Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1037/10.7TBACB-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: TELES PEREIRA
Descritores: DIREITO COMUNITÁRIO
COMPETÊNCIA JUDICIÁRIA
DECISÃO JUDICIAL
EXECUÇÃO
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
Data do Acordão: 11/08/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE ALCOBAÇA – 3º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 31º DO REGULAMENTO COMUNITÁRIO Nº 44/2001
Sumário: I – O artigo 31º do Regulamento Comunitário nº 44/2001 (respeitante à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial), ao dispor sobre a competência judiciária transnacional para adopção de medidas provisórias ou cautelares referidas a um direito feito valer em processo instaurado ou a instaurar no Tribunal de um Estado-Membro, contém a afirmação da competência dos Tribunais de outros Estados-Membros para adoptarem medidas de tutela cautelar previstas nas respectivas legislações, mesmo que a apreciação da questão de fundo (do direito pretendido acautelar) não caiba à jurisdição do Estado-Membro que adopte essas medidas.

II – Esta atribuição de uma competência especial a uma jurisdição diversa da da questão de fundo para as medidas cautelares decorre, na interpretação do artigo 31º do Regulamento 44/2001 efectuada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (nos Acórdãos Denilauler, de 1980 e Van Uden, de 1998), da existência de um elemento de conexão real entre o objecto da medida cautelar pretendida e a competência territorial nacional do Tribunal do Estado-Membro ao qual essas medidas são – devem ser – requeridas.

III – Assim sucede relativamente à pretensão de arresto do saldo de uma conta bancária domiciliada na Holanda, estando em causa acautelar um direito de crédito feito valer em acção já instaurada em Portugal: nos termos do artigo 31º do Regulamento 44/2001, a jurisdição holandesa (não a portuguesa) é a competente para apreciar essa pretensão cautelar, preenchendo-se a hipótese prevista no artigo 383º, nº 5 do CPC.

IV – A existência de jurisprudência comunitária uniforme sobre a interpretação de determinada questão de Direito comunitário (como se viu suceder com o artigo 31º do Regulamento 44/2001), faz cessar (no entendimento do Tribunal de Justiça da União Europeia expresso no Acórdão CILFIT de 1982) a obrigação de envio prejudicial dessa questão ao Tribunal de Justiça, nos termos previstos no artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra

I – A Causa


            1. Através do requerimento de fls. 3/15, apensado ao processo principal com o número acima indicado[1], Transportes …, Unipessoal, Lda. (Requerente e Apelante; trata-se de uma sociedade com sede em Portugal) requereu o presente procedimento de arresto [cfr. artigo 406º e seguintes do Código de Processo Civil (CPC)] contra a sociedade holandesa B…, BV (Requerida), invocando dedicar-se à actividade de transportes rodoviários internacionais de mercadorias, sendo que prestou serviços desta natureza à Requerida, continuadamente desde 2006 e até Dezembro de 2009. Então (em Dezembro de 2009) a Requerida pôs fim a essa relação contratual, resolvendo-a, deixando sem pagamento sete facturas apresentadas pela Requerente, totalizando estas o valor de €145.591,50 (depois de realizada a compensação de uma importância devida pela Requerente à Requerida).

            Alegando receio de que a empresa Requerida venha a encerrar (como sucedeu com outras geridas pelo mesmo responsável da Requerida), ficando o crédito da Requerente por satisfazer por falta de bens em nome da empresa Requerida. Assim, pretende a Requerente que o Tribunal de Alcobaça determine, através do presente procedimento cautelar, para ser feito valer na Holanda, o arresto do saldo de uma a conta bancária domiciliada nesse país, no Banco (holandês) BanK…, conta com o nº…. 

            1.1. Através do despacho de fls. 36/38 – este consubstancia a decisão objecto do presente recurso –, foi declarada a incompetência absoluta, em razão da nacionalidade (artigos 101º e 102º, nº 1 do CPC), dos Tribunais portugueses para determinar o arresto de uma conta bancária domiciliada na Holanda[2], determinando o Tribunal a absolvição da Requerida da presente instância cautelar.

            1.2. Inconformada, interpôs a Requerida esta apelação, motivando-a a fls. 41/45, aí formulando as conclusões que aqui transcrevemos:
“[…]


II – Fundamentação

            2. Relatado o essencial da marcha dos autos que conduziu à presente instância de recurso, sublinha-se que o âmbito objectivo deste foi delimitado pela Apelante através das conclusões transcritas no item 1.2., supra. É o que resulta da conjugação dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1, ambos do CPC.

            Vistas essas conclusões, emerge como fundamento único da apelação a seguinte questão: saber se um Tribunal português (aqui o Tribunal de Alcobaça), no qual foi instaurada uma acção declarativa de condenação visando a cobrança de uma dívida a uma sociedade holandesa, tem competência para determinar, ao abrigo do artigo 31º do “Regulamento44/2001, do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial” (doravante designado Regulamento 44/2001), o arresto de uma conta bancária domiciliada na Holanda, enquanto tutela cautelar reportada ao pedido formulado na acção declaratória aí interposta.

            2.1. Sendo este, singelamente, o fundamento do recurso – em resumo: saber se o Regulamento44/2001 possibilita à jurisdição nacional determinar o arresto de uma conta bancária domiciliada num outro Estado-Membro, tendo o processo principal sido instaurado em Portugal[3] –, os factos a considerar na apreciação do mesmo, ou, se preferirmos, as incidências processuais que foram relevantes para a decisão apelada, são as relatadas ao longo do item 1., às quais acrescentaremos, por ser relevante para a discussão da decisão apelada que aqui se empreenderá (v. item 2.1.2.1., infra), a consideração do teor da petição inicial apresentada pela ora Requerente no processo principal ao qual foi apenso o presente arresto[4].

            2.1.1. Como ponto de partida, interessa-nos ter em conta o texto do artigo 31º do Regulamento 44/2001 (que integra uma secção dedicada às “medidas provisórias e cautelares”):
As medidas provisórias ou cautelares previstas na lei de um Estado-Membro podem ser requeridas às autoridades judiciais desse Estado, mesmo que, por força do presente regulamento, um tribunal de outro Estado-Membro seja competente para conhecer da questão de fundo[5].

            Fornece-nos a Apelante, a propósito desta disposição, como abonação da sua tese quanto à competência dos Tribunais portugueses para determinarem o arresto de uma conta bancária domiciliada na Holanda, um modelo interpretativo algo sui generis. De facto – e trata-se de um paradoxo –, pretende a Apelante convocar aqui, em sede de interpretação do (vigente) artigo 31º do Regulamento, elementos respeitantes aos trabalhos preparatórios de um hipotético novo Regulamento, que ainda não existe e que, neste momento, não se sabe se alguma vez será adoptado, respeitante especificamente ao arresto ou penhora de contas bancárias, em litígios emergentes de situações transnacionais, novo Regulamento este que, quando existir, poderá afastar, por razões de especialidade, a aplicação do artigo 31º aqui em causa.

Com efeito, é este o único sentido dos dois elementos indicados pela Apelante – são “trabalhos preparatórios” respeitantes a uma “lei” que ainda não existe –, enquanto abonação interpretativa por ela (indevidamente) referida ao artigo 31º do Regulamento 44/2001: (a) o “Livro Verde Sobre Uma Maior Eficácia na Execução das Decisões Judiciais na União Europeia: Penhora de Contas Bancárias”, apresentado pela Comissão em 24/10/2006[6]; (b) o Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre este “Livro Verde”, adoptado na 438ª Reunião Plenária de 26 e 27 de Setembro de 2007[7]. Ambos estes elementos constituem – repete-se – simples documentos de trabalho, entre muitos outros que poderíamos apresentar, de um processo legislativo comunitário que está em curso, o qual, em última análise, afectará sectorialmente esse Regulamento 44/2001 (alterá-lo-á ou passará a aplicar-se, em substituição do artigo 31º, aos arrestos transnacionais de depósitos bancários), mas que, todavia, ainda não foi concluído, sendo certo que não foi adoptado qualquer Regulamento específico sobre essa matéria[8], existindo, por ora, quanto a medidas provisórias ou cautelares – para além da incidência quanto a estas de todas as outras regras de competência constantes do Capítulo II do Regulamento 44/2001 –, o artigo 31º, enquanto regra especial que estende a competência para o decretamento de tais medidas à jurisdição de um Estado-Membro que possa não dispor de competência para a questão de fundo.

Vale a constatação do evidente erro metodológico da Apelante na aproximação à questão da competência para adopção de medidas provisórias, como afastamento da asserção, por ela sustentada neste recurso, de que existam elementos interpretativos formais, aptos a serem considerados[9], relativos ao artigo 31º do Regulamento 44/2001 e que apontem no sentido desta norma conter uma atribuição de competência ao Tribunal de um Estado-Membro para decretar, no quadro das chamadas medidas provisórias ou cautelares, o arresto do saldo de uma conta bancária domiciliada num outro Estado-Membro, em função da circunstância de já estar pendente, no Tribunal daquele primeiro Estado, enquanto Tribunal competente para conhecer do mérito da causa, uma acção reportada a essa questão de mérito[10].

Não existem elementos interpretativos apontando neste sentido e que sejam passíveis de consideração, sendo certo que a jurisprudência comunitária relativa à competência para adopção de medidas provisórias e cautelares (que se refere exclusivamente ao artigo 24º da Convenção de Bruxelas mas vale inteiramente para o artigo 31º do Regulamento aqui em causa), tal jurisprudência, dizíamos, aponta, como veremos de seguida, num sentido distinto do aqui defendido pela Apelante. 

Com efeito, aquilo que visa o artigo 31º do Regulamento 44/2001 (como sucedia, e sucede na sua subsistente aplicação, com o artigo 24º da Convenção de Bruxelas) é a afirmação da competência dos Tribunais de um Estado-Membro para adoptar medidas provisórias e cautelares previstas na respectiva legislação, mesmo que a competência para apreciação da questão de fundo não caiba à jurisdição desse Estado-Membro (competente para as medidas cautelares). Ou seja, estando já instaurada, como aqui sucede, uma acção para apreciação da questão de fundo (da questão de mérito), a tutela cautelar respeitante a essa questão pode ser alcançada, como decorrência do referido artigo 31º, junto de um Tribunal de outro Estado-Membro, independentemente da (in)competência deste último para apreciar essa questão de fundo[11]. Isto, desde que exista – e estamos a sublinhar o entendimento consolidado na jurisprudência comunitária face ao artigo 24º da Convenção de Bruxelas –, desde que exista, dizíamos, relativamente ao Tribunal das medidas provisórias (Tribunal de um Estado diverso do Tribunal competente para a questão de mérito do direito pretendido acautelar),  um elemento de conexão real entre o objecto da medida e a competência territorial desse Tribunal do Estado-Membro ao qual essas medidas são requeridas[12].

Indicamos a este respeito a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, antes designado Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (lembrando a competência interpretativa deste órgão, nos termos caracterizados na nota 10, supra), consubstanciada no Acórdão de 21 de Maio de 1980, numa situação de reenvio prejudicial, no caso “Bernard Denilauler v. SNC Couchet Frères[13]:
“[…]
Os Tribunais do local ou, em qualquer caso, do Estado Contratante, onde os bens [assets] sujeitos às medidas solicitadas estão localizados, são os que em melhores condições se encontram para avaliar [to acess] todas as circunstâncias que podem conduzir à concessão ou à recusa das medidas provisórias solicitadas e ao estabelecimento dos procedimentos e das condições que o requerente dessas medidas deve observar para garantia do carácter provisório e protectivo das medidas que venham a ser determinadas.
A Convenção [de Bruxelas] tomou em conta estes aspectos ao determinar, no respectivo artigo 24º, que as medidas provisórias e cautelares previstas na legislação de um Estado Contratante podem ser requeridas junto de um Tribunal deste Estado, mesmo que, de acordo com a Convenção, sejam os Tribunais de um outro Estado Contratante os competentes para apreciação da questão substancial de fundo [even if, under the Convention, the courts of another Contracting State have jurisdiction as to the substance of the matter].   
[…]”[14]

            Isto mesmo é expressivamente sublinhado por Miguel Teixeira de Sousa e Dário Moura Vicente, em anotação ao artigo 24º da Convenção de Bruxelas:
“[…]
Por força do disposto neste preceito, no âmbito de aplicação da Convenção, a competência para decretar providências cautelares é autonomizada relativamente à competência para decidir a acção principal. Por conseguinte, os tribunais dos Estados contratantes podem apreciar pedidos de concessão de providências desse tipo se as regras do respectivo direito interno a tal os autorizarem, independentemente de serem ou não competentes para julgar as competentes questões de fundo à face das regras da Convenção.
Podem assim ser requeridas a um tribunal português, por exemplo, o arresto de bens do devedor que se encontrem em Portugal, ainda que aquele esteja domiciliado em Espanha e aí seja devido o cumprimento da sua obrigação.
Visa-se deste modo assegurar a eficácia das medidas cautelares, deferindo o seu decretamento às autoridades judiciais que, segundo o direito interno dos Estados contratantes, se encontrem melhor situados para o efeito.
[…]”[15] (sublinhado acrescentado).

E é neste sentido, enfim, que António da Costa Neves Ribeiro, já quanto ao Regulamento 44/2001, anotando o respectivo artigo 31º, refere o seguinte:
“[…]
As medidas cautelares podem ser requeridas ao tribunal ou autoridade judiciária do Estado cujos tribunais (ou tribunal), não sendo competentes para conhecer da acção principal, estão em melhores condições para assegurar a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada à efectivação do direito a acautelar, quer o direito já exista, quer venha a emergir da decisão a proferir na acção principal, já proposta ou a propor.
Se a medida cautelar for requerida em Portugal, por ser cá o local adequado à efectivação do direito acautelado, ela caduca nos termos do direito interno, em conformidade com o disposto nos artigos 383º, nº 5 e 389º, nº 1, alínea c) do CPC.
Se a medida cautelar for requerida no estrangeiro, a caducidade deve ser regulada pela lei aplicável à medida, normalmente a lei do foro do seu decretamento.
Havendo dependência de uma acção (acção principal) que já foi ou haja de ser intentada em tribunal estrangeiro, o requerente deverá fazer prova nos autos de procedimento cautelar, da pendência da causa principal, através de certidão passada pelo respectivo tribunal (artigo 383º, nº 5 do CPC).
Este preceito fala apenas em Convenção internacional em que o Estado português seja parte. Mas a situação é a mesma estando em causa um regulamento comunitário, obrigatório em todos os seus elementos.
[…]”[16]

            2.1.2. Vale o conjunto das considerações aqui desenvolvidas quanto ao sentido do artigo 31º do Regulamento 44/2001 (e do artigo 24º da Convenção de Bruxelas), repercutindo-as nas incidências do caso concreto, valem tais considerações, dizíamos, pela afirmação de que o decretamento, a título de medida cautelar prevista nesse artigo 31º, do arresto do saldo de uma conta bancária domiciliada num Banco holandês, deve ser requerido junto de um Tribunal holandês, enquanto Tribunal melhor colocado para avaliar as diversas incidências de uma pretensão de tutela cautelar referida a bens sedeados nesse país (sendo nesse país, com base nos condicionalismos do respectivo Direito, que haverá que desencadear qualquer actuação concreta sobre esses bens)[17]. E esta asserção vale – e é este, aliás, o sentido do artigo 31º do Regulamento 44/2001 –, mesmo que a acção principal, da qual esse arresto está dependente, já tenha sido instaurada junto de um Tribunal português por ser este o competente para esta acção, de acordo com as regras de competência, gerais ou especiais, previstas no Regulamento 44/2001, designadamente as previstas nos respectivos artigos 2º e 5º[18], enquanto disposições regulamentares comunitárias directamente determinantes da solução de uma questão de competência internacional colocada à jurisdição nacional (v. o trecho inicial do nº 1 do artigo 65º do CPC, cfr., no que respeita a procedimentos cautelares, o nº 5 do artigo 383º do CPC).

            Significa isto, enfim, que o Tribunal de Alcobaça, no qual pendia, à data da instauração deste arresto, o processo principal visando a declaração do direito pretendido acautelar por este mesmo arresto, não dispunha de competência internacional, em função da incidência da questão transnacional intracomunitária aqui colocada, para adjectivar essa pretensão de tutela cautelar. É que, contrariamente ao que defende a Apelante, o elemento determinante da competência internacional para apreciar essa pretensão cautelar não resulta nem esta competência é condicionada, face ao artigo 31º do Regulamento 44/2001, pelo estabelecimento da competência para apreciação da questão de fundo relativamente à jurisdição nacional.

            Foi correcta, pois, a decisão ora recorrida de declarar essa incompetência internacional (v. artigos 101º e 102º, nº 1 do CPC) – daí que a confirmemos no final –, não obstante não acompanharmos, como já de seguida explicitaremos, o argumento preponderante que conduziu o Tribunal a quo a esse (todavia correcto) resultado decisório.

            2.1.2.1. Com efeito, entendeu a primeira instância, no quadro valorativo atinente à fixação da competência internacional para decretamento do arresto, no que nos parece constituir verdadeiramente a ratio decidendi da declaração de incompetência, que a Requerente ora Apelante, não havia indicado no requerimento inicial desta providência o lugar onde deveria ser cumprida a obrigação cujo incumprimento pela Requerida era feita valer na acção principal já instaurada à data da formulação da pretensão cautelar[19], sendo que esta incidência afastaria, no entender do Tribunal a quo, o critério especial de competência do artigo 5º, nº 1, alínea a) do Regulamento 44/2001[20], induzindo a aplicação do critério geral do artigo 2º, nº 1 do mesmo Regulamento: “[…] as pessoas domiciliadas no território de um Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, perante os tribunais desse Estado”, sendo que a pessoa colectiva aqui Requerida tem a sua sede social na Holanda (v. o artigo 60º, nº 1 do mesmo Regulamento).

            Não cremos que este argumento da decisão recorrida seja particularmente actuante, parecendo-nos até introduzido em termos muito forçados, sendo certo que a primeira instância conhecia, ao proferir essa decisão, o teor da petição inicial do processo principal ao qual este estava apenso, sendo que nesse articulado o lugar do cumprimento da obrigação (da aqui Requerida) de pagamento do valor das facturas respeitantes aos diversos transportes era, inequivocamente, referenciado a Portugal (pagamento por transferência bancária em determinado dia para uma conta domiciliada em Portugal)[21].

            Todavia, independentemente da natureza pouco convincente deste argumento esgrimido na instância precedente, sempre subsistiria aqui – subsiste, aliás –, mesmo no quadro da competência especial referida ao lugar do cumprimento da obrigação, o critério decorrente do artigo 31º do Regulamento 44/2001, enquanto norma especial de competência referida à propositura de um procedimento cautelar, nos termos antes definidos nos itens 2.1.1. e 2.1.2. deste Acórdão – no âmbito do Regulamento (como no âmbito da Convenção de Bruxelas) “[…] a competência para decretar providências cautelares é autonomizada relativamente à competência para decidir a acção principal”[22].

            Vale esta circunstância pela afirmação, independentemente da fundamentação adoptada pelo Tribunal apelado, de uma subsistente incompetência de um Tribunal português para apreciar e decretar uma pretensão de arresto de uma conta bancária domiciliada na Holanda, como o Tribunal a quo até referiu (embora sem o justificar devidamente) no trecho final da decisão apelada: “[p]or outro lado, os Tribunais Portugueses sempre careciam de ius imperi para determinarem o arresto de bens que se encontrem fora do território nacional […]”.

            2.1.2.2. E a estas considerações, confirmando a afirmação da incompetência internacional do Tribunal a quo, não deixaremos de acrescentar, no que expressaria um outro obstáculo prático à consideração desta pretensão de arresto determinado por um Tribunal português para implementação na Holanda, a particularidade da qual se reveste a tramitação do arresto na nossa ordem jurídica. Referimo-nos à circunstância deste, preenchidos os respectivos requisitos, ser vinculativamente decretado sem audição da parte contrária (artigo 408º, nº 1 do CPC), lembrando aqui que essa incidência é indicada pela jurisprudência comunitária como obstáculo ao reconhecimento por um outro Estado-Membro de uma decisão atinente a medidas provisórias. Com efeito, isso é expressamente referido, enquanto obstáculo ao reconhecimento, no já mencionado Acórdão Denilauler (v. o texto que remete para a nota 14, supra): “[a]s condições estabelecidas no Título III da Convenção [de Bruxelas][[23]], não estão preenchidas [are not fulfilled] no caso de medidas provisórias e cautelares que são ordenadas ou autorizadas por um tribunal sem que a parte contra a qual essas medidas são dirigidas tenha sido chamada ao processo de decretamento dessas medidas. Este tipo de medidas [as decretadas sem possibilidade de contraditório relativamente ao acto que determinou o início da instância cautelar], não estão cobertas pelo sistema simplificado de reconhecimento decorrente do Título III da Convenção” (ponto 2 do sumário do Acórdão Denilauler)[24].

            2.1.2.3. Finalmente, complementando as considerações interpretativas tecidas ao longo deste Acórdão quanto ao artigo 31º do Regulamento 44/2001, directamente assumidas como ratio decidendi pelo pronunciamento desta Relação, excluiremos a presença neste caso de uma “questão prejudicial”, que importasse ser colocada ao Tribunal de Justiça da União Europeia, nos termos do artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (ex artigo 234º da versão anterior à introduzida pelo Tratado de Lisboa)[25]. Interessa-nos, a respeito desta opção de não realizar qualquer reenvio prejudicial, o sentido inequívoco da jurisprudência comunitária quanto à interpretação do artigo 31º do Regulamento aqui seguida, nos termos em que essa interpretação se expressa nos citados Acórdãos Denilauler e Van Uden e nos possibilita a resolução do caso concreto.

            Note-se que a obrigação do tribunal nacional de submeter uma questão de interpretação do Direito Comunitário, como questão prejudicial, ao Tribunal de Justiça, não existe – é o entendimento do Tribunal de Justiça no Acórdão de 06/10/1982, no caso “Srl. CILFIT et Lanificio di Gavardo[26] – nas situações em que exista, como aqui sucede, jurisprudência comunitária clara sobre a questão interpretativa colocada[27]:
“[…]
No caso das partes, num litígio ante um órgão jurisdicional nacional, cujas decisões não sejam susceptíveis de ulterior recurso de acordo com o Direito interno, colocarem uma questão prejudicial, o artigo 267º do Tratado impõe a esse órgão judicial a obrigação de submeter essa questão prejudicial ao Tribunal de Justiça, sempre que se coloque, a respeito dessa questão, uma dúvida razoável. A jurisprudência do Tribunal de Justiça reconduz este tipo de dúvida às doutrinas do «acto claro» e do «acto aclarado». Isto é, quando a interpretação do Direito da União Europeia afectado pela colocação dessa questão prejudicial não ofereça dúvidas na sua interpretação, ou haja sido já interpretada pelo Tribunal de Justiça, o órgão jurisdicional nacional não está submetido à obrigação de colocar a questão prejudicial ao Tribunal de Justiça. 
[…]”[28].

            É precisamente o que sucede – existe jurisprudência comunitária clara e esclarecedora – relativamente ao artigo 31º do Regulamento 44/2001, na dimensão interpretativa que aqui nos interessa. Não se justifica, pois, qualquer reenvio prejudicial.

            2.2. Aqui chegados, esclarecida a questão da incompetência da jurisdição portuguesa para decretar o arresto pretendido pela Apelante – como nos parece estar –, resta-nos confirmar o pronunciamento apelado nessa concreta incidência decisória.

            Antes, porém, sumariaremos os pontos fundamentais do antecedente percurso interpretativo, cumprindo a imposição ao relator decorrente do artigo 713º, nº 7 do CPC:
I – O artigo 31º do Regulamento Comunitário nº 44/2001 (respeitante à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial), ao dispor sobre a competência judiciária transnacional para adopção de medidas provisórias ou cautelares referidas a um direito feito valer em processo instaurado ou a instaurar no Tribunal de um Estado-Membro, contém a afirmação da competência dos Tribunais de outros Estados-Membros para adoptarem medidas de tutela cautelar previstas nas respectivas legislações, mesmo que a apreciação da questão de fundo (do direito pretendido acautelar) não caiba à jurisdição do Estado-Membro que adopte essas medidas;
II – Esta atribuição de uma competência especial a uma jurisdição diversa da da questão de fundo para as medidas cautelares decorre, na interpretação do artigo 31º do Regulamento 44/2001 efectuada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (nos Acórdãos Denilauler, de 1980 e Van Uden, de 1998), da existência de um elemento de conexão real entre o objecto da medida cautelar pretendida e a competência territorial nacional do Tribunal do Estado-Membro ao qual essas medidas são – devem ser – requeridas;
III – Assim sucede relativamente à pretensão de arresto do saldo de uma conta bancária domiciliada na Holanda, estando em causa acautelar um direito de crédito feito valer em acção já instaurada em Portugal: nos termos do artigo 31º do Regulamento 44/2001, a jurisdição holandesa (não a portuguesa) é a competente para apreciar essa pretensão cautelar, preenchendo-se a hipótese prevista no artigo 383º, nº 5 do CPC;
IV – A existência de jurisprudência comunitária uniforme sobre a interpretação de determinada questão de Direito comunitário (como se viu suceder com o artigo 31º do Regulamento 44/2001), faz cessar (no entendimento do Tribunal de Justiça da União Europeia expresso no Acórdão CILFIT de 1982) a obrigação de envio prejudicial dessa questão ao Tribunal de Justiça, nos termos previstos no artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.


III – Decisão


            3. Pelo exposto, na improcedência da apelação, decide-se confirmar a decisão recorrida – a afirmação da incompetência internacional do Tribunal de Alcobaça para decretar o arresto aqui visado.

            Custas da apelação pela Apelante.


Teles Pereira (Relator)
Manuel Capelo
Jacinto Meca


[1] Aplica-se aqui (processo principal iniciado em 2011) o regime processual dos recursos corporizado no Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto (v. os respectivos artigos 11º, nº 1 e 12º, nº 1). Assim, sempre que seja necessário convocar na subsequente exposição alguma norma do Código de Processo Civil cujo texto tenha sido alterado pelo referido DL nº 303/2007, sê-lo-á na redacção introduzida por este último diploma.

[2] Disse-se na decisão recorrida:
“[…]
As normas de competência internacional atribuem a um conjunto de Tribunais de um Estado o complexo de poderes para o exercício da função jurisdicional em questões que envolvam mais do que um Estado, entre os vários factores constitutivos de uma determinada ordem jurídica. Além das normas dos artigos 65° e 65°-A do CPC, vigoram directamente na ordem jurídica portuguesa, e enquanto fonte comunitária com relevo para a decisão da excepção suscitada nos autos, o Regulamento (CE) n° 44/2001. de 22/12/2000, relativo à competência Judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, que entrou em vigor em 13/03/2002, substituindo entre os Estados Membros da EU (com excepção da Dinamarca) a Convenção de Bruxelas de 1968.
Este Regulamento é directamente aplicável a todos os Estados Membros, em conformidade com o Tratado que instituiu a Comunidade Europeia (artigos 1°, 68°, e 76° do Tratado e art. 8° da Constituição), prevalece sobre as normas reguladoras da competência internacional previstas nos artigos 65°, 65°-A, 99°, 1094° e 1102° do CPC […]. Aliás a actual redacção do artigo 65°, n°1, do CPC (introduzida pelo DL. N° 38/2003, de 08.03) ressalva o que se acha estabelecido em tratados, convenções e regulamentos comunitários.
De acordo com o citado regulamento, a regra geral é a competência do tribunal do Estado em que o demandado tem o seu domicílio (art. 2°). Nos termos do art. 60., as sociedades comerciais têm domicílio no lugar que tiverem a sua sede social, a sua administração central ou o seu estabelecimento principal.
Concorre com esta regra geral, os critérios especiais de competência especializada estabelecidos na secção II do capítulo II.
Ora, no caso dos presentes autos, a requerida está sediado na Holanda. Contudo o art. artigo 5°, n°1, do referido Regulamento, enuncia os critérios
especiais de competência em sede de matéria contratual, nomeadamente que é competente o tribunal do lugar onde deva ser cumprida a obrigação em questão.
Sucede, porém que, em algum momento a requerente referiu no seu requerimento inicial onde a obrigação deveria ser cumprida, pelo que, na falta deste elemento, nada mais restará ao Tribunal do que declarar-se incompetente internacionalmente, uma vez, que se aplica o critério geral — domicilio do devedor (art. 2° e 60º do Regulamento).
Por outro lado, os Tribunais Portugueses sempre careciam de
ius imperi para determinarem o arresto de bens que se encontrem fora do território nacional, pelo que, de acordo com o referido art. 31 do regulamento tal medida cautelar aqui pretendida deverá ser interposta no Estado-Membro dos Países-Baixos
[…]”
                [transcrição de fls. 37/38]
[3] É esta, precisamente, a interpretação do artigo 31º do Regulamento 44/2001 sustentada pela Apelante na motivação do presente recurso.
[4] Trata-se esta de uma acção declarativa de condenação com processo ordinário, movida pela ora Requerente (aí Autora) contra a aqui Requerida (aí Ré) e na qual é pedida a condenação desta última na satisfação do valor pretendido acautelar com este arresto, acrescido dos respectivos juros (tivemos acesso ao teor desta petição inicial através do histórico desse processo no sistema Citius).
[5] Reproduz esta disposição, exactamente, o conteúdo do artigo 24º da Convenção de Bruxelas (Convenção Relativa à Competência Judiciária e à Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial, assinada em Bruxelas em 27 de Setembro de 1968): “[a]s medidas provisórias ou cautelares previstas na lei de um Estado Contratante podem ser requeridas às autoridades judiciais desse Estado, mesmo que, por força da presente Convenção, um tribunal de outro Estado Contratante seja competente para conhecer da questão de fundo”.
Note-se que a adopção deste Regulamento 44/2001rectius, o tratamento da questão da competência judiciária internacional em matéria civil e comercial entre os Estados Membros através de um Regulamento comunitário – tem na sua génese a atribuição, pelo Tratado de Amesterdão de 1999, de competência legislativa à Comunidade Europeia em matéria de Direito Internacional Privado, incluindo a competência internacional e o reconhecimento de decisões estrangeiras (v. Luís de Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, Volume III, Coimbra, 2002, p. 55).
[6] Disponível em:
 http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/pt/com/2006/com2006_0618pt01.pdf.
[7] Disponível em:
http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2008:010:0002:0008:PT:PDF.
[8]  Com efeito, existe, pendente de adopção, uma proposta de “Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho [criando] uma decisão europeia de arresto de contas para facilitar a cobrança transfronteiriça de créditos em matéria civil e comercial” [v., enquanto elemento mais recente deste processo, o “Documento de Trabalho dos Serviços da Comissão”de 25/07/2011, SEC(2011)938 final, disponível em:
http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=SEC:2011:0938:FIN:PT:PDF].
[9] Neste domínio, os únicos elementos interpretativos formais passíveis de consideração seriam constituídos por jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (anteriormente Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias), enquanto único órgão competente para decidir sobre a interpretação do Regulamento 44/2001, por substituição do regime vigente para a Convenção de Bruxelas, nos termos do artigo 68º, nº 2 do Regulamento:
“O [Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias] tem competência para decidir sobre a interpretação da Convenção de Bruxelas, por força do Protocolo de 1971 […].
A competência interpretativa do [Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias] decorre, com respeito ao Regulamento em matéria civil e comercial, dos artigos 68º e 234º do Tratado da Comunidade Europeia” (Luís de Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, Volume III, cit., pp. 56/57, a referência ao artigo 234º do Tratado deve ser actualizada para o artigo 267º da versão vigente; note-se que o artigo 1º, nº 1 do indicado Protocolo de 1971 dispõe: “[o] Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias é competente para decidir sobre a interpretação da Convenção Relativa à Competência Judiciária e à Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial e do Protocolo anexo a essa Convenção, assinados em Bruxelas em 27 de Setembro de 1968, bem como do presente Protocolo”).
[10] É esta interpretação que a Apelante propugna na motivação deste recurso, a fls. 43 (alínea G)), ao citar o ponto 4.5.1. do Parecer do Comité Económico e Social Europeu adoptado na 438ª Reunião Plenária (v. nota 8, supra): “[d]e certo modo, a questão da competência do tribunal para apreciar e decretar a providência cautelar também se acha resolvida pelo que se referiu anteriormente. Competente será, obviamente, o tribunal competente para conhecer do mérito da causa, a partir do momento em que a acção/execução já se acha interposta”.
O que a Apelante não refere – e é relevante – é que esta asserção não visa, como já se indicou, a disposição vigente (o artigo 31º do Regulamento 44/2001), mas sim um futuro Regulamento, que ainda não existe e que, quando existir, não se sabe se adoptará esse critério da competência (para bloquear cautelarmente uma conta bancária) do Tribunal do Estado que seja competente para apreciar o mérito da causa, estando a acção para apreciação desse mérito já instaurada.
[11] Note-se que no nosso regime processual, nos termos do artigo 383º, nºs 1 e 3 do CPC, essa tutela cautelar competiria, não fora o artigo 31º do Regulamento, ao Tribunal que apreciasse a questão de fundo, significando isso dever a acção correspondente a essa tutela cautelar “[…] ser proposta em Portugal […]” (artigo 65º, nº 1 , alínea b) do CPC, na redacção do Decreto-Lei nº 38/2003, de 8 de Março). Vale aqui, para afastamento desta regra, a ressalva, neste caso reportada ao artigo 31º do Regulamento, constante do nº 1 deste artigo 65º: “[s]em prejuízo do que se ache estabelecido em tratados, convenções, regulamentos comunitários […]”.
[12] Parafraseámos aqui um trecho do dispositivo do Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, de 17 de Novembro de 1998, no caso “Van Uden Maritime BV agindo sob a designação Van Uden África Line contra Kommanditgesellschaft in Firma Deco Line”, disponível, em português, no sítio: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:61995CJ0391:ptHTML:
“[…]

52 Na medida em que o objecto de um pedido de medidas provisórias incide sobre uma questão abrangida pelo âmbito de aplicação material da convenção de 27 de Setembro de 1968, esta última aplica-se e o seu artigo 24º é susceptível de fundamentar a competência do juiz das medidas provisórias mesmo que já tenha sido ou possa ser instaurado um processo quanto ao mérito e mesmo que este processo deva correr os seus termos perante árbitros.

53 O artigo 24º da convenção de 27 de Setembro de 1968 deve ser interpretado no sentido de que a sua aplicação está dependente, nomeadamente, da condição da existência de um elemento de conexão real entre o objecto desta medida e a competência territorial do Estado contratante do juiz a quem é requerida.
[…]”.
A referência deste Acórdão à incidência expressa nos seguintes termos: “[…] mesmo que este processo deva correr os seus termos perante árbitros”, sublinha, por assimilação da arbitragem à competência de um outro tribunal (arbitral), a circunstância aqui verificada do bloqueio da conta apresentar uma conexão real indutora da competência de um tribunal de um Estado diverso daquele onde ocorre a apreciação da questão de mérito do direito pretendido acautelar.
[13] Está disponível, na versão inglesa, no sítio:
http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:61979J0125:EN:HTML.
Sublinha-se que o entendimento subjacente a este Acórdão Denilauler foi posteriormente (em 1998) reafirmado pelo Tribunal na decisão “Van Uden” indicada na antecedente nota 13.
[14] Note-se que este entendimento, respeitante ao artigo 24º da Convenção de Bruxelas, continua a ser invariavelmente referenciado ao artigo 31º do Regulamento 44/2001:
“[…]

The European Commission finds that the Court of Justice of the European Communities has thus restricted the possibility of using such measures as provided in Article 31: Ínterim and precautionary measures for the purpose of Article 31 only mean measures which, in the matters to which they apply, are designed to preserve a situation of fact or law in order to safeguard rights the recognition of which is applied for in other proceedings in a court hearing the case on the merits. In addition, the grant of interim or precautionary measures within the meaning of Article 31 is subject to the condition, among others, that there must be a real link between the purpose of the measure and the territorial jurisdiction of the court applied to in the Member State. And the defendant's right to an adversarial procedure must be respected.
[…]” (Annette Kur, Lydia Lundstedt, “Seminar 3 – Private International Law, Question 6”, disponível em: http://www.juridicum.su.se/jurweb/utbildning/master/master_of_european_intellectual_property_law/Material%202008/Module%201/Summaries/InternationalPrivateLaw/Tessmann_6.pdf).
[15] Comentário à Convenção de Bruxelas, Lisboa, 1994, p. 136.
[16] Processo Civil da União Europeia, Coimbra, 2002, pp. 101/102.
[17] E o Direito holandês não deixa de prever mecanismos de tutela cautelar cobrindo o mesmo efeito aqui visado pelo arresto (v. J. B. M. Vranken, “Provisional measures as an autonomous form of judiciary protection in Dutch law”, disponível no sítio: http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=12938).
[18] Referimo-nos a estes por serem os convocados pela decisão recorrida no seu percurso argumentativo.
[19] Disse o Tribunal a quo: “[…] em algum momento a requerente referiu no seu requerimento inicial onde a obrigação deveria ser cumprida, pelo que, na falta deste elemento, nada mais restará ao Tribunal do que declarar-se incompetente internacionalmente, uma vez, que se aplica o critério geral — domicilio do devedor (art. 2° e 60º do Regulamento)”.
[20] Diz este:

Artigo 5º
Uma pessoa com domicílio no território de um Estado-Membro pode ser demandada noutro Estado-Membro:
1 – a) Em matéria contratual, perante o tribunal do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão;
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------.
[21] Disse a A. aqui Requerente no articulado inicial dessa acção:
“[…]
Artigo 29º
A R. efectuava os pagamentos dos serviços de transporte prestados pela A. através de transferência bancária, todas as semanas, normalmente à 6ª feira e normalmente disponíveis na 2ª feira seguinte, cfr. comunicações emitidas pelo BPN – Banco Português de Negócios como docs. 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16 e 17 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
[…]”
[22] Miguel Teixeira de Sousa, Dário Moura Vicente, Comentário à Convenção de Bruxelas, cit. p. 136.
[23] Equivale este ao Capítulo III do Regulamento 44/2001, referente ao “Reconhecimento e Execução” (artigos 32º a 56º).
[24] Valem a este respeito, sucessivamente, os artigos 27º, nº 2 da Convenção de Bruxelas e 34º, nº 2 do Regulamento 44/2001:
Artigo 34º
Uma decisão não será reconhecida:
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
2 – Se o acto que iniciou a instância ou acto equivalente, não tiver sido comunicado ou notificado ao requerido revel, regularmente e em tempo útil, por forma a permitir-lhe a defesa;
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------.
Quer-nos parecer que esta questão da falta de exercício do contraditório, conatural ao arresto no Direito Português, não seria ultrapassada pelo desencadear da circunstância prevista no artigo 47º do Regulamento (reconhecimento da decisão proferida no processo principal), dado o entendimento da jurisprudência comunitária (é o sentido do Acórdão Denilauler) quanto à não cobertura pelo processo simplificado de reconhecimento previsto no Capítulo III do Regulamento, relativamente a medidas provisórias decretadas num procedimento não contraditório: “[…] the defendant’s right to an adversarial procedure must be respected” (Annette Kur, Lydia Lundstedt, “Seminar 3…”, cit. na nota 15).
[25] A versão consolidada do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia está disponível no “Jornal Oficial da União Europeia” de 30/03/2010, disponível no endereço: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2010:083:0047:0200:PT:PDF.
[26] Disponível em:
http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:61981J0283:EN:HTML.
[27] Diz-se no sumário do caso “CILFIT”:
“[…]

4. Although the third paragraph of article 177 of the EEC treaty unreservedly requires national courts or tribunals against whose decisions there is no judicial remedy under national law to refer to the court every question of interpretation raised before them, the authority of an interpretation already given by the court may however deprive the obligation of its purpose and thus empty it of its substance. Such is the case especially when the question raised is materially identical with a question which has already been the subject of a preliminary ruling in a similar case or where previous decisions of the court have already dealt with the point of law in question, irrespective of the nature of the proceedings which led to those decisions , even though the questions at issue are not strictly identical. However , it must not be forgotten that in all such circumstances national courts and tribunals , including those referred to in the third paragraph of article 177, remain entirely at liberty to bring a matter before the court of justice if they consider it appropriate to do so .

[…]” (sublinhado acrescentado).
[28] Enrique Linde Paniagua, Pilar Mellado Prado, Iniciación al Derecho de la Unión Europea, 4ª ed., Madrid, 2008. pp. 270/271.