Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
16/08.9GBAVR-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BELMIRO ANDRADE
Descritores: PRISÃO PREVENTIVA
CONTINUAÇÃO DA ACTIVIDADE CRIMINOSA
Data do Acordão: 03/11/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE ÍLHAVO
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 27º,3,28,2 CRP 196º,201º E 204º CPP
Sumário: O perigo de continuação da actividade criminosa, não se confunde, necessariamente, com a consumação de novos actos criminosos. Devendo antes ser aferido em função de um juízo de prognose a partir dos factos indicados e personalidade do arguido por neles revelada.
Decisão Texto Integral: I. Relatório

P..., melhor identificado nos autos, recorre do despacho - certificado a fls. 66-67 – em que, procedendo à reapreciação dos pressupostos da prisão preventiva, o tribunal recorrido, concluindo “que se mantém todos os pressupostos de facto e de direito que não só justificam como exigem a prisão preventiva como única medida suficiente e adequada para os arguido e a ela submetidos – arts. 204º als. a) e c), 202º n.º1 al. a), 193º e 213º, todos do CPP”, decidiu que “os arguidos (…) e P... continuem a aguardar os ulteriores termos do processo sob a medida de coacção de prisão preventiva”.
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Na motivação do recurso são formuladas as seguintes CONCLUSÕES
1. O despacho recorrido fez incorrecta apreciação dos factos e violou o artigo 32º n.º2, o artigo 27º e o artigo 28º da Constituição da República Portuguesa e o artigo 213º do CPP, pelo que deve ser revogado, ordenando-se a libertação imediata do requerente.
2. Diferentemente do que sucede com outros, o recorrente não possui qualquer antecedente criminal.
3. Contudo, a intenção de associar os arguidos é tão forte, que no despacho que determinou a aplicação da prisão preventiva, o Digno Juiz de Instrução afirma, a fls. 48, que “o arguido não tem modo de vida certo”.
4. Ora, tal considerando, que pesou determinantemente, na decisão de prender preventivamente o arguido, não é, com o devido respeito, verdadeiro.
5. Pelo contrário, como o arguido referiu ao tribunal, tem modo de vida certo: é estudante universitário, frequentando o 2º ano do curso de Comunicação e Multimédia da Universidade Lusíada (Doc. 1).
6. E vive a expensas e em casa dos pais, que aliás continuam a suportar as mensalidades da Universidade, por conhecerem o filho, saberem que jamais se dedicaria a prática de tais crimes e confiarem que V. Exas. lhe permitirão continuar o curso universitário em que tanto se tem empenhado.
7. Ora, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (acórdão do TEDH no caso Tomasi v. França) tem considerado, a exemplo do que tem feito a nossa jurisprudência, que o perigo de fuga deve tomar em conta, não apenas a gravidade das sanções a aplicar, mas também, outros factores relacionados com o carácter do arguido, como a sua casa, a sua ocupação, as suas posses, os seus laços familiares, entre outros.
8. A verdade é que o arguido está inserido socialmente, tem a sua vida organizada em Lisboa, onde vive; tem uma companheira e jamais equacionou a possibilidade de fugir.
9. Por outro lado, não é admissível a aplicação de medida de coação destinada a obter os indícios do crime.
10. Nem a prisão preventiva tem em vista uma punição antecipada e só é admissível quando se verificam os pressupostos do artigo 204º do Código de Processo Penal.
11. O douto despacho recorrido não fundamenta, relativamente ao arguido P..., a existência dos pressupostos do artigo 204º do Código de Processo Penal, sendo certo que tais pressupostos se não verificam.
12. Pelo que, face aos condicionalismos pessoais do requerente e a não verificação dos pressupostas do artigo 204º do Código de Processo Penal, deveria o requerente ter sido restituído a liberdade.
13. Caso assim se não entenda e em atenção ao principio da necessidade, adequação e proporcionalidade, deve a prisão preventiva ser substituída pela medida prevista no artigo 201º do CPP, impondo-se ao ora requerente a obrigação de não se ausentar da habitação onde reside com os pais.
14. E nem se diga - como faz o Ministério público - que tal medida de coacção não permite impedir a continuação da actividade criminosa, pois, como decorre do determinado no n.º 2, do art. 201º do CPP, a obrigação de permanência na habitação é cumulável com a obrigação de não contactar, por qualquer meio, com determinadas pessoas.
15. O que pode e deve ser controlado pelos meios técnicos de controlo a distancia.
16. Pelo exposto e pelo mais que for doutamente suprido deve conceder-se provimento ao presente recurso
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Respondeu o digno magistrado do MºPº junto do tribunal recorrido sustentando a improcedência do recurso, alegando, ara tanto, em síntese conclusiva:
- Existem fortes indícios da prática, pelo recorrente, de um crime, doloso, de tráfico de estupefacientes p e p pelo art. 21º, n.º1 do DL 15/93 de 22.01, punível com prisão até 12 anos;
- A natureza do crime, aliada às circunstâncias de o arguido não possuir rendimentos próprios e consumir produtos estupefacientes denotam a existência, no caso concreto, de continuação da actividade criminosa;
- Face ás exigências cautelares do caso concreto só a sujeição do arguido a prisão preventiva se mostra adequada, além de proporcionada à gravidade do crime indiciado.
Neste Tribunal, no visto a que se reporta o art. 416º do CPP o Ex. Mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no qual manifesta a sua concordância com a resposta apresentada em 1ª instância.
Foi cumprido o disposto no art. 417º, n.º2 do CPP.
Corridos os vistos e realizado o julgamento, em conferência, cumpre decidir.
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II. Motivação

Como resulta do enunciado supra, não está em causa o despacho (exarado na acta do interrogatório, com data de 23.08.2008) que decretou a prisão preventiva do recorrente, mas aquele outro, posterior (datado de 19.11.2008), que procedeu à reapreciação da manutenção dos pressupostos daquele primeiro despacho.
Resulta ainda das conclusões que o recorrente, embora impugnando o despacho que procedeu ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva, impugna os fundamentos da própria decisão originária.
Implicando assim a apreciação do recurso que se tenha presente o despacho que determinou a medida, matriz do despacho recorrido.

Nos termos do artigo 28º, n.º 2 da Lei Fundamental, A prisão preventiva tem natureza excepcional, não sendo decretada nem mantida sempre que possa ser aplicada caução ou qualquer outra medida mais favorável prevista na lei.
Princípio que saiu reforçado da 4ª Revisão (1997) que introduziu expressamente no texto do preceito a “natureza excepcional”, que já se extraía do texto original.

Apesar de excepcional, a Constituição (art. 27º, n.º3) prevê a prisão preventiva por fortes indícios da prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão de limite máximo superior a 3 anos.
Tendo deixado de existir a categoria de crimes incaucionáveis as medidas de coacção previstas nos artigos 196º e segs. do CPP encontram-se escalonadas de forma progressiva e proporcionada à gravidade dos crimes indiciados: art. 196 (termo de identidade) – mera constituição de arguido; art. 197º (caução) - crime punível com pena de prisão; art. 198º (apresentação periódica) - crime punível com pena de prisão de máximo superior a 6 meses; art. 199º (suspensão do exercício de funções) -crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 2 anos; art. 200º (proibição e imposição de condutas) – fortes indícios de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos; art. 201º (permanência em habitação) – fortes indícios da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos; 202º (prisão preventiva) – fortes indícios da prática de crime com pena de máximo superior a 5 anos - redacção dada pela Lei 48/2077 de 29.08.

Além dos pressupostos específicos previstos no citado art. 202º do CPP, a prisão preventiva obedece aos requisitos gerais das medidas de coacção enunciados nos artigos 191º a 194º do CPP, onde se destacam:

Art. 191º: a liberdade só pode ser limitada em função de exigências processais de natureza cautelar;

Art. 193º: As medidas de coacção devem ser adequadas às exigências cautelares que o caso requer e proporcionais à gravidade do crime e sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas.

A que acrescem, cumulativamente, os requisitos enunciados no art. 204º do CPP: verificação, no momento da aplicação da medida, de: a) fuga ou perigo de fuga; b) perigo de perturbação do inquérito, nomeadamente para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; c) perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade públicas.
A prisão preventiva não constitui antecipação do cumprimento da pena de prisão que venha ou possa vir a ser aplicada, mas apenas uma medida de coacção de natureza cautelar. Trata-se de uma medida de natureza estritamente cautelar, visando prevenir o perigo de violação de exigências de natureza processual [alíneas a) e b) do art. 204º] e o perigo continuação da actividade criminosa – al. c) do mesmo preceito.
O perigo de continuação da actividade criminosa, não se confunde, necessariamente, com a consumação de novos actos criminosa. Devendo antes ser aferido em função de um juízo de prognose a partir dos factos indicados e personalidade do arguido por neles revelada - “em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido”, nos termos da citada alínea c) do art. 204º.

Como observa o Ac. RC de 02.06.99, sumário disponível em htt://www.trc.pt. – doc. 244/2 – “terá de ser aferido a partir de elementos factuais que o revelem ou o indiciem e não de mera presunção (abstracta ou genérica) ... o perigo terá de ser apreciado caso a caso, em função da contextualidade de cada caso ou situação, pelo que não cabem aqui juízos de mera possibilidade, no sentido de que só o risco real (efectivo) de continuação da actividade delituosa pode justificar a aplicação das medidas de coacção, maxime a prisão preventiva”.


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No caso dos autos a prisão preventiva (cujos pressupostos foram reapreciados pelo despacho recorrido) foi decretada (cfr. despacho certificado a fls. 31-33) com base na existência de fortes indícios da prática, pelo recorrente, de um crime de tráfico de estupefacientes p e p pelo art. 21º, n.º1 do DL 15/99 de 22.01.
Com fundamento na seguinte matéria de facto:
“No dia 23 de Agosto, pelas 05h.40m., na Estrada Nacional n.º 592, junto ao Parque de Campismo da Costa Nova (Aveiro), circulava o veículo automóvel com a matrícula TE-00-00, Opel Corsa, propriedade e conduzido pelo arguido P...;
Nele seguiam como passageiros os arguidos (…), (…) e um 3º indivíduo que, apercebendo-se da operação da G.N.R., fugiu.
No interior do veículo existia entre o banco do condutor e do pendura uma mochila de marca Quechua, de cor preta, contendo no seu interior 273,4 gramas de haxixe; 509,2 gramas de liamba; 119,9 gramas de cocaína; 2 sacos com resíduos de cocaína; um saco contendo várias saquetas de plástico para embalar estupefaciente; uma balança digital de marca “On Balance”, de modelo DX-150.
O veículo automóvel é propriedade do arguido P..., que o conduzia.
O arguido P... tinha na sua posse, entre outros objectos, vários sacos de plástico, um isqueiro de cor preta, com doseador de estupefacientes; 219 selos de droga e liamba, com o peso de 7,6 gramas.
O arguido (…) tinha na sua posse, entre outros objectos, 11,8 gramas de cocaína; 4,3 gramas de haxixe; 38 selos de droga, um frasco de LSD; três picos de LSD; uma bolsa de cor verde, contendo no seu interior uma saco com resíduos de anfetaminas e 4 sacos de anfetaminas, com o peso de 4, 2 gramas.
O arguido (…) tinha na sua posse, entre outros objectos, 23,6 gramas de haxixe e 13,2 gramas de liamba, além de € 430.
O arguido P… é estudante, frequentando o 2.º ano do curso de comunicação e multimédia na Universidade Lusíada de Lisboa.
O arguido (…) foi detido no dia 9/7/05 em Peniche e em 14/2/07, também em Peniche, por tráfico de droga.
O arguido (…) foi detido em 28/5/2006 e 24/8/2005 por tráfico de droga e em 27/1 2/2004 por roubo”.
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Perante isto, a motivação do recurso (sintetizada nas conclusões supra reproduzidas) não questiona a matéria de facto e o crime indiciados. Embora questionando os pressupostos de aplicação da medida de coacção, não põe em causa a matéria de facto concreta acabada de reproduzir, em que a decisão se funda, nem a qualificação jurídica efectuada.
Alega que, ao contrário do que refere a decisão recorrida, tem modo de vida certo - estudante.
Ora a decisão que decretou a medida assentou, desde logo, que “O arguido P… é estudante, frequentando o 2.º ano do curso de comunicação e multimédia na Universidade Lusíada de Lisboa”.
Sendo pois evidente, no contexto da decisão, que a referência à ausência de modo de vida certo se reporta a um modo de vida gerador de rendimento ou proveito económico – fundamento esse que não só não é rebatido pelo recorrente como não é contrariado por qualquer meio de prova ou indício probatório carreado ou emergente dos autos.
Não invoca, tão-pouco, o recorrente a ocorrência de qualquer circunstância superveniente em relação ao despacho que decretou a medida cujos pressupostos foram reapreciados pela decisão recorrida.
Sustenta que a decisão que determinou a medida não se encontra fundamentada, em relação ao recorrente.
Como refere o AC. TC 258/2001, DR IIS de 02.11.2001, a fundamentação (da decisão) tem, pela natureza das coisas, de estar reportada e conexionada com a própria matéria que constitui objecto de decisão, ou seja, a fundamentação tem de aparecer estruturada em função daquilo que se decide ou da matéria questionada/decidida.
Ora, tratando-se, como é o caso, de despacho que procede ao reexame dos pressupostos de anterior decisão, o dever de fundamentação reporta-se, naturalmente, às circunstâncias que possam levar à alteração dos pressupostos dessa anterior decisão que constituem o objecto de reexame. Pois que só essa alteração constitui objecto do despacho de reexame.
Com efeito, já no domínio do CPP de 1929, na redacção introduzida pelo DL 377/77 de 06.09 se entendia que as medidas de coacção, pelas contínuas variações do seu condicionalismo, assentavam no princípio ou estavam sujeitas à condição rebus sic stantibus – cfr. Maia Gonçalves CPP Anotado, 13ª ed., em anotação ao art. 212º.
Perspectiva expressamente consagrada no art. 212º, n.º 2 da Constituição, confirmada pelo Acórdão do Plenário das Secções reunidas do STJ de 24.01.96, DR IS-A de 14.03.96: A medida deve ser revogada ou substituída “logo que se verifiquem circunstâncias que o justifiquem, nos termos do artigo 212º, independentemente da revisão trimestral do art. 213º”.
Devendo assim a decisão manter-se, salva a alteração dos pressupostos em que assentou.
Em conformidade com os princípios atinentes ao caso julgado, assente na identidade de pressupostos das decisões.
Alega o recorrente que a decisão recorrida não fundamenta a existência dos pressupostos do art. 204º do CPP.
No entanto, ao contrário do que sustenta, retira-se, além do mais (cfr. descrição fáctica já efectuada) da decisão que decretou a medida (cfr. fls. 33): “a elevada quantidade de droga que tinha na sua posse (…) que o mesmo se dedica ao tráfico com um já considerável grau de organização, o que permite concluir que é levando o risco da continuação da actividade criminosa. Tanto mais que o arguido não tem modo de vida certo” – cfr. excerto da decisão a fls. 33, com destaques do relator.
Acrescentando a decisão que procedeu ao reexame (cfr. fls.66) “(…) a permanência em habitação não permitiria acautelar o perigo de continuação da actividade criminosa pois, como é sabido, o tráfico de estupefacientes pode ser realizado a partir da habitação onde o arguido se fixaria, ali contactando e recebendo terceiros sem que o sistema de vigilância electrónica seja capaz de controlar tal actividade pois apenas detecta afastamentos do arguido da residência, verificando-se , assim, a manutenção de necessidades cautelares de especial relevância que importa salvaguardar”.
Ora, no que se refere ao perigo de continuação da actividade criminosa invocado na decisão recorrida (e não o perigo de fuga a que o recorrente se refere, certamente por lapso, nas conclusões), como se viu, o despacho recorrido fundamentou-o na natureza dos factos e no modo de actuação tal como emergem da factualidade supra descrita – “quantidade de droga (…) tráfico com um já considerável grau de organização”, refere a decisão.
Por outro lado, a este respeito, para além da descrição dos factos em si, emerge dos autos, com incidência no modo de actuação e organização da actividade indiciada em que a decisão se fundamenta:
- o recorrente (tal como o co-arguido que viajava no bando da frente ao lado do condutor) residia na área metropolitana de Lisboa;
- quando foram interceptados pela GNR (às 5h.40m. da madrugada) dirigiam-se para uma festa de jovens a decorrer junto ao Parque de Campismo da Costa Nova – Aveiro
- como os próprios disseram em interrogatório, vinham de uma “rave” em Idanha-a-Nova;
- o recorrente, mal se apercebeu da existência de uma operação stop, imobilizou a viatura (o que permitiu a fuga de um passageiro do banco traseiro) – o que deixou a GNR desconfiada dos motivos de “receio” e levou a que efectuasse a fiscalização da viatura;
- além dos estupefacientes encontrados na revista ao corpo do arguido e dos companheiros, o arguido transportava na viatura uma mochila contendo os produtos estupefacientes e com eles relacionados supra descritos;
- se é certo que o arguido que todos negam (incluindo o recorrente) que a mochila lhes pertencesse, não é menos certo que o recorrente era o dono da viatura e não podia desconhecer a presença da mochila - colocada entre os dois bancos da frente da viatura – precisamente à mão direita do condutor e dono da viatura;
- quer o ocupante do banco direito da frente quer o identificado no banco traseiro são pessoas claramente relacionados com o consumo, além da detenção de drogas.
Tais circunstâncias revelam um modo de actuação com grande mobilidade e alguma sofisticação, em áreas geográficas diferenciadas, a centenas de quilómetros da área de residência dos arguidos, procurando locais de ajuntamento de jovens, associados ao consumo de estupefacientes.
Aliás, no recurso interposto pelo co-arguido (que questionou logo a decisão que originariamente decretou a medida) este Tribunal da Relação (em acórdão certificado a fls. 79-98) entendeu existir perigo de continuação da actividade criminosa em face do nível organizacional, em função da cumplicidade do meio do tráfico/consumo, rede estabelecida, ausência de recursos do co-arguido.
Fundamentos que se verificam também quanto ao recorrente, apesar de não lhe serem conhecidos antecedentes, saindo reforçados pela circunstância de ser o dono e condutor da viatura que definiu e executou o circuito realizado durante a madrugada por duas “raves”, bem longe da área da sua residência, transportando passageiros portadores e conotados com o consumo de drogas. Sendo praticamente impossível que alguém sem o seu conhecimento colocasse a mochila, dentro do seu automóvel, em local situado bem à sua mão direita.
Acresce a não apresentação, por parte do recorrente, de qualquer juízo de censura sobre os factos que possa dar guarida a uma mudança de atitude ou de corte com o passado que legitime uma tomada de posição prospectiva de afastamento do risco inerente à dependência dos rendimentos auferidos, às cumplicidades inerentes a este tipo de criminalidade - de consenso – e dificuldades para quem esteve submerso no meio dele se desligar e autonomizar.
Além dos hábitos de consumo de estupefacientes desde os 13 anos de idade, assumidos pelo recorrente no interrogatório - cfr. fls. 26.
Hábitos que dão consistência ao invocado perigo de continuação da actividade face à ausência de autonomia económica do recorrente.
A sugerida subsidiariamente aplicação da permanência em habitação com vigilância electrónica foi afastada pela decisão recorrida nos termos a que se fez referência. E o recorrente nada de relevante contrapõe. Não só quanto á afastada adequação e suficiência de tal medida, como ainda quanto á sua exequibilidade em termos de suporte físico efectivo e de autorização/consentimento dos eventuais titulares da habitação.
Não aduzindo, outrossim, qualquer meio de prova no sentido de comprovar o “alegado modo de vida a expensas e em casa de seus pais”.
Sendo certo que tal alegação é contraditória, diga-se, com a invocada convivência em união de facto com uma companheira - cfr. auto de interrogatório, fls. 26.
Impondo-se assim a improcedência do recurso pela insubsistência dos fundamentos invocados.
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III. Nos termos e com os fundamentos expostos, decide-se negar provimento ao recurso. -----
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) UC.