Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1443/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: SERRA LEITÃO
Descritores: FUNDO DE ACIDENTES DE TRABALHO
DESPESAS DE FUNERAL
DE TRANSPORTE
INDEMNIZAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
JUROS DE MORA
Data do Acordão: 05/12/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DA FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: DL Nº 142/99, DE 30/04 .
Sumário: I – Ao FAT compete garantir o pagamento das prestações que forem devidas por acidentes de trabalho, sempre que , por motivo de incapacidade económica ... , não possam ser pagas pela entidade responsável .
II – Sendo as prestações infortunísticas devidas as resultantes da Lei nº 2127, de 3/8/1965, nelas se incluem as despesas pelo funeral e o reembolso dos gastos com transportes, mas não as indemnizações de carácter não patrimonial nem os juros de mora .
Decisão Texto Integral: Acordam os Juizes da Secção Social do T. Relação de Coimbra
Neste processo e por acórdão proferido em 9/6/03, por esta Relação e posteriormente confirmado por douto aresto do STJ , datado de 1/3/01 (que transitou em julgado) foi A... na qualidade de entidade patronal do sinistrado B..., condenado:
1) a reconhecer que o acidente de que foi vítima o João Luís foi um típico e indemnizável acidente de trabalho;
2) consequentemente a pagar aos AA( pais do malogrado trabalhador) e para além do mais, que ao caso não importa;
3) a quantia de 84. 510$00 a título de reparação pelas despesas de funeral
- a quantia de 8.000$00 como reembolso de despesas com transportes;
- a quantia de 2.000.000$00 a título de indemnização por danos não patrimoniais
- juros moratórios á taxa legal
Uma vez que a entidade patronal não comprovou no processo o pagamento de tais quantias, foi instaurada a competente execução, no âmbito da qual não foi possível penhorar nenhum bem, dado que de facto a entidade patronal desapareceu não lhe sendo conhecidos bens passíveis de apreensão
Em vista disso o Ex. mo Sr Juiz da 1º instância determinou que o FAT assegurasse o pagamento das prestações devidas aos pais do trabalhador falecido, na sequência da decisão condenatória proferida nestes autos.
Discordando agravou o FAT, alegando e concluindo:
1-A responsabilidade do FAT pelo pagamento das prestações emergentes de acidentes de trabalho ocorridos antes de 1/1/00, corresponde nos exactos termos àquela que cabia ao ex- FGAP, ou seja de acordo com o estipulado no Anexo à Portaria nº 642/83 de 1/6;
2-Não responde pois por despesas de funeral e despesas de transportes
3-Também a indemnização por danos não patrimoniais se insere no âmbito da responsabilidade subjectiva e como tal excluída da enumeração taxativa das prestações que integram o direito à reparação- Base XVII- estas provenientes da reparação infortunística por acidente de trabalho, que se situa no domínio da responsabilidade sem culpa, ou pelo risco- objectiva- não sendo pois susceptível de ser transferida para o FAT;
4-A obrigação do FAT de pagar as pensões ao sinistrado referido nos autos só surge com o despacho em que o T. Trabalho da F. Foz, ordena o pagamento das prestações da responsabilidade do R A..., por reconhecer a sua impossibilidade de pagamento. Antes de tal despacho , não era o Fundo devedor de qualquer prestação, nunca tendo sido chamado a satisfazer qualquer pagamento, ou seja não se encontrava em mora. Não pode pois ser ordenado o pagamento de juros moratórios.
Contra alegaram os agravados defendendo a justeza do despacho em causa, despacho esse que o Ex. mo Sr. Juiz do Tribunal recorrido, sustentou tabelarmente.
Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Dos Factos:
É a seguinte a factualidade a ter em conta, que aliás já consta da parte expositiva deste acórdão.
1- Neste processo e por acórdão proferido em 9/6/03, por esta Relação e posteriormente confirmado por douto aresto do STJ , datado de 1/3/01 (que transitou em julgado) foi A.... na qualidade de entidade patronal do sinistrado B..., condenado:
a) a reconhecer que o acidente de que foi vítima o João Luís foi um típico e indemnizável acidente de trabalho;
b) consequentemente a pagar aos AA( pais do malogrado trabalhador) e para além do mais que ao caso não importa,
a quantia de 84. 510$00 a título de reparação pelas despesas de funeral
- a quantia de 8.000$00 como reembolso de despesas com transportes;
- a quantia de 2.000.000$00 a título de indemnização por danos não patrimoniais
a) juros moratórios á taxa legal
2- Uma vez que a entidade patronal não comprovou no processo o pagamento de tais quantias, foi instaurada a competente execução, no âmbito da qual não foi possível penhorar nenhum bem, dado que de facto a entidade patronal desapareceu não lhe sendo conhecidos bens passíveis de apreensão
3- Em vista disso o Ex. mo Sr Juiz da 1º instância determinou que o FAT assegurasse o pagamento das prestações devidas aos pais do trabalhador falecido, na sequência da decisão condenatória proferida nestes autos.
Do Direito
Sabe-se que é pelas conclusões das alegações que se delimita o objecto do recurso- artºs 684 n.º 3 e 690º nºs 1 e 3 ambos do CPC-.
Deste modo, a única questão a dilucidar, prende –se com a responsabilização ou não do FAT, pelo pagamento das despesas relativas ao funeral e ao transportes, pela indemnização por danos não patrimoniais e pelo juros moratórios.
Vejamos então:
Como é sabido, o FAT foi criado pelo D.L. 142/99 de 30/4 ( seu artº 1º n.º 1), competindo-lhe, e além do mais que ao caso não importa, garantir o pagamento das prestações que forem devidas por acidentes de trabalho sempre que, por motivo de incapacidade económica objectivamente caracterizada em processo judicial de falência ou processo equivalente, ou processo de recuperação de empresa, ou por motivo de ausência, desaparecimento ou impossibilidade de identificação, não possam ser pagas pela entidade responsável( alínea a) dos mesmos n.º e artº).
O caso de que trata o presente processo, integra-se numa destas situações, pois está perfeitamente provada a incapacidade da entidade responsável( na hipótese a empregadora) solver os seus compromissos perante os titulares do direito à reparação infortunística, derivados da condenação judicial.
Com a criação do FAT, foi determinada a extinção do FGAP, transitando para aquele as respectivas responsabilidades e saldos, nos termos e condições que seriam definidas por portaria dos Ministérios das Finanças e do Trabalho e Solidariedade( artº 15º n.º 2 do citado D.L.).
Este diploma ( Portaria n.º 291/00) datada de 12/5/02 foi publicada no D.R. I- B de 25/5/02 e segundo o seu n.º 1º o FGAP considerava-se extinto a partir de 15/6/02, continuando a assegurar até essa data, o pagamento das pensões por incapacidade permanente ou morte em caso e acidente de trabalho da responsabilidade de entidades insolventes ou equiparadas.
E o seu n.º 2 determinava que os processos do FGAP, referentes a pensões em pagamento ou relativos a responsabilidades já definidas pelos tribunais de trabalho, deveriam ser transferidos para o FAT até 15/5/02, acrescentando o n.º 3 da mesma portaria que as responsabilidades do FGAP, que transitam para o FAT, correspondentes a acidentes de trabalho ocorridos até 31/12/99 ficam limitadas às obrigações legais e regulamentares do anterior fundo.
Poder-se-ia então concluir que a responsabilidade de pagamento do FAT, estava circunscrita às pensões no domínio dos acidentes de trabalho, por incapacidades permanentes e morte( cfr. artº 1º do Anexo à Portaria 624/83 de 1/6.
Com todo o respeito por entendimento diverso, julgamos não será assim.
Na realidade, do que dispõem os aludidos nºs 1 e 2 da Portaria 291/00, resulta, como supra se referiu, que em caso de transferência de responsabilidades do FGAP para o FAT e relativamente aos acidentes ocorridos até 31/12/99, aquelas ficam limitadas às obrigações legais e regulamentares do primeiro.
Mas uma coisa é a “ transferência de responsabilidades, outra a assunção directa de obrigações decorrentes de sinistro laboral, como aliás implicitamente reconhece a agravante nas suas doutas alegações de recurso
No caso em apreço, a responsabilidade do FAT surge em consequência do despacho ora recorrido, verificada que foi a impossibilidade da entidade responsável proceder aos devidos pagamentos e não como resultante de qualquer obrigação que já impendesse sobre o FGAP.
E este despacho foi proferido- e portanto a responsabilidade foi atribuída ao FAT- em 12/1/05 data em que de há muito, como se viu o FGAP estava já extinto.
Pelo que, o FAT é responsável de acordo como estabelecido no já mencionado artº 1º n.º 1 a) do D.L. 142/99 e com a amplitude ali determinada,
Se tal entidade fora extinta , não lhe poderia ser assacada uma responsabilidade definida posteriormente.
Logo não estamos perante uma situação de transferência de responsabilidade, caso em que, então sim, se teria que ter em conta a limitação prevista no n.º 3º da Portaria 291/00.
Ora bem:
De acordo com o disposto no artº 1º nº 1 a) do citado D.L. 142/99 compete ao FAT garantir o pagamento das prestações que forem devidas por acidentes de trabalho sempre que por motivo de incapacidade económica objectivamente caracterizada em processo judicial de falência ou processo equivalente, ou processo de recuperação de empresa, ou por motivo de ausência, desaparecimento ou impossibilidade de identificação, não possam ser pagas pela entidade responsável.
Ora e como se refere no Ac da Rel. Porto de 19/2/04, in C.J. XXIX, I, 225, as responsabilidades do FAT restringem-se às prestações que forem devidas por acidente de trabalho.
“ In casu”, este ocorreu em 7/9/94, sendo- lhe portanto aplicável a L. 2127 de 3/8/65.
Logo as prestações infortunísticas a ter em conta são aquelas que deste diploma constam, a saber: as despesas pelo funeral e o reembolso dos gastos com transportes- cfr. Bases IX b) e XIV da citada L. 2127-.
Mas já não assumem tal característica, quer os juros moratórios, quer a indemnização de carácter não patrimonial.
Efectivamente e relativamente aos primeiros não estão eles previstos na dita Base IX.
E além disso, sabendo-se que a mora se configura como um retardamento por facto imputável ao devedor, na efectivação da prestação que lhe incumbe, prestação essa que ainda é possível cumprir( cfr. artº 804º nº 2 ), nunca o FAT poderia ser responsabilizado pelos ditos juros já que nunca se encontrou em mora.
No que concerne ao pagamento dos danos de carácter não patrimonial- e seguindo o que se escreveu no citado acórdão da Rel. Porto- diremos que a circunstância de o nº 3 da Base XVII, prever a responsabilidade civil por danos morais no caso do acidente se ficar a dever a culpa( lato sensu) do empregador, tal não significa que esta indemnização assuma a natureza de uma prestação devida por acidente de trabalho, uma vez que ela não decorre da lei dos acidentes de trabalho, mas antes da responsabilidade civil em geral.
Não pode portanto ser considerada, como uma prestação devida por acidente de trabalho.
Em suma: o FAT é “ in casu” responsável pelas prestações infortunísticas( para além das outras que não foram questionadas) que são o reembolso dos gastos com os transportes e as despesas feitas com o funeral do malogrado trabalhador.
Termos em que e concluindo, dando-se parcial provimento ao agravo, absolve-se o recorrente do pagamento da indemnização por danos não patrimoniais e pelos juros de mora, mantendo-se no restante o despacho agravado.
Sem custas- artº 2º nº 1 a) e m) do CCJ. -