Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
166/1984.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERREIRA DE BARROS
Descritores: FALÊNCIA
REMUNERAÇÃO
ADMINISTRADOR
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Data do Acordão: 05/13/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Legislação Nacional: ART. 8º DO DL N.º 49213, DE 28.08; ART. 11º DO DL N.º 254/93, DE 15.07 E N.º3 DO ART. 8º DO CPEREF
Sumário: Nos processos instaurados antes da entrada em vigor do CPEREF, aprovado pelo DL n.º 132/93, de 23.04, a remuneração do administrador da falência deve ser fixada em conformidade com o disposto no art. 8º do DL n.º 49213, de 28.08, pois apesar de expressamente revogado pelo art. 11º do DL n.º 254/93, de 15.07, aquela disposição continuou em vigor para os ditos processos, atenta a norma transitória do n.º3 do art. 8º do CPEREF.
Decisão Texto Integral:

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

                                    I)- RELATÓRIO

Por sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Leiria, em 9 de Outubro de 1984 e já transitada em julgado, foi declarada a falência de A...... a requerimento do credor B....., apresentado em 4 de Maio de 1984.

Seguidamente à declaração da falência foram reclamados vários créditos e o Administrador nomeado iniciou, de imediato, a liquidação do activo, sob a orientação do Síndico, tendo o produto da liquidação sido depositado na Caixa Geral de Depósitos.

No apenso de verificação do passivo, o Administrador da falência, - tal como se vê de fls. 656 a 671, 710, 710v e 737 a 741-,  deu o seu parecer, ao abrigo do art. 1226º do CPC, então em vigor, contestando, no todo ou em parte, a existência de alguns dos créditos reclamados, tendo alguns dos credores, cujos créditos foram impugnados, respondido à contestação do Administrador.

Foi ordenado à Secretaria do Tribunal a organização do mapa de todos os créditos reclamados, e sua junção ao processo principal, tal como prevê o art. 1230º do CPC.

Por despacho de 10 de Abril de 1987, exarado a fls. 743v e 744, foi declarada suspensa a instância de reclamação de créditos, com fundamento na pendência de duas acções que corriam por apenso, consideradas prejudiciais, porque influindo na graduação de créditos e na forma de pagamento aos credores privilegiados (Centro Regional de Segurança Social e trabalhadores da falida), em caso de procedência. Nesse mesmo despacho consigna-se ser possível verificar e graduar os créditos reclamados sem necessidade de produção de prova.

As mencionadas duas acções foram definitivamente julgadas por acórdãos do STJ, com as datas de 15 de Março de 1989 e 3 de Novembro de 1992 (cfr. fls. 774 e a 783 do apenso de verificação do passivo e fls. 358 a 360 do processo principal).

Tendo o Administrador falecido no dia 3 de Agosto de 1998, foi nomeado novo Administrador da falência que, uma vez ultimada a liquidação do activo, deu cumprimento ao disposto no art. 1252º do CPC (exame da liquidação), sem que tivesse sido apresentada qualquer reclamação.

Pelo Administrador da falência foi requerido, em 20.01.2003, além do mais,

-a elaboração da sentença de graduação de créditos, sendo certo que todos os créditos reclamados e custas serão pagos na íntegra;

-a elaboração da conta de custas do processo;

-autorização para pagamento dos créditos reclamados;

-fixação da remuneração aos anteriores intervenientes no processo, sendo de opinião que todos os serviços prestados pelo Ilustre Administrador falecido, e que se estima terem sido muitos e complexos, devem ser pagos à família;

-a fixação da remuneração do Administrador em funções.

Junto pela Secretaria, em 09.06.2003, o mapa das reclamações, a que alude o art. 1230º do CPC, foi, em 15.01.2008, proferido despacho a fixar a remuneração dos Administradores da falência, sendo atribuída a quantia de € 3.500,00 ao Administrador em exercício e ao anterior Administrador, já falecido, uma quantia correspondente a 1% do valor total que se encontra depositado após liquidação do activo. Foi ainda ordenado ao Administrador da falência para, em 30 dias, proceder ao pagamento aos credores. Ponderou-se, nesse despacho, que a liquidação do activo traduziu-se em valores depositados que podem satisfazer todos os créditos reclamados, bem como as custas e remuneração aos Administradores da falência, sendo mesmo previsível um valor excedentário avultado. Nessa perspectiva, considerou-se diligência dilatória a verificação e graduação de créditos.

A Ex.ma Magistrada do M.P. não se conformou com tal decisão, dela agravando, tendo extraído da sua minuta de recurso as seguintes conclusões:

1ª-Dispõe o art. 1231º do CPC, aplicável aos presentes autos, que a secretaria organiza e junta ao processo principal, o mapa de todos os créditos reclamados ou indicados pelo administrador, contendo em relação a cada um, nomeadamente, nota de ter sido impugnado e por quem, folha em que se achar a impugnação, e, além disto, lugar em aberto para ser oportunamente preenchido com a menção de julgamento, de ter ou não havido recurso e do resultado deste;

2ª-O referido mapa foi elaborado e encontra-se datado de 09.06.2003 e junto a fls. 445 a 450 do 3º volume dos autos de insolvência, mapa esse onde aparecem créditos impugnados, sendo certo que o mesmo é posterior à relação de créditos reclamados apresentados pelo actual administrador da insolvência e junta a fls. 807 a 814 do 4º volume do apenso de reclamação de créditos, onde igualmente consta a menção de pelo menos um crédito impugnado;

3ª-Efectuado o referido mapa, dispõe o art. 1231º do referido diploma legal, que os créditos não impugnados se consideram reconhecidos e os impugnados não verificados, sendo certo que, junto o mapa das reclamações, é proferido despacho nos termos do art. 510º e 511º do referido diploma legal. Sendo que, se nenhum dos créditos tiver sido impugnado  ou a verificação  dos impugnados não depender de prova a produzir, o saneador tem a forma e o valor de sentença que os declare reconhecidos ou verificados e os gradue em harmonia com as disposições legais, fixando logo a data da sentença. Caso esteja dependente de produção de prova, declaram-se reconhecidos ou verificados os que puderem ser, mas a graduação de todos fica para a sentença final;

4ª-É na sentença de graduação de créditos, conforme dispõe o art. 1235º do CPC, para além do mais, que se gradua em conformidade com a lei, os créditos verificados ou reconhecidos e fixa a data da falência, sendo geral para todos soo bens da falida e particular para os bens a que respeitem direitos reais de garantia;

5ª-Encontrando-se a fls. 43 e segs. do 3º volume dos autos de falência, com a data de 20.01.2003, requerimento do actual administrador da insolvência, onde era requerido, para além do mais, ao Tribunal que “actualizar os titulares e a morada nas contras da massa falida (…); requerer a elaboração da sentença de graduação dos créditos, sendo certo que todos os créditos reclamados, tal como se acham na relação unta são pagos na íntegra, face aos valores existentes; requerer que seja elaborada a conta de custas do processo; requerer autorização para pagamento dos esmoa créditos; requerer a dispensa da apresentação, nas contas finais, dos documentou anteriores, dado desconhecer o seu paradeiro; requerer a fixação da remuneração aos anteriores   intervenientes no processo  (…); requerer a fixação da remuneração do administrador agora em funções (…), e no mapa das reclamações foram assinalados créditos impugnados, não se compreende a decisão, na nossa opinião, sem qualquer fundamento legal, de dispensar a elaboração da sentença de verificação e graduação de créditos;

6ª-Pese embora no requerimento de fls. 803 do 4º volume do apenso de reclamação de créditos, fosse pelo actual administrador da falência para além do mais, solicitada a dispensa do rateio parcial, atento o facto de previsivelmente se encontrar na CGD saldo suficiente (o qual, senão depois do despacho de que ora se recorre foi dado conhecimento nos autos e compreende o valor de fls. 361 e 32º do 3º volume da liquidação do activo), para pagamento das custas (as quais até à presente data não forma contadas) e remunerações dos administradores da falência (que apenas no despacho de que se recorre foram fixadas), atentas as vicissitudes elencadas, não deveria o mesmo ser dispensado em ordem a poderem ser efectuados alguns pagamentos; sendo certo que dispensados não se encontram os autos do rateio final - art.1259º do CPC;

7ª-Os pagamentos que se vierem a apurar dever ser efectuados terão que o ser mediante cheque assinado pelo administrador da falência e pelo actual síndico (que tomou posse em Setembro de 2007), cuja assinatura terá ainda que ser actualizada na CGD;

8ª-Diversos trabalhadores/credores já faleceram, conforme se constata da devolução das cartas enviadas para notificação do despacho de que ora se recorre e juntas no vol. 4º do apenso de reclamação de créditos. Circunstância esta que leva a que se tenha que aquilatar nos autos, quem são os seus herdeiros e no essencial, a quem deverá ser efectuado o pagamento dos créditos sobre a falida. Foi igualmente dada ao processo informação de que o mandatário da requerente da falência já faleceu e bem assim as instalações da mesma já se encontram encerradas;

9ª-Eventuais incidentes de habilitação de herdeiros que possam correr por apenso aos autos ou mesmo recursos que possam ser interpostos, são tributados, pelo que, nesta altura, não é previsível um valor para a conta de custas a efectuar;

10ª-O montante da remuneração fixada aos administradores da falência, tendo em conta os anos e actividades desenvolvidas aparece como dispare, uma vez que, o primeiro dos administradores exerceu funções desde 1984 a 1998, tendo pelo mesmo sido desenvolvidas a maior parte das diligências, nomeadamente liquidação do activo e por sua vez o actual administrador iniciou as suas funções em finais de 2003, com a execução das diligências descritas no despacho de que ora se recorre;

11ª-Não se encontra efectuado o apenso de prestação de contas a que alude o art. 1265º do CPC;

12ª-Foram omitidos actos previstos na lei, conforme decorre das presentes conclusões, nomeadamente e desde logo, sentença de verificação dos créditos o que consubstancia uma nulidade do despacho ora recorrido e subsequente processado, dado que a omissão daqueles actos, violadora da lei processual, é susceptível de influir no exame ou decisão da causa – art. 201º e 755º, n.º1, alínea b) do CPC;

13ª-Igualmente o despacho de que ora se recorre, não especificou, quando dispensou e considerou dilatória a realização da sentença de verificação e graduação de créditos e bem assim a pouca diferença entre os valores da remuneração atribuída aos administradores da falência, tendo em conta os anos e actividades desenvolvidas por um e por outro, os fundamentos de facto e de direito que justificaram aquela decisão, pelo que o despacho ora recorrido viola o disposto nos arts. 893º, n.º1 e 668º, n.º1, alínea b), ambos do CPC, este último ex vi do art. 666º, n.º 3 do referido diploma legal.

Como corolário das conclusões, vem defendida pelo Agravante a revogação do despacho impugnado com fundamento em nulidade, e sua substituição por outro que determine o estrito cumprimento da legislação processual e fixe a retribuição dos Administradores da falência, de acordo com a actividade e anos dispensados por um e por outro.

Não foram produzidas contra-alegações.

Foi mantido o despacho impugnado.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

                                 II)- MÉRITO DO RECURSO

A factualidade com interesse ao julgamento do objecto do recurso decorre dos autos e foi acima relatada.

Sendo o objecto do recurso delimitado, em princípio, pelas conclusões da alegação (arts. 690º, n.º1 e 684º, n.º3, ambos do CPC), coloca o Agravante a julgamento deste Tribunal as seguintes questões:

1ª-Definir se a verificação e graduação dos créditos reclamados constitui, no caso, uma diligência dilatória ou, diversamente, o despacho impugnado sanciona uma nulidade processual;

2ª-Averiguar se o despacho é nulo por omissão dos fundamentos de facto e de direito;

3ª-Fixar a remuneração dos Administradores da falência.

II-1)- Vejamos a 1ª questão.

O processo de falência em apreço foi instaurado em 4 de Maio de 1984, sendo a sua tramitação regulada pelos artigos 1135º a 1325º do Código de Processo Civil, em vigor antes da sua revogação pelo art. 9º do DL n.º 132/93, de 23 de Abril (CPEREF), cujo n.º 3 do art.8º determina que “sem prejuízo do disposto no artigo 5º para a extinção das câmaras de falências, o novo Código não se aplica às acções pendentes à data da sua entrada em vigor”.

A verificação do passivo e ainda a restituição e separação de bens vêm reguladas nos arts. 1218º a 1244º.  Decorre do n.º1 do art. 1231º que “os créditos não impugnados consideram-se reconhecidos; os impugnados são verificados”. O n.º2 desse artigo impõe a prolação de despacho saneador nos termos dos artigos 510º e 511º após a junção do mapa das reclamações. E nos termos do n.º3 “se nenhum dos créditos tiver sido impugnado ou a verificação dos impugnados não depender de prova a produzir, o saneador tem a forma e o valor de sentença que os declare reconhecidos ou verificados e os gradue em harmonia com as disposições legais, fixando logo a data da sentença”. “A graduação dos créditos é geral para os bens da massa falida e particular para os bens a que respeitem direitos reais de garantia” e “na graduação dos créditos não é atendida a preferência resultante de hipoteca judicial nem a resultante da penhora, mas as custas pagas pelo autor ou exequente são equiparadas às do processo de falência para o efeito de saírem precípuas da massa”- n.sº 2 e 3 do art. 1235º. O art. 1244º consagra a precipuidade das custas e das despesas da administração  em relação a todo o produto da massa falida.

Salvo o devido respeito, e contrariamente ao entendimento perfilhado no despacho recorrido, jamais a sentença que reconheça e verifique os créditos reclamados no processo de falência e os gradue de harmonia com as disposições legais, pode configurar diligência processual dilatória. E mesmo que o produto da liquidação do activo da falida, que se encontra depositado, seja suficiente para pagamento dos créditos reclamados, das custas, das despesas da administração e das remunerações devidas ao administrador da falência. Sendo embora certo que o fim primário da falência, como execução universal, seja o pagamento aos credores mediante liquidação do património do falido e, por isso, razoável que o produto da liquidação seja atribuído aos credores com a possível brevidade, prevendo mesmo os arts. 1254º e 1255º, respectivamente, pagamento aos credores preferentes e rateios parciais.

Os credores do falido ao reclamar a verificação dos seus créditos, quer comuns, quer preferenciais, têm de provar a existência e natureza dos créditos, e apenas serão pagos se reconhecidos e verificados pelo tribunal. Reconhecidos porque não impugnados e verificados conforme prova produzida. Apenas serão atendidos nos rateios, quer parciais, quer finais, os créditos reclamados cuja existência, natureza, validade e exigibilidade o tribunal declare e gradue em conformidade com a lei.  Não basta, como decorre claramente da lei adjectiva, a simples reclamação do crédito para que este seja atendido na falência, então, nesse caso, até seria despicienda a contestação dos créditos reclamados por parte dos credores, do falido ou do administrador da falência e estaria aberta a porta a todos os abusos. Como prevê até o n.º1 do art. 1258º, “havendo recurso da sentença de verificação e graduação dos créditos ou protesto por acção pendente, consideram-se condicionalmente verificados os créditos dos recorrentes ou protestantes para o efeito de serem atendidos no rateio”.

 

No caso ajuizado, e não obstante ter o Administrador da falência informado nos autos que o produto da liquidação do activo é suficiente para pagar os créditos reclamados e custas, foram até impugnados vários créditos reclamados, como melhor se vê da do parecer do Administrador da falência que, durante vários anos, empreendeu as diligências várias visando a liquidação dos bens da falida.

Mas, de qualquer modo, antes do pagamento aos credores em rateio final, há lugar à prestação de contas por parte do Administrador (art. 1261º a 1265º), contas essas que se destinam a apurar o saldo da falência, do qual sairão as verbas para pagamento das custas e encargos da falência e dos créditos verificados. As custas do processo de falência e seus apensos, bem como a remuneração do administrador, constituem encargos da massa falida, a determinar através da conta nos termos do art. 11º do DL n.º 49.213, de 29.08.1969, e também o seu pagamento goza de precipuidade (art. 1244º). O rateio dos créditos reconhecidos e verificados são pagos, de acordo com o plano de rateio, nos termos do n.º1 do art. 12º do citado diploma, pelo que sobrar do saldo homologado das contas da administração, depois de deduzidas as  custas e remuneração do administrador ou o valor apurado na conta da falência. Ou seja, antes do rateio final do produto da liquidação deve ser organizada a conta de custas em seguida ao julgamento das contas da administração. Importa, pois, no caso presente observar a tramitação processual, a começar pelo disposto no art. 1231º do CPC.

Torna-se evidente que o despacho impugnado sanciona nulidade processual ao determinar o pagamento aos credores reclamantes em rateio final, sem que previamente estejam verificados e graduados os créditos, sem a fixação da data da falência, sem a prestação de contas da administração e ainda sem a elaboração da conta de custas. É dada  guarida a manifesto desvio do ritualismo previsto na lei, omite-se toda uma série de actos processuais, com relevância no exame e decisão da causa (n.º1 do art. 201º do CPC). E de nada vale argumentar que a tramitação processual omitida reveste carácter dilatório, porque o produto da liquidação do activo, que se encontra depositado, assegura o pagamento dos créditos reclamados e custas da falência, havendo até remanescente.

II-2)- Examinemos, agora, a 2ª questão.

Vem arguida a nulidade do despacho sob recurso, porque, alegadamente, não especificou os fundamentos de facto e de direito ao prescindir da sentença de verificação e graduação de créditos e bem assim a pouca diferença entre os valores da remuneração atribuída aos administradores da falência.

Como é sabido e recorrentemente sublinhado na jurisprudência, a nulidade da sentença ou despacho por omissão dos fundamentos de facto e de direito, prevista na alínea b) do n.º1 do art. 668º do CPC, só ocorre quando a falha total ou absolutamente a fundamentação e não quando a motivação seja apenas deficiente. Não se confundindo também tal nulidade com o erro de julgamento. Ora, no caso vertente, não se vislumbra total falta de fundamentação do despacho que prescinde da verificação e graduação dos créditos reclamados e fixou a remuneração devida aos Administradores da falência. Improcede, pois, a arguição de nulidade.

II-3)- Atentemos, por fim, na 3ª questão.

Como se vê da decisão recorrida, ao Administrador inicialmente nomeado- Dr. César Valente- foi fixada a remuneração equivalente a 1% do valor total do produto da liquidação que se encontra depositado. Tal Administrador exerceu funções até à data do seu falecimento ocorrida em 3 de Agosto de 1998, tendo levado a cabo, nesse lapso de tempo, a completa liquidação do activo. O actual Administrador da falência - Dr. C.....- foi nomeado por despacho de 18 de Outubro de 2002 e a sua remuneração foi fixada em € 3.500,00.

Na fixação da remuneração do Administrador, inicialmente nomeado, atendeu-se ao disposto no n.º1 do art. 8º do DL n.º 49.213, de 29 de Agosto de 1969, que revogou o art. 80º do Código das Custas. Decorrendo dessa norma que nos processos e falência ou insolvência, a administração e a liquidação da massa são remuneradas com uma importância que resulta da aplicação de taxas sobre o valor da falência ou insolvência. Excedendo o valor de 2.000.000$00 a taxa a aplicar é de 1%. O valor da falência ou insolvência é encontrado pela aplicação da alínea m) do Código das Custas de então, ou seja, corresponde ao activo liquidado.

Já no tocante à remuneração do actual Administrador da falência atendeu-se ao disposto no art. 5º do DL n.º 254/93, de 15 de Julho, onde é regulada a remuneração do liquidatário judicial, norma que remete para o art. 34º do CPEREF[1].

Entendemos, porém, que nos processos de falência instaurados antes da entrada em vigor do CPEREF, a remuneração do administrador da falência deve ser fixada em conformidade com o disposto no art. 8º do DL n.º 49213, de 28.08, pois apesar de expressamente revogado pelo art. 11º do DL n.º 254/93, de 15 de Julho, aquela disposição continua a vigorar para os ditos processos atenta a norma transitória do n.º3 do art. 8º do CPEREF[2].

Sendo assim, a remuneração total devida aos Administradores não poderá exceder 1% do valor do activo liquidado, por aplicação do n.º1 do art. 8º do DL n.º 49213, de 29 de Agosto de 1969, a determinar na conta das custas da falência. E tendo a administração sido exercido, no caso presente, por mais que um Administrador, a remuneração será fixada em proporção da qualidade e quantidade dos serviços prestados e diligência empregue por cada um deles, a fixar, pois, ao tempo da elaboração da dita conta de custas.

Consequentemente, apesar de ter sido requerida, é intempestiva a fixação da remuneração dos Administradores, que deve ser determinada proporcionalmente aquando da contagem das custas da falência e não podendo, na sua globalidade, exceder 1% do valor do activo liquidado.

Neste âmbito, também não é de manter o despacho sob exame.

                                       III)- DECISÃO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acorda-se em:

1-Conceder provimento ao recurso.

2-Revogar o despacho impugnado que deve ser substituído por outro que observe o ritualismo previsto na lei processual, sendo a remuneração dos Administradores oportunamente determinada na conta de custas da falência.

Sem custas (alínea g) do n.º 1 do art. 2º do Código das Custas).


[1] Presentemente a remuneração do administrador da insolvência está prevista nos arts.19º a 27º do CIRE, que remete para a Portaria n.º n.º 51/2005, de 20 de Janeiro.  E tal regime só é de aplicar aos processos instaurados após a sua entrada em vigor do CIRE, como decorre do n.º 9 do art. 28º (norma transitória).
[2] Cfr., neste sentido, os acórdãos do STJ, de 15.03.2001 e de 30.03.2006,  acessíveis na base de dados do STJ, respectivamente, P. 06B878 e P. 01B231 e, ainda, os acórdãos proferidos no P. 06A2199, de 31.10.2006, no P. 083497, de 20.05.1993 e no P. 062918, de 09.01.1970.