Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
322/11.5IDAVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOSÉ EDUARDO MARTINS
Descritores: ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL
DECLARAÇÃO TRIBUTÁRIA
Data do Acordão: 10/30/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA (JUÍZO DE INSTÂNCIA CRIMINAL DE ÁGUEDA - JUIZ 2)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 105.º DO RGIT
Sumário: A entrega da declaração tributária, constituindo uma mera obrigação acessória à obrigação de entrega do imposto, não interfere com o preenchimento do tipo legal do crime de abuso de confiança fiscal, que se pode verificar independentemente da referida entrega da declaração.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:
                                                                                                                                            
I. Relatório:                                                  
            A) No âmbito do processo comum (tribunal colectivo) n.º 322/11.5IDAVR que corre termos na Comarca do Baixo Vouga, Águeda - Juízo de Instância Criminal – Juiz 2, em 10/12/2012, foi proferida Acórdão, cujo DISPOSITIVO é o seguinte:
   “Pelo exposto, julgando procedente, por provada, a acusação deduzida pelo Ministério Público, acordam os juízes que constituem este Tribunal Colectivo em:
A) - condenar o arguido A..., pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de sete crimes de abuso de confiança fiscal, previstos e punidos pelo artigo 105.º, nºs 1 e 4, do RGIT, na pena de oito meses de prisão cada um;
A.1) – em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 77.º, do Código Penal, vai o arguido A... condenado na pena única de um ano e oito meses de prisão efectiva;
B) – condenar o arguido A..., pela prática de sete contra-ordenações de falta de declarações, previstas e punidas pelo artigo 116.º, do RGIT, nas coimas de duzentos euros cada uma;
B.1) – em cúmulo material, nos termos do artigo 25.º, do RGIT, vai condenado na coima unitária de mil e quatrocentos euros;
C) – condenar o arguido no pagamento de cinco UC de taxa de justiça e demais custas.
Notifique e deposite
Após trânsito, remeta boletim ao registo criminal.
                                                                        ****
            B) Inconformado com a decisão recorrida, dela recorreu, em 4/2/2013, o arguido A..., extraindo da motivação as seguintes conclusões:      
            1 - O arguido não se pode conformar com a douta sentença proferida “in casu” pelo Tribunal “a quo”, daí o presente recurso;
            2 - Foi o arguido, ora recorrente condenado na pena única de um ano e oito meses de prisão efetiva, como autor material e em concurso efetivo, de sete crimes de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos nºs 1 e 4 do artigo 105º do RGIT.
            3 - Tal condenação tem por base a não entrega das declarações periódicas de IVA, e a consequente não entrega do referido imposto, que após ação inspectiva, se veio a apurar nos seguintes períodos:
            - Segundo trimestre de 2007 no valor de EUR. 12.605,12;
            - Terceiro trimestre de 2007 no valor de EUR. 11.731,55;
            - Quarto trimestre de 2007 no valor de EUR. 16.775,06;
            - Primeiro trimestre de 2008 no valor de EUR. 13.557,97;
            - Segundo trimestre de 2008 no valor de EUR. 16.004,90;
            - Terceiro trimestre de 2008 no valor de EUR. 17.918,53;
- Quarto trimestre de 2008 no valor de EUR. 10.768,05;
- Num total de EUR. 99.361,18.

            4 - Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária a douta sentença padece do vício enunciado na alínea b) e c) do artigo 410º n.º 2 do CPP
            5 - Pois que, no entendimento do ora recorrente, existe entre os fatos provados e a decisão uma contradição insanável, fruto de erro notório na interpretação do artigo 105.º do RGIT.
            6 - Isto porque o douto acórdão considerou os fatos integradores de sete crimes de abuso de confiança fiscal quando na verdade os fatos imputados ao arguido não integram aquele tipo de crime, mas sim um crime de Fraude Fiscal, p. e p. no art. 103.º do RGIT.
            7 - Pelo que, andou mal o Tribunal à quo, que no seguimento do teor da acusação pública, considerou os fatos em causa como se de um crime de abuso de confiança fiscal se tratasse.
            8 - Na verdade, a existir ilícito criminal, nunca o mesmo poderia ser tipificado como se abuso de confiança fiscal, p. e p. nos termos do disposto no artigo 105.º do RGIT,
            9 - Pois que, o legislador ao criar tal norma especifica pretendeu diferenciar duas condutas diferentes do agente,
            10 - Por um lado, situam-se os casos da não entrega do imposto que foi tempestivamente declarado,
            11 - E por outro, em que a falta da entrega da prestação tributária está associada ao incumprimento da obrigação de apresentar a declaração de liquidação ou pagamento do imposto.
            12 - Nesse contexto, entende-se que o legislador pretendeu aplicar a norma do artigo 105.º do RGIT, apenas aos casos da não entrega do imposto devidamente declarado perante a administração fiscal, como aliás, facilmente se poderá constatar pelo corpo do artigo, que está todo ele direccionado para os casos em que o agente apesar de apurar o imposto e declara-lo atempadamente e através dos meios próprios, não efectuou a liquidação do imposto.
            13 - Só assim fará sentido todo o corpo do artigo, mais concretamente o disposto no seu n.º 4, al. a) e b), que estipula a condições necessárias de punibilidade, mais concretamente o decurso de dois prazos distintos para o cumprimento.
            14 - Quer num quer noutro caso, o legislador pressupõe sempre que o agente procedeu á entrega da declaração de apuramento do imposto, e apenas não efectuou o seu pagamento.
            15- Pelo que a nosso ver o crime de abuso de confiança fiscal apenas ocorre quando haja entrega da declaração tributária.
            16 - No caso dos presentes autos, o arguido efetivamente não procedeu á entrega das declarações.
            17 - Neste caso concreto, o que existe é uma INTENÇÃO DE OCULTAÇÃO dos fatos tributários á administração fiscal, como aliás se pautou toda a demais atuação do arguido, e que se revelou, embora tivesse sido interpelado para o efeito no âmbito da ação inspetiva, no fato de não proceder á entrega dos elementos contabilísticos.
            18 – Efectivamente, só pela conjugação dos documentos contabilísticos de terceiros foi possível á administração fiscal apurar o imposto de IVA que faz constar na sua participação criminal, que dá origem aos presentes autos, tudo conforme melhor se poderá aferir pelos vários documentos juntos aos autos.
            19 - Pelo que tais atos constituem, outrossim, um crime de FRAUDE FISCAL, p. e p. nos termos do disposto no artigo 103.º e seguintes do RGIT e não um crime de abuso de confiança fiscal.
            20 – O que aqui revela para efeitos de punição efetivamente será a primeira atuação do arguido – não entrega da declaração tributária – subsumindo-se o não pagamento ou entrega do imposto apurado naquele crime.
            21 - O imposto apurado pela administração fiscal no que ao caso concreto diz respeito, só se verificou pela ação inspectiva, pelo que a conduta ilegítima resulta na ocultação dos fatos tributários, visando a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária.
            22 - Ora, tal dissertação, leva a considerar que o Tribunal “a quo” nunca deveria ter condenado o arguido pelo crime de abuso de confiança fiscal de que vinha acusado, mas sim pelo crime de fraude fiscal, violando assim com aquela douta decisão o disposto no artigo 105.º n.º 1 e 4 do RGIT.
            Pelo que, nesta matéria, deverão os autos baixar para a necessária alteração do tipo legal de crime, com as demais consequências legais.
            Mais e para o caso de assim não se entender sempre se dirá o seguinte:
            23 - Mesmo que se venha a considerar que a prática dos fatos por parte do arguido integra o tipo legal de crime de abuso de confiança fiscal, a verdade é que uma vez mais o Tribunal “a quo” decidiu erradamente, ao condenar o arguido pela prática em autoria material e concurso efectivo, de sete crimes de abuso de confiança fiscal.
            24 - Na óptica do recorrente deveria ter-se considerado como provado, sem qualquer distinção temporal, que este tomou uma una, inicial e única resolução de não pagar impostos.
            25 - Resolução que se prolongou de forma ininterrupta no tempo desde o segundo trimestre de 2007 ao quarto trimestre de 2008.
            25 - A verdade é que inexiste prova de que o arguido tenha tomado uma pluralidade de resoluções criminosas
            26 – Tratou-se sim de uma única decisão, tomada num único momento temporal, uma vez que o arguido tomou a resolução de, globalmente, não proceder ao pagamento dos impostos.
            27 - Pelo que repita-se, inexistiu, como tal, uma plúrima tomada de resoluções criminosas, mas antes uma linha de continuação que leva a que se esteja em face de um único crime, na medida em que houve uma única decisão de não pagamento dos impostos que engloba a não entrega das prestações de IVA referente aos meses de Abril de 2007 a Dezembro de 2008.
            27 – Aliás como facilmente se verifica, o comportamento criminoso do arguido deu lugar á não entrega e subsequente apuramento do imposto por sete períodos trimestrais.
            28 - Ora, na verdade e face à absoluta inexistência de prova nesse sentido dever-se-á atender aos princípios gerais da teoria da infracção, relativamente á questão do concurso de crimes, ou, eventualmente, do crime continuado.
            29 - Como é sabido, “o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente” – Cfr. artigo 30, n.º 1 do Código Penal.
            30 - No entanto, esse mesmo preceito, mas no seu número 2, prevê o crime continuado, cujos requisitos ai estão elencados.
            31 - Pressupondo a repetição ou reiteração da actividade criminosa, não obstante o agente preencher várias vezes o mesmo tipo legal ou diversos tipos legais de crime com o mesmo objecto, o legislador ficciona a existência de um só crime.
            32 - Em função de factores exógenos, há uma disposição exterior das coisas para o crime, facilita-se o exercício da actividade criminosa, pelo que se entende menos exigível que o sujeito actue em conformidade com o direito.
            33 - Para que estejamos perante um crime continuado, têm de se verificar os seguintes pressupostos:
            1 – Existência de elementos constitutivos do mesmo comportamento, que se dirigem fundamentalmente contra o mesmo bem jurídico, ou contra bens jurídicos fundamentalmente idênticos;
            2 – O exercício de forma essencialmente homogénea e no quadro de uma situação exterior que diminui consideravelmente a culpa;
            3 – O agente deve ter uma culpa consideravelmente diminuta.
            34 - No que se refere a este último pressuposto, tem de existir uma situação que, de fora e de maneira considerável, facilita a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao arguido que se comporte de acordo com o direito.
            In casu,
            35 - Verificam-se os pressupostos da prática de um crime continuado de abuso de confiança fiscal em relação á administração tributária.
            36 - Tratando--se do mesmo bem jurídico, o comportamento do arguido revela-se homogéneo, segundo uma continuidade, seja ao nível espácio-temporal (7 trimestres seguidos), seja quanto á própria linha psicológica de actuação, que presidiu á renovação sucessiva da resolução criminosa.
            37 - Por outro lado, verifica-se, igualmente, uma conformação exterior que concorreu para determinar o arguido para a resolução de renovar a prática do crime.
            38 - Resulta provado, que a actuação do arguido, embora reiterada no tempo, se deveu ainda ao facto de, aproveitando a posição privilegiada em que se encontrava enquanto substituto tributário, após a primeira não entrega (uma vez mais a questão da entrega, quando o arguido nem sequer se apurou o imposto) dos montantes devidos a titulo de imposto e sua inerente apropriação (quais montantes? os apurados em acção inspectiva? dos quais o arguido nunca foi notificado para pagamento?), e a não fiscalização ou inspecção, criou na sua consciência uma crença de impunidade, levando-o á prática de condutas semelhantes.
            39 - Na verdade, em virtude do arguido não ser imediatamente sujeito á inspecção por parte dos competentes serviços de fiscalização tributária, convenceu-se que a actuação que havia levado a cabo havia sido bem sucedida, o que motivou a instalação de um ambiente favorável á sua reiteração nos trimestres seguintes.
            É facto que a morosidade da actuação das entidades competentes e mercê do benefício patrimonial imediato que a situação de incumprimento determinava, proporcionou ao arguido o meio próprio para a prática do crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, que se consuma, como tal, com a prática do último facto, definindo, como tal a lei aplicável – artigo 3.º do Código Penal.
            40 - Crime esse, pelo qual, quando muito, deveria o arguido ser condenado, e não em sete crimes em concurso efectivo, pelo que se for vencida a alegação supra de alteração do tipo legal de crime, em última instância, deverá o arguido ser condenado pelo crime de abuso de confiança fiscal na forma continuada, alterando-se, assim, nessa parte a sentença de que se recorre.
            Acontece ainda que,
            41 - Contrariamente ao entendimento que o Tribunal “a quo” teve na decisão ora recorrida, sempre o disposto nos art.ºs 40º (Finalidades das penas e das medidas de segurança) e 71º (Determinação da medida da pena), ambos do Código Penal, impunham a aplicação ao recorrente de medida da pena menos severa e mais equilibrada.
            42 - Na determinação da medida concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente as indicadas no artº 71º nº 2 do Código Penal. Sem esquecer que, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa. – artº 40º nº 2 do Código Penal. 
            43 - Efectivamente, considerada a idade do arguido, a data da prática dos fatos, a sua inserção social, o tempo entretanto decorrido e as condições pessoais deste, não pode deixar de se considerar como manifestamente excessiva a pena aplicada,
            44 - É consabido que o legislador, no artigo 70.º do Código Penal, manifestou a sua preferência pela aplicação de penas não privativas da liberdade nos casos em que a escolha seja possível, como é o caso, desde que realizem adequadamente as finalidades da punição.
            45 - Em conformidade com o disposto no artigo 40.º, n.º 1, e no artigo 71.º, n.º 1 do Código Penal, a aplicação das sanções penais têm por escopo a prevenção geral positiva da integração do sujeito, que consiste na reafirmação contrafática da confiança da comunidade na validade das normas jurídicas violadas, ou, numa enunciação menos normativista, na necessidade de protecção dos bens jurídicos, bem como da prevenção especial positiva ou de reintegração do arguido na sociedade.
            46 - Embora no caso dos autos as exigências de prevenção geral sejam elevadas, até como se refere pelo “descalabro do nosso País”, o certo é que a data da prática dos fatos pelo arguido tem, necessariamente que relevar a seu favor.
            47 - Efetivamente corresponde à verdade que o arguido já fora condenado por ilícitos de igual natureza, sendo que duas das penas se encontram extintas, e a última, remonta a fatos praticados em 2004, cuja sentença foi proferida apenas em 05/11/2009,
            48 - Isto é, posterior á prática dos factos em discussão nos presentes autos.
            49 - Ademais e embora não conste da Douta Sentença por culpa exclusiva do arguido se diga, desde o ano de 2009 não mais se comportou da mesma forma, no que á questão fiscal diz respeito,
            50 - Não correspondendo à verdade que o mesmo continuou a laborar á data de 2010 e 2011, ou mesmo agora, em desrespeito pelas suas obrigações fiscais, até porque deixou a atividade por conta própria, encontrando-se há cerca de 2 anos a trabalhar por conta de outrem, onde não exerce qualquer cargo de responsabilidade a este nível.
            51 - Ora, á data de hoje, ainda impende sobre o arguido a pena suspensa sentenciada no âmbito do processo n.º 87/06.2IDVAR, o único que se encontra activo, a qual terminaria em Novembro do corrente ano de 2013.
            52 - Posteriormente a esta condenação, o arguido não praticou qualquer facto criminal desta natureza, nem se encontra indiciado pela sua prática, o que terá necessariamente que relevar a seu favor.
            53 - É pessoa socialmente integrada e encontra-se a trabalhar, pelo que no que respeita ás exigências de prevenção especial, há que atender a tais fatos.
            54 - O arguido não se escusou ao presente processo, sendo que a sua falta a julgamento se deu hà infeliz verificação de dois factos,
            55 - Quer no primeiro TIR quer no segundo que prestou, o arguido indicou como residência a morada de seus pais em (...), Águeda,
            56 - Contudo, como resulta dos autos, entre um e outro TIR, o arguido foi viver para a localidade da (...), onde passou a residir com uma companheira.
            57 - Ainda assim quando prestou o segundo TIR, entendeu manter a morada dos seus pais, pois por razões meramente pessoais.
            58 - Ocorre que os seus pais são pessoas de avançada idade, e por motivos que desconhece a carta com a marcação de julgamento não lhe foi entregue pelos mesmos.
            59 - Por tal facto, sem que tivesse conhecimento da sua falta, não compareceu á audiência de julgamento, sendo certo que em todos os processos anteriores sempre esteve presente e assumiu os seus actos.
            Assim,
            60 - Em face da idade do arguido, da sua integração social e profissional, da data da prática dos factos, e da ausência de processos pendentes desta natureza, deverá a pena de prisão que vier a ser fixada, tomando por base a alteração do crime para abuso de confiança fiscal na forma continuada, ser suspensa na sua execução,
            61 - Ou se assim não se entender, suspender a pena de prisão de um ano e oito meses que se encontra sentenciada. 
                                                                       ****
C) O Ministério Público junto da 1ª instância respondeu, em 7/3/2013, ao recurso do arguido, defendendo a sua improcedência e apresentando as seguintes conclusões:
1. Deverá ser proferido despacho de aperfeiçoamento, nos termos e para os efeitos do n.º 3, do artigo 417.º, do CPP, ou seja, no sentido de convidar o recorrente a terminar a sua motivação com um pequeno número de conclusões que constituam verdadeiramente uma síntese do que foi desenvolvido no texto da motivação.
2. Os factos dados como provados pelo douto acórdão recorrido integram efectivamente os sete (7) crimes de abuso de confiança fiscal, previstos e punidos pelo art.º 105.º, n.ºs 1 e 4, do RGIT, para além das sete(7) contra-ordenações não impugnadas pelo recorrente.
3. Por inexistência dos necessários pressupostos, não é possível subsumir a conduta do recorrente à prática de um único (continuado) crime de abuso de confiança fiscal.
4. A opção pela não suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido não merece, em nossa opinião, qualquer censura
                                                              ****
            O recurso foi, em 8/4/2013, admitido.
Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, em 24/4/2013, emitiu douto parecer no qual defendeu a improcedência do recurso.
Cumprido que foi o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, não foi exercido o direito de resposta.
Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos, teve lugar a legal conferência, cumprindo apreciar e decidir.
****
II. Decisão Recorrida:
 “(…)
Realizada a audiência de julgamento, resultaram provados os seguintes factos:
1 – O arguido é empresário em nome individual, sendo que, desde 29 de Maio de 1989 e até à presente data, se encontra colectado naquela qualidade e registado em sede de IVA e IRA para o exercício da actividade de exploração florestal, estando enquadrado para efeitos de tributação por Imposto sobre o Valor Acrescentado no regime normal de periodicidade trimestral.
2 – No âmbito dessa actividade que o arguido exercia e exerce de facto e de direito, incumbe-lhe, além do mais, proceder ao pagamento das prestações tributárias devidas pelo exercício da referida actividade comercial.
3 – No âmbito da actividade comercial exercida pelo arguido enquanto empresário em nome individual, este vendeu bens e prestou serviços entre o segundo trimestre de 2007 e o quarto trimestre de 2008, que facturou e pelos quais se faz pagar, liquidando o Imposto sobre o Valor Acrescentado correspondente.
4 – Neste período entre o segundo trimestre de 2007 e o quarto trimestre de 2008, decidiu o arguido deixar de apresentar as declarações periódicas de IVA e deixar de entregar nos cofres do Estado o IVA que em cada trimestre foi apurado no decurso da sua actividade comercial, como imposto a pagar ao Estado, resultante da diferença entre o IVA por este suportado e o IVA liquidado aos seus clientes.
5 – Pretendia assim o arguido integrar e passar a usar as disponibilidades financeiras obtidas com tais emissões de entrega no seu património, o que efectivamente logrou realizar.
6 – Assim, nos trimestres que a seguir se indicam, o arguido apurou IVA a pagar a favor do Estado, de valor superior a 7.500 euros, nos concretos montantes que seguem igualmente discriminados:
- Segundo Trimestre de 2007: doze mil, seiscentos e cinco euros e doze cêntimos;
- Terceiro Trimestre de 2007: onze mil, setecentos e trinta e um euros e cinquenta e cinco cêntimos;
- Quarto Trimestre de 2007: dezasseis mil, setecentos e setenta e cinco euros e seis cêntimos;
- Primeiro Trimestre de 2008: treze mil, quinhentos e cinquenta e sete euros e noventa e sete cêntimos;
- Segundo Trimestre de 2008: dezasseis mil, novecentos e dezoito euros e cinquenta e três cêntimos;
- Terceiro Trimestre de 2008: dezassete mil, novecentos e dezoito euros e cinquenta e três cêntimos;
- Quarto trimestre de 2008: dez mil, setecentos e sessenta e oito euros e cinco cêntimos.
7 – O arguido devia ter remetido ou feito remeter à administração fiscal as respectivas declarações periódicas de IVA e, bem assim, cada um dos valores de IVA apurados a favor do estado até ao dia 10 do segundo mês seguinte ao termo do período a que respeitavam.
8 – Em execução daquele desígnio apropriativo, o arguido não remeteu as competentes declarações periódicas nem remeteu os valores acima descritos nem os fez remeter aos competentes serviços da administração fiscal, nem até ao dia 10 do segundo mês seguinte ao termo do período, nem nos 90 dias seguintes ao termo de tal prazo, nem até à presente data.
9 – O arguido sabia que os referidos valores não lhe pertenciam e que eram pertença da Fazenda Nacional, bem como devia entregar cada um dos referidos montantes nos prazos legais, mas não se absteve de omitir a sua entrega, o que quis e concretizou.
10 – Com tais omissões de entrega, logrou o arguido apropriar-se da quantia de noventa e nove mil, trezentos e sessenta e um euros e dezoito cêntimos, a qual passou a dispor como sua e em seu benefício integrando parte das disponibilidades financeiras provenientes da falta de entrega daquelas prestações tributárias no normal giro comercial da sua actividade comercial.
11 – O arguido agiu ainda de forma livre e com o propósito concretizado de, mediante as condutas acima descritas, não apresentar no prazo legal as declarações periódicas de IVA, assim procurando frustrar a capacidade de obtenção de receitas fiscais devidas à administração tributária, o que representou.
12 – O arguido agiu de forma livre e consciente, bem sabendo da censurabilidade e punibilidade de tais comportamentos.
13 – O arguido foi julgado nos seguintes processos:
13.1 – processo comum singular n.º 112/98, do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Águeda, onde foi condenado, por sentença de 03.03.1999, pela prática de um crime de desobediência qualificada, por factos ocorridos em 16.04.1998, na pena de 90 dias de multa à taxa diária de esc. 750$00; por despacho de 20.09.2007, tal pena foi declarada extinta pelo pagamento efectuado em 09.06.1999;
13.2 - processo comum singular n.º 184/03.6TAAGD, do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Águeda, onde foi condenado, por sentença de 04.02.2005, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, por factos ocorridos em Abril de 1995, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de 9,98 euros; tal pena foi declarada extinta pelo pagamento da multa em 09.06.1999;
13.3 – processo comum singular n.º 122/01, do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Águeda, onde foi condenado, por sentença de 22.11.2001, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, por factos ocorridos em 22.12.1992, na pena de 2 anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 4 anos; tal pena foi declarada extinta (já no processo com o n.º 49/99.4IDAVR), por despacho de 02.09.2011;
13.4 - processo comum singular n.º 87/06.2IDAVR, do Juízo de Instância Criminal de Águeda, Da Comarca do Baixo Vouga, onde foi condenado, por sentença de 05.11.2009, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, por factos ocorridos em 2004, na pena de 7 meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, com sujeição a deveres.
14 – O arguido, nascido a 14.05.1953, é casado, trabalha como madeireiro, em 2010/2011, efectuou vendas no valor de pelo menos 542 mil euros.
15 – O arguido não compareceu na audiência de julgamento, nem foi encontrado pelos serviços de reinserção social que o procuraram para elaborar o atinente relatório social.
Factos não provados:
Nenhuns outros factos, com relevância para a decisão da causa, se provaram em audiência.
                                                             *
Motivação:
A) De facto:
A decisão do tribunal fundou-se na análise dos documentos indicados na acusação conjugados com o depoimento da testemunha B....
A testemunha disse que conhece o arguido da acção de inspecção efectuada nos presentes autos bem como de outra que presentemente está em curso; relatou como fez a instrução deste processo, disse que enviaram notificações postais para o arguido exibir a contabilidade mas este nada apresentou; perante isso, contactaram clientes do arguido e foi assim que recolheram as facturas de clientes para quem o arguido havia feito as vendas; tais facturas constavam da contabilidade dos respectivos clientes.
Da acção de inspecção que presentemente desenvolve, tem conhecimento de que o arguido continua a trabalhar, em 2010/2011, teve uma facturação de cerca de 542 mil euros (“mais IVA”).
(…)
Foram analisados os documentos de fls. 71 a 367 entre os quais se encontram as referidas cópias das facturas emitidas pelo arguido nos períodos em apreço nestes autos. Do teor das mesmas resulta que tais facturas foram emitidas pelo arguido e que os respectivos montantes, incluindo o respeitante a IVA, foram pagos pelos clientes que as integraram na respectiva contabilidade. Aliás, como descrito pela testemunha, foram esses clientes que facultaram as ditas cópias aos serviços de inspecção tributária.
(…)
A situação pessoal e familiar do arguido foi apurada a partir dos elementos existentes nos autos e do conhecimento manifestado pela testemunha do contacto que teve com o arguido; os serviços de reinserção não conseguiram elaborar o atinente relatório social por impossibilidade de localização do arguido (fls. 438).
(…)
                                                              *
B) De direito:
(…)
                                                              *
Não suspensão da execução da pena de prisão:
(…)
O arguido não compareceu na audiência de julgamento nem foi encontrado pelos serviços de reinserção social que o procuraram para elaborar o atinente relatório social. Igualmente, já anteriormente foi condenado em pena de prisão suspensa na execução sem sucesso.
Neste contexto, não se demonstrou qualquer facto que permita formular um prognóstico favorável relativamente ao seu comportamento e apostar na sua capacidade de recuperação dos valores socialmente relevantes nem acreditar na sua reinserção plena e responsável (“Velhas e novas questões sobre a pena de suspensão de execução de prisão”, F. Dias, RLJ, 124º-65).
Na formulação de tal prognóstico, o tribunal reporta-se ao momento da decisão, não ao momento da prática do facto (mesmo Prof., “As consequências jurídicas do crime”, pág. 343).
Ora, a situação deste arguido desde a prática dos factos em apreço não apresenta qualquer evolução no sentido de permitir um prognóstico favorável, pelo que não se justifica a aposta na suspensão da execução da pena de prisão por não se verificarem os pressupostos previstos no artigo 50.º
                                                              *
Tendo em conta a situação concreta do arguido, não se vislumbra a possibilidade de substituir a pena de prisão por trabalho a favor da comunidade ou qualquer outra pena não privativa da liberdade sendo que qualquer outro modo de cumprimento da pena se mostra insuficiente para satisfazer as necessidades de prevenção ou de ressocialização que o caso exige.
(…)”.
****
III. Apreciação dos Recursos:
O objecto de um recurso penal é definido pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso – artigos 403.º e 412.º, n.º 1, ambos do C.P.P.
Na realidade, de harmonia com o disposto no n.º1, do artigo 412.º, do C.P.P., e conforme jurisprudência pacífica e constante (designadamente, do S.T.J. –  Ac. de 13/5/1998, B.M.J. 477/263, Ac. de 25/6/1998, B.M.J. 478/242, Ac. de 3/2/1999, B.M.J. 477/271), o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelos recorrentes da motivação apresentada, só sendo lícito ao tribunal ad quem apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410.º, n.º 2, do mesmo diploma, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R. I – A Série, de 28/12/1995).
            São só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões, da respectiva motivação, que o tribunal ad quem tem de apreciar – artigo 403.º, n.º 1 e 412.º, n.º1 e n.º2, ambos do C.P.P. A este respeito, e no mesmo sentido, ensina Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, Vol. III, 2ª edição, 2000, fls. 335, «Daí que, se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringir o objecto do recurso), o Tribunal Superior só conhecerá das que constam das conclusões».
As questões a conhecer são as seguintes:
1) Saber se os factos dados como provados integram o crime de fraude fiscal, p. e p. nos termos do disposto no artigo 103.º e seguintes do RGIT.
2. Saber se a conduta do arguido configura a prática de um crime continuado.
            3. Saber se a pena aplicada em concreto deve ser suspensa na sua execução.
                                                                       ****
- Questão prévia:
            O Ministério Público considera o seguinte:
Quando as conclusões do recorrente resumem verdadeiramente as razões do pedido, de acordo com o n.º 1 do art.º 412.º do CPP, a tarefa dos demais sujeitos processuais na elaboração da Resposta e do tribunal ad quem na decisão do recurso fica mais facilitada. Com efeito, além de articuladas as conclusões resumem-se a uma síntese do que foi desenvolvido no corpo ou texto da motivação e onde se concretiza e concentra o “onde” e o “porquê” se terá decidido mal e o “como” e o “porquê” se deverá decidir de modo diferente, formulando-se os correspondentes pedidos para tal fim (cfr. Noções de PROCESSO PENAL, de Manuel Simas Santos, Manuel Leal-Henriques e João Simas Santos, Rei dos Livros, 2010, pág. 511). Por outro lado, nunca é demais sublinhar, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões, pelo que a sorte do recurso depende, em grande medida, da forma como foram formuladas as conclusões.
No caso vertente, as conclusões do recorrente são uma reprodução mais ou menos fiel da motivação, como tantas vezes acontece ainda hoje, decorridos mais de vinte anos sobre o início da vigência do actual Código Processo Penal. Porém, tendo em conta que o recorrente dedica 11 páginas úteis da sua motivação aos quatro aspectos em que manifesta a sua discordância com o douto acórdão recorrido e que, a final, formula 61 conclusões que explana em 10 páginas, forçoso é concluir que é exagerado o número de conclusões e demasiado extensas algumas delas.
Pelas razões expostas entendemos que deverá ser proferido despacho de aperfeiçoamento, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do art.º 417.º do CPP, ou seja, no sentido de convidar o recorrente a terminar a sua motivação com um pequeno número de conclusões que constituam verdadeiramente uma síntese do que foi desenvolvido no texto da motivação.
Com efeito, a actual redacção do n.º 3 do art.º 417.º do CPP, introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29.08, prevê a possibilidade do tribunal superior (o relator) convidar o recorrente a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, incluindo-se no termo “esclarecer” as situações de “aperfeiçoamento”, como será o caso da falta de concisão das conclusões.
É esta também a opinião de Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 2.ª edição actualizada, pág. 1142, citando vários acórdãos do T.C., do S.T.J. e do T.E.D.H., que aqui damos por reproduzidos, e ainda o acórdão de 06.10.2004, do Tribunal da Relação de Coimbra, in C.J., XXIX, 4, 46, que diz o seguinte: É de rejeitar, nos termos do art.º 412.º n.ºs 1, parte final, e 2, a), do CPP, um recurso em que os recorrentes mesmo após terem sido convidados a aperfeiçoar o que apelidaram de “conclusões”, apresentam umas “conclusões” que são ” ipsis verbis” (tirando uma pequena e irrelevante diferença de pormenor) o conteúdo da motivação.
O recurso ao despacho de aperfeiçoamento previsto no n.º 3 do art.º417.º do CPP por parte dos tribunais superiores, quando está em causa a falta de concisão das conclusões é, em nossa opinião, uma prática salutar, pois parece ser o único remédio eficaz para combater a frequência de tal fenómeno.
Mesmo nas situações de manifesta improcedência do recurso por falta de fundamento, as vantagens resultantes da aplicação do despacho de aperfeiçoamento previsto no n.º 3 do art.º 417.º do CPP para combater a prática da falta de concisão das conclusões, superam sempre as possíveis desvantagens da quebra de celeridade processual, dado que o atraso não vai muito além dos 10 dias.”
                                                                       ****
            «Os recursos não podem ser utilizados com o único objectivo de uma “melhor justiça”. O recorrente tem de indicar expressamente os vícios da decisão recorrida. A motivação do recurso consiste exactamente na indicação daqueles vícios» - Cunha Rodrigues, Jornadas de Direito Processual Penal, CEJ, p. 387.
São as conclusões que irão, de um modo conciso, habilitar o tribunal superior a conhecer das razões que levam o recorrente a discordar da decisão recorrida, quer no campo dos factos quer no plano do direito.
Ora, as conclusões destinam-se a condensar essas razões que servem de fundamento ao pedido não podendo confundir-se com o próprio pedido, pois destinam-se a permitir que o tribunal apreenda, de forma imediata e resumida, o âmbito do recurso e os seus fundamentos, exigindo a lei que o recorrente sintetize os fundamentos por que recorre e diga ao tribunal o que pretende seja decidido.
                                                             ****
É pertinente a questão prévia suscitada pelo Ministério Público.
Sem dúvida que, no caso em apreço, é exagerado o número de conclusões, da mesma forma que são demasiado extensas algumas delas.
A desejada síntese está arredia.
No entanto, a exposição feita pelo recorrente torna possível compreender, em termos inequívocos, as exactas questões que devem ser conhecidas pelo TRC.
Por uma questão de celeridade processual, entendemos que o despacho de aperfeiçoamento a que alude o artigo 417.º, n.º 3, do CPP, só deve ter lugar naqueles casos em que as conclusões, por serem prolixas, impedem, em termos absolutos, a compreensão das questões a analisar.
Assim sendo, estão reunidas as condições para avançarmos, sem necessidade de formular qualquer convite ao recorrente.
****
1) Da qualificação jurídica do ilícito criminal praticado pelo arguido:
            O recorrente defende o seguinte:
            “Com efeito, salvo o devido respeito por opinião contrária, desde logo andou mal o Tribunal “a quo”, pois que, no seguimento do constante da acusação pública, considerou os fatos em causa como se de um crime de abuso de confiança fiscal se tratasse.
            Na verdade, a existir ilícito criminal, nunca o mesmo poderia ser tipificado como de abuso de confiança fiscal, p. e p. nos termos do disposto no artigo 105.º do RGIT.
            Senão vejamos:
            O legislador ao criar tal norma específica pretendeu diferenciar duas condutas diferentes do agente, ou seja,
            A) Por um lado, situam-se os casos da não entrega do imposto que foi tempestivamente declarado,
            B) E por outro, em que a falta da entrega da prestação tributária está associada ao incumprimento da obrigação de apresentar a declaração de liquidação ou pagamento do imposto.
            Nesse contexto, entende-se que o legislador pretendeu aplicar a norma do artigo 105.º do RGIT, apenas aos casos da não entrega do imposto devidamente declarado perante a administração fiscal, como aliás, facilmente se poderá constatar pelo corpo do artigo, que está todo ele direccionado para os casos em que o agente apesar de apurar o imposto e declara-lo atempadamente através dos meios próprios, não efectuou a liquidação do imposto.
            Só assim fará sentido todo o corpo do artigo, mais concretamente o disposto no seu número 4, al. a) e b), que estipula a condições necessárias de punibilidade, mais concretamente o decurso de dois prazos distintos para o cumprimento,
            Isto é,
            a) Tiverem decorrido mais de 90 dias sobre o termo do prazo legal de entrega da prestação;
            b) A prestação comunicada à administração tributária através da correspondente declaração não for paga, acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.
            Quer num quer noutro caso, o legislador pressupõe sempre que o agente procedeu à entrega da declaração de apuramento do imposto, e apenas não efectuou o seu pagamento.
            Na verdade, o legislador diferencia, embora de modo não totalmente explícito, ambas as situações, enquadrando-as mesmo em tipos legais de crime distintos, seja pela conduta do agente, seja pela sua maior ou menor gravidade.
            No caso dos presentes autos, o arguido limitou-se a não proceder à entrega das declarações, o que diferencia a sua atuação, que não se subsume apenas ao não pagamento do imposto.
            Neste caso concreto, o que existe é uma INTENÇÃO DE OCULTAÇÃO dos fatos tributários á Administração Fiscal, como aliás se pautou toda a demais atuação do arguido, que, apesar de várias vezes interpelado para proceder à entrega dos vários elementos contabilísticos, ainda no âmbito da ação inspectiva, nada veio dizer, ocultando os necessários documentos de contabilidade para que a administração fiscal, avalie, fiscalize ou controle a matéria colectável.
            Efetivamente, só pela conjugação dos documentos contabilísticos de terceiros foi possível á Administração Fiscal apurar o imposto de IVA que faz constar na sua participação criminal, que dá origem aos presentes autos, tudo conforme melhor se poderá aferir pelos vários documentos juntos aos autos.
            Ora, a atuação do arguido nunca poderia ser qualificada como se de um crime de abuso de confiança fiscal se tratasse.
            Tais atos constituem, outrossim, um crime de FRAUDE FISCAL, p. e p. nos termos do disposto no artigo 103.º e seguintes do RGIT.
            A ocultação de fatos ou valores NÃO DECLARADOS e que devam ser revelados á administração tributária, assim como a ocultação de documentação contabilística, constitui, SEM MARGEM PARA DÚVIDAS, o tipo legal de FRAUDE FISCAL, e não de abuso de confiança fiscal.
            Não poderá relevar para o enquadramento jurídico do tipo legal de crime, a última atuação do arguido, ou seja, o não pagamento do imposto, mas sim a sua primeira atuação, que se traduz na ocultação da sua faturação, e bem assim dos valores aí constantes, os quais, então sim, servirão para o apuramento do imposto.
            Embora o resultado seja o não pagamento ou entrega do imposto apurado, fato é que o agente comete o crime quando oculta os dados fiscais necessários ao seu apuramento.
            O imposto apurado pela Administração Fiscal no que ao caso concreto diz respeito, só se verificou pela ação inspectiva, pelo que a conduta ilegítima resulta na ocultação dos factos tributários, visando a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária.
            Ora, tal dissertação, leva a considerar que o Tribunal “a quo” nunca deveria ter condenado o arguido pelo crime de abuso de confiança fiscal de que vinha acusado, mas sim pelo crime de fraude fiscal, pelo que nesta matéria, deverão os autos baixar para a necessária alteração do tipo legal de crime, com as demais consequências legais.
            Ao decidir como decidiu o tribunal violou o artigo 105.º n.º 1 e 4 do RGIT.
                                                                       ****
            O Ministério Público, na resposta ao recurso, diverge do recorrente, nos seguintes termos:
Ora, no caso vertente, o recorrente não só não procedeu à entrega da declaração de apuramento do imposto à administração fiscal, como ocultou, escondeu ou não revelou (embora tenha sido interpelado para o fazer no decurso da acção inspectiva) os elementos contabilísticos necessários ao apuramento rigoroso do imposto devido, obrigando a administração fiscal a recorrer aos documentos contabilísticos de terceiros para apurar o IVA não declarado e não pago pelo recorrente.
Pensamos que o recorrente não tem razão, uma vez que os factos dados como provados pelo douto acórdão recorrido integram efectivamente os sete (7) crimes de abuso de confiança fiscal, p.s e p.s pelo art.º 105.º n.ºs 1 e 4 do RGIT, para além das sete(7) contra-ordenações não impugnadas pelo recorrente.
De facto, várias decisões dos tribunais superiores têm defendido a possibilidade da verificação do crime de abuso de confiança fiscal não só nas situações em que o agente económico não pagou o IVA que liquidou e recebeu nas transacções comerciais e que apurou, indicou nas respectivas declarações e enviou aos Serviços de Cobrança do IVA, como também nas situações em que o agente económico não pagou o IVA que liquidou e recebeu nas transacções comerciais e que não apurou nem procedeu ao preenchimento e envio aos Serviços de Cobrança do IVA das correspondentes declarações (cfr. Ac.s do STJ de 17.01.2002, proc. n.º 3819/01.5, e de 08.07.1999, proc. n.º 603/99, indicados por Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, in Regime Geral das Infracções Tributárias, anotado, 3.ª edição, 2008, Áreas Editora, a pág.s 720 e 744, respectivamente).
Que motivos poderão ser invocados para integrar no crime de abuso de confiança fiscal e não no crime de fraude fiscal as situações em que o agente não apurou nem fez entrega da declaração de apuramento do imposto à administração fiscal?
Os diferentes bens jurídicos tutelados por aqueles dois tipos legais de crime e, naturalmente, os específicos (e diferentes) elementos que integram aqueles dois crimes, uns e outros claramente realçados no Ac. do STJ de 12.10.2000, in Ac.s STJ, VIII, 3, 194, cujo sumário passo a transcrever:
1. O crime de abuso de confiança fiscal, previsto no art.º 24.º n.º 1 do RJIFNA, tem como pressupostos objectivos a apropriação total ou parcial de prestação tributária, que essa prestação tenha sido deduzida pelo agente nos termos da lei e que o agente estivesse obrigado a entregá-la ao credor tributário.
2. O crime de fraude fiscal e de abuso de confiança fiscal tutelam bens jurídicos diversos: o primeiro, a verdade nas relações entre o contribuinte e o Fisco; o segundo, a confiança do Fisco em relação a quem a lei impõe a abrigação de deduzir prestação tributária.
3. O crime de fraude fiscal consuma-se independentemente de qualquer prejuízo efectivo na esfera patrimonial do Fisco ou de qualquer enriquecimento do agente, enquanto que o crime de abuso de confiança fiscal pressupõe precisamente a existência de prejuízo patrimonial para o Fisco, com a apropriação de prestação recebida pelo agente para entrega ao credor tributário.
Ao não pagar o IVA que liquidou e recebeu nas transacções comerciais, o arguido causou um prejuízo efectivo ao Fisco e quebrou a relação de confiança que tinha (ou devia ter) com ele, relação essa que se traduz ou materializa na obrigação legal de deduzir prestação tributária.
Prejuízo efectivo e relação de confiança, dois aspectos característicos do crime de abuso de confiança fiscal, que não se coadunam com o crime de fraude fiscal, como defende o recorrente”.
                                                                       ****
Liminarmente, importa reter que o recorrente não questiona a matéria de facto dada como provada pelo tribunal a quo, simplesmente entende que a sua conduta enquadra-se no art.º 103.º n.º 1 al. a) do RGIT – Fraude Fiscal e não no art.º 105.º n.ºs 1 e 4 do RGIT – Abuso de Confiança Fiscal.
É quanto basta para deixar claro que só um mero equívoco pode justificar o que consta dos pontos 4 e 5 das conclusões, nos quais consta que a decisão recorrida padece dos vícios enunciados nas alíneas b) e c), do artigo 410.º, n.º 2, do CPP (existe entre os factos provados e a decisão uma contradição insanável, fruto de erro notório na interpretação do artigo 105.º, do RGIT).
Tais vícios reportam-se à decisão de facto e não à decisão de direito e sua fundamentação.
Quando ocorre errada aplicação do direito aos factos provados, o que se verifica não são os indicados vícios que, a verificarem-se, conduzirão à anulação da decisão, mas um erro de direito que conduz à sua revogação.
Logo, há que apreciar esta primeira questão em sede de erro de direito.
                                                           ****
Tal como o Ministério Público, não podemos concordar com o raciocínio expendido na fundamentação jurídica do recurso, segundo o qual só haveria crime de abuso de confiança fiscal nas situações em que o agente entrega a respectiva declaração tributária mas, dolosamente, não paga a prestação devida.
Os elementos do tipo constam do n.º1, do art.º 105,º, do RGIT, a saber, a (dolosa) não entrega (total ou parcial) da prestação que for legalmente devida à Administração tributária.
Sob o ponto de vista dogmático/jurídico, o crime de abuso de confiança fiscal configura-se como um crime omissivo puro na medida em que o facto típico revisto na norma incriminadora se verifica com a não entrega da prestação tributária, tendo-se por praticada a omissão na data em que termina o prazo para o cumprimento da obrigação tributária, por força do n.º2, do art.º 5º, do RGIT.
O crime tem como pressuposto a existência de uma prestação tributária deduzida e a que o agente está legalmente obrigado a entregar ou que, tendo sido recebida, haja obrigação legal de a entregar, caindo fora da esfera da norma incriminadora as situações em que a não entrega da prestação tributária se deve à sua não dedução, não liquidação ou ao seu não recebimento por parte do agente.
É um crime doloso, dividindo-se a doutrina entre aqueles que consideram ser necessária a existência de um dolo específico e aqueles que entendem que o dolo se afere nos termos gerais do art.º 14.º. do Código Penal, sendo esta a posição que melhor se coaduna com o texto do art.º 105.º. do RGIT.
No que concerne ao bem jurídico protegido, o crime de abuso de confiança fiscal tem por fundamento a protecção do património do Estado, mediante a tutela e protecção criminal da obrigação da entrega das quantias que foram confiadas ao agente para que este as entregasse nos Cofres do Estado.
Dito isto, é nosso entendimento que a entrega da declaração deve ser vista como uma mera obrigação acessória à obrigação da entrega do imposto que não interfere com o preenchimento do tipo legal, motivo pelo qual o crime de abuso de confiança fiscal ocorre quer haja ou quer não haja a entrega da declaração tributáriaver, neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 29/2/2012, Processo n.º 1638/09.6IDLRA, relatado pelo Exmo. Desembargador Paulo Guerra.
É esta orientação que, sem dúvida, se impõe.
Na verdade, o arguido, por um lado, não fez a entrega de qualquer declaração tributária e, por outro, não entregou, como devia, o imposto ao Estado.
Portanto, não pode escamotear que foi efectivado o dano no património fiscal do Estado.
Sendo assim, ainda que se pudesse configurar a conduta do arguido como crime de fraude fiscal (no sentido de apenas ocultar algo), como pretende o recorrente, o bem jurídico, pelo menos na sua configuração de bem último, que é o património fiscal do Estado, ficou violado (existiu dano) e essa violação tem de absorver o estádio anterior de antecipação da tutela do mesmo património (a verdade nas relações entre contribuinte e Fisco), ao nível da punição.
Por isso, não merece reparo, nesta parte, o decidido pelo Tribunal a quo.
****
            2) Do Crime continuado:
            O recorrente alega o seguinte:
            “Mesmo que se venha a considerar que a prática dos fatos por parte do arguido integra o tipo legal de crime de abuso de confiança fiscal, a verdade é que uma vez mais o Tribunal a Quo decidiu erradamente, ao condenar o arguido pela prática em autoria material e concurso efectivo, de sete crimes de abuso de confiança fiscal.
            Como facilmente se verifica, o comportamento criminoso do arguido deu lugar á não entrega e subsequente apuramento do imposto por sete períodos trimestrais.
            A repetição do comportamento criminoso ao longo do tempo encerrará um só crime, ou importará tantos crimes quantas as não entregas (uma vez mais se entende que a questão principal não se centra nas entregas mas na ocultação dos factos tributários)?
            Voltando um pouco atrás, como se poderá falar de entregas se o arguido nem se dignou a apurar o imposto devido, que resulta do diferencial entre as compras e as vendas?
            Seja como for, ainda sobre a questão agora em dissertação, dir-se-á, que sobre tal matéria, não existe, hoje, qualquer disposição legal que dirima expressamente esta questão.
            Como tal, dever-se-á atender aos princípios gerais da teoria da infração, relativamente á questão do concurso de crimes, ou, eventualmente, do crime continuado.
            Como é sabido, “o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efetivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente” – Cfr. artigo 30, n.º 1 do Código Penal.
            No entanto, esse mesmo preceito, mas no seu número 2, prevê o crime continuado, cujos requisitos ai estão elencados.
            Pressupondo a repetição ou reiteração da atividade criminosa, não obstante o agente preencher várias vezes o mesmo tipo legal ou diversos tipos legais de crime com o mesmo objecto, o legislador ficciona a existência de um só crime.
            Em função de fatores exógenos, há uma disposição exterior das coisas para o crime, facilita-se o exercício da atividade criminosa, pelo que se entende menos exigível que o sujeito actue em conformidade com o direito.
            Para que estejamos perante um crime continuado, têm de se verificar os seguintes pressupostos:
            “1 – Existência de elementos constitutivos do mesmo comportamento, que se dirigem fundamentalmente contra o mesmo bem jurídico, ou contra bens jurídicos fundamentalmente idênticos;
            2 – O exercício de forma essencialmente homogénea e no quadro de uma situação exterior que diminui consideravelmente a culpa;
            3 – O agente deve ter uma culpa consideravelmente diminuta.”
            No que se refere a este último pressuposto, tem de existir uma situação que, de fora e de maneira considerável, facilita a repetição da atividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao arguido que se comporte de acordo com o direito.
            In casu,
            Verificam-se os pressupostos da prática de um crime continuado de abuso de confiança fiscal em relação á Administração Tributária.
            Tratando-se do mesmo bem jurídico, o comportamento do arguido revela-se homogéneo, segundo uma continuidade, seja ao nível espácio-temporal (7 trimestres seguidos), seja quanto á própria linha psicológica de actuação, que presidiu á renovação sucessiva da resolução criminosa.
            Por outro lado, verifica-se, igualmente, uma conformação exterior que concorreu para determinar o arguido para a resolução de renovar a prática do crime.
            Resulta provado, que a atuação do arguido, embora reiterada no tempo, se deveu ainda ao fato de, aproveitando a posição privilegiada em que se encontrava enquanto substituto tributário, após a primeira não entrega (uma vez mais a questão da entrega, quando o arguido nem sequer se apurou o imposto) dos montantes devidos a titulo de imposto e sua inerente apropriação (quais montantes? os apurados em acção inspectiva? dos quais o arguido nunca foi notificado para pagamento?), e a não fiscalização ou inspeção, criou na sua consciência uma crença de impunidade, levando-o á prática de condutas semelhantes.
            Na verdade, em virtude do arguido não ser imediatamente sujeito á inspeção por parte dos competentes serviços de fiscalização tributária, convenceu-se que a atuação que havia levado a cabo havia sido bem sucedida, o que motivou a instalação de um ambiente favorável á sua reiteração nos trimestres seguintes.
            É fato que a morosidade da atuação das entidades competentes e mercê do benefício patrimonial imediato que a situação de incumprimento determinava, proporcionou ao arguido o meio próprio para a prática do crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, que se consuma, como tal, com a prática do último facto, definindo, como tal a lei aplicável – artigo 3.º do Código Penal.
            Crime esse, pelo qual, quando muito, deveria o arguido ser condenado, e não em sete crimes em concurso efectivo, pelo que se for vencida a alegação supra de alteração do tipo legal de crime, em última instância, deverá o arguido ser condenado pelo crime de abuso de confiança fiscal na forma continuada, alterando-se, assim, nessa parte a sentença de que se recorre.
            Consequentemente, tendo em conta todo o fatualismo considerado deve o douto acordão ser revogado condenando-se o arguido pela prática de um só crime e não pela prática de sete crimes de abuso de confiança fiscal.
                                                                       ****
   O Ministério Público, na resposta ao recurso, contra-alegou o seguinte:
   “A fls. 8 da motivação (fls. 559 dos autos) o recorrente especifica os três pressupostos necessários à existência do crime continuado: existência de elementos constitutivos do mesmo comportamento, que se dirigem fundamentalmente contra o mesmo bem jurídico, ou contra bens jurídicos fundamentalmente idênticos; o exercício de forma essencialmente homogénea e no quadro de uma situação exterior que diminui consideravelmente a culpa; e o agente deve ter uma culpa consideravelmente diminuída.
Em seguida analisa cada um dos referidos pressupostos para concluir, a final, que todos eles se verificam pelo que, consequentemente, “deve o douto acórdão ser revogado condenando-se o arguido pela prática de um só crime e não pela prática de sete crimes de abuso de confiança fiscal” (SIC).
Com o devido respeito, discordamos do recorrente relativamente aos segundo e terceiro pressupostos, por entendermos que o arguido não poderia ter agido num quadro de uma situação exterior que lhe diminuiu consideravelmente a culpa, ou que a sua culpa possa ser tida como consideravelmente diminuída. Na verdade, conjugando os antecedentes criminais do arguido com o depoimento da testemunha B... (e o próprio teor do Auto de Notícia de fls. 72 a 74), facilmente chegamos à conclusão que o recorrente nos últimos 20 anos tem estado sob vigilância atenta (e quase permanente) da administração fiscal, por causa dos quatro (4) crimes de abuso de confiança (fiscal e contra a segurança social) praticados pelo arguido naquele período, sempre através do mesmo modus faciendi, ao que tudo indica, isto é, não entregando à administração fiscal o IVA que liquidou e recebeu nas transacções comerciais e não entregando à Segurança Social as contribuições deduzidas pelo arguido no seu vencimento ou nos vencimentos dos seus colaboradores e ainda não enviando à administração fiscal e à Segurança Social as respectivas declarações relativas ao IVA e contribuições.
Como o arguido manteve sempre a mesma atitude com a administração fiscal, não pagando o imposto devido, não enviando as respectivas declarações e não apresentando ou facultando os documentos contabilísticos (e furtando-se a qualquer contacto), a administração fiscal viu-se obrigada, por quatro vezes em 20 anos, a recorrer aos documentos contabilísticos de terceiros para apurar os montantes do imposto não pago pelo arguido.
As quatro acções de inspecção a que o arguido foi sujeito nos últimos 20 anos (decorre ainda a 5.ª inspecção referente aos anos 2010/2011 – ponto 14 dos factos provados) terão sido necessariamente morosas, pelas razões supra indicadas, o que explica também (em parte) o longo período que separa a data da prática dos factos da data da sentença que condenou o arguido pela prática daqueles factos, nos vários processos indicados no douto acórdão recorrido e nos presentes autos.
Certamente que durante esses longos períodos de inspecção a administração fiscal não deixou de contactar ou tentar contactar o arguido variadíssimas vezes, ora para lhe exigir os documentos contabilísticos necessários ao apuramento do imposto em dívida, ora para dar cumprimento a diligências ou formalidades no âmbito dos Inquéritos, ora apenas e tão só para o aconselharem a actuar dentro da legalidade fiscal. Sendo assim pensamos não ter havido condições para uma alegada “conformação exterior que concorreu para determinar o arguido para a resolução de renovar a prática do crime”, e consideramos exagerada e sem fundamento a afirmação de que “após a primeira não entrega (…) dos montantes devidos a título de imposto e sua inerente apropriação (…), e a não fiscalização ou inspecção, criou na sua consciência uma crença de impunidade, levando-o à prática de condutas semelhantes” (v. fls. 559/560).
De facto, pela quantidade e morosidade das acções de inspecção a que o arguido foi sujeito nos anos que antecederam a prática dos factos que deram origem aos presentes autos, não parece ser possível afirmar que o arguido actuou no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminuiu consideravelmente a sua culpa. Pelo contrário, apesar das muitas advertências da administração fiscal, o arguido continuou a fazer «orelhas moucas» e a violar os seus deveres fiscais mais elementares, integrando no seu património elevados montantes que deveria entregar nos serviços de cobrança do IVA, nunca tendo enviado àqueles serviços as declarações respeitantes a tais montantes, recusando-se a facultar à administração fiscal os documentos contabilísticos necessários ao apuramento rigoroso dos montantes do imposto não entregues à administração fiscal e furtando-se a qualquer contacto com os inspectores tributários.
Assim sendo, por inexistência dos necessários pressupostos, não é possível subsumir a conduta do recorrente à prática de um único (continuado) crime de abuso de confiança fiscal.
                                                           ****
Não assiste razão ao recorrente, pelos motivos constantes da resposta ao recurso que entendemos por bem citar, dada a sua clareza.
Há que salientar, e em síntese, que a realização plúrima do mesmo tipo de crime pode configurar:
a) um só crime, se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou a resolução inicial;
b) um só crime na forma continuada, se toda a actuação não obedecer ao mesmo dolo, mas este estiver interligado por factores externos que arrastam o agente para a reiteração das condutas;
c) um concurso de infracções, se não se verificar qualquer dos casos anteriores (acórdão do S.T.J., de 25-6-86, in BMJ, 358/267.
Nos crimes tributários, a omissão das entregas pode ser fruto da execução de um plano prévio, gizado antes da primeira falta, cujo dolo todas abrange – caso em que se estará perante a hipótese acima aludida em a); se, pelo contrário, antes de cada falta, foi tomada a resolução de não entregar a próxima prestação, então o comportamento do agente cairá numa das hipóteses das als. b) ou c).
A punição menos grave do crime continuado (artigo 79.º, do Código Penal) decorre da circunstância da culpa se mostrar diminuída, por o agente ter repetidamente deparado com uma situação exterior igual às que anteriormente o haviam solicitado para o comportamento criminoso.
Nos crimes tributários, é vulgar acontecer esta forma de crime.
O agente, num dado momento, por dificuldades económicas ou outra razão, não entrega uma prestação que tinha retido. Aquando da próxima prestação, porque as dificuldades se mantêm e nenhuma reacção institucional houve à sua falta, toma nova decisão de não fazer as entregas. Nas seguintes, mantendo-se o quadro, repete-se o comportamento.
A manutenção deste quadro exterior, que facilitou a repetição da actividade criminosa, torna cada vez menos censurável o comportamento do agente por não agir de acordo com o Direito.
Mas todo este quadro “estável” se altera se houver, num dado momento, uma qualquer reacção institucional.
Se os serviços tributários reclamarem as entregas em falta, se um cidadão for notificado para prestar declarações num processo-crime, ou se, em último grau, for julgado e condenado por determinados factos relacionados com as suas obrigações fiscais, tudo isso constitui um alerta quanto ao desvalor da sua conduta, relativamente a situações futuras semelhantes.
Por conseguinte, se ele persistir no seu comportamento, então, em vez duma diminuição de culpa, deverá, antes, ser considerado que houve um agravamento.
A interpelação ao arguido sobre o carácter ilícito da sua conduta, altera inevitavelmente, para sempre, o quadro de solicitação externa em que ele se move, não podendo deixar de ter reflexos no juízo concreto de censura que é feito.
Pois bem, no nosso caso, não estamos a falar de um arguido que tenha sido confrontado, pela primeira vez, com uma intervenção dos serviços tributários.
Pelo contrário, os antecedentes criminais do arguido revelam que este não pode desconhecer que a sua inércia em sede de obrigações respeitantes ao IVA desencadeia, forçosamente, uma resposta repressiva dos referidos serviços.
Por isso mesmo, não estamos perante uma situação de continuação criminosa, porque não se mostra provado o quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente, o que é exigido, além do mais, pelo n.º 2, do artigo 30.º, do C. Penal, como requisito do crime continuado.
            Na verdade, face aos factos provados respeitantes a diversas fiscalizações efectuadas ao longo de vários anos, temos de concluir que a cada uma das condutas do arguido correspondeu uma diversa resolução criminosa, e que nada exteriormente facilitou a repetição da actividade criminosa.
            Ou seja, essas resoluções foram entre si autónomas e não estiveram numa relação de continuidade e interdependência, pois não se inseriram numa rotina de procedimentos, facilitada pelo mesmo circunstancialismo externo.
            Face a tal não se pode falar em crime continuado, a propósito da conduta do recorrente, em toda a sua extensão, fazendo todo o sentido o que consta na decisão recorrida.
                                                                       ****
            3) Da suspensão da execução da pena:
            Quanto a esta última questão, há que atender aos pontos 41 a 61 das conclusões, aqui dados por reproduzidos.
            Convém lembrar, agora, que a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, de que é exemplo o Acórdão de 21/12/2006, tem entendido que, em princípio, na criminalidade fiscal, os fins das penas só se atingem com uma pena de prisão.
Afirmou-se nesse aresto o seguinte:
A reacção penal não se compadece com a adopção de penas simbólicas que perpetuam um sentimento de impunidade, ou pecuniárias, pois não levam à interiorização, por parte do agente, da responsabilidade pelo acto danoso, subestimando-o (Acórdãos de 17-04-02, Proc. n.º 160/02 e de 19-10-05, Proc. n.º 2321/05, qualquer deles da 3.ª Secção). Muito pelo contrário, desvalorizando a ilicitude que lhe está subjacente, adensam um sentimento generalizado de quase despenalização, que perpassa transversalmente à comunidade: conclusão esta que se espelha na frequência e na amplitude que vai assumindo a violação dos deveres fiscais, reforçadas pela progressiva desvalorização do acto punitivo e facilitada pela má consciência cívica em matéria fiscal. Tratando-se de quantias já com alguma expressão, a imposição directa de uma pena de multa que se reflecte monetariamente numa pequena parcela do montante total em dívida, pode contribuir, ainda mais, para "um amolecimento da consciência colectiva do dever de cumprimento das obrigações fiscais" (expressão empregue no Acórdão deste Tribunal de 21-04-04, Proc. n.º 259/04 - 3.ª Secção).” (ver Processo n.º 06P2946, disponível em www.dgsi.pt/jstj.).
Por isso mesmo, nenhuma crítica merece a opção feita pelo tribunal recorrido, no sentido de ser aplicada uma pena privativa de liberdade.
Os factos que ficaram provados são graves e socialmente muito reprováveis.
No que concerne ao crime em causa, as exigências de prevenção geral são avultadas, ponderando que a evasão fiscal configura um fenómeno generalizado e responsável por flagrantes injustiças de ordem social, na medida em que os trabalhadores dependentes, impedidos de se furtar às suas obrigações fiscais (uma vez que vêem as quantias devidas serem retidas na base do vencimento), acabam por ter que suportar encargos fiscais acrescidos, em determinadas ocasiões, por existirem cidadãos que se evadem ao cumprimento das suas obrigações tributárias.
Note-se que a confiança da Administração Fiscal na real capacidade contributiva dos cidadãos, configura um bem jurídico com assento Constitucional (art.º 103.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa) e reclama que seja garantido o seu respeito de forma efectiva.
Por via dos factos descritos nos autos, viu-se frustrada a satisfação do crédito do Estado, repercutindo-se essa situação na satisfação das necessidades sociais dos demais cidadãos que cumprem as suas obrigações fiscais e contribuem para o bem-estar sócio-económico da restante comunidade.
Por outro lado, mostram-se também elevadas as exigências de prevenção especial, em face dos antecedentes criminais do arguido, ainda que este se mostre inserido ao nível sócio-profissional e familiar, pois, à data da prática dos factos, o arguido já havia sido condenado por duas vezes pela prática de crimes da mesma natureza.
            O recorrente, em boa verdade, não coloca em causa a pena de prisão, pugnando, apenas, pela suspensão da sua execução.
Negado o enquadramento da sua conduta num crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, resta ver se estão reunidos os requisitos para suspender a pena de um ano e oito meses de prisão que lhe foi fixada.
                                                              ****
 A suspensão da pena constitui uma verdadeira pena autónoma.
A suspensão da execução da pena é uma medida com um cariz pedagógico e reeducativo, visando proporcionar ao delinquente condições ao prosseguimento de uma vida à margem da criminalidade e exigir-lhe que passe a pautar o seu comportamento pelos padrões ético-sociais dominantes.
A suspensão da execução da pena depende da verificação cumulativa de dois pressupostos: um formal, material o outro.
O primeiro exige que a pena de prisão aplicada não exceda 5 anos.
O pressuposto material consiste num juízo de prognose, segundo o qual, o Tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclui que a simples censura do facto e a ameaça de prisão bastarão para afastar o delinquente da criminalidade, salvaguardando as exigências mínimas da prevenção geral (artigo 50.º, do Código Penal).
E o tribunal só deve decretar a suspensão da execução quando concluir, face a esses elementos que essa é a medida adequada a afastar o delinquente da criminalidade.
O instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o tribunal e o condenado.
É necessário que, por um lado, se faça uma prognose social favorável quanto ao arguido no sentido de que, perante a factualidade apurada se conclui que o mesmo aproveitará a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, não voltando, com elevado grau de certeza, a delinquir e, por outro lado, que a suspensão cumpra as exigências de reprovação do crime servindo para satisfazer a confiança da comunidade nas normas jurídicas violadas.
Subjacente à aplicação desta medida existe um juízo favorável a que a socialização do arguido, em liberdade, possa ser alcançada.
Mas este juízo deve assentar em factos que, com suficiente probabilidade, indiciem que o arguido assumirá o tal comportamento adequado ao não cometimento de novos ilícitos.
A conclusão de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição assenta, obviamente, no pressuposto de que, por um lado, o que está em causa não é qualquer certeza mas, tão-só, a esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser lograda e de que, por outro, o tribunal deve encontrar-se disposto a correr um certo risco - digamos: fundado e calculado - sobre a manutenção do agente em liberdade.
Havendo razões sérias para duvidar da conformação do comportamento do agente a não delinquir ou se, não obstante o juízo de prognose ser favorável, as necessidades de reprovação e prevenção do crime aconselharem a não suspensão da execução da pena de prisão, então esta medida deve ser negada.
Em suma, é necessário que, por um lado se faça uma prognose social favorável quanto ao arguido no sentido de que, perante a factualidade apurada se conclui que o mesmo aproveitará a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, não voltando, com elevado grau de certeza, a delinquir e, por outro lado, que a suspensão cumpra as exigências de reprovação do crime servindo para satisfazer a confiança da comunidade nas normas jurídicas violadas.
                                                           ****
Tecidas estas considerações, e revertendo ao caso dos autos, poderá a socialização do ora recorrente realizar-se em liberdade?
Para fundamentar a sua pretensão, o arguido faz apelo à sua idade, ao tempo decorrido sobre a prática dos factos, à sua inserção social e, bem assim, à cessação da sua actividade de madeireiro e à total ausência de conflitos com a administração fiscal, a partir de 2009.
Em primeiro lugar, não vislumbramos como a idade do arguido possa ter qualquer influência para o fim pretendido.
O quotidiano dos tribunais ensina que comportamentos ilícitos como os descritos nos autos surgem em qualquer idade e nada nos diz que o arguido não prolongue a sua actividade por muitos anos, designadamente na época actual em que a esperança de vida aumenta e a reforma aparece cada vez mais tarde.
Em segundo lugar, é verdade que os factos descritos nos autos aconteceram em 2007/2008.
Ainda que se considere que já decorreu algum tempo sobre a sua prática, daí não pode ser retirado, necessariamente, algo de positivo.
É que o arguido, anteriormente (em 1992 e 1995), cometera crimes da mesma natureza.
E não se argumente que tais práticas podiam estar esquecidas em 2007/2008, já que uma das respectivas condenações sofridas tinha acontecido em Fevereiro de 2005. Além disso, em 2004, o arguido voltou a praticar um crime de abuso de confiança fiscal (ponto 13.4 dos factos provados).
Está visto, portanto, que o decurso do tempo não pode servir para fundamentar um juízo de prognose favorável.
Em terceiro lugar, quanto à inserção social do arguido, pouco sabemos a não ser que é casado e que trabalha (ponto 14 dos factos provados), o que, de qualquer modo, favorece o arguido.
Nada mais foi possível apurar, o que nada tem de estranho face à informação que consta de fls. 438 dos autos, trazida aos autos pela Delegação Regional de Reinserção do Centro – Equipa do Baixo Vouga, em 23/11/2012, à qual voltaremos mais à frente.
Em quarto lugar, é inglório o arguido alegar, neste momento, que deixou a actividade por conta própria e que cessou a actividade de madeireiro (ponto  n.º 50 das conclusões), uma vez que tal matéria não consta dos factos dados como provados.
Como tal, isso não pode ser tomado em consideração.
Em quinto lugar, é verdade que a última condenação do arguido está datada de 5/11/2009 (ver antecedentes criminais).
Embora isso não signifique que os problemas com a administração fiscal estejam ultrapassados em definitivo (a testemunha B..., aquando da audiência de julgamento, disse estar, então, em curso nova inspecção relativa ao recorrente), certo é que o Tribunal só pode levar em consideração condenações transitadas em julgado.
Tal condenação consistiu numa pena de 7 meses de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos.
Por uma questão de coerência que deve existir entre diversas decisões judiciais, numa primeira abordagem, não podemos deixar de pensar que deve ser concedida nova suspensão da execução da pena, na medida em que os factos em causa nos presentes autos ocorreram antes de 2009, de modo a não criar obstáculos à oportunidade concedida em 5/11/2009.
No entanto, num segundo momento, temos que entrar em linha de conta com outro factor de ponderação, a saber, o recorrente revela falta de sentido de responsabilidade social.
Na verdade, face aos seus antecedentes criminais, a circunstância de, pura e simplesmente, se ter afastado dos presentes autos não permite perspectivar um juízo de prognose favorável. Exigiria o bom senso que o arguido tivesse comunicado a nova residência (na (...)) a fim de poder comparecer, mais tarde, em audiência.

Na acusação de fls. 393/397, datada de 14/5/2012, consta que “não foi possível proceder à aplicação de medida de coacção ao arguido, porquanto não se logrou apurar o actual paradeiro do mesmo. (…) Por intermédio do OPC competente, notifique o arguido do presente despacho de acusação, atenta a morada conhecida do mesmo, devendo aquele ser constituído como arguido e nesse acto prestar termo de identidade e residência.
Na sequência, o arguido, em 14/6/2012, foi notificado e constituído arguido, tendo prestado TIR (indicou como residência: (...), Águeda).
Depois disso, nada comunicou ao processo e não compareceu em audiência, sendo pertinente, neste momento, transcrever o teor da informação de fls. 438, atrás mencionada:
Vimos informar Vª. Ex.ª que o arguido em referência foi convocado, por escrito, para comparecer a 31/10/2012, nos Serviços de Reinserção Social, não tendo comparecido, nem a convocatória sido devolvida pelos CTT.
Em 14/11/2012, foi efectuada deslocação à morada indicada, Á-dos-Ferreiros/Águeda, não tendo sido encontrado o arguido e nos contactos com os pais (idosos), residentes na localidade, foi-nos referido pelos mesmos que o filho não reside ali não indicando nova morada. Em contactos com pessoas da localidade foi-nos referido que não é visto no meio e desconhecido o seu paradeiro.
Esta situação inviabiliza a nossa intervenção, não nos permitindo dar resposta ao solicitado.
Aproveite-se esta transcrição para deixar aqui expresso que acompanhamos o Ministério Público, quando este, na resposta ao recurso, refere que o “teor desta informação, importa realçar, contraria a alegada vontade do arguido em comparecer ao julgamento, pois ao manter a residência dos seus pais no TIR sabia, por experiência própria, que as cartas de notificação do tribunal seriam enviadas para aquela morada e, como tal, teria que pedir a alguém da sua confiança para o avisar atempadamente.
Face ao exposto, não merece reparo, também nesta parte, o decidido pelo Tribunal a quo.
****
          IV – DECISÃO:
Nestes termos, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a 5ª Secção deste Tribunal da Relação de Coimbra em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em quatro UC.
****
               
                  Coimbra, 30 de Outubro de 2013

(José Eduardo Martins - Relator)
           (Maria José Nogueira)