Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1786/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: GARCIA CALEJO
Descritores: ALEGAÇÕES
PROCESSO URGENTE
SUSPENSÃO DE PRAZO
FÉRIAS JUDICIAIS
Data do Acordão: 06/22/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LOUSÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Legislação Nacional: ARTº 144º, Nº 1 DO CPC
Sumário: 1. De harmonia com o art. 144.º n° 1 do C.P.Civi1 os prazos judiciais são contínuos (isto é, não se suspendem aos sábados domingos e feriados) suspendendo-se apenas nas férias judiciais (ou seja, de 22/12 a 3/1, do domingo de Ramos a segunda- feira de Páscoa e de 16/7 a 14/9 -.artigo 10.º da Lei 38/87 de 23/12). Porém, mesmo nestes casos, os prazos não se suspendem quando se trate de prazos de duração igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processos urgentes.
2. Nos termos do art. 35.º n° 2 do Dec-Lei 385/88 de 25/10 (Lei do Arrendamento Rura1), os processos judiciais referentes a .arrendamentos rurais têm o carácter de urgência. Tendo esta natureza urgente, teremos de concluir que os respectivos prazos judiciais se não suspendem em férias judiciais.
3. De harmonia com o art. 143.º n° 1 do mesmo Código, não sendo o acto de apresentação de alegações uma citação ou notificação e não constituindo também, patentemente, uma acção destinada a evitar um dano irreparável, teremos que concluir que esse acto não pode ser praticado em férias judiciais. Mas nada impede que esse acto seja praticado logo após terminarem essas férias, isto é, no primeiro dia útil depois do seu término.
4. Tendo, no caso vertente, o processo carácter urgente, o prazo judicial para apresentação das alegações não se suspendeu durante as férias judiciais de Verão. O que sucedeu foi que na altura em que terminou o prazo para alegar, por decorrem as férias judiciais e nos termos do dito art. 143.º n.ºs 1 e 2, a parte não pôde apresentar no tribunal as suas alegações. Nessas circunstâncias deveria apresentá-las logo que lhe fosse (legalmente) possível, ou seja, no primeiro dia útil depois das férias.
Decisão Texto Integral: 1

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I- Relatório:
1-1- No Tribunal Judicial da Comarca da Lousã, A e maridoB , C e marido D, E, F, G e H, propuseram a presente acção com processo sumário contra I e mulher J, todos com os sinais dos autos, pedindo que seja decretada a resolução do contrato de arrendamento rural que identificam e, em consequência, sejam os RR. condenados a pagarem-lhe uma indemnização por danos causados no prédio arrendado, no montante de 500.000$00.
1-2- O processo seguiu os seus regulares termos, tendo sido proferida sentença em que se declarou improcedente a excepção dilatória inominada ( invocada pelos RR. ), mas procedente a acção, declarando-se a resolução do contrato de arrendamento rural aludido na p.i., com condenação dos RR. a pagar aos AA. uma indemnização por danos causados, a liquidar em execução de sentença.
1-3- Não se conformando com esta decisão, dela vieram recorrer os RR., recurso que foi admitido como apelação e com efeito suspensivo.
1-4- Os RR. recorrentes alegaram, mas a parte contrária, notificada da apresentação das alegações, veio suscitar a questão da intempestividade dessa apresentação e, como tal, invocou a deserção do recurso.
1-5- Suscitada esta questão, foram notificados os recorrentes para se pronunciarem, mas nada disseram.
1-6- Por decisão judicial de 7-11-03, foram consideradas como tempestivas as alegações e assim indeferido o pedido de declaração de deserção do recurso, formulado pelos recorridos.
1-7- Não se conformando com esta decisão, dela vieram recorrer os AA. (recorridos ), recurso que foi admitido como agravo com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
1-8- Os recorrentes deste agravo alegaram, tendo formulado as seguintes conclusões:
1ª- Os processos referentes a arrendamento rurais têm a natureza de urgência, não se suspendendo durante as férias judiciais.
2ª- O prazo processual para apresentação das alegações de recurso não se suspende também nas férias.
3ª- As alegações dos recorrentes entraram em tribunal muito depois do termo do prazo, devendo, por isso, o recurso ser julgado deserto por falta de alegações dos recorrentes.
4ª- Foram violados os arts. 143º nº 2 e 291º nº 2 do C.P.Civil e 35º nº 2 do Dec-Lei 385/88 de 25/10.
1-9- A parte contrária não respondeu a estas alegações.
1-10- O Mº Juiz recorrido manteve a sua decisão.
Corridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.
II- Fundamentação:
2-1- A única questão que se coloca no presente agravo, é o de saber-se se as alegações de recurso ( apelação ) interposto pelos RR., deram ou não entrada tempestivamente em juízo. O Mº Juiz entendeu que sim. Os ora recorrentes ( e recorridos no primitivo recurso ), entendem que não.
Na douta decisão recorrida considerou-se, em síntese, que deveria aplicar-se in casu o disposto no art. 143º nº 1 do C.P.Civil, ou seja, que os actos processuais a praticar na sua tramitação se suspendem durante o período das férias judiciais, como é o caso da apresentação das alegações de recurso e, como tal, devem as alegações em causa serem consideradas como tempestivamente apresentadas.
Por sua vez os agravantes entendem que os processos referentes a arrendamento rurais têm a natureza de urgência e, por isso, não se suspendem durante as férias judiciais. Igualmente o prazo processual para apresentação das alegações de recurso não se suspende também nas férias. Assim sendo, concluem, que as alegações dos recorrentes entraram em tribunal muito depois do termo do prazo.
Vejamos:
Para a decisão, há a considerar as seguintes circunstâncias:
a) Por requerimento entrado em juízo em 30-5-03, os RR. interpuseram recurso da sentença condenatória contra eles proferida.
b) Por despacho judicial, notificado aos recorrentes por carta registada enviada a 27-6-03, foi admitido o recurso de apelação.
c) As alegações de recurso deram entrada em juízo em 30-9-03.---------
Face ao disposto no art. 254º nº 3 do C.P.Civil ( diploma de que serão as normas a indicar sem menção de origem ), a parte tem-se como notificada da admissão do recurso no terceiro dia posterior ao registo, isto é, no caso vertente, deve a parte recorrente ter-se como notificada, em 30-6-03.
De harmonia com o art. 698º nº 3, os recorrentes devem alegar por escrito no prazo de 30 dias, contados da notificação do despacho de recebimento de recurso.
Tendo começado o prazo para alegar, in casu, a correr a partir de 30-6-03, é evidente que quando as alegações deram entrada em juízo ( 30-9-03 ), já haviam ocorrido muito mais de 30 dias ( tinham decorrido, precisamente, 90 dias ).
Sucede porém que, entre 15 de Julho e 15 de Setembro de 2003 ocorreram, como se sabe, as férias judiciais de Verão.
De harmonia com o art. 144º nº 1 “o prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processos que a lei considere urgentes”.
Desta disposição resulta que os prazos judiciais são contínuos ( isto é, não se suspendem nos sábados, domingos e feriados ), suspendendo-se apenas nas férias judiciais ( ou seja, de 22/12 a 3/1, do domingo de Ramos a segunda-feira de Páscoa e de 16/7 a 14/9 - art. 10º da Lei 37/87 de 23/12 -). Porém, mesmos nestes casos, os prazos não se suspendem quando se trate de prazos de duração igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processos que a lei considere urgentes.
Quer isto dizer e que para o que aqui interessa que, os prazos relativos a actos a praticar em processos que a lei considere urgentes, não se suspendem em férias judiciais.
Nos termos do art. 35º nº 2 do Dec-Lei 385/88 de 25/10 ( Lei do Arrendamento Rural ), os processos judiciais referentes a arrendamentos rurais têm o carácter de urgência.
Tem pois o presente processo, por incidir sobre arrendamento rural, a natureza de urgente. Tendo esta natureza urgente, teremos de concluir, pelo que dissemos, que os respectivos prazos judiciais se não suspendem em férias judiciais.
Estabelece, todavia, o art. 143º nº 1 que “não se praticam actos processuais nos dias em que os tribunais estiverem encerrados, nem durante o período de férias”, acrescentando o nº 2 da disposição que “exceptuam-se do disposto no número anterior as citações, notificações e os actos que se destinem a evitar dano irreparável”.
Significa isto que não sendo, o acto de apresentação de alegações, uma citação ou notificação e não constituindo também, patentemente, uma acção destinada a evitar um dano irreparável, teremos que concluir que esse acto não pode ser praticado em férias judiciais. Mas nada impede, obviamente, que esse acto seja praticado logo após terminarem essas férias, isto é, no primeiro dia útil depois do seu término.
Pelo que se deixa dito, tendo, no caso vertente, o processo carácter urgente, contra o que defendeu o Mº Juiz a quo, o prazo judicial para apresentação das alegações, não se suspendeu durante as férias judiciais de Verão. O que sucedeu é que na altura em que terminou o prazo para alegar, por decorrem as férias judiciais e nos termos do dito art. 143º nºs 1 e 2, a parte não pôde apresentar no tribunal as suas alegações. Nessas circunstâncias deveria apresentá-las logo que lhe fosse ( legalmente ) possível, ou seja no primeiro dia útil depois das férias, que ocorreu em 15-9-03 ( uma 2ª feira ).
Quer isto dizer que quando foram apresentadas as alegações ( em 30-9-03), não só já há muito se havia esgotado o prazo para a parte as efectuar, como também já vários dias tinham decorrido sobre o primeiro dia útil em que lhe teria sido possível entregá-las em juízo.
Teremos pois que considerar tal apresentação como intempestiva o que leva a que se declare o recurso deserto por falta de alegações, nos termos do art. 291º nº 2.
III- Decisão:
Por tudo o exposto, dá-se provimento ao recurso, julgando deserto o recurso ( de apelação ) interposto pelos RR. por falta de alegações.
Sem custas.