Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3581/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: TAXA DE JUSTIÇA
ARGUIDO
INSTRUÇÃO CRIMINAL
Data do Acordão: 12/14/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE SERTÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIME
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ART.º 83º, Nº 2, DO C.C. JUDICIAIS
Sumário: No final da instrução, só é fixada taxa de justiça no caso de o arguido não ser pronunciado por todos ou alguns dos crimes acusados pelo assistente e, nesse caso, só por este (assistente) é devida taxa de justiça.
Decisão Texto Integral: Acordam os Juizes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra
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No processo supra identificado, em que é arguida, A..., veio esta interpor recurso, formulando as seguintes conclusões, que delimitam o objecto do mesmo:
A)- seja revogado o despacho datado de 10.11.2004, a fls. 366 proferido pelo Tribunal "a quo" e
B)- mantido o despacho a fls. 230 que condenou nas custas e encargos do processo correctamente a assistente por ter desistido do mesmo e não condenou em quaisquer custas e encargos a arguida A..., sendo certo que naquela altura só a arguida beneficiava do apoio judiciário na modalidade de dispensa/isenção total de custas, preparos e encargos do processo.
C)- Sejam ainda anulados todos os actos posteriores àquele acto NULO - ora recorrido - e todos os demais que dele dependam.
D)- Deve promover-se o apuramento de responsabilidades junto dos serviços do Tribunal "a quo", pelos lapsos e erros cometidos e que deram origem ao presente recurso.
E)- Que o presente processo, que correu os seus termos junto do Tribunal "a quo" seja devidamente auditado pelos Serviços de Inspecção a fim de ser verificada a sua plena legalidade e
F)- Que sejam arbitrados honorários ao mandatário da arguida pelo estudo, preparação, elaboração e remessa do presente recurso por considerar "patológica" e não previsível ou normal a forma como foram violadas normas processuais e legais as quais deram origem a esta reacção da arguida.
Decidindo neste sentido e nestes precisos termos farão Vªs. Exªs. Sã, Serena e Objectiva JUSTIÇA!
Não houve resposta.
Nesta instância o Ex.mo Procurador Geral Adjunto, emite parecer no sentido da improcedência do recurso.
Foi cumprido o disposto no art. 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal.
Não foi apresentada resposta.
Foram colhidos os vistos legais.
Realizada a conferência, cumpre-nos decidir.
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Informação na conclusão e despacho proferido a fls. 366:
Conclusão: Em l0.11.2004, com a informação a V. Exª. de que ao pretender elaborar a conta de custas me suscitam dúvidas, porquanto verifico que na decisão de fls. 230 se encontra fixada a taxa de justiça a pagar pelos assistentes em 2 UC, sem prejuízo do apoio judiciário de que gozam. Salvo o devido respeito, na data em que foi proferida tal decisão só os arguidos beneficiavam de apoio judiciário, pelo que faço os autos conlusos para que V. Exª. ordene o que tiver por conveniente.
“Por manifesto lapso foram os assistentes condenados em custas a fls. 230, quando as custas seriam, nos termos legais, da responsabilidade dos arguidos, pelo que se procede à rectificação de tal decisão nos termos do disposto no art. 380 do CPP, ficando as custas a cargo dos arguidos, fixando-se a taxa de justiça em 2 Ucs, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário”.
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Conhecendo:
Insurge-se a arguida/recorrente contra a sua condenação em custas, relativamente à fase da instrução, e só esta.
O despacho de fls. 366 citado reporta-se à taxa de justiça fixada na instrução, em que a arguida foi pronunciada -fls. 230.
Argui a recorrente a nulidade de tal despacho por falta de notificação.
Mas notoriamente sem razão.
É manifesto o lapso no despacho de fls. 230 em que se condenou em taxa de justiça os assistentes, quando os arguidos foram pronunciados (os assistentes obtiveram vencimento).
Daí a rectificação como permite a lei, ao abrigo do art. 380 do CPP. Mas pior a emenda que o soneto (como soi dizer-se), uma vez que não há fundamento legal para a condenação do arguido em taxa de justiça pela instrução (art. 83 do CC, à contrário), mesmo quando é pronunciado.
Antes do despacho ora recorrido, se deu conta do lapso e se corrigiu, correcção que deveria ter sido levada em conta pelo senhor funcionário e pelo senhor juiz em vez de informarem na conclusão e despacharem conforme fls. 366 (uma correcção levada a efeito no processo deve ser anotada no local próprio -é elementar).
Acresce que, e como resulta da lei, art. 96 nº 2 do Código das Custas, a taxa de justiça devida pela instrução é liquidada no tribunal em que foi fixada, exceptuando-se apenas casos de urgência (presos). Preceito legal que muitas vezes é inobservado, o que provoca consequências futuras, como o caso deste recurso. Neste sentido, veja-se o Ac. da Rel. Lx. de 5-02-2003, in Col. Jurisp. tomo 1, pág. 138.
Logo a seguir à acta do debate instrutório, a fls. 233, é aberta conclusão por ordem verbal e proferido o seguinte despacho: “Por padecer de evidente lapso material, decido reformar a decisão antecedente quanto a custas por forma a que, onde se lê “assistentes” se passe a ler arguidos”. Notifique”.
E este despacho foi notificado ao mandatário da ora recorrente em 25 de Março de 2002, conforme cópia de fls. 235, com o qual se conformou, prosseguindo o processo seus termos até ao julgamento sendo que na audiência (acta de fls. 352 a 354), houve desistência do pedido cível e acordado que as custas respectivas ficavam a cargo da demandada, e a assistente desistiu da queixa, que foi homologada, sendo a condenação nas custas cíveis “conforme acordado” e as custas crime a suportar pela “desistente”.
Nada foi acordado quanto a custas ou taxas de justiça anteriormente fixadas, nomeadamente as fixadas na instrução e pela pronuncia da arguida.
Estas, há muito deveriam estar liquidadas, como já se referiu.
A rectificação quanto a custas ocorreu logo de imediato após o debate instrutório e pronuncia da arguida, sendo o mandatário desta notificado e conformando-se.
O despacho ora em crise apenas vem confirmar essa rectificação, em nada a alterando.
Este despacho em crise, foi notificado a advogado diferente do mandatário do arguido, justificando-se o lapso pelo facto de ambos terem o mesmo nome, e quiçá (?) por no decurso do processo o mandatário da arguida ter mudado de escritório -fls. 282, e se viu obrigado a insistir pela anotação do novo endereço -fls. 318.
Mas, detectado o lapso foi ordenada a notificação do mandatário da recorrente, na sequência da qual foi apresentado o recurso.
A notificação da rectificação das custas não foi notificada à arguida, nem tinha de o ser.
O art. 113 nº 9 do CPP indica as situações em que as notificações têm de ser efectuadas na pessoa do sujeito processual e do seu mandatário (ou defensor). A rectificação das custas para este efeito não integra o despacho ou decisão. Embora formalmente se integre no despacho, sentença ou decisão, não é decisão de fundo. E só assim se justifica que possa ser alterada a condenação em custas, porque esta “não importa modificação essencial”, art. 380 nº 1 al. b) do CPP.
Nem implica nulidade da sentença ou despacho, a omissão quanto a custas, podendo a rectificação ter lugar a todo o tempo -art. 667 do CPC, aplicável ex vi art. 4 do CPP.
Inexiste, pois, qualquer nulidade por falta de notificação da arguida/recorrente, uma vez que foi notificada na pessoa do seu mandatário.
Como já se referiu, a recorrente foi notificada na pessoa do seu mandatário em 25-03-2002, do despacho que rectificou a condenação em custas da instrução, fls. 233 e 235, conformando-se.
Foi notificada da reafirmação desta rectificação, na pessoa do seu mandatário, fls. 366, 387 e 388.
Apresentou o recurso, que foi recebido.
Esta notificação da reafirmação da rectificação (2ª rectificação no mesmo sentido da 1ª) concedeu à arguida novo prazo para se pronunciar e eventualmente apresentar recurso, o que fez.
E, caso não se aceitasse o recurso, seriam violados os princípios da segurança jurídica, da confiança e das garantias de defesa consagradas no art. 2 e 32 nº 1 da Constituição.
A arguida e o então arguido foram pronunciados pelos crimes de que os assistentes os acusavam, daí que estes não devessem pagar taxa de justiça (art. 83 do CC).
Mas também aqueles (arguidos), não têm que pagar taxa de justiça, a tal não podem ser condenados, por falta de fundamento legal.
Sobre esta matéria rege o art. 83 do Código das Custas.
Pela abertura da instrução (independentemente de quem a requer), é devida taxa de justiça -nº 1.
No final da instrução, só é fixada taxa de justiça, no caso de o arguido não ser pronunciado por todos ou alguns dos crimes acusados pelo assistente, e nesse caso, só por este (assistente) é devida taxa de justiça.
Neste sentido, a anotação ao art. 83 do Código das Custas Judiciais, anotado e comentado de Salvador da Costa, que, reportando-se à taxa de justiça referida no nº 2 escreve “trata-se de uma taxa de justiça independente e que acresce àquela a que se reporta o nº 1, e pelo seu pagamento só o assistente é susceptível de ser responsável” (sublinhado nosso).
Assim, temos como incorrecta a rectificação operada pelo despacho de fls. 366, na parte em que corrige o despacho de fls. 230 e imputa a responsabilidade e condenação em taxa de justiça aos arguidos, por falta de fundamento legal para essa condenação, motivo pelo qual, nessa parte se revoga tal despacho.
Mantém-se esse despacho, na parte em que retira a condenação em taxa de justiça aos assistentes, uma vez que os mesmos obtiveram vencimento, tendo os arguidos sido pronunciados pelos crimes de que aqueles assistentes os acusavam (art. 83 nº 2 do CC, à contrário).
Embora de maneira não muito clara, a recorrente alega que a desistente da queixa se responsabiliza pelo pagamento de todas as custas.
Manifestamente sem razão, uma vez que como já supra se referiu, foi acordado, relativamente à parte cível, que “as custas em dívida serão a cargo da demandada”, havendo condenação em conformidade com esse acordo.
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Quando não se concorda com as decisões, recorre-se, ou reclama-se, quando a lei o permitir.
O Tribunal Superior decidirá em conformidade, mantendo ou alterando (no todo ou em parte) as decisões recorridas.
Não se vislumbra que tivessem sido cometidos lapsos ou erros graves em relação aos quais fosse necessário efectuar participação para apuramento de responsabilidades.
Esta interpretação não impede a recorrente de o fazer, caso entenda que se justifica.
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Pretende a recorrente/arguida, que sejam arbitrados honorários ao seu mandatário.
Como a arguida refere, e pelos motivos que explica -laços familiares, parentesco- constituiu mandatário, reconhecendo que o apoio judiciário que lhe foi concedido não abrange o patrocínio.
Assim, não pode o Tribunal arbitrar honorários no âmbito do apoio judiciário.
Havendo mandato, o Tribunal só virá a arbitrar honorários em acção própria que para o efeito terá que ser intentada.
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Decisão:
Face ao exposto, acordam nesta Relação e Secção Criminal em, com outros fundamentos, conceder provimento ao recurso e consequentemente se revoga parcialmente o despacho recorrido -fls. 366, na parte em que condena os arguidos no pagamento de taxa de justiça pela realização da instrução.
No mais se indeferem as conclusões do recurso.
Sem custas.
Coimbra,