ºe artºs 118º,aln c) e 137º do Cod. Penal) sempre se teria de concluir que o prazo normal de três anos (nº1 do mesmo artº498º) contado desde a data do acidente não se chegara a completar.
E isso na medida em que os AA haviam feito uma notificação judicial avulsa da R da sua intenção de proporem contra ela a presente acção, a qual se operou antes de completado aquele prazo.
Ajuizou em suma que essa notificação tinha eficácia interruptiva da prescrição nos termos previstos no artº 323ºdo CCivil
E contrariando a argumentação da R que sustentava não revestir ela essa virtualidade, aduziu que uma das funções da notificação judicial é justamente a de interromper a prescrição, constituindo um acto processual idóneo para produzir tal efeito.
Ora no presente recurso mais não faz a recorrente do que voltar à carga com o mesmo argumento especioso de não se tratar a notificação apontada de um acto de exercício do direito, ou seja de um acto processual, mas antes o de anúncio de um propósito.
Mas não é, nem pode ser assim.
Dispõe o artº 323º,nº1 do C.Civil que a prescrição ( que é um efeito jurídico da inércia prolongada do titular de um direito em exercê-lo, por via de regra um direito de crédito, traduzindo-se após um certo prazo, na debilitação da respectiva eficácia, com a possibilidade de recusa da prestação pelo devedor) se interrompe pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente, acrescentando o nº4 que é equiparado à citação e notificação, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o direito pode ser exercido.
Discorrendo sobre esta temática da interrupção da prescrição, diz –nos Pais de Vasconcelos ( Teoria Geral, Vol II, 265) ao debruçar-se sobre o preceito que ele apenas não considera suficiente a interpelação ou outra manifestação ou a comunicação extra judicial ao obrigado pelo titular do direito, de que pretende exercê-lo.
O nº4 justamente exige que seja judicial o meio.
Ora a notificação judicial avulsa prevista e regulada nos artºs 261º e 263ºdo CPC corresponde inteiramente a essa exigência legal,
Trata-se de uma comunicação judicial, dependente sempre de despacho prévio e levada a efeito pelo funcionário judicial na própria pessoa do notificando.
Não se ignora, é certo, haver alguma jurisprudência que defende que tais notificações não são meios de fazer valer direitos, nem actos praticados no âmbito de um processo e que a declaração da intenção de exercer um direito, não é o mesmo que exercê-lo.
Contudo, a jurisprudência largamente dominante rejeita semelhante entendimento, o qual não tem o mínimo apoio na letra e no espírito do preceito ( cfr, além de P. de Lima e A Varela, Anotado, Vol.I, 4ª ed.,290 e Ac.s do Supremo de 9/04/92, BMJ 416º, 558, de 20/04/94, ( proc.nº3890) e de 5/06/97 CJ/STJ, T.II, 115).
No caso em apreço, os AA serviram-se de um meio judicial para comunicar à R a sua intenção de exercer um direito e fizeram-no aliás de forma a ela não ter dúvidas quanto à existência deste, já que disseram no requerimento a data e o local do acidente, as mortes a que ele deu causa e as suas relações de parentesco com as vítimas justificativas da sua legitimidade em pedir o integral ressarcimento dos danos, o nome do condutor e segurado, a matrícula do veículo causador e o nº da apólice do seguro.
Como ensina também Lebre de Freitas, citando outros eminentes processualistas (in Cod. de Processo Civil Anotado, Vol.I, 459) a função das notificações judiciais é de precisamente obter em processo «adhoc» efeitos declarados na lei substantiva, tanto ela podendo transmitir uma declaração de ciência ( conhecimento ao destinatário da prática dum acto ou da ocorrência de um facto com relevância jurídica)como uma declaração de vontade, ou seja,inter alia, a da intenção do exercício de um direito prescritível, justamente para interromper o curso do prazo substantivo da prescrição.
Improcede, assim , em toda a linha, o recurso.
Demais, mesmo a entender-se diferentemente, sempre os AA beneficiariam do prazo mais longo de 5 anos interrompido pela citação, por no recurso da sentença final a R sequer pôr em dúvida a conduta culposa do condutor do veiculo seguro, com a inerente enquadramento dos factos na previsão de um crime duplo de homicídio por negligência.

IV – Importa, agora, para apreciação dos demais recursos de apelação, enunciar os factos dados por assentes e provados após o julgamento:
a) No dia 22 de Junho de 1995, pelas 18h.45m, o veículo OQ –39-21 seguia na IP 5 ao Km 161,4 no sentido Guarda- Celorico.
b) Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar , mas em sentido oposto seguiam os veículos M – 858 HT e AC – 669 EP
c) No local do acidente , a estrada descreve uma curva acentuada à direita , atento o sentido de marcha do AC
d) As duas metades da faixa de rodagem eram separadas por uma linha longitudinal contínua.
e) A estrada tem no local do acidente, 7 m e 20cms de largura.
f) O piso encontrava-se molhado
g) O AA Lucetta e Gianfranco são respectivamente mãe e irmão de Andrea Santaniello.
h) Ao AA Mario e Bruna são os pais de Saveria Radice e os demais AA irmãos desta .
i) Saveria Radice era casada com o A Alberto Mosso.
j) O A Alberto passou procuração aos pais e irmãos da Saveria
k) Por contrato de seguro titulado pela apólice nº 01338002 a responsabilidade civil emergente de acidente de viação relativa ao OQ encontrava-se à data transferida para a R.
l) O condutor do AC, Andrea Santaniello e o passageiro que seguia ao seu lado Saveria Radice morreram em consequência do acidente.
m) A data do acidente ambos tinham 36 anos de idade
n) O Andrea morreu no estado civil de solteiro.
o) O OQ era propriedade de José Manuel da Silva Costa que seguia como passageiro e era conduzido por Serafim Manuel da Silva Gomes.
p) O AC seguia a uma velocidade não superior a 70 kms h
q) Pela metade direita da faixa de rodagem
r) O OQ seguia a uma velocidade não inferior a 60 Kms h.
s) Quando começou a descrever uma curva à esquerda, atento o seu sentido de marcha , a referida em c), numa descida, o OQ transpôs o traço contínuo longitudinal que separava as duas faixas de rodagem e invadiu a metade esquerda da via .
t) E foi embater com a sua parte frontal esquerda e lateral esquerda na parte lateral esquerda do M-858HT.
u) Após o que o OQ embateu na parte dianteira do veículo AC-669EP.
v) O embate ocorreu nas parte direita da faixa de rodagem atento o sentido de marcha do veículo italiano (AC).
w) A A Lucetta sentiu grande dor e tristeza com a morte do seu filho.
x) Sentimentos que perduram até hoje.
y) Em consequência do acidente, o veículo AC ficou bastante danificado.
z) Foi transportado para Bolonha, onde foi removido para a sucata.
aa) A sua reparação não era economicamente vantajosa.
bb) Não foi recebida qualquer quantia pelos salvados.
cc) O veículo AC havia sido adquirido em 11/01/1995 pelo preço de € 8.986,35, por correspondência ao preço em liras
dd) A A Lucetta com os serviços fúnebres do filho Andrea, despesas de cemitério e lápide despendeu o equivalente a €3775,92
ee) E com encargos registrais relacionados com a retirada de circulação do veículo AC e com a sua destruição final em sucata , despendeu o equivalente a €30,68
ff) A A Lucetta vivia com o falecido filho e com outro, o Gianfranco.
gg) Este não trabalha com regularidade.
hh) A mesma Lucetta em Junho de 1998 recebia mensalmente uma pensão de reforma no montante líquido de 1.505.120 liras e que correspondem a € 777,33
ii) O falecido Andrea no ano fiscal de 1994 declarou um rendimento anual líquido de 36.196.000 liras que correspondem a € 18.963,67, de que lhe foi retirada a quantia de 7.726.000liras e que correspondem a € 3.990,15.
jj) E contribuía para as despesas e encargos familiares.
kk) Os 3º a 7º AA suportaram , com os serviços fúnebres de Saveria Radice, despesas de cemitério e lápide, a quantia total de 4.27 87.000 liras que correspondem a € 2.214,05, bem como 500.000 liras que correspondem a € 258, 23 por conta do preço de um monumento fúnebre.
ll) Antes do aludido em s), o condutor do OQ seguia na sua mão de trânsito
mm) A velocidade não inferior a 60Kms/h
nn) E perdeu o controle do dito veículo, tendo invadido a metade esquerda da faixa de rodagem, atento o seu sentido de marcha .
oo) Foi embater com a sua parte frontal e lateral esquerda na parte lateral esquerda do M- 858HT
pp) Após o que embateu na parte dianteira do AC 669EP.
qq) Em consequência do que rodopiou e veio a imobilizar-se na metade esquerda da faixa de rodagem, atento aquele sentido, com a frente voltada para o eixo da estrada.
rr) Em momento que antecedeu a sua morte , Andrea Santaniello apercebeu-se da inevitabilidade do embate no OQ
ss) A R foi citada para contestar em 22/09/1999.

V – Considerando as conclusões que ambos os apelantes extraem das suas alegações e que delimitam, como bem se sabe, o objecto do recursos, nos termos das disposições combinadas dos artºs 684º,nº3 e 690º,nº1 do CPC e porque nada obsta a que as apreciemos pela ordem que entendamos mais adequada, são as seguintes as questões essenciais que nos compete dilucidar:
1 – Modificação residual da decisão da matéria de facto (quesitos 24º , 28ºe 29º)
2 – Indemnização pelos danos patrimoniais derivados da perda do veículo
3 –Indemnização pelo danos não patrimoniais sofridos pela vítima Andrea antes de morrer.
4 – Indemnização pelos danos patrimoniais relativos à perda de alimentos dos AA Lucetta e Gianfranco

1ª Questão
Para a análise desta questão, não há que tecer grandes considerações teóricas sobre o novo regime de reapreciação da decisão da matéria de facto, introduzido pela Reforma do Processo Civil pois que as respostas dadas pelo tribunal aos quesitos suprareferenciados se basearem em exclusivo nos depoimentos escritos em carta rogatória pelas testemunhas arroladas pelos AA, e residentes em Itália, conjugados com os documentos juntos.
Assim e mesmo que vigorasse a anterior redacção do nº1 do artº 712º , sempre este tribunal poderia sindicar a convicção firmada pelo Mmo Juiz, no âmbito da sua liberdade de julgamento, nos termos do artº 655º,nº1, ambos do CPC tanto mais que na audiência de julgamento apenas foi ouvido em vídeo conferência uma única testemunha, ou seja, o guarda participante sobre as circunstâncias do acidente, que não sobre a matéria em causa que respeita ao invocado direito de alimentos.
De todo o modo e como se diz na actual redacção do mesmo preceito, esta Relação pode alterar a decisão da matéria de facto do tribunal de 1ª instância, conforme a aln a) do seu nº1 se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão da matéria de facto em causa.
Mas vejamos quais os quesitos e respectivas respostas que os recorrentes Lucetta e filho pretendem ver modificadas.
Ao quesito 24º ( “ O outro filho - da A Lucetta Zamboni- tem doença do foro neurológico que o impede de trabalhar”?)respondeu o tribunal , conforme consta da aln GG ) provado que o outro filho Gianfranco Santaniello não trabalha com regularidade.
Ao quesito 28º ( “ O falecido Andrea Santaniello contribuia para as despesas de alimentação , vestuário da mãe e do irmão e despesas de saúde deste ?) respondeu, conforme consta da aln JJ) provado apenas que o falecido Andrea Santaniello contribuia para as despesas e encargos familiares.
Por último foi também dada uma resposta negativa ao quesito 28º, em que na sequência da anterior, se perguntava “se o mesmo contribuía com cerca de 1/3 do seu salário correspondente a 104.000$00 mensais”
Na respectiva fundamentação , o tribunal baseou as respostas nos depoimentos escritos das testemunhas Chiara Antoli, , Rosa Santaniello, esta sobrinha da Lucetta e Maria Grazia Santaniello, irmã da mesma, ouvidas por carta rogatória afirmando que embora duas das testemunhas refiram uma doença do Gianfranco que aliás não especificam, outra esclareceu que o mesmo era toxicodependente e que não trabalhava com regularidade.
Os recorrentes insurgem-se contra esta resposta restritiva, dizendo resultar dos depoimentos das testemunhas no seu conjunto que o dito A por doença eventualmente ligada a toxidependência não trabalhava, o que já sucedia anteriormente ao acidente.
Digamos que os depoimentos prestados cuja tradução consta de fls 459 e ss, não são rigorosamente coincidentes, a primeira testemunha Chiara, amiga da A Lucetta alude que o Gianfranco sofre de doença grave que o impede de trabalhar, aliás nunca trabalhou, não especificando porém a doença em causa, enquanto a segunda testemunha Rosa, sobrinha da Lucetta foi mais explícita, relatando que o mesmo trabalha irregularmente, por ser toxicodependente, apesar de ter mais de 30 anos.
Por último, o depoimento da testemunha Maria Grazia, irmã da Lucetta é no sentido justamente do Gianfrenco sofrer de doença que o o impede de trabalhar.
Ou seja, duas testemunhas afirmam que o Gianfranco é um doente, não trabalhando e apenas uma delas , sem negar em termos genéricos essa lamentável situação, admitiu trabalhar ele irregularmente, em virtude de toxicodependência
No entanto essa mesma testemunha reconhece que o Gianfrenco não é economicamente suficiente
Ora a ser assim, nada obstaria a que se desse por provado que o Gianfranco por sofrer de doença e problemas de toxicodependência nunca trabalhou, nem trabalha com regularidade, não dispondo de autonomia económica.
Vejamos, agora, as demais respostas.
Pretendem aqui também os recorrentes que a prova testemunhal implicaria uma resposta inteiramente afirmativa aos quesitos mencionados.
Todas as testemunhas concordam em dizer que o falecido vivia em economia comum com a mãe , titular de uma pensão de reforma e com o irmão e este não auferindo, pelas razões atrás apontadas qualquer rendimento, ou pelo menos qualquer rendimento certo.
E certo é também que nenhuma das testemunhas foi capaz de dizer especificadamente e com conhecimento de causa em que termos essa contribuição se operava.
Deste modo a resposta dada pelo tribunal está de acordo com a prova, o falecido que vivia em companhia da mãe e irmão e em economia comum, contribuia para as despesas comuns e temos que ficar por aqui, desde logo por não se ter apurado se a pensão auferida pela A Lucetta era insuficiente para a respectiva manutenção e do outro filho, por cotejo da mesma com o salário mínimo em Itália, alegadamente equivalente a 120.000$00, objecto do quesito 27º que foi respondido negativamente.
Deste modo, entendemos poder apenas modificar a resposta restritiva ao quesito 24º , ficando a aln GG) com a redacção seguinte:
GG ) O outro filho por sofrer de doença e problemas de toxico dependência,nunca trabalhou, nem trabalha com regularidade, não dispondo de autonomia económica

2ª Questão
O tribunal considerou dever fixar, atendendo a critérios de equidade o dano da perda do veículo propriedade do falecido, veículo que foi para a sucata por se tornar economicamente inviável a sua reparação, em € 8.500,00.
A R contesta vivamente a apontada indemnização e aduz que os factos provados eram de todo insuficientes para se determinar com recurso à equidade tais danos, por se desconhecer o estado da viatura no momento do acidente , sua marca e modelo e em especial a sua antiguidade.
Quanto a marca, modelo e antiguidade, parecem-nos as interrogações da recorrente um pouco estranhas, pois esses elementos constam de fls 119 e ss : tratava-se de um Nissan Micra 1.3 ALX 3 portas, cõr metalizada e novo de fábrica quando foi adquirido.
E resulta, ainda da matéria provada que ele fora adquirido pelo falecido em Janeiro de 1995, por 17.400.000 liras e que correspondem a € 8.986, 35.
Ora que mais elementos seriam necessários, dada a evidência do carro ter sido já destruído há 9 anos e num país estrangeiro para o Mmo Juiz não poder, de imediato, socorrer-se de um critério de equidade, ao abrigo do disposto no artº 566º, nº 3 do CCivil, ao invés de compelir os AA à «via sacra » de um incidente de liquidação em sede de execução de sentença que com toda a probabilidade nada iria adiantar?
Cremos que nenhuns, num critério de razoabilidade, pelo que a opção da sentença de dispensar o apuramento de todo inviável do valor exacto, em termos de valor de mercado, do automóvel nos parece criteriosa, adequada e correcta.
Ou seja, os elementos recolhidos eram mais do que suficientes para fixar ao mesmo um valor próximo do preço de compra apurado pois que tinha apenas 6 meses de uso, no fundo praticamente novo aquando do acidente.
Certo que se pode discutir o coeficiente de desvalorização atribuído, pois bem se sabe que com a saída do stand , qualquer carro sofre uma desvalorização significativa, adquirindo o estatuto de veículo para venda em 2ª mão
No entanto , não estamos a ver que tal coeficiente de 6% ( na prática o automóvel custou € 9.000,00 )se afaste muito das práticas de mercado, tendo em conta justamente o seu escasso tempo de uso.
Assim, julgamos improcedente o recurso de apelação da R.

3ª Questão.
Pediram os AA, ora recorrentes ( os familiares da Saveria auto excluiram-se do recurso) a título de compensação do dano moral pelo pavor e angústia sentido pelo Andreia, antes de morrer, a quantia de 1.500.000$00, cujo contra valor em euros se cifra em 7.841,97
O Mmo juiz entendeu em termos de equidade, e face ao que ficou provado, atribuir aos AA o montante de € 1.500,00, considerando este já actualizado.
Julgamos que lhes assiste, também aqui, alguma razão.
Certo que estamos perante uma questão sempre melindrosa qual seja a da quantificação da indemnização correspondente aos danos morais, merecedores da tutela do direito, com base na equidade, prevista no artº 496ºnº3 do C.Civil
Como é bem sabido, a gravidade de tal dano deve ser medida por um padrão objectivo e a indemnização atinente calculada em qualquer caso (haja dolo ou mera culpa do lesante) segundo juízos de equidade, tendo em conta as circunstâncias concretas do caso, a situação económica de agente e do lesado e o grau de culpabilidade de um e outro, como defendem Pires de Lima e A Varela ( CCivil Anotado, 1 Vol., 3ª ed. 474), os quais acrescentam que deve a quantia ser proporcionada à efectiva dimensão do dano, tomando-se em conta na sua fixação todas as regras da boa prudência, do bom senso prático e da justa medida das coisas.
Não se discute que são reparáveis os danos de quem perdeu a vida num acidente pelo sofrimento moral ou físico experimentado com a percepção do perigo ou com as dores suportadas ainda que com morte imediata ou quase imediata, como parece ter sido o caso.
Mas no caso em apreço , a razão pela se entendeu baixar o «quantum» pedido foi – julga-se - por apenas se ter provado que o falecido se deu conta da inevitabilidade do embate, com o inerente susto antes de sucumbir com o mesmo, mas não do perigo iminente para a sua vida.
No entanto e mesmo assim, ponderando por ser uma evidência que nem careceria de prova que o embate lhe causou, face às lesões letais, sofrimento, o que aliás foi alegado, julgamos haver razão para colocar em patamar mais elevado, mais de acordo com as tendências actuais da jurisprudência e o influxo das directivas europeias o cálculo deste dano perspectivado este na dimensão antropológica do «memento mortis»
Cálculo que também deve ter em conta as devidas proporções, não devendo afastar-se em demasia dos valores de referência aceites pela elaboração jurisprudencial num país como o nosso, que, infelizmente, ainda longe está de atingir os níveis de desenvolvimento dos países que estão na dianteira da União Europeia, como será o caso da Itália
Nesta óptica, entendemos até por se ter provado culpa grave e exclusiva do causador do acidente, ao aparecer descontrolado pela frente do veículo tripulado pelo falecido com invasão da respectiva faixa de rodagem como se ajuízou na sentença, ser mais adequado elevar o mesmo para € 5.000,00 montante esse na mesma devidamente actualizado.
Procedem, portanto, mas em parte, as conclusões 1ª a 5ª da apelação dos AA

4ª Questão
Resta abordarmos a questão também melindrosa e complexa do direito dos AA recorrentes à reparação dos danos patrimoniais pela privação de alimentos a que alude o nº3 do artº 495º do C.Civil.
O falecido vivia, por ser solteiro, não obstante ter já 36 anos de idade em economia comum com a mãe, viúva e pensionista, então com 66 anos de idade e um irmão, de 33 anos, elementos esses que constam e estão certificados em documentos juntos com a petição inicial
E ficou provado que contribuía em medida e proporção ignoradas para os encargos desse lar comum,
O nº3 do artº 495ºdo C.Civil ( norma que regula a indemnização a terceiros em caso de morte ou lesão corporal) reza assim:
« Têm igualmente direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem este prestava no cumprimento de uma obrigação natural»
Esta norma deve ser conjugada por sua vez com o nº 3 do artº 566º, a qual dispõe que não podendo ser averiguado o valor exacto dos danos , o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados e com o artº 564ºnº2 na qual se determina que a fixação de danos patrimoniais futuros previsíveis, desde que não determináveis pode ser relegada para decisão ulterior.
Em matéria de alimentos e como correctamente se ajuizou na sentença por estarmos perante uma relação jurídica plurinacional ou plurilocalizada visto os credores de alimentos terem a nacionalidade italiana e residirem em Itália, haveria que determinar qual a lei aplicável e essa sem dúvida é a italiana, por força do disposto nos artºs 1º e 4º s da Convenção sobre a Lei Aplicável às Obrigações Alimentares, de que tanto Portugal , como a Itália são partes, tendo a mesma entrado em vigor no nosso país em 1/10/1977.
A qualificação do que se entende por alimentos pertence contudo à lei portuguesa, nos termos do artº15º do C.Civil e vem contemplada no artº 2003º,nº1 «tudo o que é indispensável ao sustento , habitação e vestuário»
No entanto os pressupostos respectivos constam do Codice Civile em vigor na Itália cujas disposições constam do documento junto antes da prolação da sentença, importando para a questão em análise o artº 433º que vincula a essa obrigação os filhos e os irmãos, 438º que refere como pressuposto geral a necessidade do respectivo beneficiário por impossibilidade em prover ao seu próprio sustento e a regra da proporcionalidade entre essa necessidade e a possibilidades de quem os presta , não devendo exceder o necessário à manutenção da vida do alimentado em coerência com a sua posição social , 439º que dispõe que a medida de alimentos entre irmãos é o estritamente necessário à subsistência 440º, segundo o qual pode a medida ser reduzida devido a conduta reprovável do beneficiário e 442º, segundo o qual quando mais de uma pessoa tenha direito a alimentos de um mesmo obrigado e este os não puder satisfazer, podem ser eles prestados por um obrigado de grau posterior.
Ou seja , o sistema legal italiano não é diferente do português, como de resto o sublinham AVarela e P de Lima a propósito das normas sobre alimentos no Vol. V do seu Anotado
Ora no caso vertente e ponderando os factos provados, considerou o Mmo Juiz não resultar dos mesmos que o Andrea prestasse alimentos aos AA, já que o seu contributo no âmbito da economia comum em que todos viviam podia significar apenas o pagamento da sua parte nas despesas comuns.
E avançado quando à previsibilidade dessa obrigação , também julgou o pedido improcedente, pois não resultara provado a necessidade dos AA os receberem, apenas e tão somente se provando o valor da pensão de reforma da A Lucetta, o valor do salário auferido pelo falecido e que o A Andrea não trabalha com regularidade.
Ora sem quebra do devido respeito, julgamos que o não se ter provado que o falecido contribuisse para além do que a sua parte nas despesas comuns lhe exigiria para o sustento da mãe e irmão, não privaria estes de fazer valer o seu direito a alimentos.
Com efeito é dominante o entendimento, aliás reconhecido na douta sentença que para o exercício do direito de indemnização não é necessário provar que já se recebesse alimentos, bastando demonstrar que se esteva em situação de legalmente os poder vir a exigir e a existência de elementos factuais que apontem para a previsibilidade dos mesmos.( v, neste sentido , entre outros, os Acs do STJ de 29/02/1996, CJ Ano IV, T.I. 104 e de 8/07/2003, CJ Ano XI, T.II, 141, este reportando muitos outros e os ensinamentos de AVarela , Das Obrigações em Geral, Vol.I, 9ª ed. 647e de Vaz Serra , RLJ 105º, 47).
E essa previsibilidade há de assentar em critérios de probabilidade a projectar em termos de normalidade da vida.
No caso vertente ao A Gianfranco particularmente não será de afastar a probabilidade, em termos de normalidade da vida da sua carência de alimentos a satisfazer por parte do falecido irmão, por não ter outro amparo para a sua comprovada situação de insuficiência económica - trata-se de pessoa doente, com problemas de toxidependência que não trabalha - senão a sua mãe, então com 66 anos de idade e que não por muitos mais anos, eventualmente por não mais de 10 anos a contar do acidente, lhe poderá continuar a facultar.
Outrotanto não estamos a ver serem eles previsíveis no tocante à Lucetta que é titular de rendimentos que não se demonstrou serem insuficientes para o sustento do agregado que passou a ser constituido por ela e filho sobrevivo, doente e tudo indica que inapto para o trabalho.
Ora os irmãos também pelo direito italiano estão vinculados à prestação de alimentos, faltando cônjuges , descendentes ou ascendentes, apenas sobre eles sobrelevando os afins ( nora ou genro e sogro ou sogra ) aspecto esse irrelevante, no contexto do presente caso.
A questão que se coloca é porém a de encontrar os parâmetros para a fixação de tais danos patrimoniais futuros, sabendo-se apenas como se sabe que o falecido tinha 36 anos e o A seu irmão 33, auferindo aquele em 1994, pelo menos, a importância mensal equivalente a 315.000$00.
Para tanto seria necessário demonstrar em termos aproximados a quanto ascendem as despesas de subsistência do Gianfranco à luz do custo de vida médio em Itália e da sua efectiva dependência de ajuda de terceiros, o que de todo se ignora.
Tudo a apontar para a determinação de tais danos dever ser relegada para execução de sentença, procedendo, assim, em parte, as conclusões 10º a 14ºdo recurso da apelação dos AA.

VI – Nos termos expostos, acorda-se em conceder parcial procedência à apelação dos AA Lucetta e Gianfranco e negar procedência a ambas as apelações da R e, em consequência :
A ) Revogar a sentença recorrida na parte em que fixou os danos não patrimoniais próprios da vítima Andrea , antes de morrer em €15000,00 montante que ora se eleva para € 5.000,00.
B) Revogar, também a sentença , na parte em que decidiu não ter o A Gianfranco direito a uma indemnização pela morte de seu irmão, relacionados com a obrigação alimentar a que este se vivo fosse estaria vinculado perante a sua situação de insuficiência económica por morte da mãe, ora já com 74 anos e em, reconhecendo esse direito, relegar para execução de sentença a fixação da correspondente indemnização, com o limita do pedido a esse respeito formulado.
C) Confirmar no mais , a douta sentença

Custas dos recursos de apelação da R a cargo desta e da apelação dos AA na proporção do decaímento, sendo as da 1ª instância também na proporção do decaímento, quanto ao montante já liquidado e provisóriamente em metade no montante a liquidar em execução de sentença, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.