Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
226/06.3TTSTR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERNANDES DA SILVA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
DESCARACTERIZAÇÃO DE ACIDENTE
SONOLÊNCIA DO TRABALHADOR VÍTIMA DE ACIDENTE DE VIAÇÃO/ACIDENTE DE TRABALHO
Data do Acordão: 11/11/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DE TOMAR
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTºS 7º, Nº 1, AL. B), DA LAT (LEI Nº 100/97, DE 13/09).
Sumário: I – Conforme previsão com guarida na al. b) do nº 1 do artº 7º da LAT (completada pelo nº 2 do artº 8º do respectivo Regulamento), o acidente de trabalho descaracteriza-se, não dando lugar a reparação, quando provier exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado, como tal se havendo o comportamento temerário em alto e relevante grau, que não se consubstancie em acto ou omissão resultante da habitualidade ao perigo do trabalho executado, da confiança na experiência profissional ou dos usos e costumes da profissão.

II – A sonolência, “qua tale”- admitida na acepção de uma função biológica que significa dificuldade em manter um estado de alerta – subsume-se, directa e necessariamente, enquanto causa de um despiste automóvel, no conceito geral de negligência grosseira (ou culpa grave), com o dito recorte.

III – Com efeito, a dimensão da culpa é, neste contexto de significação, de elevada exigência, demandando uma censurabilidade exponencial, como se reconhece unanimemente.

Decisão Texto Integral:
Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

I –
A CAUSA

1 – Terminada sem sucesso a fase conciliatória deste processo especial emergente de acidente de trabalho, veio A..., (primeiro patrocinado oficiosamente pelo M.º P.º, e de depois com mandatário constituído – ‘ut’ fls. 148 e 170), demandar as RR. Companhia de Seguros ‘B...’ e ‘C...’, todos devidamente identificados, pedindo a final a sua condenação nos termos e proporções discriminados no petitório, a que nos reportamos.

Pretextou, em síntese útil, que se acidentou no dia 8.8.2005,ao serviço da co-R. patronal, consistindo o sinistro em ter-se despistado e embatido em vários obstáculos, do que lhe resultaram diversas fracturas e traumatismos por todo o corpo, ficando com amputação do braço esquerdo, perda de visão do olho esquerdo, luxação da anca do mesmo lado e depressão reactiva.
Ficou por via disso com uma IPP de 0,779, com IPATH.
O contrato de seguro que a R. patronal outorgou com a R. Seguradora garante a responsabilidade pelo salário base mensal no valor de € 500,00x14 meses+€ 5,00 de subsídio de alimentaçãox22x11+€ 280,00 de média mensal de outras remuneraçõesx11 meses, num total anual de € 11.570,00.
O A., à data do acidente, enquanto vendedor, tinha direito à retribuição descrita no item 12.º da P.I., num total anual de € 12.427,00.

2 – As RR. contestaram.

3 – Condensada, instruída e discutida a causa, proferiu-se finalmente sentença, a julgar a acção procedente, com condenação das co-RR. Seguradora e patronal, conforme dispositivo a fls. 304-305, que aqui damos por inteiramente vertido.

4 – A co-R. patronal, irresignada, vem apelar.
Alegando, concluiu assim (O expediente relativo ao recurso foi inicialmente dirigido ao Tribunal da Relação de Lisboa, lapso depois devidamente rectificado a fls. 345):
[…]
Deve assim ser concedido provimento ao recurso e alterada a decisão recorrida, nesta parte.

5 – Mas a co-R. Seguradora também não se conformou com o decidido.
E veio apelar, alegando e concluindo:
[…]
O A./recorrido ofereceu contra-alegações às duas impugnações, concluindo no sentido da procedência da deduzida pela co-R. patronal, mas já não assim quanto ao recurso interposto pela co-R. Seguradora.

6 – Foi a seguir proferido o despacho de fls. 414, em cujos termos se atendeu ao protesto da co-R. patronal, considerando efectivamente que foi acordado pelas partes, no início da Audiência de Discussão e Julgamento, que estava totalmente transferido para a co-R. Seguradora o salário de € 528,00x14 meses.
Procedeu-se à reforma da sentença e às rectificações correspondentes, consignando-se a final que ‘fica prejudicada a subida do seu recurso junto ao Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, ordenando-se ainda concomitantemente a devolução do valor da caução por esta prestado’.
E, do mesmo passo, admitiu-se o recurso interposto pela co-R. Seguradora.

Mas a co-R. patronal, não obstante, não se resignou com a decisão de reforma da sentença e interpôs recurso de Apelação, conforme fls. 921.
Aí alegou e concluiu assim:
[…]
Repetiu-se o despacho de admissão do recurso da R. Seguradora (…já proferido a fls. 415v.º) e admitiu-se o recurso ora interposto pela co-R. patronal.

Exposto esquematicamente o desenvolvimento da lide e colhidos que se mostram os vistos legais devidos – com o Exm.º P.G.A. a emitir Parecer no sentido da improcedência de ambos os recursos, a que ainda reagiu a co-R. patronal – vamos analisar, ponderar e decidir.
______

II –
DOS FUNDAMENTOS.
A – DE FACTO.
Vem seleccionada a seguinte factualidade:
[…]
____

B – CONHECENDO.
Como se constata, o objecto da impugnação interposta pela co-R. Seguradora coloca-nos uma (única) questão, (a da pretendida descaracterização do acidente a que se reporta o processo), cujo tratamento e solução têm precedência lógica relativamente ao mais controvertido.
Por aqui começamos, pois.

- Da Apelação da co-R. Seguradora.
Identificada a (parte da) decisão contra que se reage – concretamente a que a condenou no pagamento ao A. das importâncias discriminadas – a Recorrente adianta a seguir as razões por que, no seu entendimento, se impunha solução diferente.
Vejamos então por que pede a sua anulação.

Embora não seja explícita na formulação desse seu propósito, a Apelante visaria, como pressuposto lógico da tese que sustenta, a impugnação da decisão da matéria de facto.
Referindo-se ao elenco dos factos provados relevantes, (para se centrar concretamente na circunstância de a Mm.ª Juíza 'a quo' ter admitido que o motivo do despiste do A.…’pode ter sido devido a sonolência’), começa por alegar que a prova foi gravada, referindo-se, primeiro, ao depoimento de uma testemunha (D...) e, depois, a uma descrição do acidente, feita por escrito e assinada pelo próprio A., para finalmente rematar que …’existem elementos nos Autos, quer objectivos, quer subjectivos, dos quais se conclui que o despiste se ficou a dever em consequência da sonolência do condutor do veículo OH, o A.’.
Assim, contrariamente ao entendido, tendo o acidente ocorrido exclusivamente por negligência grosseira do A., (o seu comportamento tem de classificar-se como temerário, ostensivamente indesculpável e reprovado por um elementar sentido de prudência…- sic, a fls. 338), verifica-se a sua descaracterização.

Ora – e antes de mais – pretendendo a Recorrente impugnar a decisão de facto, não poderia ignorar a disciplina e ónus que sobre si faz impender o art.690.º-A do C.P.C.
Sob pena de rejeição, (como se comina no n.º1 da previsão), deve o recorrente especificar obrigatoriamente, em tal circunstância, quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Tendo sido gravados os invocados meios probatórios, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na Acta, nos termos do disposto no n.º2 do art. 522.º-C…
…Isto, antes de mais, para viabilizar à contraparte o devido contraditório, acautelado no n.º3, tudo como claramente se preceitua na norma em caixa.
E, fundamentalmente, depois – …como se depreende da economia da previsão – para permitir a conferência pontual do pretenso erro de julgamento, se no identificado confronto, se viesse a concluir que outra devesse ter sido necessariamente a percepção e resposta do Exm.º Decisor!
Parte dessa exigência legal não foi satisfeita.
Funcionando a cominação legal, não se pode, pura e simplesmente, conhecer deste fundamento do recurso.

Sempre se consigna, não obstante, (para que mais facilmente se conceda…), que, na verdade, não se vê donde poderia provir a prova segura do que, em contrário, se fixou no ponto de facto em crise.
Nele se exarou, expressamente, que …’o A., por motivos concretos que se desconhecem, admitindo-se poder ser devido a sonolência, perdeu o controle do veículo que conduzia, o qual se foi desviando lentamente para a esquerda, atento o seu sentido de marcha…’
Ora, o que realmente prevalece, neste ponto de facto, é que se desconhecem os motivos concretos por que o sinistrado perdeu o controle do veículo que conduzia.
Poderia ter sido por diversas causas, admitindo-se até que pudesse ter sido devido a sonolência, quiçá a mais plausível…
…Mas não se apurou exactamente a razão determinante.
Como não vêm indicado/s o/s meios/elementos de prova que imporiam (…) resposta diversa (e, menos, o modo por que pudessem ser sindicados nesta sede), fica intocado o juízo alcançado, que o foi necessariamente à luz do princípio da liberdade de julgamento, com fundamentação/motivação conferida, (fls.291v.º – onde se invocam, como determinantes no caso, o depoimento de parte do A. e das testemunhas E..., D... e F...), a qual não patenteia qualquer vício que suscite a nossa intervenção oficiosa.

Com o quadro de facto definido nos termos em que se nos apresenta – que assim como tal se fixa – outra não poderia ser, também na nossa perspectiva e entendimento, a solução eleita.


Mas, mesmo raciocinando no pressuposto de que o despiste se tivesse ficado a dever a sonolência do A./sinistrado, ainda assim teríamos sérias dificuldades em concluir, sem mais, pela sua pretendida descaracterização.
Conforme previsão com guarida na alínea b) do n.º1 do art. 7.º da L.A.T., (complementada pelo n.º2 do art. 8.º do respectivo Regulamento), o acidente de trabalho descaracteriza-se, não dando lugar a reparação, quando provier exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado, como tal se havendo o comportamento temerário em alto e relevante grau, que não se consubstancie em acto ou omissão resultante da habitualidade ao perigo do trabalho executado, da confiança na experiência profissional ou dos usos e costumes da profissão.

Afigura-se-nos que a sonolência, ‘qua tale’, – admitida na acepção adiantada pela Recorrente, como sendo, de acordo com a última classificação internacional (sic), uma função biológica que significa dificuldade em manter um estado de alerta – se subsuma, directa e necessariamente, enquanto causa de um despiste, no conceito geral de negligência grosseira, com o recorte postulado.
Com efeito, a dimensão da culpa é, neste contexto de significação, de elevada exigência, demandando uma censurabilidade exponencial, como se reconhece unanimemente, diversa da noção/intensidade/grau de ilicitude com que se lida no âmbito da responsabilidade meramente civil e, concretamente, no campo das infracções estradais/acidentes rodoviários.

A negligência grosseira é culpa grave, consubstanciada em comportamento ou omissão que uma pessoa normalmente diligente vivamente repudiaria, (aquilo a que os Romanos chamavam – como ensina Galvão Teles, op.loc.cit., lembrado na decisão sujeita – ‘magna negligentia’/’non intelligere quod omnes intelligunt’).
Exigindo-se que seja uma conduta temerária, em alto e relevante grau, e por isso ostensivamente indesculpável, pressupõe logicamente que possa ser subjectivamente imputada ao respectivo agente.

Ora, – raciocinando ainda nos termos do falado cenário virtual – não se vê/nada mais alegado foi que impusesse excluir-se, por exemplo, que o sinistrado foi acometido de um estado de súbita, inesperada, imprevisível sonolência, (que o tenha surpreendido e para que/em nada/e de nenhuma forma tenha contribuído) …; ou, pela positiva, que houve, por banda do sinistrado, uma clara omissão das precauções ou cautelas mais elementares que, a terem sido normalmente tomadas, teriam necessariamente evitado que cedesse ao sono, enquanto estado/circunstância/causa única e exclusiva do despiste.

Como se verifica, tudo o que a propósito a Apelante expende mais não constitui – com o devido respeito – do que simples especulação sobre a teoria do aparecimento dos múltiplos sintomas e dos efeitos deletérios da sonolência e do adormecimento, (este enquanto estádio final daquela...), acrescida de alguns cuidados ou conselhos práticos para evitar a fadiga e o sono ao volante…

Longe de pôr em crise o bem fundado da decisão sujeita, a tese da Recorrente – que vimos de tratar na essencialidade dos seus argumentos – não pode ser acolhida, porque inconsistente.
Em resumo:
O acidente infortunístico a que nos reportamos não se mostra descaracterizado, não tendo sido afrontado o disposto no art. 7.º, n.º1, alíneas b) e c), da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro.
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- Da Apelação da co-R. Patronal.
Como se verifica, a sentença 'sub judicio' condenou a ora Apelante no pagamento dos valores discriminados originalmente no dispositivo de fls. 304v.º/305.
Na sequência da reacção desta, (fls. 345 e ss.), foi proferido o despacho de fls. 414-415, (como acima se referiu já), reformando-se a sentença nos moldes requeridos pela recorrente, (sic), com rectificação da decisão em conformidade com o aí consignado.
Como vemos, concedeu-se que tinha razão a Recorrente ao denunciar que não fora levado ao rol dos factos havidos como provados a circunstância de as partes terem acordado expressamente que estava totalmente transferido para a co-R. Seguradora o salário de €528,00x14 meses.
Assumiu-se o lapso e operou-se a rectificação tida por devida, ao abrigo do consentido pelos arts. 669.º, n.º2, b), e 669.º/3 do C.P.C., ‘ex vi’ do art. 1.º, n.º2, a), do C.P.T.

Simplesmente a co-R. patronal não se conformou, ainda assim, com o decidido e veio deduzir a impugnação que subiu até nós e de que ora se cuida.
Vejamos então.
Pretexta a Recorrente que, contrariamente ao decidido, não foi devidamente entendido o que as partes acordaram no que tange à assunção/transferência da responsabilidade, por banda da co-R. Seguradora, relativamente à actualização da retribuição, convencionalmente operada com efeitos retroactivos.
Tendo a co-R. patronal pago à co-R. Seguradora todas as diferenças salariais, (sic), no momento imediatamente a seguir àquele em que tomou conhecimento da actualização salarial, conforme a Seguradora confirmou em sede de audiência de julgamento, isso significou que pagou a diferença do salário-base, bem como os demais diferenciais que dele dependiam directamente, ou seja, os referentes ao subsídio de alimentação, de isenção de horário de trabalho, de abono para falhas, tudo como aliás resulta do documento que anexou.
Acordada a transferência da totalidade da responsabilidade pela reparação do acidente para a co-R. Seguradora e pago/aceite o valor correspondente, não faz sentido que a Apelante veja ainda parte da responsabilidade sobrar para si, como afinal se conclui da reacção apresentada.

A co-R. Seguradora, notificada da interposição do recurso e do teor das respectivas motivação e conclusões, nada contrapôs.
O A., já antes se pronunciara sobre a posição da Recorrente Patronal, adiantando nada ter a opor à sua pretensão, …uma vez que em sede de Audiência de discussão e julgamento efectivamente foi apresentado pela entidade empregadora comprovativo de pagamento do premio do seguro correspondente ao aumento salarial decorrente do citado CCT.
Reagindo ao Parecer do Exm.º P.G.A., (que propendeu para a falta de razão da ora Recorrente), esta veio ainda dizer que o entendimento preconizado enferma do mesmo vício que atinge a sentença recorrida, pois ignorou que a impetrante pagou à co-R. Seguradora, imediatamente após a publicação da revisão global da CCT, todos os valores correspondentes aos retroactivos salariais, o que esta aceitou.

Tudo revisto:
Cremos que a Apelante tem razão.
Não obstante se dever reconhecer que as coisas poderiam perfeitamente ter ficado mais claramente expressas e discriminadas – não dando azo a quaisquer dúvidas, como, v.g., as que motivam esta reacção – cremos haver elementos suficientemente fiáveis que apontam no sentido de que há que fazer prevalecer como boas as razões que dão voz ao protesto da Recorrente, atenta a patente boa fé, ínsita na acordada transferência da responsabilidade superveniente.
Liminarmente porque não seria razoável admitir-se que, tendo havido uma alteração salarial intercorrente, com efeitos retroactivos, se equacionasse a imediata actualização do prémio correspondente ao aumento da retribuição -base, se dispusesse a R. patronal a pagá-lo e a Seguradora a recebê-lo…e se deixasse de fora, como encargo residual, a cobertura reflexa das componentes retributivas cujo valor dependeria directamente da actualização daquele salário-base.
Seria irrazoável e incompreensível.
Reportados à Acta da Audiência de Discussão e Julgamento, a fls. 289, nela se exarou que a R., na sequência da dedução de um requerimento para junção de documento, declarou que aceita estar validamente transferida para si a responsabilidade pelo salário de € 528,00x14 meses, uma vez que posteriormente a tal salário ter saído em CCT, foram pagos os retroactivos à Companhia de Seguros.
Aí se consignou, em despacho subsequente, que a segunda parte do requerimento seria considerada em momento proprio.

Esta confissão de facto acresce, pois, ao elenco da factualidade seleccionada, havida como provada, o que aqui se determina.

Resta ora sondar o seu real alcance, ou seja, saber e decidir se na sua expressão literal consta menos/se disse menos do que se quis e deveria ter dito, já que, lamentavelmente, não é inequívoca, como prescreve a Lei que o devesse ser (art.357.º/1 do Cód. Civil).
Não temos nenhum motivo para não aceitar que a confessada/assumida transferência da responsabilidade pelo diferencial do salário, entretanto actualizado, com o pagamento dos correspondentes retroactivos do prémio feito à Seguradora, não tenha tido na base a comunicação da co-R. patronal à co-R. Seguradora, comunicação essa que constitui o documento (justificadamente) junto com as alegações, a fls. 430.
A Seguradora, notificada da sua junção com o demais expediente relativo à interposição do recurso (fls. 440), nada disse.
Nele consta concretamente que se informa a destinatária de que …‘no mês de Dezembro de 2006 procedemos ao pagamento de retroactivos conforme consta da nossa folha de férias ao Sr. A....
Actualização de vencimento de €500 para 528€; Isenção de horário de 100€ para 137,10€ e do Abono de Falhas de 20€ para 21,65€.
Agradecemos que estes valores actualizem o prémio de seguro.
Ora, nem isto nem os restantes elementos documentais juntos em cópia, respeitantes aos valores adiantados, liquidados e pagos, foram impugnados, como se disse.
Reportados aos factos assentes, relembramos que o contrato de seguro outorgado entre as co-RR. garantia o salário mensal de € 500,00 x 14 meses + € 5,00 x 22 dias x 11 meses, de subsídio de alimentação, + € 280,00 (média mensal de outras remunerações) x 11 meses…
…E que à data do acidente o A., enquanto vendedor, tinha direito ao salário base no valor de € 528,00x14 meses + € 5,00x22 dias x 11 meses, de subsídio de alimentação + € 160,00 de prémio de vendas x 12 meses + €137,10 de prémio de isenção de horário de trabalho x 12 meses + € 21,65 de abono para falhas x 12 meses…

Como se constata desde logo pelos termos constantes do auto de não conciliação (fls. 112-114), a Ré patronal sempre sustentou que transferira para a R. Seguradora todos os montantes remuneratórios que o A. reclama como fazendo parte da sua retribuição mensal, o que a R. não contrariou, antes aceitando serem realmente esses os valores da sua responsabilidade, ao tempo, antes da actualização operada com efeitos retroactivos.
A R. Seguradora, na sua contestação, não tomou posição especificadamente quanto a tal questão, não reagindo sequer ao que a propósito alegou a co-R.

As variáveis da retribuição que foram actualizadas foram as referidas na comunicação que a R. patronal fez à R. Seguradora, conforme fls. 430.
As demais componentes mantiveram-se inalteradas e a respectiva cobertura já estava transferida.
Se antes da comunicação a R. Seguradora já era a responsável pela cobertura da retribuição integral, a comunicação feita, com a sobredita discriminação e a consequente liquidação do diferencial do prémio correspondente, que a Seguradora entretanto embolsou, só poderia, lógica e razoavelmente, visar igual propósito: o da reposição da situação de transferência total da responsabilidade em função da retribuição devida.
Não tem pois fundamento válido, ante tudo quanto se analisou e expendeu, o entendimento preconizado, do que resultaria uma injusta e injustificada repartição de responsabilidades.
A declaração de aceitação de transferência, por banda da co-R. Seguradora, exarada na Acta, nos termos sobreditos, tem implicitado esse alcance e cobertura, solução que se elege e que é postulada pelos ditames da boa fé … – e a que corresponde, em admitido caso de dúvida sobre o sentido da declaração, o maior equilíbrio das prestações, ‘ex vi’ do disposto nos arts. 237.º, 2.ª parte, 238.º/2 e 239.º, todos do Cód. Civil.
Acolhem-se, pelo exposto, as razões que enformam a reacção da Apelante patronal, o que implicará a alteração do julgado, em conformidade, havendo a co-R Seguradora que suportar a totalidade da reparação infortunística que é devida.
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III –
DECISÃO

Assim, deliberam os Juízes que integram esta Secção do Tribunal da Relação de Coimbra o seguinte:
- Julgam improcedente o recurso de Apelação interposto pela co-R. Seguradora.
- Julgam procedente o recurso de Apelação deduzido pela co-R. patronal, e, em consequência:
a) - Revogando a sentença na parte em que a condenou no pagamento das importâncias discriminadas no dispositivo, a fls. 305v.º, (com a rectificação decorrente do despacho de fls. 414-415), absolvem-na do correspondente pedido;
b) – Condenam a co-R. Seguradora no pagamento integral das importâncias conferidas ao A./sinistrado, nos termos em que foram oportunamente liquidadas na sentença.
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Custas legais pela co-R. ‘B...’.
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Coimbra,