Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1512/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: BELMIRO ANDRADE
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
ASSINATURA DIGITAL
Data do Acordão: 10/13/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 1º JUÍZO CRIMINAL - TRIBUNAL JUDICIAL DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: PORTARIA N.º 1178-E/2000 DE 15 DE DEZEMBRO, ART. 3 N° 2 DO DL 200/2003 E PORTARIA 985-A/2003, DE 15 DE SETEMBRO
Sumário: A exigência da assinatura digital não se aplica ao requerimento executivo.
Com efeito foi expressamente excepcionado que “não se aplica ao requerimento executivo o disposto na Portaria n.º 1178-E/2000 de 15 de Dezembro” - Portaria esta que, na redacção dada pela Port. N.º 8/2001 de 03.01, estabelece, no n.º3 a necessidade da aposição de assinatura digital certificada do signatário.
Decisão Texto Integral: 1

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA


1. A... deduziu pedido de indemnização civil, fundamento base em responsabilidade civil conexa com a criminal, no processo de onde foi extraída a certidão para julgamento do presente recurso.
Nesse processo, foi proferida sentença final que, na parcial procedência daquele pedido, condenou o arguido B..., melhor id. nos autos, a pagar à ora recorrente (A....),a quantia de € 396,73 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde o dia 20.01.200 até integral pagamento.

2. Transitada em julgado aquela decisão, através de correio electrónico, deu entrada naquele tribunal o requerimento executivo e respectivos anexos certificados a fls. 3 e 5 a 9 dos presentes autos.
Sobre tal expediente lavrou e Senhor Secretário Judicial a seguinte informação: “O e-mail correspondente à presente cópia de segurança não foi enviado. Não foi paga a multa a que se refere o art. 3º, n.º4 do DL 200/2003 de 10.09”.
Na sequência de tal informação, proferiu o Mº Juiz o despacho certificado a fls. 4 do seguinte teor:
“Atenta a informação supra, não tendo sido paga a multa a que se refere o art. 3º, n.º4 do DL 200/2003 de 10.09, por inobservância da aposição da assinatura digital e não tendo sido alegado impedimento a que alude o art. 146º do CPC, a distribuição é recusada (art. 474º, al. g) do CPC)”.

3. Desse despacho recorre a autora do pedido civil e requerimento executivo subsequente, formulando a recorrente as seguintes CONCLUSÕES:
O Normativo referido no despacho recorrido comina a sanção de multa para as situações em que, sendo exigido o envio do requerimento executivo através de transmissão electrónica de dados, tal não seja observado, procedendo-se à entrega em papel.
Todavia, in casu, tal não se verificou.
Porquanto, no dia 29 de Dezembro de 2003, o E-mail, contendo o requerimento executivo, foi enviado e recebido por volta das 17 horas.
Esse recebimento foi confirmado em data posterior pelo Sr. Secretário de Justiça da Secção Central do Tribunal da Comarca de Leiria.
Todavia, o requerimento não foi recebido para os efeitos legais, por não se encontrar aposta a assinatura digital.
No entanto, tal formato não é, de todo, condição necessária do recebimento do requerimento executivo.
Tal se conclui, forçosamente, da análise do art. 3 n° 2 do DL 200/2003, bem como, do disposto na portaria 985-A/2003, de 15 de Setembro, a qual vem regular a forma de entrega do requerimento executivo.
A portaria supra aludida, em momento algum exige a aposição de assinatura digital no requerimento executivo.
Do mesmo modo, não se vislumbra o alcance da invocação do disposto no art. 146° do CPC, porquanto a recorrente praticou o acto em tempo, não se vislumbrando motivo algum de recusa de recebimento do requerimento.
De igual modo, não se compreende a invocação do plasmado no art. 474°, alínea g), porquanto o requerimento executivo estava assinado pelo mandatário.
Assinatura que, em face de tudo quanto se expôs, e como cabalmente se conclui, não teria de ser aposta em formato digital.
Termos em que deve dar-se provimento ao agravo, revogando-se a decisão recorrida.

4. Não foi apresentada resposta, nem despacho de sustentação/reparação, limitando-se o Mº Juiz a mandar “subir os autos”.
Realizada a conferência, não se verificando obstáculos ao conhecimento de mérito, cumpre conhecer e decidir.

5. A questão suscitada – com génese na labiríntica “reforma da acção executiva” - consiste em apurar se, na data em o requerimento executivo (para execução de decisão proferida no processo) deu entrada em tribunal, a assinatura do advogado subscritor do requerimento executivo enviado por correio electrónico tinha que ter aposta a respectiva assinatura digital.
O despacho recorrido fundamenta a solução de rejeição adoptada no disposto no art. 3º, n.º4 do DL 200/2003 de 10.09.
Quer do teor do despacho recorrido quer das posições assumidas, em especial as conclusões do recurso – confirmado pelo teor do expediente de fls. 9 - resulta claro que o requerimento executivo foi enviado por correio electrónico, ou e-mail, tendo sido recebido no tribunal. Isto, apesar de, na informação que o precedeu se fazer referência apenas à falta de apresentação de cópia de segurança e não à falta de assinatura digital.
Aliás o recurso incide sobre o despacho judicial acima transcrito e não sobre a informação que o precede, pelo que não resultam dúvidas sobre o fundamento do mesmo: a necessidade, ou não, da assinatura digital do correio electrónico através do qual foi enviado o requerimento executivo.
O citado art. 3º, n.º4, fundamento legal do despacho, postula, na parte que ora interessa: “A parte que, estando obrigada à entrega por transmissão electrónica de dados, proceda à entrega do requerimento executivo apenas em suporte de papel, fica obrigada ao pagamento imediato de uma multa de montante ...”.
No caso, como foi evidenciado o requerimento executivo foi enviado por correio electrónico – procedimento aliás obrigatório a partir de 15.09.2003, nos termos da Port. 985-A/2003 de 15.09.
Pelo que não podia a requerente ser sancionada com base em tal dispositivo, que prevê precisamente o caso contrário – a entrega apenas em suporte de papel. E na verdade o despacho recorrido não a sancionou, mas rejeitou o requerimento e expediente que o acompanhava, por falta da assinatura digital.
A assinatura digital é obrigatória, em geral, para as peças processuais enviadas por correio electrónico - cfr. n.º 3 da Port. 1178-E/2000 de 15.12.
No entanto o requerimento executivo foi objecto de regulamentação minuciosa, reformulando, de forma tendencialmente exaustiva e autónoma, todo o regime da acção executiva.
Até porque tratando-se de procedimento assente na existência prévia de um título, que define o conteúdo e alcance da obrigação exequenda, o legislador pretendeu proceder, ao máximo, à sua simplificação, pondo termo “à excessiva jurisdicionalização e rigidez” do regime anterior – cfr. preâmbulo do DL 38/2003 de 08.03.
Ora a não obrigatoriedade da assinatura digital, quando o requerimento executivo é enviado por correio electrónico parece resultar clara do disposto no n.º 2 do art. 3º citado.
Com efeito postula expressamente tal dispositivo: “Ao requerimento executivo não se aplica o disposto na Portaria n.º 1178-E/2000 de 15 de Dezembro”.
Portaria esta que, na redacção dada pela Port. N.º 8/2001 de 03.01, estabelece, no n.º3: “Quando os actos processuais forem praticados através de correio electrónico, é necessária a aposição de assinatura digital certificada do signatário”.
De onde resulta que, tendo a aplicação desta norma que exige a assinatura digital ao requerimento executivo sido excepcionada pelo citado n.º2 do preceito aplicado pela decisão recorrida, por remissão para a Port. 1178-E/2000, parece claro que ficou arredada, expressamente, a obrigatoriedade da assinatura digital, no requerimento executivo.
Aliás, apenas sendo obrigatória a constituição de advogado, na acção executiva, quando o valor da execução for superior à alçada da Relação (cfr. art. 60º do CPC, na redacção dada pelo DL 38/2003), a obrigatoriedade da assinatura digital inviabilizaria a apresentação e recepção em Tribunal de execuções subscritas pelo próprio exequente, ao contrário daquilo que o próprio legislador previu.
Pelo que, concluindo, tendo o despacho recorrido decido o contrário, não pode prevalecer.
6. Termos em que, com os fundamentos expostos, se acorda em conceder provimento ao recurso, determinando-se a substituição do despacho recorrido por outro que dê seguimento ao requerimento executivo em causa.-------------
Sem custas.