Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
102/07.2TBSEI-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE ARCANJO
Descritores: NOTIFICAÇÕES ELECTRÓNICAS
MANDATÁRIOS JUDICIAIS
PRESUNÇÃO LEGAL
Data do Acordão: 11/09/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: SEIA – 2º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 21º-A, Nº 5, DA PORTARIA Nº 114/2008, DE 6/02 (ALTERADA PELA PORTARIA Nº 1538/2008, DE 30/12).
Sumário: I – Como garantia do contraditório e do direito a um processo equitativo, as partes são notificadas dos actos praticados em juízo (artºs 3º e 228º, nº 2, CPC), em regra na pessoa do respectivo mandatário (artº 253º, nº 1, CPC).

II – Com a entrada em vigor do DL nº 183/2000, de 10/08, após a fase da contestação as notificações dos articulados e requerimentos autónomos são realizadas pelos mandatários entre si, no respectivo domicílio profissional, por todos os meios legalmente admissíveis para a prática dos actos processuais (artºs 229º-A, nº 1, 260º-A, nº 1, 150º, nº 1 e 2, do CPC).

III - A presunção legal estabelecida no artº 21º-A, nº 5, da Portaria nº 114/2008, de 6/02 (alterada pela Portaria nº 1538/2008, de 30/12), de que a expedição da notificação se presume feita no terceiro dia posterior ao da elaboração, é aplicável às notificações electrónicas entre mandatários das partes.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra


I – RELATÓRIO

1.1. - A Autora - A... Lda - instaurou na Comarca de Seia acção declarativa, contra a Ré – B....

         A Ré deduziu (11/2/2010 ) articulado superveniente, notificando electronicamente a Autora, na mesma data, através do sistema CITIUS.

         A Autora respondeu, através do mesmo sistema, em 24/2/2010.

         1.2. - Por despacho de 28/4/2010, entendendo-se que o articulado da Autora dera entrada no segundo dia útil após o termo do prazo, determinou-se o cumprimento do disposto no art.145 nº6 do CPC, sob pena de perda do direito à prática do acto.

         1.3. - Inconformada, a Autora recorreu de agravo ( com subida em separado ) com as seguintes conclusões:

[…]

        

         A Ré não contra-alegou e o M.mo Juiz manteve o despacho impugnado.


II – FUNDAMENTAÇÃO

         2.1. - A questão colocada no recurso consiste em saber se a presunção legal estabelecida no art.21-A nº5 da Portaria nº114/2008 de 6/2 ( alterada pela Portaria nº 1538/2008 de 30/12), é aplicável às notificações electrónicas entre mandatários das partes.

         O despacho recorrido considerou que a presunção do art.21-A nº5 da Portaria 114/2008 de 6/2, bem como o disposto no art.254 nº5 do CPC, não é aplicável às notificações entre mandatários, mas tão somente às notificações da Secretaria, porque – “ entre mandatários não há lugar ao acto de “elaboração da notificação” ( a notificação é assegurada pelo sistema CITIUS ) e, bem assim, esta última disposição está inserida na “Subdivisão I” referente a “notificações da Secretaria”, não havendo idêntico regime ( ou remissão) no art.260-A ambos do CPC”.

         Nesta medida, deu como assente que a notificação à parte contrária se efectivou em 11/2/2010, terminando o prazo ( dez dias ) para a resposta em 22/2/210, pelo que a apresentação ( 24/2/2010 ) ocorreu no segundo dia útil ao termo do prazo, determinando o cumprimento do art.145 nº6 CPC.

         Em contrapartida, a agravante rejeita tal interpretação, sustentando ser aquela presunção aplicável também às notificações entre mandatários, logo a resposta foi junta tempestivamente.

                 

2.2. - Como garantia do contraditório e do direito a um processo equitativo, as partes são notificadas dos actos praticados em juízo, ( arts.3 e 228 nº2 CPC), em regra na pessoa do respectivo mandatário ( art.253 nº1 CPC ).

         Com a entrada em vigor do DL nº 183/2000 de 10/8, após a fase da contestação, as notificações dos articulados e requerimentos autónomos são realizadas pelos mandatários judiciais entre si, no respectivo domicílio profissional ( art.229-A nº1 CPC ).

         Estas notificações efectuam-se por todos os meios legalmente admissíveis para a prática dos actos processuais, nomeadamente por via electrónica, como meio legalmente preferível ( art.260-A nº1, 150 nº1 e 2 CPC, redacção do DL nº303/2007 de 24/8 ).

         Os termos a que devem obedecer as notificações entre mandatários realizadas por transmissão electrónica, estão definidos por Portaria do Ministério da Justiça ( arts.138-A, 150 nº2 e 260-A nº2 CPC).

         A Portaria nº114/2008 de 6/2 veio determinar que a apresentação em juízo das peças processuais e documentos por via electrónica de dados seja feita através do sistema informático CITIUS.

         Entretanto, a Portaria nº 1538/2008 de 20/12 acrescentou ( art.3º ) àquela um novo capítulo das “Notificações”, abrangendo os arts.21-A a 21-C, ficando agora previsto que as notificações entre mandatários são realizadas através do sistema CITIUS, quando se tenham manifestado nesse sentido ou enviado para o processo qualquer peça processual ou documento através desse sistema informático ( art.21-A nº3 ).

         Dispõe nº 5 do art.21-A da Portaria nº 114/2008 ( introduzido pela Portaria nº 1538/2008 ):

         “ O Sistema informático assegura a certificação da data da elaboração da notificação, presumindo-se feita a expedição no terceiro dia posterior ao da elaboração ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o final do prazo termine em dia não útil”.

         A “data da elaboração” reporta-se ao momento da colocação da notificação em “versão final”, distinguindo-se da data da “data da expedição”, por esta ser presumida, correspondendo ao terceiro dia posterior ao da elaboração.

         A razão de ser desta dilação contende com eventuais vicissitudes que possam ocorrer entre o envio da notificação através do sistema informático e a posterior visualização pelo mandatário destinatário.

         Conforme justificou pertinentemente a agravante, no sistema de notificações electrónicas, não há que fazer qualquer distinção entre notificações da secretaria e notificações entre os mandatários, no que concerne à data da elaboração e de expedição, logo a presunção estabelecida no nº5 do art.21-A da Portaria é aplicável às notificações entre mandatários.

         Desde logo, pelo argumento gramatical e sistemático, na medida em que o art.21-A, reporta-se às “Notificações electrónicas”, tanto às realizadas pela Secretaria (nº4), como às notificações entre mandatários judiciais (nº3). A norma do nº5, aparecendo sequencialmente, abrange ambos os tipos de notificações.

         O art.21-B ( “Notificações electrónicas entre mandatários”) da Portaria não afasta ou excepciona as regras das “notificações electrónicas “, plasmadas no art.21-A, enquanto disposições gerais, e, por isso mesmo, aplicáveis a todas as notificações electrónicas, designadamente as realizadas entre mandatários judiciais.

         Por outro lado, o argumento teleológico assim o exige, não fazendo sentido a interpretação restritiva acolhida no despacho, já que a razão ser da presunção do art. 21-A nº5 da Portaria é a mesma, para ambas as notificações, que não tem a ver com a elaboração do documento, mas com os problemas que possam surgir na transmissão, havendo uma errónea interpretação do nº2 do art.21-B, quando aí se refere que “ o sistema informático CITIUS assegura a notificação por transmissão electrónica (…)”, pois este segmento normativo não posterga o preceito contido no nº5 do art.21-A da citada Portaria.

         Conclui-se, portanto, ser tempestiva a apresentação da resposta pela Autora/agravante.

        

2.3. - Em resumo:

A presunção legal estabelecida no art.21-A nº5 da Portaria nº 114/2008 de 6/2 ( alterada pela Portaria nº 1538/2008 de 30/12), de que a expedição da notificação se presume feita no terceiro dia posterior ao da elaboração, é aplicável às notificações electrónicas entre mandatários das partes.


III – DECISÃO

         Pelo exposto, decidem:


1)

         Julgar provido o recurso e revogar o despacho recorrido, devendo ser substituído por outro a considerar tempestivo o articulado resposta, sem aplicação da sanção do art.145 nº6 do CPC.


2)

         Sem custas.


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JORGE ARCANJO (RELATOR)
ISAÍAS PÁDUA
TELES PEREIRA