Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1747/17.8T8ACB-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
ADMINISTRADOR JUDICIAL PROVISÓRIO
NOMEAÇÃO
Data do Acordão: 11/07/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA, ALCOBAÇA, JUÍZO DE COMÉRCIO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 17.º C, N.º 3, AL. A) E 52.º DO CIRE
Sumário: 1. No âmbito de um processo especial de revitalização, em sede de nomeação do administrador judicial provisório, a regra é da aleatoriedade, a não ser que sejam exigidos conhecimentos especiais para o bom desempenho deste cargo.
2. A nomeação tem de recair sobre pessoa que conste das listas oficiais e processa-se por meio de sistema de sorteio informático que assegure a aleatoriedade da escolha e a distribuição em idêntico número dos administradores judiciais nos processos.

3. A faculdade de o requerente do processo especial de revitalização indicar a pessoa que deverá ser nomeada para administrador judicial provisório, e a consequente possibilidade de o juiz atender a essa indicação, está restringida aos casos de processos em que seja previsível a existência de atos de gestão que requeiram especiais conhecimentos.

Decisão Texto Integral:

            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

           

“A... , SA”, já identificada nos autos, requereu PER, alegando que tinha várias dívidas vencidas e não pagas, encontrando-se em difícil situação financeira, mas, ainda, com viabilidade económica, como melhor consta do requerimento inicial de tal pedido, aqui junto, de fl.s 3 a 11.

No mesmo requerimento, solicitou a nomeação de Administrador Judicial Provisório, em que requer seja indicado como tal a pessoa que ali identifica, com escritório na cidade de (...) , que justifica da seguinte forma:

“D) Do Administrador Judicial Provisório:

40º

Como resulta de tudo o supra exposto o acompanhamento do presente processo, bem como das inerentes negociações reveste-se de especial complexidade.

41º

Por isso, e sem querer faltar ao respeito a qualquer Senhor Administrador de Insolvência, não será qualquer um daqueles que estará habilitado a desempenhar o cargo.

42º

Isto porque, é necessário tempo para se tomar conhecimento de todas as questões essenciais, nomeadamente quanto ao funcionamento das requerentes, as interligações entre elas, as especificidades de cada uma, as características dos respectivos negócios, a composição dos activos e dos passivos, as relações com os principais credores, etc….

43º

Para além do conhecimento dos assuntos acima referidos no artigo precedente, o Administrador Judicial Provisório terá ainda, nos termos do disposto no artº.17º-E do CIRE, que fazer o acompanhamento da gestão da requerente,

44º

o que só poderá ser feito por alguém que tenha conhecimentos e esteja habilitado a praticar actos de gestão.

45º Por isso, a requerente antes de apresentar o presente processo, contactou um Administrador de Insolvência constante da lista oficial, Dr. B..., sócio da sociedade C... , Lda.”, com sede na Rua do (...) (...) ,

46º

a quem solicitou todo o apoio necessário na preparação do presente processo,

47º

na compilação da documentação necessária ao presente processo.

48º

O Sr. Dr. B... está especialmente habilitado a praticar actos de gestão,

49º

e tem neste momento um conhecimento substancial da requerente e do negócio da mesma.

50º

Daí que seja intenção da requerente propor a nomeação do Sr. Dr. B... para Administrador Judicial Provisório nos presentes autos.”.

Conforme consta da certidão que antecede, na parte atinente, de fl.s 299, foi liminarmente admitido o requerimento inicial de PER, no qual, relativamente à designação do Administrador Judicial, se exarou o seguinte:

“Mostrando-se reunidos os pressupostos formais legalmente previstos nos artigos 17.º-A a 17.º-C do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, ao abrigo do disposto no artigo 17.º-C, n.º 4 do mesmo diploma, nomeio administrador judicial provisório da requerente « A..., S.A.», por sorteio do sistema informático de selecção aleatória de Administradores Judiciais, a Dra. D...., com domicílio profissional na Rua (...) (artigos 32.º, n.º 1 do CIRE e 13.º da Lei n.º 22/2013, de 26 de Fevereiro).

As razões avançadas para nomeação do indicado Administrador Judicial Provisório não se afiguram suficientemente fortes para afastar a regra legal ínsita no mencionado artigo 13.º da Lei n.º 22/2013, de 26 de Fevereiro, que visa assegurar a rotatividade das nomeações e a distribuição equitativa de processos.”.

Inconformada com tal decisão, na parte em que não atendeu nem conheceu do seu pedido de nomeação do administrador da insolvência, interpôs recurso a requerente “ A..., SA”, recurso, esse, que veio a ser admitido como de apelação, com subida imediata, em separado, e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 403), apresentando as seguintes conclusões:

I

O poder de nomeação do Administrador Judicial Provisório é do juiz, mas que tal poder só será verdadeiramente discricionário na falta de indicação, ou nos casos de simples indicação daquele na petição inicial sem qualquer fundamentação factual.

II Quando há alegação factual com vista à nomeação de Administrador Judicial Provisório em processo especial de Revitalização, o poder conferido ao juiz através das disposições conjugadas dos artsº.52º, nºs.1 e 2, 17º-B, nº4, e 32º, nº1, todos do CIRE, não é totalmente discricionário, devendo sempre a decisão de indeferimento da nomeação da pessoa sugeria para o exercício do cargo, ser devidamente fundamentada, com explicitação das razões de facto e de direito que alicerçam o indeferimento, pro força do disposto no artº.154º do Cód. Proc. Civil ex vi artº.17º, nº1, do CIRE, e artº.205º, nº1, da CRP.

III

A invocação em singelo da regra legal prevista no artº.13º da Lei n.º 22/2013, de 26 de Fevereiro, ou de qualquer outra normas relativa às regras de nomeação do Administrador Judicial Provisório, apenas funcionará nos casos em que o juiz proceda à nomeação do mesmo por falta de indicação pelo requerente, ou por um credor, ou no caso em que tal indicação não ter sido acompanhada de qualquer tipo de fundamentação factual.

IV

In casu, não constam da douta decisão aqui em crise as específicas razões porque o Meritíssimo Tribunal a quo considera insuficientes as razões invocadas pela recorrente para a nomeação do Dr. B... como Administrador Judicial Provisório, desconhecendo-se se aquele Meritíssimo Tribunal entende que deveria ter sido alegada mais alguma factualidade, e, em caso afirmativo, qual a que está em falta; não se consegue também saber se as razões invocadas pela recorrente são suficientes mas se, no caso concreto, não se justifica a nomeação do Administrador Judicial Provisório indicado pela recorrente devido à própria natureza da situação; do mesmo modo, não há qualquer elemento que permita fundamentar o entendimento da razão porque nesta situação concreta o Meritíssimo Tribunal a quo deu prevalência ao disposto no artº. 13.º da Lei n.º 22/2013, de 26 de Fevereiro, quando o mesmo salvaguarda expressamente as regras do CIRE em matéria de nomeação do Administrador Judicial Provisório.

V

Por outras palavras, in casu, o Meritíssimo Tribunal a quo exerceu o seu poder jurisdicional de forma arbitrária, não sendo possível à recorrente, ou a qualquer outra pessoa colocada em posição similar à mesma, perceber qual o itinerário cognoscitivo e valorativo que levou ao indeferimento da sua pretensão, uma vez que a douta decisão aqui em crise é totalmente omissa quanto às razões que, concretamente, o levaram a rejeitar a pretensão da recorrente.

VI

Face ao supra exposto, constata-se que, atento o disposto no artº.615º, nº1, alínea b), do Cód. Proc. Civil, o douto despacho aqui em crise é nulo, por falta de fundamentação, nulidade essa que desde já aqui se argui para todos os devidos e legais efeitos.

VII

Existe uma particularidade que resulta do próprio processo – lista de credores e declarações previstas no artº.17º-C, nº1 do CIRE, na redacção dada pelo D.L nº79/2017, de 30 de Junho – que se prende com o facto de a aprovação do Plano de Revitalização estar totalmente dependente de um banco cujo departamento que acompanha a recorrente

tem sede no Porto, onde também se encontram os serviços administrativos da mesma, as quais se situam a cerca de 100m do escritório do signatário, que tem outros processos em conjunto com o Dr. B...e com quem está em contacto quase diário.

VIII

Na preparação do presente processo, nomeadamente nos contactos e negociações com os principais credores da recorrente a intervenção do Dr. B...foi decisiva, na medida em tem conhecimento pessoal com os responsáveis do departamento do banco que acompanha a recorrente – Novo Banco -, tendo sido o próprio a diligenciar junto daquele a obtenção da declaração prevista no nº1 do artº.17º-C do CIRE, e também a colaborar com a Administração da recorrente como na elaboração do próprio Plano de Recuperação.

IX

A recorrente solicitou os serviços do Dr. B... para a acompanhar nesta fase difícil que atravessa, sendo que numa empresa com objecto similar ao da recorrente, detida pelos mesmos accionistas da recorrente, com os mesmos Administradores, já tinha sido pedida a intervenção daquele, tendo o mesmo sido nomeado pelo tribunal no processo especial de revitalização que corre termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, sob o nº2434/17.278LRA, Juízo do Comércio, J1, com a particularidade de que a fundamentação factual foi precisamente a mesma que, ipsis verbis, foi invocada nos presentes autos.

X

Tendo em conta o disposto no artº.32º, nº1, do CIRE, a factualidade alegada pela recorrente para fundamentar a sua pretensão de ser nomeado como Administrador Judicial Provisório o Dr. B... é suficiente, pelo que, ao não entender assim, violou o Meritíssimo Tribunal o disposto na citada norma.

Nestes termos e mais de Direito que V.Exªs. doutamente suprirão, deve o presente recurso

ser julgado provado e procedente e, por via disso, ser revogada a douta decisão recorrida, sendo substituída por outra que contemple as conclusões atrás aduzidas, e decrete a nomeação do Dr. B... como Administrador Judicial Provisório, tudo

com as legais consequências.

Decidindo deste modo, farão V.Exªs., aliás como sempre, um acto de INTEIRA E SÃ JUSTIÇA.

            Não foram apresentadas contra-alegações.

            Dispensados os vistos legais, há que decidir.

            Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir:

            A. Se a decisão recorrida padece da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC e;

B. Se deve ser designada para o exercício do cargo de administrador judicial, a pessoa, para tal, indicada pela ora recorrente, no seu requerimento inicial.

            Os factos a ter em conta são os que constam do relatório que antecede.

            A. Se a decisão recorrida padece da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC.

A ora recorrente defende que assim é porque a opção por pessoa diferente da por si indicada, para exercer as funções de administrador da insolvência, foi feita sem qualquer fundamentação.

O artigo 615, n.º 1, al. b), CPC, sanciona com a nulidade a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.

            Para que a sentença sofra de nulidade de falta de fundamentação, é necessário que haja falta absoluta, quer relativamente aos fundamentos de facto quer aos de direito e não já uma justificação deficiente, incompleta ou não convincente – cf. A. Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, in Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, a pág. 669.

            No mesmo sentido, Lebre de Freitas, ob. cit., a pág. 669 e onde se referem, no mesmo sentido alguns Arestos do STJ.

            Isto porque, as decisões devem ser sempre fundamentadas (artigos 205.º, n.º 1, da CRP e 158.º, n.º 1, CPC) e a falta de fundamentação constitui nulidade, desde que se verifique a falta absoluta de fundamentos, quer estes respeitem aos factos quer ao direito, não acarretando tal vício uma fundamentação lacónica, incompleta, deficiente ou errada, a qual apenas afecta o valor doutrinário e persuasivo da decisão.

            A nível jurisprudencial, também neste sentido, o Acórdão do STJ, de 12/07/2007, Processo 06S4104, disponível in http://dgsi.pt.jstj e os desta Relação de 20/01/2004, Processo n.º 2294/03 e de 14/12/2005, Processo 3533/05, ambos disponíveis in http://www.trc.pt.

           

            Ora, compulsando a decisão recorrida, constata-se que na mesma, embora, reconhece-se, em termos parcos, se justificou a opção tomada – designação aleatória do Administrador Judicial, pelo que, salvo o devido respeito por contrária opinião, não padece a mesma da nulidade que lhe assaca a recorrente.

            Efectivamente, a mesma não padece da nulidade da al. b), porquanto na mesma se refere a razão pela qual se desatendeu a indicação da requerente, nos moldes que da mesma constam e que acima se transcreveram.

            Ali se refere, como fundamento para tal, que não foram invocados motivos que afastem a nomeação do Administrador Judicial por sorteio do sistema informático de selecção aleatória, do que decorre, como consequência, que do disposto no artigo 32.º, n.º 1, do CIRE, este preceito não impõe que o juiz acate a indicação feita pela parte, nesse sentido.

            A requerente pode discordar da mesma, mas a fundamentação (que, reitera-se, podia e devia ser mais extensa) consta da decisão em causa, pelo que, nos expostos termos, não se verifica a invocada nulidade.

            De resto, refira-se que no processo a que se alude na conclusão IX.ª, conforme consta de fl.s 345, também apenas se consignou que “encontrando-se reunidos os pressupostos legais nomeia-se como administrador provisório, o indicado pela requerente em face dos motivos invocados para tal …”.

            Pelo que, quanto a esta questão, improcede o recurso.

B. Se deve ser designada para o exercício do cargo de administrador judicial, a pessoa, para tal, indicada pela ora recorrente, no seu requerimento inicial.

No que a esta questão concerne, passamos a seguir, o por este Colectivo já anteriormente decidido, designadamente, por último, na Apelação n.º 1932/17.2T8VIS-B.C1, de 19 de Setembro do corrente ano.

De acordo com o disposto no artigo 17.º C, n.º 3, al. a), do CIRE, na decisão que defira liminarmente o PER, o juiz deve nomear o administrador judicial provisório, aplicando-se o disposto nos artigos 32.º a 34.º.

            Sendo que, nos termos do seu artigo 52.º, n.º 1, a nomeação do administrador da insolvência é da competência do juiz.

            E de acordo com o n.º 2 do artigo 52.º do CIRE (na redacção que lhe foi dada pelo DL 282/2007, de 7/8):

            “Aplica-se à nomeação do administrador da insolvência o disposto no n.º 1 do artigo 32.º, podendo o juiz ter em conta as indicações que sejam feitas pelo próprio devedor ou pela comissão de credores, se existir, cabendo a preferência, na primeira designação, ao administrador judicial provisório em exercício de funções à data da declaração da insolvência.”.

            Estipulando este artigo 32.º, n.º 1 (na mesma redacção) que:

            “A escolha do administrador judicial provisório recai em entidade inscrita na lista oficial de administradores de insolvência, podendo o juiz ter em conta a proposta eventualmente feita na petição inicial no caso de processos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos.”.

            Em sentido idêntico se pronuncia o artigo 2.º, n.os 1 e 2, da Lei 32/2004, de 22/7.           Daqui resulta, pois, que o devedor, ao apresentar-se à insolvência ou o requerente de PER, pode indicar a pessoa que, no seu entender, desempenhe as funções de administrador da insolvência/administrador judicial provisório, desde que respeitados os requisitos legais previstos nos preceitos ora citados.

            Depois, como destes resulta (designadamente, do n.º 2 do artigo 52.º do CIRE), ao efectuar a nomeação o juiz pode ter em conta as indicações que sejam feitas pelo devedor ou pela comissão de credores.

            De realçar, neste domínio, que na redacção original do artigo 52.º, n.º 2, do CIRE se referia que “devendo o juiz atender igualmente às indicações que sejam feitas pelo próprio devedor …”, ao passo que na redacção ora em apreço se passou a mencionar “podendo o juiz ter em conta as indicações que sejam feitas pelo próprio devedor …”.            O mesmo se verifica no artigo 32.º, n.º 1, onde se utiliza o vocábulo “podendo”.

Ou seja, a nova e actual redacção do n.º 2 do artigo 52.º do CIRE, veio reforçar o poder decisório do juiz quanto à nomeação do administrador da insolvência, uma vez que contrariamente à versão original, agora, o juiz pode ter em conta as indicações, quando antes, devia atendê-las – neste sentido, vejam-se Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE, Anotado, edição de 2008, pág.s 243 a 245.

            No entanto, acrescentam os mesmos Comentadores que “Confrontado com indicações contrárias do devedor e da comissão de credores, o tribunal não está obrigado a preferir nenhuma delas nem sequer é obrigado a optar por qualquer. Mas deverá, como é próprio das decisões, fundamentar a escolha, designadamente quando se afaste das indicações recebidas ou quando privilegie alguma delas”.

            Ora, no caso em apreço, a requerente indicou a pessoa que devia ser nomeada administrador judicial, invocando que o acompanhamento do processo e inerentes negociações “reveste-se de especial complexidade”, pelo que não será qualquer administrador de insolvência “que estará habilitado a desempenhar o cargo”.

            Quanto a isto apenas cumpre referir não existirem “classes” de administradores.

            Fazendo parte da lista oficial, qualquer deles estará apto a desempenhar o cargo em causa, bem como a controlar a gestão da requerente.

            Igualmente, não consideramos relevante o facto de a sede do contencioso de um banco credor se situar perto do escritório do Ex.mo Mandatário da requerente ou de este ter outros processos em conjunto com a pessoa indicada pela recorrente.

            De igual modo, irreleva o facto de o administrador indicado conhecer, pessoalmente, os responsáveis do banco do departamento que acompanha a recorrente.

            Por certo, a este nível, os negócios bancários não se pautarão (ou não o devem) por relações pessoais. Como diz o povo “amigos, amigos, negócios à parte”.

            Em suma, a regra é a de que a escolha do administrador judicial provisório, no âmbito de um PER, tem de recair sobre pessoa que conste das listas oficiais, processando-se a respectiva escolha por meio de sistema informático que assegure a aleatoriedade da escolha e a distribuição em idêntico número dos administradores judiciais nos processos – cf. artigos 52.º, n.º 2 e 32.º, n.º 1, do CIRE e artigo 13.º da citada Lei n.º 22/2013.

            Só assim não sendo nos casos em que seja previsível a existência de actos de gestão que requeiram especiais conhecimentos.

            Ora, salvo o devido respeito, a recorrente não alegou quaisquer factos dos quais se possa extrair a conclusão de que este processo/caso exija por parte do administrador judicial provisório actos de gestão que demandem especiais conhecimentos.

            Isto é, nada resulta dos autos que permita supor que se trata de uma situação que se revista de excepcionais contornos – por cotejo com a maioria das situações de PER – que o diferencie dos demais; que seja uma “situação especial” a exigir os tais “especiais conhecimentos”.

            A intenção do legislador ao redigir uma norma como a do artigo 32.º, n.º 1 do CIRE, complementada com o supra referido artigo 13.º, n.o 1 e 2, é a de que a distribuição de processos pelos diversos administradores judiciais, que constem das listas oficiais, se faça por meio de sistema informático que assegure a aleatoriedade da escolha, postergando as “escolhas ou conveniências” das empresas que recorrem ao PER, a não ser que, justificadamente, se demonstre a existência de vantagem em se nomear o indicado, o que, sempre terá de se basear no critério indicado na parte final do n.º 1 do artigo 32.º do CIRE; isto é, repete-se, só “no caso de processos em que seja previsível a existência de atos de gestão que requeiram especiais conhecimentos”, o que in casu, não resulta do alegado, nem se vislumbra.

            Precisamente, a decisão recorrida, fazendo apelo à regra da aleatoriedade que emana do artigo 32.º, n.º 1, do CIRE, procedeu a sorteio, designando/nomeando a pessoa sorteada.

Como resulta dos preceitos citados, a M.ma Juiz a quo não estava obrigada a seguir a indicação dada pela requerente e justificou a sua opção, como legalmente se lhe impunha.

É para nós indubitável que, em casos como o presente, o Juiz está obrigado a fundamentar a sua opção quanto à nomeação do administrador da insolvência, – neste sentido, podem ver-se os Acórdãos deste Tribunal da Relação, de 11/07/2012, Processo n.º 134/12.9TBPBL, disponível in http://www.dgsi.pt/jtrc e da Relação de Guimarães, de 27/01/11 e de 22/02/11, respectivamente, Processos 6811/10.1TBBRG-A.C1 e 5433/10.1TBBRG-B.C1, disponíveis in http://www.dgsi.pt/jtrg.

            Mas, salvo o devido respeito por opinião em contrário, também pensamos que resulta do disposto nos artigos 32.º, n.º 1 e 52.º do CIRE, que em sede de nomeação de administrador da insolvência ou administrador judicial provisório, a regra é da aleatoriedade, a não ser que sejam exigidos conhecimentos especiais para o bom desempenho deste cargo.

            Neste sentido e por último, vejam-se o Acórdão da Relação de Lisboa, de 17 de Julho de 2017, Processo n.º 3862/16.6T8VFX-A.L1.2 e o da Relação do Porto, de 12 de Janeiro de 2016, Processo n.º 6304/15.0T8VNG-A.P1, ambos disponíveis no respectivo sítio do itij.

            Ora, como acima já referido, a requerente, não justificou, em termos concretos, o porquê de dever ser nomeado o administrador que indica, designadamente, como a lei o refere, que se trata de caso em que se exijam especiais conhecimentos e a pessoa indicada os possua (e por contraponto, que a nomeada não os detenha), sendo que, nos termos do disposto no artigo 32º, n.º 2 do CIRE, na redacção que lhe foi dada pelo DL282/2007, de 7/8, o deveria fazer.

            Por outro lado, como já dito e decorre do disposto no artigo 13.º, n.º 2 da Lei 22/2013, de 26/2, a nomeação a efectuar pelo juiz processa-se por meio de sistema informático que assegure a aleatoriedade da escolha e a distribuição em idêntico número dos administradores da insolvência nos processos.

            Como decorre da decisão recorrida (cf. fl.s 299), foi esse o procedimento adoptado.

            Isto, sem esquecer que, como acima, também, já referimos, o juiz não está vinculado à indicação que é feita pelos requerentes, pelo que nada obstava a que nomeasse como administrador da insolvência pessoa diferente da indicada pela requerente.

            Pelo que, atento o quanto a tal já exposto, não vemos razões para, agora, nomear como administrador o indicado pela requerente, uma vez que tal indicação, para além de não estar motivada, nos termos legalmente exigíveis (cabendo dizer que se as partes devem exigir que as decisões judiciais sejam devidamente fundamentadas, também quando formulam uma pretensão, a terão de fundamentar, nos moldes legalmente exigíveis), não vincula o juiz.

            Impõe-se, pois, concluir que a decisão recorrida respeitou os ditames legais aplicáveis e não sofre dos vícios que lhe assaca a recorrente.

            Assim, também, quanto a esta questão, improcede o presente recurso.

Nestes termos se decide:

Julgar improcedente o presente recurso de apelação, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas (deste recurso) a suportar pela requerente.

Coimbra, 07 de Novembro de 2017.