Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4001/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: MONTEIRO CASIMIRO
Descritores: ACÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO
OBRIGAÇÃO DE MEIOS E OBRIGAÇÃO DE RESULTADOS
DISTINÇÃO ENTRE ELAS
Data do Acordão: 04/19/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 496º, 790º, 793º, 798º E 799º DO C.C.
Sumário: I – Na obrigação de meios o devedor apenas se compromete a desenvolver diligentemente certa actividade para a obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se produza. Contrapõem-se-lhes as obrigações de resultado, que se verificam quando se conclua da lei ou do negócio jurídico que o devedor está obrigado a conseguir um certo efeito útil.
II – Estamos perante uma obrigação de resultado se consta de uma cláusula de um protocolo que “O ACP se compromete a incluir no itinerário significativo número de provas de classificação nos concelhos que integram a Região de Turismo do Centro e/ou subscritores deste protocolo”.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

A A..., com sede no Largo da Portagem, em Coimbra, intentou, em 17/09/1999, pelo Tribunal de Círculo de Coimbra, acção com processo ordinário, contra B..., com sede na Rua Rosa Araújo, 49, em Lisboa, pedindo a condenação deste na quantia de 10.303.205$00, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação.
Filia a causa de pedir num contrato que outorgou com o réu, mediante o qual este, em troca de contribuições financeiras, se comprometeu a realizar em cada um dos concelhos provas de classificação do Rallye de Portugal. Essa realização foi divulgada, chegando a ser editadas publicações com os mapas e guias dos concelhos, indicando aos leitores os melhores locais para ver as classificativas. O Rallye de Portugal é um importante meio de divulgação das potencialidades turísticas da região e as provas têm vindo a realizar-se nos concelhos referidos no contrato. No Rallye de 1999 o réu optou por não incluir e não realizar provas de classificação nos concelhos de Lousã, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão Grande. Em resultado do incumprimento do contrato, sofreu danos de índole patrimonial, derivados dos folhetos promocionais que tinha mandado imprimir e que deixou de poder usar, no valor de 303.205$00.Do mesmo modo, padeceu prejuízos não patrimoniais, porque houve dezenas de munícipes que atribuíram à inépcia da autora a não realização do Rallye de Portugal de 99 naqueles concelhos. Este assunto foi amplamente discutido naqueles concelhos e em Coimbra, o que afectou


a imagem de prestígio social e a credibilidade de que gozava. Para compensar tais danos pede a quantia de 10.000.000$00.
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O réu contestou, requerendo a apensação de outras acções que pendem noutros tribunais e que com esta estão conexas e arguindo a excepção de incompetência material.
Do mesmo modo, alega que a definição das regras do Rallye pertence à FIA. Todos os anos é apresentado ao Conselho Mundial do Desporto da FIA um projecto da realização de cada Rallye, sendo este órgão que decide quais as provas que são incluídas no Campeonato do Mundo, após negociação, para aprovação, dos projectos apresentados pelos organizadores. A este órgão pertencia o Senhor C..., anterior presidente do B..., que tinha voz activa no interior daquele órgão para decidir as questões relativas ao Campeonato Mundial de Rallies. O mesmo faleceu subitamente em 1998, facto que, aliado aos problemas de segurança que tinha apresentado o Rallye de 1998, comprometeu a presença de Portugal no Campeonato do Mundo de Rallies. A ameaça de exclusão de Portugal do Campeonato do Mundo era um facto público, noticiado na imprensa, situação que era do conhecimento da autora e das demais entidades subscritoras do protocolo. Defende que este protocolo designa uma forma de colaboração entre as entidades signatárias, com carácter institucional, precárias, que não chegam verdadeiramente a criar obrigações contratuais, mas apenas linhas mestras de actuação conjunta. É um acordo sem intuito negocial, tanto mais que o protocolo é subscrito pelo Sr. C..., então presidente do B..., quando os seus estatutos exigem a assinatura de dois directores para obrigar o Clube em actos e contratos que envolvam responsabilidade pecuniária. Se se tratar de um contrato, será ineficaz, por falta de poderes de representação; o documento não foi submetido à apreciação e aprovação do órgão executivo do Clube. Por outro lado, o protocolo visa manter parte significativa da prova desportiva na região centro, ressaltando que o interesse que se pretende acautelar é o da região e nunca a realização de provas em cada um dos concelhos. Para além disto se não poderia comprometer o réu, já que o traçado concreto do Rallye depende, em cada ano, da FIA, o que era do conhecimento da autora. Este compromisso foi mantido pelo réu em 1999, já que, em 1998, realizaram-se na A... 39,2% da totalidade das provas e 44,4% de quilómetros de classificação e, em 1999, realizaram-se 34,7% das provas e 38,1% dos quilómetros. O rallye manteve, assim, a sua importância na região centro. O protocolo foi celebrado quando o centro do rallye estava situado na Figueira da Foz e passou para Matosinhos, o que levou a região centro a assinar o protocolo com receio de ser preterida. A FIA impôs, para o rallye de 1999, normas que impuseram restrições ao percurso do rallye, quanto aos locais de chegada e partida, que determinaram à exclusão dos concelhos mais a sul da região: Figueiró dos Vinhos, Pedrógão e Lousã. Este facto foi comunicado a estas Câmaras. O réu deslocou-se às instalações da autora para lhe explicar as exigências da FIA e a dificuldade em manter o traçado do rally. Impugna os prejuízos reclamados pela autora, defendendo que o interesse da região não foi afectado com a alteração do traçado do rallye.
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A autora replicou, defendendo a improcedência das excepções da incompetência material e do incumprimento do contrato por causa imputável a terceiro.
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No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção de incompetência material e organizados os factos assentes e a base instrutória para apuramento da matéria necessária ao conhecimento das demais questões suscitadas, com reclamação do réu, parcialmente atendida.

Teve lugar o julgamento, com gravação da prova.
Decidida a matéria de facto controvertida, sem reclamações, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente.
Apelou a autora, juntando as partes desenvolvidos Pareceres dos Srs. Profs. Paulo Videira Henriques e António Menezes Cordeiro, determinando este Tribunal da Relação a ampliação da matéria de facto.
Aditados à base instrutória os itens 42º a 45º, o tribunal respondeu a tal factualidade nos moldes exarados na decisão de fls. 730 a 731, sem reclamação.
Foi proferida nova sentença, que julgou a acção totalmente


improcedente.
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Na 1ª instância foi dado como provado o seguinte factualismo:
1. A autora e sete municípios integrados na região de turismo do centro (Arganil, Figueiró dos Vinho, Góis, Lousã, Mortágua, Pedrógão Grande e Tábua) celebraram com o réu um protocolo, com início em 14.7.97 e final em 31.3.2000, para cobrir a realização das edições do Rallye de Portugal de 1998, 1999 e 2000, válidas para o Campeonato do Mundo e/ou Taça do Mundo da Federação Internacional do Automóvel (FIA). O protocolo é subscrito pelo então Presidente do B..., Sr. C... - (al. a) dos Factos Assentes).
2. No âmbito desse protocolo, o réu comprometeu-se a incluir no itinerário significativo número de provas de classificação nos concelhos que integram a região de turismo do centro e/ou subscritores do protocolo, a inserir no regulamento, nos folhetos promocionais e no cartaz, o logotipo RTC, a salientar, nas apresentações nacionais e internacionais do Rallye de Portugal, a contribuição da RTC e das Câmaras Municipais e a divulgar uma lista das unidades hoteleiras, a editar pela RTC, para promocionar as actividades turísticas da região – (al. b).
3. A autora e as Câmaras Municipais referidas comprometeram-se a assegurar ao réu uma contribuição financeira anual de 16.000.000$00 (2.000.000$00 de cada uma dessas entidades), a liquidar entre 15 e 20 de Janeiro de 1998, 1999 e 2000, valores que seriam corrigidos de acordo com o índice de inflação oficial para os anos de 1999 e 2000 – (al. c).
4. A autora comprometeu-se a informar a organização do Rallye de Portugal sobre as alterações significativas que se constatem ao nível da oferta de serviços de alojamento, restauração e outros na área da região, de molde a habilitar aquela organização de todos os elementos úteis para o formato da prova - (al. d).
5. A autora e as referidas Câmaras Municipais comprometeram-se a abster-se de qualquer publicidade que não fosse previamente acordada com o réu -


(al. e).
6. Em 29.9.98, a World Rally Teams Association comunicou ao réu a necessidade de introduzir alterações no percurso do Rallye de Portugal, com vista a adaptá-lo à nova filosofia do Campeonato do Mundo, esclarecendo que o número de provas classificativas do Rallye teria que ser reduzido, mantendo-se a distância total do percurso, obrigando a aumentar a distância média das provas classificativas e ainda que, para permitir o acesso diário ao ponto de partida (Matosinhos), seria necessário reduzir os parques de assistência e o número de cidades visitadas. Pedia também para que o período de reconhecimento do percurso do Rallye pelos pilotos fosse equivalente a apenas ¾ do período de duração do Rallye - (al. f).
7. Em 1.10.98, a FIA sublinhou que o Campeonato do Mundo de Rallies sofrera uma mudança nos últimos anos, com a aceitação de novos construtores. Essa carta referia que, de acordo com o estabelecido em reuniões mantidas com o réu, teriam de ser implementadas para o Rallye de Portugal 1999 as seguintes medidas: etapas especiais mais longas com eliminação de outras etapas especiais, menor quilometragem entre as provas classificativas, menor número de parques de assistência, de modo a ter apenas uma unidade de assistência por cada automóvel inscrito. A implementação destas medidas era condição necessária para que o Rallye de Portugal se mantivesse no Campeonato do Mundo, em 1999 - (al. g).
8. Em 1.9.98, o réu alertou as Câmaras municipais da Lousã, de Pedrógão Grande e de Figueiró dos Vinhos para o facto das normas fixadas pela FIA imporem algumas restrições nomeadamente quanto à extensão do percurso e quanto aos locais de partida e chegada do Rallye, limitações que iriam afectar esses concelhos, porque eram os mais a sul em relação ao local de partida e chegada das etapas. O réu sublinhava que tais limitações eram alheias à sua vontade e impostas pela FIA – (al. h).
9. Em 23.11.98, o réu declarou àqueles municípios a impossibilidade de executar o protocolo, em resultado do Rallye não poder passar no concelho de Pedrógão Grande, devido a imposições da FIA - (al. i).



10. Antes de abordar individualmente cada um dos municípios signatários do protocolo, o réu, na pessoa do presidente da sua comissão organizadora, Sr. Matos Chaves, e do director do Rallye, Dr. António Mocho, deslocou-se às instalações da autora, a quem explicou aquelas exigências da FIA e a dificuldade em manter o traçado do Rallye - (al. l).
11. O Rallye de Portugal realizava-se, desde há muitos anos, em alguns dos concelhos signatários do protocolo - (al. m).
12. Na edição do Rallye de 1999, que decorreu em Março, o réu não incluiu e não realizou provas de classificação nos concelhos da Lousã, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão - (al. n).
13. Para obrigar o réu em actos e contratos que envolvam responsabilidade pecuniária são necessárias as assinaturas de dois directores (doc. fls. 122 a 132) - (al. o).
14. A autora incluiu no folheto promocional de Figueiró dos Vinhos a passagem no concelho do Rallye de Portugal - (resp. qº 1º da Base Inst.).
15. Foram impressos 15.000 folhetos, em línguas francesa, inglesa, espanhola e portuguesa - (qº 2º).
16. Esses folhetos destinavam-se a ser distribuídos pelo público no triénio 1998/1999/2000 - (qº 3º).
17. Como não foram incluídas as classificativas do Rallye de Portugal de 1999 no concelho de Figueiró dos Vinhos, a autora teve de inutilizar 10.000 folhetos, no valor global de 231.660$00 - (qs. 4º, 5º e 6º).
18. A passagem do Rallye de Portugal nos troços de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Lousã havia-se tornado num fenómeno social que arrastava para aqueles concelhos dezenas de milhar de pessoas - (qº. 10º).
19. E contribuía para a divulgação das suas potencialidades turísticas (qº11º).
20. Com a não realização daquelas provas, houve munícipes que atribuíram tal facto à inépcia da autora - (qº. 12º).
21. O que foi discutido nesses concelhos e em Coimbra - (qº. 13º).
22. A autora, representada pelos seus órgãos dirigentes, sendo um motor do


desenvolvimento turístico da região centro, ficou preocupada com a ausência da passagem do Rallye de Portugal nos concelhos de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Lousã - (qs. 14º e 15º).
23. A definição das regras do Rallye de Portugal cabe à FIA – (qº. 17º).
24. Todos os anos é apresentado ao Conselho Mundial do Desporto Automóvel, órgão da FIA, o projecto de cada Rallye, a realizar no ano seguinte - (qº 18º).
25. Durante o mês de Outubro de cada ano, esse Conselho decide quais as provas que são incluídas no campeonato do Mundo - (qº 19º).
26. Após negociação dos projectos apresentados pelos organizadores dos países candidatos - (qº 20º).
27. O anterior Presidente do réu, Sr. C..., era membro desse Conselho, com voz activa no seio desse Conselho - (qº 21º).
28. Com o seu falecimento, em 1998, nenhum português o substituiu nesse Conselho e o réu deixou de ter participação nesse órgão de decisão – qº 22º).
29. A edição do Rallye de 1998 foi marcada por problemas de segurança, devido à afluência do público, que assistia às provas em locais de risco e invadia as estradas – (qº 23º).
30. Cada país não pode incluir no campeonato mais do que um Rallye -(24º).
31. As alterações impostas pela FIA para a organização do Rallye de Portugal de 1999 e a diminuição do poder de negociação do réu, por ter falecido o Dr. C..., determinavam a que, não cumpridas as exigências da FIA, o Rallye de Portugal fosse excluído do Campeonato do Mundo de Rallies - (qs. 25º, 26º, 27º e 28º).
32. O réu conseguiu manter o Rallye de Portugal de 1999 no Campeonato do Mundo devido ao cumprimento das exigências da FIA - (qº. 29º).
33. A não aceitação das condições impostas pela FIA levaria o Rallye a ser excluído do Campeonato do Mundo - (qº 30º).
34. As normas do Rallye são traçadas em cada ano pela FIA, o que era do conhecimento da autora, não obstante ter assinado o protocolo depois do réu lhe ter comunicado que, no triénio 1998/2000, se mantinham as provas


classificativas da Lousã, Pedrógão Grande e Figueiró dos Vinhos (33º e 34º).
35. No ano de 1998 realizaram-se na região de turismo do centro 39,2% da totalidade das provas do Rallye e 44,4% de quilómetros de classificação-35º.
36. No ano de 1999, foi executado 34,7% das provas classificativas e 38,1% dos quilómetros das provas de classificação - (qº 36º).
37. O protocolo foi celebrado quando o centro do Rallye deixou de estar situado na Figueira da Foz e passou para Matosinhos - (qº 37º).
38. Na regulamentação do Campeonato do Mundo releva a opinião dos construtores, de cuja participação depende a subsistência da prova - (qº 40º).
39. As alterações impostas pela FIA para a organização do rally de 1999 vieram a revelar-se incompatíveis com a passagem do rally pelos concelhos de Figueiró dos Vinhos, Lousã e Pedrógão Grande - (qº 42º).
40. O réu envidou esforços no sentido de manter a passagem do rally de 1999 naqueles concelhos - (qº 43º).
41. Mas esses esforços vieram a revelar-se infrutíferos, dado que a FIA não aceitou alterar as suas exigências - (qº 44º).
42. O B... não pode evitar a decisão da FIA de fazer gravitar o rally de Portugal, em 1999, em torno de Matosinhos, sob pena de o rally ser excluído do Campeonato do Mundo - (qº 45º).
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Inconformada, interpôs a autora recurso de apelação, rematando a sua alegação com as seguintes (extensas) conclusões:
a) Foi incorrectamente julgada a matéria de facto respeitante ao presente processo, em especial no que tange os (supostos) factos elencados nos nºs 39 a 42 da fundamentação de facto da sentença recorrida.
b) Com efeito, elementares regras da experiência ditavam, tendo em apreço os depoimentos prestados por Eduardo Portugal Ribeiro (depoimento registado na cassete nº 1, lado A, com o nº de contador 000 a 2055), António Mocho (depoimento registado na cassete nº 1, lado A 2080 a lado B 1450) e António Magalhães (depoimento registado na cassete nº 2, lado A 885 a lado B 607), que não houvesse sido estabelecida como suporte fáctico da sentença recorrida o arrazoado factual vertido naqueles nºs 39 a


42, tal como ficou demonstrado na motivação do presente recurso.
c) Tivesse sido correctamente julgada a matéria de facto a que se vem aludindo e jamais o Tribunal a quo poderia ter sustentado a solução jurídica que para o caso sub judice apresentou.
d) Ademais, a decisão recorrida viola contundentemente o artº 236º, nº 1 do CC e o cânone interpretativo aí plasmado, porquanto toda a argumentação em que a sentença se alicerça depende de uma errónea interpretação do acordo firmado entre as partes: jamais se poderia ter concluído que de tal negócio resultara uma mera obrigação de meios, a vincular a ré a usar tão-só de um mero dever de diligência, independentemente do resultado que viesse a ser logrado – é esta a conclusão a qu somos remetidos quando lancemos mão do critério interpretativo (de pendor objectivista) prescrito no CC.
e) Com efeito, sempre um declaratário normal e razoável, colocado na posição do real declaratário, se consciencializaria da vinculatividade das obrigações no protocolo referido assumidas – a depor em favor disso está, entre o mais, o facto de o ora recorrente se ter obrigado a prestar anualmente ao réu uma quantia de 2.000.000$00, quando inclusivamente o Rally já passava nos respectivos concelhos (sendo, pois, patente que apenas o propósito de ser salvaguardada a passagem do Rally nos próximos anos poderia justificar a despesa assumida).
f) É, aliás, essencial atentar no comportamento do réu no primeiro ano de vigência do protocolo. Em cumprimento da obrigação em análise, na edição de 1998, o réu incluiu e realizou provas de classificação em áreas de todos os concelhos subscritores do protocolo. Ora, este facto é precioso por desvelar o sentido que o próprio réu atribuiu ao protocolo.
g) Com o acordo sub judice, as partes pretenderam acautelar a continuidade, nas edições de 1998, 1999 e 2000, das provas de classificação em áreas dos concelhos signatários. A obrigação a que o B... passou a estar adstrito tinha, pois, por objecto, ao menos, o seguinte: incluir os concelhos da Lousã, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão no projecto de estrutura do Rally anualmente organizado; apresentar aos órgãos da FIA para negociação um projecto contemplando efectivamente aqueles concelhos. Quanto a estes aspectos, é indiscutível que o devedor estava adstrito à produção do resultado útil.
h) Para além de razoável, este é o sentido conhecido do real declaratário. Com efeito, a


base factual dada como provada é bastante para que possamos considerar, sem tergiversações, que, enquanto real declaratário, o B... tinha a exacta noção do resultado que o credor visava com a obrigação estipulada na cláusula 2 do referido acordo. Isto é: o réu estava ciente dos resultados pretendidos pela contraparte com a celebração do protocolo – salvaguardar a manutenção daquelas provas classificativas nos respectivos concelhos. Por conhecer a necessidade da autora é que o B... a pôde tranquilizar.
i) Pura e simplesmente, o que sucedeu foi que a RTC e os demais Municípios signatários sentiram necessidade de salvaguardar a habitual visita aos concelhos dos espectadores do Rally, agora que a competição iria iniciar-se e terminar no concelho de Matosinhos. E foi essa a razão e nessa conformidade que as partes decidiram firmar um acordo, formalizando-o num protocolo – o que também ilustra bem a vincaltividade que lhe quiseram conferir e a importância que o alcançar do resultado aí previsto se verificasse.
j) Também não se vislumbra na lista dos factos provados o menor vestígio de esforço ou diligência do B..., no sentido de apresentar e defender junto da FIA um itinerário que contemplasse os concelhos referidos. Isto porque, deferentemente do que sucedeu na edição de 1998, na edição de 1999 o réu não praticou qualquer facto material que concretizasse a intenção de realizar a prestação devida. Pelo contrário, a base factual revela que logo à partida, ao delinear o projecto da estrutura da prova, o réu decidiu não incluir no Rally as provas de classificação naqueles concelhos, sendo que jamais se poderá sustentar que tal exclusão se ficou a dever a alterações exigidas por órgãos internacionais (pois não ficou provada qualquer relação de causalidade entre a necessidade de observar as novas regras do Campeonato do Mundo e a não inclusão daqueles concelhos no itinerário do Rally).
l) É indefensável a aplicação (que na decisão recorrida se fez) dos artºs 790º e 793º do CC à situação fáctica em apreço. Com efeito, não está provado que o cumprimento do protocolo fosse uma tarefa de todo impossível; também não está provado que a FIA tenha rejeitado um projecto de itinerário organizado pelo B..., na edição de 1999, que contemplasse a visita aos concelhos da Lousã, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão. Deste modo, é forçoso concluir que a situação não acarretava a impossibilidade da prestação regida nos artºs 790º e 793º do CC.


m) Além do mais, a alegada impossibilidade de realizar a prestação (invocada na sentença recorrida), onde se aplicam os artºs 790º, nº 1 e 793º, nº 1 do CC), caso se verificasse (embora não existam factos provados a sustentar essa possibilidade), seria imputável ao devedor, devendo aplicar-se o disposto no artº 801º, nº 2 do CC. Na verdade, fosse por confiar no seu poder de influência junto da FIA, fosse por querer responder afirmativamente ao dinamismo de alguns concelhos da região norte, fosse por pretender agradar às marcas construtoras no itinerário delineado, o certo é que foi o próprio B... que se colocou numa situação em que lhe seria extremamente oneroso cumprir todos os compromissos que assumira relativamente ao Rally.
n) Se, em Agosto de 1998, o réu entendia que as circunstâncias haviam sofrido uma alteração anormal, devia ter emitido a pertinente declaração resolutiva (artº 437º do CC) e oferecido a restituição da contrapartida recebida (artº 437º, nº 2). O que não podia, decerto, ter feito era romper abruptamente o acordo que firmara com a RTC, infligindo-lhe os mais diversos danos (de natureza patrimonial e moral).
o) Consequentemente, é iniludível que estamos perante uma violação do protocolo imputável culposamente ao réu, devendo, pois, o presente recurso ser julgado procedente, sob pena de violação dos artºs 236º, nº 1, 798º, 801º, nº 1, e 804º, nº 1, do Código Civil.
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O réu contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso e a confirmação da sentença recorrida.
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Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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Como é sabido, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal da Relação conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo razões de direito ou a não ser que aquelas sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs 664º, 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil).
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I – Começa a recorrente por impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, alegando que foi incorrectamente julgada tal matéria de facto no que tange aos factos elencados nos nºs 39 a 42 da fundamentação de facto da sentença recorrida (correspondentes às respostas aos quesitos 42º a 45º da Base Instrutória).
Uma vez que os depoimentos foram gravados, poderia a recorrente impugnar tal decisão se desse cumprimento ao disposto no artº 690º-A do Código de Processo Civil.
Vejamos se o fez.
Dispõe aquela norma (na redacção anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 183/2000, de 10 de Agosto, atenta a data da propositura da acção) que, quando seja impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente obrigatoriamente especifique, sob pena de rejeição, quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e quais os concretos meios probatórios, constantes da gravação, que impunham decisão diversa da recorrida e que, neste último caso, sob pena de rejeição do recurso, proceda à transcrição, mediante escrito dactilografado, das passagens da gravação desses meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas.
Resulta deste normativo que devem ser indicados com clareza os pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados, por referência à Base Instrutória onde estão enquadrados, como é óbvio, e, por outro lado, devem ser transcritas, mediante escrito dactilografado, as passagens da gravação desses meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas.
Ora, no presente caso, a recorrente não deu cumprimento à condição indicada em segundo lugar, pois, ao contrário do que fez no primeiro recurso, não procedeu à transcrição, mediante escrito dactilografado, das passagens da gravação dos depoimentos das testemunhas que invoca como fundamento do erro na apreciação das provas.
Assim sendo, há que rejeitar o recurso sobre a matéria de facto com base nos depoimentos das testemunhas, conforme vem invocado pela recorrente, no que diz respeito aos quesitos 42º a 45º da Base Instrutória.



Mas, isso não quer significar que as respostas aos quesitos 42º a 44º sejam de manter, visto se colocar a questão de as mesmas conterem matéria conclusiva.
Com efeito, tais quesitos tiveram, como se recorda, as seguintes respostas:
42º - As alterações impostas pela FIA para a organização do rally de 1999 vieram a revelar-se incompatíveis com a passagem do rally pelos concelhos de Figueiró dos Vinhos, Lousã e Pedrógão Grande.
43º - O réu envidou esforços no sentido de manter a passagem do rally de 1999 naqueles concelhos.
44º - Mas esses esforços vieram a revelar-se infrutíferos, dado que a FIA não aceitou alterar as suas exigências.
Não obstante tais respostas não terem sido objecto de reclamação - até porque a redacção desses quesitos foi determinada pelo Acórdão desta Relação proferido a fls.566/592 -, nem ter sido feita qualquer referência na alegação do recurso quanto a esse aspecto, entendemos que tal questão pode ser aqui apreciada oficiosamente.
Com efeito, de acordo com o disposto no artº 511º, nº 1, do Código de Processo Civil, o juiz, ao fixar a base instrutória, só deve ser seleccionar a matéria de facto relevante para a decisão da causa que deva considerar-se controvertida.
Por outro lado, determina o artº 646º, nº 4, do mesmo Código que se têm por não escritas as respostas sobre questões de direito.
A cominação estabelecida neste normativo (de tais respostas se considerarem não escritas), porque se trata de uma imposição legal, sobrepõe-se à necessidade de reclamação ou de alegação das partes.
Mas, dada a similitude de situações, tem de se entender que tal imposição é aplicável ao caso de as respostas serem conclusivas ou excessivas, uma vez que ele não está previsto em qualquer disposição legal.

Ora, salvo o devido respeito, as respostas àqueles quesitos 42º a 44º contêm matéria conclusiva.



Com efeito, dizer-se que as alterações impostas pela FIA vieram a revelar-se incompatíveis com a passagem do rally pelos concelhos de Figueiró dos Vinhos, Lousã e Pedrógão Grande é uma conclusão, que tem de resultar de outros factos necessários à caracterização dessa incompatibilidade, de forma a esclarecer em que medida é que tais alterações levaram a essa incompatibilidade.
Por outro lado, o dizer-se que o réu envidou esforços no sentido de manter a passagem do rally de 1999 nesses concelhos e que esses esforços vieram a revelar-se infrutíferos, também é conclusivo, visto que o que interessa saber, e que as respostas não esclarecem, é que esforços é que o réu efectuou no sentido de manter a passagem do rally nesses concelhos.
Assim, e visto o atrás exposto (artº 646º, nº 4, do Código Processo Civil), deverão ter-se por não escritas as respostas aos quesitos 42º, 43º e 44º da Base Instrutória.
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II – Alega a recorrente que a decisão recorrida viola o artº 236º, nº 1, do Código Civil e o cânone interpretativo aí plasmado, porquanto toda a argumentação em que a sentença se alicerça depende de uma errónea interpretação do acordo firmado entre as partes: jamais se poderia ter concluído que de tal negócio resultara uma mera obrigação de meios, a vincular o réu a usar tão-só de mero dever de diligência, independentemente do resultado que viesse a ser logrado.
Estamos aqui perante a questão de saber se o acordado entre a autora e o réu integra uma obrigação “de meios” ou “de resultado”.
Conforme ensina o Prof. Almeida Costa (Direito das Obrigações, 7ª ed., pág. 933), nas obrigações de meios o devedor apenas se compromete a desenvolver prudente e diligentemente certa actividade para a obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se produza. Daí que o devedor fique desonerado na hipótese de o cumprimento requerer uma diligência maior do que a prometida, e que tanto a impossibilidade objectiva como a subjectiva não imputáveis ao devedor o liberem.
Contrapõem-se-lhes as obrigações de resultado, que se verificam quando se conclua da lei ou do negócio jurídico que o devedor está obrigado a


conseguir um certo efeito útil. Neste caso, só a impossibilidade objectiva e não culposa da prestação exonera o devedor.
Na sentença recorrida entendeu-se que o referido acordo entre a autora e o réu se traduz numa obrigação de meios, uma vez que o devedor se obrigou somente a usar da diligência necessária a proporcionar ao credor a prestação esperada.
Analisando o aludido “protocolo”, não nos parece que a interpretação do mesmo deva ser nesse sentido.
Com efeito, a cláusula 2ª não nos deixa margem para grandes dúvidas que estamos perante uma obrigação de resultado, ao dizer que “o B... se compromete a incluir no itinerário (o realce é nosso) significativo número de provas de classificação nos concelhos que integram a A... e/ou subscritores deste protocolo”.
Se, como se entende na sentença, o réu se obrigou somente a usar da diligência necessária a proporcionar à autora a prestação esperada, então deveria constar da aludida cláusula que “o B... se compromete a envidar esforços ou a diligenciar no sentido de ser incluído no itinerário (…)”.
E não é isso que consta e que, numa interpretação objectiva, se pode deduzir do conteúdo dessa cláusula.
Importa ver que o protocolo foi assinado em 14 de Julho de 1997.
E, nessa altura, o presidente do réu, Sr. C..., era membro do Conselho Mundial do Desporto Automóvel, órgão da FIA a quem era apresentado o projecto de cada rally, tendo o referido C... voz activa no seio desse Conselho (cfr. respostas aos quesitos 18º e 21º da Base Instrutória).
Por outro lado, não obstante ser do conhecimento da autora que as normas do rally são traçadas em cada ano pela FIA, aquela assinou o protocolo depois de o réu lhe ter comunicado que, no triénio 1998/2000, se mantinham as provas classificativas da Lousã, Pedrógão Grande e Figueiró dos Vinhos (cfr. resposta conjunta aos quesitos 33º e 34º).
E o projecto de cada rally era elaborado pelo réu, como fluí, nomeadamente, da alínea n) dos Factos Assentes e da resposta ao quesito 18º.



Tudo isto leva à conclusão que a obrigação assumida pelo réu perante a autora e os concelhos interessados que assinaram o protocolo foi no sentido de conseguir um certo efeito útil, que era o da passagem de provas de classificação em cada um desses concelhos.
Aliás, outra interpretação não pode ter, também, a contribuição financeira assumida pela autora e por esses concelhos, em relação a cada ano desse triénio 1998/2000.
Não se descortina qual o interesse dessas entidades em prestar tal contribuição se o compromisso do réu não fosse no sentido aqui preconizado.
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III - Concluindo-se, portanto, que a obrigação assumida pelo réu é de resultado e que no ano de 1999 o rally não passou pelos concelhos de Figueiró dos Vinhos, Lousã e Pedrógão Grande, vejamos se o mesmo fez, ou não, as diligências necessárias para cumprir o protocolo nesse ano.
De acordo com o disposto no artº 799º do Código Civil (diploma a que pertencerão os restantes normativos sem menção de proveniência), incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua.
Já vimos que, embora sujeito a aprovação da FIA, o projecto de cada rally era elaborado pelo réu.
Ora, analisando a matéria de facto dada como provada – com exclusão, como é óbvio, das respostas aos quesitos 42º a 44º, que se consideram como não escritas -, não resulta demonstrado que a introdução de etapas especiais mais longas com eliminação de outras etapas especiais, menor quilometragem entre as provas classificativas e menor número de parques de assistência, pudesse ter concorrido para que o rally deixasse de passar naqueles concelhos.
Note-se que o réu, ao elaborar o projecto do rally de 1999, excluiu dele a passagem por aqueles três concelhos.
Ainda poderíamos considerar que o réu tudo fez para cumprir o protocolo se tivesse incluído tais concelhos no projecto e este, depois, tivesse sido rejeitado pela FIA.
Mas, o que se provou foi que o réu não incluiu provas de classificação


nesses concelhos (cfr. al. n) dos factos Assentes).
Há, portanto, incumprimento culposo por parte do réu, não sendo, por isso, de aplicar ao caso o disposto no artº 790º, nem o disposto no artº 793º, por também não se encontrar demonstrado que a prestação se tenha tornado parcialmente impossível.
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IV – Verificado o incumprimento do réu, sendo, portanto, responsável pelos prejuízos que possa ter causado à autora (artº 798º), importa agora ver se esta tem direito ao pedido que formula a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.

A indemnização por danos patrimoniais diz respeito ao prejuízo, no montante de 303.205$00, que a autora sofreu com a inutilização de folhetos promocionais de Figueiró de Vinhos, destinados a ser distribuídos ao público no triénio de 98/99/2000, nos quais se fazia referência à passagem no concelho do Rally de Portugal.
A esse propósito provou-se, como se recorda (cfr. respostas aos quesitos 1º a 6º da Base Instrutória), que a autora incluiu no folheto promocional de Figueiró dos Vinhos a passagem no concelho do Rally de Portugal; Foram impressos 15.000 folhetos, em língua francesa, inglesa, espanhola e portuguesa; Esses folhetos destinavam-se a ser distribuídos pelo público no triénio 1998/1999/2000; Como não foram incluídas as classificativas do Rally de Portugal de 1999 no concelho de Figueiró dos Vinhos, a autora teve de inutilizar 10.000 folhetos, no valor global de 231.660$00.
Em face disso, está o réu obrigado a indemnizar a autora pelo valor desta importância de 231.660$00, por a tanto montar o prejuízo apurado a título de danos patrimoniais, a que acrescem os juros de mora à taxa legal, desde a citação.

A autora pediu também uma indemnização por danos não patrimoniais, no montante de 10.000.000$00, com os seguintes fundamentos: com a não realização das provas de classificação, à semelhança do que aconteceu na Lousã e em Figueiró dos Vinhos, houve dezenas de munícipes daqueles concelhos que atribuíram a ausência do rally à inépcia da autora, responsabilizando-a pelo sucedido; Tal assunto foi e é


amplamente discutido nos referidos concelhos e na cidade de Coimbra, pelo que a boa imagem, o prestigio social, a credibilidade de que gozava como defensora dos concelhos e da Região Centro, ficaram consideravelmente afectadas; A R.T.C., que era vista como um motor de desenvolvimento, uma instituição capaz de se impor a nível nacional, trazendo para os concelhos eventos de grande impacto económico-social, é agora vista como uma entidade em que se não pode confiar, débil, fraca e incapaz de fazer valer os interesses da Região Centro.

Antes de apreciar o pedido formulado pela autora, importa ponderar que, embora estejamos no domínio da responsabilidade contratual, é entendimento maioritário da jurisprudência e da doutrina no sentido de que os danos não patrimoniais são ressarcíveis no âmbito de tal responsabilidade, uma vez que o disposto no nº 1 do artº 496º é aplicável a toda a responsabilidade civil, incluindo, portanto, também a responsabilidade contratual (cfr., entre outros, Acs. do S.T.J. de 17/01/1993, de 21/03/1995, e de 25/11/1997, da R.E. de 12/07/1984, da R.C. de 14/04/1993 e da R.L. de 17/06/1993, in, respectivamente, CJ, T1-61, T3-174, BMJ 445º-487, T3-140, T4-288, $26º-540 e T3-129, Prof. Vaz Serra, R.L.J. 108º-222; Prof. Almeida Costa, obra citada, pág. 523/524, Prof. Galvão Teles, Obrigações, 6ª ed., pág. 383, Prof. Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, pág. 318, Prof. Calvão da Silva, Responsabilidade Civil do Produtor, pág. 688 e Prof. Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, pág. 31).

O referido nº 1 do artº 496º dispõe que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Tal dispositivo legal não determina, pois, quais os danos não patrimoniais que são compensáveis, limitando-se a fixar um critério geral, que é o da gravidade dos mesmos danos.
Os danos destituídos de gravidade não justificam uma compensação pecuniária, competindo ao juiz determinar se é, ou não, razoável uma compensação.



No presente caso, dos factos alegados pela autora na petição inicial, provou-se, como se recorda (cfr. respostas aos quesitos 10º a 15º da Base Instrutória), que: A passagem do Rally de Portugal nos troços de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Lousã havia-se tornado num fenómeno social que arrastava para aqueles concelhos dezenas de milhar de pessoas; E contribuía para a divulgação das suas potencialidades turísticas; Com a não realização daquelas provas, houve munícipes que atribuíram tal facto à inépcia da autora; O que foi discutido nesses concelhos e em Coimbra; A autora, representada pelos seus órgãos dirigentes, sendo um motor do desenvolvimento turístico da região centro, ficou preocupada com a ausência da passagem do Rally de Portugal nos concelhos de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Lousã.
Deste factualismo não é possível concluir pela existência de danos não patrimoniais por parte da autora.
Mas, ainda que se considere que se verifica a existência de danos não patrimoniais, em virtude de alguns munícipes atribuírem à autora a culpa pela não passagem do rally nesses concelhos e de a autora ter ficado preocupada com a ausência da passagem do rally, tais danos não revestem uma gravidade que mereça a tutela do direito, pois, como se tem entendido, os meros transtornos, incómodos e preocupações não revestem aquela gravidade que deverão assumir os danos não patrimoniais indemnizáveis.
Improcede, assim, o pedido formulado pela autora no que respeita à indemnização por danos não patrimoniais.
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Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em dar parcial provimento ao recurso, condenando o réu a pagar à autora a quantia de 231.660$00 (correspondente a 1.155,52 €), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação, assim revogando nessa parte a sentença recorrida e absolvendo o réu do restante pedido.
Custas na proporção a cargo do réu, já que a autora delas está isenta.