Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2265/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: ISAÍAS PÁDUA
Descritores: REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL
FACTORES A TER EM CONTA NO DESTINO DOS MENORES; ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
Data do Acordão: 10/12/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE CANTANHEDE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ART.ºS 1905º E 1906º DO C. CIV. .
Sumário: I – O escopo fundamental a ter em conta na decisão sobre o destino do menor é o interesse deste último, ou seja, saber qual das pessoas a quem legalmente o menor pode ser confiado estará em melhores condições de realizar tal desiderato, nomeadamente em termos de assegurar melhor o desenvolvimento da sua personalidade, particularmente a nível físico, psicológico, afectivo, moral e social .
II – É hoje inquestionável, a nível das diversas ciências que estudam o desenvolvimento das crianças, que os irmãos devem crescer juntos, sendo isso importante para o seu desenvolvimento harmonioso, formação das suas personalidades e para o seu equilíbrio afectivo-psicológico .
III – O dever de contribuir para o sustento dos filhos menores constitui uma obrigação dos pais, assumindo estes a posição de devedores e aqueles a de credores, tendo origem na relação biológica da filiação .
Decisão Texto Integral:
Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra
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I- Relatório
1- A... intentou a presente acção de regulação do exercício do poder paternal dos menores B... e C..., contra D..., alegando, em síntese, que se encontra separada de facto do seu marido, o ora requerido, desde Janeiro de 2002, impondo-se a regulação do poder paternal relativamente aos filhos do casal, acima identificados, sendo que o Diogo se encontra a viver consigo e o Rui com o pai.
No final requereu que ambos os menores sejam confiados à sua guarda e tutela, que o requerido seja condenado a contribuir com pensão alimentícia mensal no montante total de € 250 a favor de ambos os filhos, e que o regime de visitas fosse regulado nos termos por si ali indicados.

2- Realizada que foi a conferência a que se reporta o artigo 175º da 0TM, não foi possível obter o acordo entre a requerente e requerido, muito embora tivessem aí esboçado um acordo provisório, a vigorar até à decisão final a proferir, no que concerne à guarda dos menores e ao direito de visitas e em temos que melhor constam da acta de fls. 27/28.

3- Nas alegações que entretanto apresentou (a fls. 44/48), o requerido pugnou para que lhe seja confiada a tutela e a guarda dos dois filhos, com a regulação do direito de visitas a ser efectuada de acordo com as condições específicas dos menores (sendo que no que concerne à pensão alimentícía nada disse).

4- Por sua vez, nas suas alegações que também apresentou (a fls. 52/58), a requerente pugnou pela regulação do exercício do poder paternal nos termos já por si defendidos aquando do requerimento inicial.

5- Procedeu-se depois à instrução do processo, destacando-se a realização dos inquéritos sobre a situação social, moral e económica dos pais e a que se refere o art. 178º n. 3 da O.T.M. (os quais se encontram juntos a fls. 68/73 e 79/83), sendo que mais tarde, e na sequência do que fora ordenado em plena realização do julgamento, foi ainda junto aos autos (a fls. 191/196) um relatório do exame psicológico ao menor Rui, acompanhado de uma entrevista clínica aos pais dos menores e ao próprio menor Diogo, realizado pelo Instituto de Medicina Legal (delegação de Coimbra).

6- Procedeu-se, mais tarde, à realização do julgamento - sem a gravação da audiência -, com a audição dos pais dos menores e bem assim da prova testemunhal arrolada.
6.1 Acresce que no início do julgamento os pais acordaram em regular, novamente em termos provisórios, o exercício do poder paternal, no que concerne a aspectos de tutela e regime de visitas dos menores, e a vigorar até ao momento que fosse proferida a decisão definitiva no processo, o que foi homologado judicialmente nos termos que constam da acta de fls. 166/167.

7- Seguiu-se a prolação da douta sentença final, junta a fls. 248/275, e na qual, com base nos fundamentos aí brilhantemente aduzidos, acabou por se decidir a regulação do exercício do poder paternal dos sobreditos menores nos seguintes termos:
“A) Os menores ficam confiados à guarda e cuidados da mãe, que sobre eles exercerá o poder paternal, devendo zelar pela sua educação, saúde e alimentação.
B) O pai poderá ter consigo ambos os menores simultaneamente:
- Ao fim de semana, de quinze em quinze dias, indo buscá-los a casa da mãe ao sábado às 10 horas e entregá-los ao domingo às 19 horas.
- Os menores passarão com o pai 15 dias das férias de Verão, devendo o pai avisar a mãe, acerca do período que pretende passar com os menores com, pelo menos, 2 meses de antecedência.
- O Natal, o Ano Novo e a Páscoa serão passados alternadamente, com o pai e com a mãe, começando o Natal este ano com a mãe, o Ano Novo com o pai e a Páscoa com a mãe.
- Nas alturas festivas que couberem ao pai, este poderá ficar com os menores o tempo correspondente às férias escolares dos menores. Tendo em conta que as férias de Natal e Ano Novo costumam ser contínuas, o pai poderá vir buscar os menores a casa da mãe no dia 27 de Dezembro e tê-los consigo até ao dia 1 de Janeiro.
- Na Páscoa, a semana que a precede será passada com o progenitor a quem corresponder esse período festivo, desde o fim de semana-sábado- que precede a semana da Páscoa até ao Domingo de Páscoa.
- Os aniversários dos menores serão passados, alternadamente, com o pai e com a mãe começando com o pai.
- O pai poderá visitar os menores sempre que quiser desde que não prejudique o descanso e as obrigações escolares destes, avisando previamente a mãe dos menores.
C) O pai contribuirá com a prestação de alimentos relativamente a cada um dos filhos, na quantia de € 100, que deverá enviar mensalmente à requerente, até ao dia 10 de cada mês, por vale postal ou através de cheque”.

8- Porém, por não se ter conformado com tal sentença, mesmo depois de ter sido objecto do despacho aclaratório de fls. 283 na sequência do pedido feito nesse sentido pelo mesmo, o requerido dela interpôs recurso, o qual foi admitido como apelação e como efeito devolutivo.

9- Nas correspondentes alegações que apresentou, a fls. 310/316, o requerido concluiu as mesmas nos seguintes termos:
“A) Em processo de regulação do poder paternal, o que é essencial é a defessa dos interesses dos menores, tomando-se em consideração as idades e o meio familiar em que estão inseridos ou onde se pretende inseri-los.
B) Para a prossecução destes objectivos é princípio fundamental o da estabilidade que aconselha a manutenção da residência dos menores no meio onde vivem, brincam e têm os seus amigos.
C) No caso sub judice o menor Rui Alexandre sempre viveu com o pai e acompanhado dos avós paternos, estando inserido num meio que lhe proporciona equilíbrio emocional e afectivo.
D) Esse equilíbrio, conforme consta dos diversos relatórios juntos aos autos, está a ser permanentemente afectado por força da indecisão quanto à eventual decisão judicial de passar a viver com a mãe, facto que ele próprio rejeita expressamente.
E) No pressuposto de que a educação dos dois menores deveria ser conjunta, facto ao qual não adere muita da mais recente doutrina, sempre seria muito menos prejudicial a saída do menor Diogo da companhia da sua mãe, a qual, para além do mais, atrasou o início do processo de fala do seu filho por sua única e exclusiva responsabilidade.
F) De acrescentar, por significativo e importante para a avaliação do carácter psicológico dos pais relativamente aos filhos, o reiterado incumprimento do regime provisório de regulação do poder paternal, conforme decorre expressa e abundantemente dos autos e que muito afectou o menor Rui Alexandre. Assim,
G) Os menores deveriam ter sido confiados à guarda do ora recorrente dado ser este que melhores condições tem para, conjuntamente a família, assegurar a efectivação dos princípios necessários ao normal desenvolvimento educacional dos menores. Acresce que
H) O recorrente aufere um salário mensal líquido de € 375,00, pelo que,
I) Não pode pagar, a título de prestação de alimentos, € 200,00 mensais e, ainda, deslocar-se a Cantanhede, de 15 em 15 dias, para ver os filhos. Por outro lado,
J) A retroactividade da pensão de alimentos à data da propositura da presente acção representaria um enriquecimento, ilegítimo e sem causa, da recorrida à custa do ora recorrente, pois este teve a seu cargo e suportou toda a educação do seu filho Rui Alexandre.
K) A douta sentença recorrida violou, assim, os princípios da equidade e os que emergem dos artºs 2003º e 2004º do Código Civil.
Nestes termos deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, os menores serem confiados à guarda do pai, ora recorrente ou, a não se entender assim, a ser fixada uma pensão de alimentos que, em nenhuma circunstância, poderá ser superior a € 50,00 mensais por cada um dos filhos....”.

10- O Digno Magistrado do MPº e bem assim a requerente contra-alegaram, respectivamente, a fls. 332/346 e 347/358, pugnando ambos pela improcedência do recurso e pela, consequente, manutenção, do julgado, defendendo ainda a última que o início do vencimento das prestações alimentícias se retroaja à data da instauração da acção.

11- Entretanto, a requerente e o requerido, chegaram novamente a um acordo provisório sobre a regulação do exercício do poder paternal dos sobreditos menores - para vigorar até ser proferida decisão sobre o presente recurso muito embora com a alegação de não prescindirem daquilo que cada um deles defendeu em sede das respectivas alegações -, e que foi logo homologado judicialmente, nos termos constantes da acta de fls. 367/368.

12- Corridos que foram os vistos, cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.
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II- Fundamentação
1- Delimitação do objecto dos recursos.
Como é sabido, e constitui hoje entendimento pacífico, é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objecto e o âmbito dos mesmos (cfr. artºs 690, nº 1, e 684, nº 3, do CPC), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso (cfr. nº 2 – fine - do artº 660 do CPC).
É também sabido que, dentro de tal âmbito, deve o tribunal resolver todas as questões que lhe sejam submetidas a apreciação, exceptuando-se aquelas questões cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras (cfr. 1ª parte do nº 2 do artº 660 do CPC).
Por fim, vem, também, sendo dominantemente entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a derimir (vidé, por todos, Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Rev. nº 2585/03 – 2ª sec.” e Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Agravo nº 480/03 – 7ª sec.”).

2.1 Ora calcorreando as conclusões do recurso verifica-se que são três as questões que importa aqui apreciar e decidir e que são as seguintes.
a) A qual dos pais deve ser confiada a guarda e a tutela dos dois menores (ao pai, como defende o próprio, ou à mãe como foi decidido pela sentença recorrida)?
b) Qual o montante da prestação ou pensão alimentícia mensal com que deve contribuir o progenitor a quem não for confiada a guarda dos menores?
c) Saber, no caso presente, o momento a partir do qual deve fixar-se o vencimento da aludida pensão?
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3- Os factos
Na sequência da discussão da causa, foram dados, pela 1ª instância, como provados os seguintes factos (os quais se deverão considerar definitivamente como assentes, dado que não se verificam, in casu, nenhuma das situações tipificadas no nº 1 do artº 712 do CPC, que pudessem levar à sua alteração):

3.1 A requerente A... e o requerido D... casaram em 19 de Julho de 1997;
3.2 Deste casamento nasceram dois filhos: B... em 2.07.1998 e C..., em 31.05.2001;
3.3 O casal fixou inicialmente a sua residência em Cadima, Cantanhede, em casa dos pais da requerente, os quais se encontram emigrados na Suíça, vindo a ausentar-se para trabalhar em França, quando o menor Rui tinha cerca de sete meses de idade, deixando-o aos cuidados dos avós paternos;
3.4 O casal regressou alguns meses depois, fixando residência em Lisboa, perto dos pais do requerido;
3.5 Nessa época, ambos os progenitores trabalhavam fora, ficando o menor Rui, até à chegada da mãe, junto aos avós paternos, os quais exploram um café e restaurante, sito no Campo das Amoreiras nº91, Lisboa, onde a requerente e requerido jantavam com o resto da família;
3.6 A dada altura, a requerente ficou desempregada passando a auxiliar os sogros no restaurante e aí permanecendo com o menor;
3.7 Após o nascimento do menor Diogo, começaram a surgir desentendimentos entre o casal, que conduziram à saída de casa da requerente, em Outubro de 2002;
3.8 Surgiram desentendimentos entre a requerida e a sogra e a incompatibilização entre estas;
3.9 Nessa altura (teria o menor Diogo cerca de 8 meses e o Rui 3 anos e ½), no decurso de um desentendimento familiar a requerente saiu da residência do casal, levando consigo o menor Diogo, regressando a Cantanhede, à casa de seus pais, sita em Cadima (a requerente salienta que o requerido a pôs fora de casa, não a deixando trazer nem despedir-se do menor Rui, visto que era essa a sua vontade, tal versão é contrariada pelo requerido que refere ter aquela saído voluntariamente apenas com o menor Diogo – todavia, acrescentamos nós, e tal como se nos afigura que foi a intenção da srª juiza a quo ao colocá-los entre parêntesis e numa perspectiva contraditória, estes factos sublinhados não devem ser tidos como assentes);
3.10 Em Novembro de 2001 o casal reata relações, indo o requerido ter com a requerente a Cadima, Cantanhede, ao fim de semana;
3.11 Nessa altura, o menor Rui passa a residir com a mãe, a solicitação desta e com o irmão Diogo em Cantanhede, passando a frequentar o jardim infantil de Cadima;
3.12 Em inícios de Janeiro de 2002, o requerido, por razões que não foi possível concretamente apurar, sem avisar a requerente, regressa a Lisboa, levando consigo o menor Rui, o qual tinha, na altura, 3 anos e meio;
3.13 A mãe do menor ficou desesperada, quando teve conhecimento de tal situação;
3.14 Desde então e, até à realização do acordo provisório acima aludido, no que se refere às visitas, a requerente deixou de ter contacto com o menor Rui (a requerente refere que o mesmo lhe foi negado pelo pai, não permitindo sequer o contacto telefónico entre a mãe e o filho);
3.15 O menor frequenta um jardim de infância em Lisboa;
3.16 É o avô paterno quem, habitualmente, leva o menor de manhã ao infantário e o vai buscar ao fim do dia, permanecendo este no café/restaurante dos avós paternos, com estes, até ao regresso a casa, que se dá habitualmente após a hora do jantar, o qual é tomado no restaurante;
3.17O pai, ora requerido, trabalha como técnico de próteses numa clínica dentária, no Monte da Caparica, onde aufere o salário mensal liquido de cerca de € 375;
3.18 Ao fim de semana o requerido ajuda os seus pais/avós paternos do menor, no restaurante;
3.19 Regressa ao restaurante dos pais, ao fim do dia, onde toma o jantar juntamente com o menor;
3.20 O menor pernoita juntamente com o requerido em casa dos avós , dormindo habitualmente com o avô;
3.21 O requerido dorme na sala;
3.22 São os avôs que cuidam, alimentam e acompanham o menor Rui nas suas actividades escolares e ao médico, assumindo um papel preponderante no seu processo educativo, revelando o pai algum alheamento relativamente a alguns aspectos da vida do menor;
3.23 O menor tem uma estreita relação afectiva com os avós paternos, especialmente com o avô;
3.24 A maior parte do seu tempo disponível é passado com os avós;
3.25 Os avós paternos vivem em casa arrendada, composta por 3 assoalhadas, cozinha e casa de banho;
3.26 O requerido despende 10 € com o jardim Infantil, 60€ de transportes.
3.27 O pai dos menores revelou um bom funcionamento cognitivo, personalidade emocionalmente estável, equilibrada e sem patologia visível;
3.28 Revela um grande apego e dependência afectiva aos seus progenitores , avós dos menores;
3.29 O menor Rui tem vindo a ser acompanhado por um psicólogo, apresentando alterações de comportamento, agressividade;
3.30 Possui um desenvolvimento intelectual e funcionamento cognitivo dentro da normalidade;
3.31 Revela-se uma criança emocionalmente instável, com dificuldade em cumprir tarefas e respeitar regras estabelecidas;
3.32 O tema “família” é uma área que incomoda e perturba o menor, revelando no seu comportamento indícios de vivência de um quadro familiar instável e perturbado;
3.33 Segundo o relatório elaborado pelo Instituto de Medicina Legal no âmbito do exame psicológico a este realizado, “a disfuncionalidade que foi detectada ao nível do comportamento do menor Rui Alexandre poderá estar associada a factores educacionais decorrentes do meio ambiente em que está inserido pelo que deverão ser os adultos envolvidos neste processo e que têm a seu cargo a responsabilidade de orientar o processo educativo desta criança quem necessita de rever as suas posições e estratégias educativas. Com a idade que tem ( quatro anos e dez meses à data da avaliação) o menor encontra-se em plena fase de desenvolvimento (físico, psíquico e social) pelo que ainda é possível alterar o processo educativo desta criança, de modo a minimizar eventuais sequelas.”
3.34 O menor Rui mantém uma ligação afectiva com a mãe, e os contactos havidos, desde a instauração do processo, têm estreitado esse relacionamento que, no início, evidenciou algum distanciamento da relação com a figura materna - com referências a “não gostar da mãe”-, relacionamento que se tem revelado gratificante para o menor - o qual, segundo declarações do pai, pergunta muitas vezes por aquela-;
3.35 A relação entre os dois irmãos , embora de início conotada com algum ciúme e competição entre eles, tem vindo a sedimentar-se durante o tempo que tem sido partilhado em comum, verificando-se que cada vez são mais estreitos os laços e a vontade de estar juntos;
3.36 O menor Diogo encontra-se desde a separação do casal a residir com a mãe em Cadima- Zambujal, área desta comarca, em casa dos avós maternos, os quais se encontram ausentes, emigrados na Suíça;
3.37 A referida habitação é composta de um piso, com duas salas; 3 quartos, cozinha e duas casas de banho, oferecendo boas condições;
3.38O menor frequenta a creche Pedro Teixeira, em Cantanhede, pela qual a mãe paga a mensalidade de € 60;
3.39 Aos 4/5 meses de idade o menor revelou sofrer de bronquite asmática o que conduziu a diversos internamentos Hospitalares- Hospital pediátrico de Coimbra, consultas médicas no Centro de Saúde Cantanhede e necessidade de medicação;
3.40 Durante os períodos de internamento que foram do conhecimento do pai, o menor não foi visitado por este, que revelou algum alheamento;
3.41 A mãe do menor revela-se uma mãe atenta, cuidadosa, preocupada com a saúde e bem estar do menor do qual cuida com imenso carinho, dedicação e afecto;
3.42 Em situação de doença a requerente é bastante zelosa;
3.43 A relação afectiva entre a mãe e o menor Diogo é muito estreita e intensa, sendo notória a forte relação afectiva que o menor mantém com a figura materna;
3.44 Neste momento o Diogo encontra-se melhor de saúde.
3.45 O Diogo é uma criança alegre, activa, dada, bem disposta e bem integrada.
3.46 O menor denota adequados hábitos de higiene, quer a nível pessoal, quer de vestuário.
3.47 A mãe do menor, a qual tem de habilitações literárias, o 12º ano, neste momento, encontra-se a tirar um curso remunerado- aufere cerca de € 396,22 líquido -, com a duração de 9 meses, de apoio familiar à comunidade, entre as 09h e as 17h, semanalmente, em Vilamar, área desta comarca de Cantanhede;
3.48 Tem perspectivas de ingressar, findo o curso, num Centro de Dia em Cadima, nesta comarca de Cantanhede;
3.49 A mãe dos menores revelou um bom funcionamento cognitivo, personalidade emocionalmente estável, equilibrada e sem patologia visível;
3.50 A mãe dos menores é pessoa de bom comportamento, tem uma vida estabilizada, e é tida por aqueles que com ela privam como boa mãe, carinhosa e dedicada;
3.51 Recebe auxilio financeiro dos pais, sempre que necessário, normalmente, mensalmente.
3.52 Tem veículo automóvel que se encontra a ser pago pelos seus pais;
3.53 A requerente vai levar e buscar o menor à creche, com quem fica após a saída do curso que frequenta- por volta das 17 horas.

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4- O Direito
4.1 Aproximação teórica, numa perspectiva histórica, à problemática do tema aqui em questão
Antes de mais apraz-nos registar a forma profunda, equilibrada e sensata com que a douta sentença recorrida tratou e analisou as diversas questões que lhe foram submetidas para apreciação neste processo, e a tal ponto que estivémos quasi tentados, à luz do estatuído no nº 5 do artº 713 do CPC, a remetermos simplesmente para os termos dos fundamentos da referida peça.
Porém, e porque haverá um pequeno aspecto (no que concerne à terceira questão acima enunciada)a alterar ou a esclarecer, decidimo-nos por adiantar algumas pinceladas, muito embora tendo sempre como pano de fundo, em termos referenciais, a aludida sentença.
Como resulta do que logo no início se deixou expresso, com o presente processo visa-se regular o exercício do poder paternal dos sobreditos menores, cujos pais, embora ainda casados, se encontram separados de facto.
É sabido que esse tipo de processos, ex vi o artº 150 da OTM, assumem a natureza de processos de jurisdição voluntária.
Significa tal, e antes de mais, que neste tipo de processos não existe um verdadeiro conflito de interesses a compôr, mas tão só um interesse a regular – o do menor -, muito embora possa existir um conflito de representações ou de opiniões acerca desse mesmo interesse (do menor).
Assim, neste tipo de processos, e ao contrário do que sucede nos processos de jurisdição contenciosa, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo, antes e sempre, adoptar a solução que julgar mais conveniente e oportuna para o caso concreto, sempre com os olhos postos nos reais interesses das crianças envolvidas (em termos do seu desenvolvimento físico-psicológico, intelectual e moral, que se pretende o mais harmonioso e equilibrado possível), tal como resulta daCarta Fundamental dos Direitos da Criança (vulgo, Convenção dos Direitos da Criança), da nossa Lei Fundamental, e dos vários diplomas avulsos, dos quais se destacam a LOTM e o C.C., e sem nunca esquecer que, por isso, neste domínio as decisões nunca são definitivas, já que podem ser alteradas ou modificadas sempre que circunstâncias supervenientes o justifiquem.
Porém, e infelizmente, nem sempre, ao longo dos tempos, foi assim.
Na verdade, remontando ao Direito Romano o pater-familias dispunha do jus vitae ac necis sobre os filhos, exercendo o seu poder sobre todos os membros da família, de modo absoluto e descriminatório, sem qualquer diferença. O filho e os seus bens pertenciam ao pai até à morte de um e de outro.
É, assim, que nas sociedades mais antigas, quer na grega, quer na romana, os filhos pertenciam ao pai como qualquer outro objecto da sua propriedade, significando, assim, que podia dispôr deles como de quaisquer outros produtos da sua actividade.
Seria só através de uma lenta evolução de longos séculos que se viria a atingir a noção de “filho”, como individualidade que deve ser considerada só por si e para si.
Foi então que, a partir de uma noção de poder paternal como símbolo de um poder total e absoluto, se chegou nos nossos dias à ideia de poder paternal como responsabilidade dos pais na orientação e preparação dos filhos menores para vida.
Tal ideia reflecte-se, entre, nós, ao consagrar-se o poder paternal como “um direito de ambos os pais, cujo papel insubstituível é reconhecido constitucionalmente, bem como se reconhecem os direitos dos filhos, ora como crianças, ora como filhos, a serem protegidos, quer pelos pais, como naturais protectores, quer pelo Estado, o qual, pelo controle da autoridade paternal, deverá, quando for caso disso, substituir-se aos pais – vg. artº 1881, nº 2, do CC e 36, nº 5, da CRP – na procura efectiva da realização integral da criança, futuro adulto e cidadão que se pretende saudável, equilibrado e consciente do seu papel na sociedade” – cfr. Maria de Fátima Abrantes Duarte, in “O Poder Paternal; contributo para o estudo do seu actual regime, pág. 40”.
É que, em virtude da agressividade (entendida no sentido mais amplo do termo) cada vez maior do mundo moderno, reconhece-se que a tarefa dos pais como educadores se encontra bastante dificultada, pois tal agressividade repercute-se nas relações pais-filhos, no entanto, e apesar disso, todo o menor tem o direito de ser educado, alimentado e orientado na sua preparação para a vida. E é para a prossecução de tal fim que o poder paternal existe. Não para o bem dos pais e para a realização da personalidades ou ambições destes, mas sim, para um interesse bem mais importante, qual seja o dos filhos.
Neste sentido se tem desenvolvido a ideia do poder paternal como um poder-dever, um poder funcional.

4.2 Apreciação da 1ª questão acima enunciada
Do destino dos menores
Debruçando-nos, agora mais de perto, sobre o caso em apreço, verifica-se que estamos perante pais que, muito embora ainda casados, se encontram separados de facto. Essa alteração na vida dos progenitores, reflecte-se, necessariamente, também na vida dos dois filhos menores aqui em causa. E daí que seja imperativo acautelar o destino destes através da regulação do exercício do seu poder paternal) nos termos e por força do disposto nos artºs 1905 e 1906 ex vi artº 1909, todos do CC.
Como é sabido, e resulta do disposto no artº 1905, nº 1, do Código Cívil - diploma ao qual nos referiremos sempre que doravante mencionarmos somente o normativo sem a indicação da sua origem –, numa acção de regulação do exercício do poder paternal, as questões que importa decidir são as seguintes:
- O destino do(s) menor(es).
- O direito de visitas.
- A fixação dos alimentos e a forma de os prestar.
Como resulta do atrás exarado, no caso apreço apenas se atacou directamente a sentença recorrida no que concerne à decisão tomada quanto à 1ª (destino dos menores) e à 3ª (atribuição da pensão alimentícia) daquelas questões (sendo certo que no caso de vir a ser alterado o regime ali estipulado quanto ao destino dos menores, nomeadamente no sentido de serem entregues ao pai, tal levaria inevitável e consequentemente à alteração do regime de visitas ali igualmente estipulado).
E é precisamente aquela 1ª questão, que supra enunciamos também como 1ª questão, cumpre aqui a apreciar neste recurso.
Em abono de tudo o que atrás já deixámos expresso, ou seja, no sentido do único vector a tomar em conta neste tipo de processos, e agora mais particularmente no que concerne ao regime do seu destino, preceitua o nº 2 do citado artº 1905 que “na falta de acordo, o tribunal decidirá de harmonia com o interesse do menor..”.
Por sua vez, estipula o actual artº 1096, nº 2, que “na ausência de acordo dos pais, deve o tribunal através de decisão fundamentada, determinar que o poder paternal seja exercido pelo progenitor a quem o filho for confiado”.
Portanto, em definitivo, o escopo fundamental a ter em conta na decisão sobre o destino do menor é o interesse deste último, ou seja, saber qual das pessoas a quem legalmente o menor pode ser confiado estará em melhores condições de realizar tal desiderato, nomeadamente em termos de assegurar melhor o seu desenvolvimento da sua personalidade, e particularmente a nível físico, psicológico, afectivo, moral e social.
Hoje, e acompanhando as mais avançadas ordens jurídicas, o nosso ordenamento jurídico encontra-se despido de qualquer preconceito, permitindo que qualquer dos progenitores (homem o ou a mulher) possa ter à sua guarda e cuidado os seus filhos, sendo ainda certo que, em casos de verdadeira excepção, a lei permite ainda que os menores possam ser confiados a terceiras pessoas ou mesmo a estabelecimentos de reeducação ou de assistência (cfr. artºs 1905, nº 2, do CC e 189, nº 1, da OTM).
Posto isto, na situação configurada nestes autos estamos perante um casal que vive separado, que tem dois filhos menores: o Rui (hoje já com 6 anos) e o Diogo (hoje já com 3 anos de idade). Separação essa longínqua em termos físicos – já que o requerido-pai vive em Lisboa e a requerente-mãe no concelho de Cantanhede -, e que tem a particularidade de cada pai viver com um daqueles filhos, ou seja, o menor Diogo está com o pai enquanto o menor Diogo está com a mãe, sendo, todavia, certo que cada um dos progenitores reclama a tutela de ambos os filhos.
E é fundamentalmente esse o aspecto mais importante da disputa dos referidos progenitores. Disputa essa que nos deixa a convicção, pelo que ressalta dos vários elementos juntos autos, de à qual não serem de todo alheios os avós paternos, com quem vive o apelante e bem assim o jovem Rui.
Estamos, todavia, felizmente perante um caso, em que os pais, ao contrário do que sucede bastas vezes, não renegam o amor e o carinho dos filhos, antes o proclamam e reclamam.
É hoje inquestionável, a nível das diversas ciências que estudam o desenvolvimento das crianças, que os irmãos devem crescer juntos (idealmente juntos dos pais), sendo isso importante para o seu harmonioso desenvolvimento e formação das suas personalidades e para o seu equilíbrio afectivo-psicológico, e que só em casos verdadeiramente excepcionais, motivados por razões extremamente ponderosas, tal deve deixar de acontecer. Situação de excepção essa que, como facilmente se extrai da matéria factual dada como assente, não ocorre no caso presente.
E tanto assim é que os pais, tendo a noção dessa realidade, reclamam que lhes seja atribuída a custódia dos dois filhos.
A questão que se põe é saber qual dos pais reúne, neste momento, as melhores condições para ter à sua guarda aqueles seus dois filhos – já que potencialmente qualquer um deles tem capacidades para o efeito –, e com vista a serem atingidos, no que concerne aos mesmos, aqueles desideratos de que atrás falámos?
Ora, face à matéria fáctica que foi dada como provada (vidé, nomeadamente, a descrita sob os pontos 3.11, 3.16, 3.18, 3.19, 3.20, 3.21, 3.22, 3.23, 3.24, 3.25, 3.29, 3.30, 3.31, 3.32, 3.33, 3.34, 3.36 a 3.53) é, também para nós, inquestionável que é a mãe quem, neste momento, se encontra em melhores condições (sempre numa perspectiva de melhor salvaguarda dos interesse dos mesmos) de ter à sua guarda aqueles seus dois filhos.
Na verdade, olhando para o pai, de tal matéria factual, ressalta, desde logo, o seguinte:
Que trabalhando diariamente fora de Lisboa, e donde só regressa no final do dia, praticamente mal tem tempo para acompanhar o menor Rui, que se encontra à sua guarda, sendo o seu papel de pai, na prática, desempenhado pelos avós paternos, e mais concretamente pelo avô, com quem aquele dorme habitualmente, sendo os mesmos que dele cuidam, o acompanham nas actividades escolares (vg. levando-o e indo buscá-lo ao infantário), nas idas ao médico e noutras actividades básicas essenciais. Mesmo aos fins-de-semana, que poderia aproveitá-los para estar com o filho Rui, emprega o seu tempo para ajudar os pais no restaurante destes. Tudo isso levando à conclusão, como, aliás, resulta dos factos dados como provados, que com aquele seu comportamento o recorrente-pai revela um certo alheamento e distanciamento no que concerne a alguns dos aspectos mais importantes da vida do menor Rui.
Logo, pergunta-se se o pai mal tem tempo para cuidar de um dos filhos, como seria se lhe fosse entregue ainda a guarda do outro filho - o Diogo -, por sinal ainda de mais tenra idade? Seria também para os avós paternos assumirem igualmente a sua guarda e o papel paternal que incumbe àquele?
Por outro lado, vivendo ele e o menor Rui, em casa dos seus pais, e sendo a mesma apenas composta por três assoalhadas – a pontos de o recorrente ter de dormir na sala -, como sucederia, perante espaço tão exíguo, se o menor Diogo fosse confiado à guarda do seu pai e fosse para lá viver?
Por outro lado, não nos podemos esquecer que o menor Rui revela algumas alterações de comportamento, nomeadamente em termos de instabilidade emocional e de agressividade. Disfuncionalidade essas que, segundo a psicóloga do IMLC que elaborou o relatório pericial junto aos autos, “poderá estar associada a factores educacionais decorrentes do meio ambiente em que está inserido, sendo de opinião, tal técnica, que deverão ser os adultos envolvidos neste processo e que têm a seu cargo a responsabilidade de orientar o processo educativo da criança quem necessita de rever as suas posições e estratégias educativas, (....) sendo ainda possível alterar o processo educativo da criança, de modo a minimizar as eventuais sequelas”.

Olhando agora a situação para a perspectiva da mãe, ressalta, daquela matéria factual dada como provada, o seguinte:
Que o Diogo, filho mais novo, vive com ela.
Que o mesmo depois de ter passado por um período inicial de algumas dificuldades em termos de saúde - mostrando-se a mãe nessas alturas uma pessoa bastante zelosa, terna e preocupada -, o seu estado é actualmente melhor, sendo hoje mesmo uma pessoa alegre, activa, dada, bem disposta e bem integrada, denotando mesmos adequados hábitos de higiene, quer a nível pessoal, que a nível de vestuário.
Que actualmente existe uma forte relação efectiva entre o Diogo e a mãe.
Que ambos se encontram a viver, sozinhos, na casa dos avós maternos - que se encontram emigrados na Suíça – que é composta de um piso, com duas salas, 3 quartos, cozinha e duas casas de banho, oferecendo boas condições de habitabilidade.
Que menor Diogo encontra-se a frequentar uma creche, sendo a sua mãe que o ali vai levar e buscar.
Que mãe, possuindo o 12º ano de escolaridade, se encontra a frequentar um curso remunerado, com perspectivas de no final do mesmo vir a ficar definitivamente empregada, sendo certo que actualmente, e de forma mensal, recebe ainda auxílio financeiro dos pais.
Que a mãe é uma pessoa de bom comportamento, equilibrada, sem qualquer patologia visível, sendo considerada, por todos que com ela privam, como uma boa mãe, carinhosa e dedicada.
Por outro lado, resulta ainda de tal matéria factual que não obstante nos primeiros tempos, após a separação dos pais, o Rui - que ficou então a viver com progenitor paterno – ter revelado um certo distanciamento em relação à mãe (o que se nos afigura normal, atendendo à sua tenra idade, e a outros factores que são facilmente perceptíveis), vem hoje - e na sequência dos contactos que foram sendo progressivamente mantidos com base nos acordos provisórios a que os pais chegaram já após o inicio deste processo – mantendo uma ligação afectiva com a mãe, com um progressivo estreitamento dos laços não só com ela mas também com o próprio irmão Diogo, sendo cada vez maior, ao contrário de outrora (e pelas razões supra expostas), a vontade de estarem juntos.
Ora, perante este quadro fáctico, afigura-se-nos, repetimo-lo, que é notoriamente óbvio e claro que é a mãe-requerente quem neste momento reúne as melhores condições (afectivas-materiais) para ficar com a guarda e tutela dos sobreditos filhos-menores, com vista atingir os desideratos acima referidos, e na perspectiva do real interesse dos mesmos.
E sendo assim, a decisão da srª juiza do tribunal a quo, ao decidir, quanto a essa questão, nos termos em que o fez não só não merece a nossa censura como, mais do que isso, merece mesmo o nosso aplauso.
Pelo que, nessa parte, o recurso terá, assim de improceder.

4-2 Quanto à 2ª questão acima enunciada
4-2.1 Da fixação do montante da contribuição da pensão alimentícia
Como resulta do que acima deixámos expresso, a fixação de alimentos e o modo de os prestar é uma das questões que urge acautelar numa regulação do exercício do poder paternal.
O encargo dos alimentos, a título de contribuição de ambos os progenitores para o custeio de todas as despesas inerentes ao sustento, habitação, saúde, vestuário e educação do menores, constitui uma imposição legal (cfr. artºs 36, nº 4, da actual revisão da CRP, e 1878, nº 1) o que não é se não mais do que uma consequência ou desenvolvimento do que consta no Principio IV da Declaração Universal dos Direitos da Criança.
A noção de alimentos compreende, nos termos do disposto no artº 2003 “tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário” (nº 1) e ainda também “a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor” (nº 2).
O dever de contribuir para o sustento dos filhos menores constitui uma obrigação dos pais, assumindo estes a posição de devedores e aqueles a de credores, tendo origem na relação biológica da filiação. E, tanto assim é, que a obrigação de alimentos transcende o plano do poder paternal, uma vez que mesmo inibidos do exercício deste os pais continuam obrigados à prestação alimentícia (cfr. artº 1917).
Dever obrigacional esse que se mantém até os menores atingirem a sua maioridade, ou seja, os 18 anos (cfr. artºs 1877 e 122), podendo mesmo, nas situações excepcionais previstas no artº 1880, estender-se para além dessa idade.
Na fixação dessa prestação alimentícia deve ponderar-se o binómio: possibilidades do devedor e necessidades do credor (menor), devendo aquelas possibilidades e estas necessidades serem actuais.

4-2.2 Postas estas considerações de cariz teórico-técnico debrucemo-nos agora, mais de perto, sobre o caso em apreço e no que concerne à questão ora em apreciação da fixação dos alimentos.
Ora tendo-se atrás confirmado a sentença da 1ª instância que decidiu confiar a guarda e tutela dos dois filhos do casal à mãe, é inolvidável que recairá sobre o pai-ora apelante a obrigação legal de contribuir com uma pensão alimentícia para o sustento e educação dos menores (envolvendo as cambiantes prescritas no citado artº 2003).
A questão que importa aqui decidir consiste em fixar o seu montante.
Na sentença recorrida entendeu-se, por bem, fixar tal montante em € 100 (cem euros) mensais por cada um dos referidos dois menores.
O ora apelante entende que, atendendo, sobretudo, à escassez do montante do seu vencimento mensal, tal montante não deve ir além de metade do que foi estipulado, ou seja, em € 50 por cada um dos filhos.
Quid iuris?
Esta questão, como regra, revela-se sempre uma das mais problemáticas na fixação do regime do exercício do poder paternal.
Por norma, quem fica obrigado a contribuir entende sempre que dá de mais, e quem recebe entende que recebe de menos.
Isso sucede ainda mais quando, como sucede no caso em apreço, os rendimentos de quem dá e de quem recebe (aqui vista na perspectiva da mãe) não são famosos.
Vejamos então os factos, dados como provados, tidos como mais significativos para ajudar na resolução da questão:
Por um lado, temos o apelante que aufere um salário mensal líquido de € 375, que aufere da actividade profissional de técnico de próteses num clinica dentária, sita no Monte da Caparica, e que vive em casa dos seus pais.
Por outro, temos a mãe que aufere cerca de € 396,22 mensais, num curso (remunerado) que anda a tirar, vivendo em casa dos pais, de quem vem recebendo também algum apoio financeiro (muito embora não se saiba em que condições ou montantes).
É de presumir (pelo menos atentos os factos atrás descritos e de acordo com as regras da experiência da vida) que nenhum deles paga qualquer retribuição aos seus progenitores pela utilização das suas casas. Todavia, nenhuma prova foi feita no sentido do seu pagamento.
Verifica-se, desde logo, assim, que a requerente e o requerido auferem ordenados muito parecidos, com uma diferença, insignificante, a favor da primeira, de aproximadamente € 25.
Porém, a requerente passa agora a ter ao seu encargo os dois filhos do casal, ambos ainda de tenra idade, sendo que o Diogo, agora com 3 anos de idade, frequenta uma creche, na qual a mãe paga € 60, sendo ainda certa que denota alguns problemas de saúde (felizmente não muito graves e, ao que parece, em franca melhoria); enquanto que o Rui, agora com 6 anos de idade, irá frequentar com toda a probabilidade o ensino básico, o que, como é notório, irá acarretar outro tipo de despesas, nomeadamente a nível de livros e outro material escolar.
Ora, muito embora não tenha sido feita qualquer outro tipo de prova quanto a outras despesas específicas (e nesse caso esse ónus caberia à requerente nos termos do disposto no artº 342, nº 1), considerando, porém, as referidas idades dos menores, e tendo em consideração aquilo que notoriamente terá que ser despendido com crianças nessa condição, nomeadamente com a sua alimentação, o seu vestuário, a sua higiéne e com a sua educação, pergunta-se se, de acordo com a actual realidade da vida, será muito, ou seja, será irrazoável impôr ao pai-ora apelante que contribua com o montante mensal de € 100 (e partindo do princípio que a mãe contribuirá com igual montante, muito embora tenha já sobre si todo um natural acréscimo de trabalho e preocupação, não remuneráveis, que tal situação lhe irá trazer) para a ajudar a suportar tais inerentes despesas comuns aos dois aludidos filhos, num total de € 200 mensais (para os dois)? A resposta, a nosso ver, é claramente negativa. A pecar, quanto a nós, só será por defeito, e tendo em conta o seu baixo salário – o qual, repete-se, é sensivelmente idêntico ao mãe, a quem os menores vão ficar diariamente confiados. Todavia, o apelante para além de viver em casa dos seus pais, não fez prova – como também nesse aspecto lhe competia, nos termos do disposto no artº 342 -, de qualquer despesa normal ou extraordinária que tenha a seu encargo.
Por tudo isso, termos de concluir que se nos afigura ajustado o montante da pensão alimentícia que foi fixado pela srª juiza do tribunal a quo, pelo que também, quanto a essa parte, não nos merece censura a sua decisão, devendo, consequentemente, o recurso improceder também nessa parte.

4-3 Quanto à 3ª questão
Do início vencimento da aludida pensão alimentícia.
Muito embora da decisão final não conste expressamente a data a partir da qual é devida a pensão alimentícia que foi fixada, todavia, subentende-se que tal vencimento se retroage à data da instauração da presente acção, já que na abordagem da questão específica se afirmou na sentença recorrida (fls. 26 da mesma), e citando aí o artº 2006, que “os alimentos são devidos desde a propositura da acção”, sendo que nada mais, em sentido contrário, foi dito daí em diante.
Na verdade, resulta do princípio geral estatuído no aludido artº 2006, que “os alimentos são devidos desde a propositura da acção”.
Porém, não estando o juiz neste tipo de processos vinculado a princípios de legalidade estrita, devendo as suas decisões ser sempre norteadas pelo princípio da equidade, em homenagem a este último princípio, afigura-se-nos que, no caso em apreço, tal regra não deve funcionar e pelo seguinte:
Como atrás se deixou exarado, um dos grandes objectivos desta acção visava fixar o destino dos dois filhos do casal, sendo que aquando da instauração da presente acção cada um dos pais tinha um filho à sua guarda e cuidado, ou seja, o menor Rui estava a viver com o pai e o Diogo vivia com a mãe, assumindo cada um dos aludidos progenitores (pelo menos dos autos nada resulta em contrário) as despesas relacionadas com o descendente que então estava à sua guarda.
Assim, e à falta de mais e melhores elementos, devem ter-se como compensados os “créditos” resultantes das despesas que cada um dos progenitores dispendeu com o descendente que então tinha ao seu encargo.
Desse modo, afigura-se-nos que equitativamente se impõe decidir, como se faz, que a pensão alimentícia fixada a favor dos sobreditos menores e imposta a cargo do pai-ora apelante se comece a vencer, ou seja, só seja devida a partir do momento ou data em que ambos os menores passaram a ficar à guarda e tutela da mãe.
Pelo que nessa parte, de decide julgar procedente o recurso, revogando, quanto a tal questão, a douta sentença da 1ª instância, alterando-a naquele sentido.
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III- Decisão
Assim, em face do exposto, acorda-se em julgar apenas parcialmente procedente o presente recurso de apelação, decidindo-se, em consequência, que a pensão alimentícia fixada na sentença da 1ª instância a favor dos menores B... e C..., e a cargo do seu pai, D..., somente será devida a partir da data em ambos ficaram confiados à guarda e tutela da sua mãe, A..., todos melhores id. nos autos, confirmando-se quanto ao demais tudo que foi decidido naquela douta sentença no que se refere ao exercício do poder paternal dos sobreditos menores (e cujos termos atrás deixámos exarados).

Custas da (acção e do recurso) pelo requerido-apelante e pela requerente-apelada, na proporção do respectivo decaímento, e que para o efeito fixo em 3/4 para o primeiro e em 1/4 para a última (muito embora se deva ter em atenção o benefício de apoio judiciário de que a mesma goza, até ao momento, em tal modalidade – cfr. fls. 9/10).
***
Cumpra-se, oportunamente, o disposto no artº 78, nº 2, do C. Reg. Civil.

Coimbra, 12 de Outubro de 2004