Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
5424/05.4TBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: TÁVORA VÍTOR
Descritores: CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
INTERPRETAÇÃO
COMUNICAÇÃO
Data do Acordão: 10/06/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA - 1º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: DL Nº 446/85 DE 25 DE OUTUBRO E ARTIGO 11º Nº 1 E 2 DO DL 446/85 DE 7 DE JULHO
Sumário: 1) As cláusulas contratuais gerais surgiram como resultado da massificação que se verificou após a revolução industrial e que tem vindo a acentuar-se com a expansão do comércio e serviços propiciada pelo fenómeno da globalização cujos instrumentos proporcionam a oferta e procura de bens em mercados até há pouco tempo dificilmente acessíveis.

2) Esta evolução pressupõe e exige todavia mecanismos reguladores jurídicos eficientes de molde a acompanhar os inegáveis benefícios facultados pela nova ordem económica. Tais instrumentos para que possam ser úteis terão que ser eficientes e só o poderão ser na medida em que fomentem a economia de tempo e igualação no tratamento dos clientes e fornecedores.

3) Assim se explica que os "contratos de adesão", instrumentos reguladores por excelência da massificação negocial, tenham merecido a atenção dos Estados com vista a procurar minorar tanto quanto possível desigualdades provocadas por abusos na sua regulamentação e capciosidade em consequência do modo como são por vezes intencionalmente redigidos.

4) Fruto deste esforço, o DL nº 446/85 de 25 de Outubro de inspiração germânica surgiu entre nós como a primeira tentativa de disciplinar as cláusulas contratuais gerais insertas nos contratos.

5) À interpretação das ditas cláusulas aplicam-se à partida as normas gerais, devendo o Juiz estar atento aos termos do contrato em ordem impedir que equivocidades de índole puramente formal possam interferir no equilíbrio das prestações e justiça material que teleologicamente dever prosseguir, considerando em última análise o disposto no artigo 11º nº 1 e 2 do DL 446/85 de 7 de Julho, de harmonia com o qual "na dúvida prevalece o sentido mais favorável ao aderente".

6) As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra, sob pena de exclusão, aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou aceitá-las, cabendo o ónus da prova dessa comunicação ao contratante que submeta a outrem as ditas cláusulas.

Decisão Texto Integral: 1. RELATÓRIO.

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra.

A..., com sede na .... e B..., com sede na ...., vieram instaurar acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário contra Companhia de Seguros C....,com sede na ...., peticionando a condenação desta a pagar à 1ª autora a quantia de € 35.000 ou subsidiariamente a quantia de € 31.923,06, ou, ainda subsidiariamente, a quantia de € 29.114,23, em qualquer caso acrescidas de juros legais; e a pagar à 2ª Autora a quantia de € 4.923,42 ou subsidiariamente a quantia de € 15.404,04, acrescidas de juros legais.

Para tanto, alegam ter ocorrido um acidente rodoviário no dia 4 de Agosto de 2004 na E.N. 1 no qual intervieram o veículo 00-00-QE, pesado, propriedade da 1ª autora, o reboque C-59800, propriedade de 2ª Autora e o veículo ligeiro de passageiros 11-11-QJ, propriedade de D..., que, por contrato de seguro, transferira a sua responsabilidade para a Ré.

Todos estes veículos circulavam no sentido norte-sul, estando o reboque da 2ª Autora atrelado ao veículo da 1ª Autora e a determinada altura o veículo QJ fez sinal de mudança de direcção para a direita, tendo o condutor do veículo QE travado, mas não conseguiu evitar o embate naquele.

Para além do QJ, os veículos das Autoras estavam também seguros na Ré por via de contratos de seguro com cobertura de danos próprios.

O veículo QE sofreu danos cuja reparação foi orçada em € 29,114,23, sendo que este veículo tinha um valor comercial não inferior a 35.000 euros, o que aconselhava e justificava a reparação, mas a ré rejeitou essa possibilidade, admitindo apenas uma reparação parcial.

Também o reboque C-59800 sofreu danos orçados em 4.923,42, tendo a Ré recusado também a reparação. Ambas as viaturas tinham cobertura de danos próprios, incluindo a perda total, mas a Ré nada pagou.

A Ré apresentou contestação, na qual reconhece a existência dos contratos de seguro alegados, referindo porém que, no caso de danos próprios, e nos termos do contrato, estão excluídos os danos causados por objectos e mercadorias transportados no veículo e os causados por objectos transportados ou durante as operações de carga e descarga.

Ora, para além dos danos causados pela colisão no veículo QJ, os danos na cabine do veículo QE e no reboque foram causados pela carga, um enorme bloco de ferro pesando muitas toneladas, transportado no reboque, que, devido à travagem, rebentou as cintas de segurança, causando danos no reboque e na cabine por se ter deslocado para a frente.

Só pela travagem o bloco se soltou, pelo que se constata que os danos foram motivados pela forma deficiente como a carga estava estivada, e por essa razão a Ré recusou as reparações na cabine do QE e no reboque.

O veículo QJ sofreu perda total, pois apenas valia € 33.050,00, valor em que foi orçada a reparação.

A Ré admite ter de pagar os danos resultantes da colisão no QJ, que foram orçados em € 1.371,86, requerendo a consignação em depósito desta quantia.

As Autoras replicaram, sustentando que o condutor do QJ não se limitou a travar, e rejeitando que a carga estivesse mal acondicionada, concluindo como na petição inicial.

A Ré foi convidada a concretizar a afirmação de que a carga vinha acondicionada de forma deficiente, tendo apresentado nova contestação.

Foi proferido despacho saneador, no qual se considerou a instância válida e regular, e efectuou-se a selecção da matéria de facto, que não foi objecto de reclamação.

Procedeu-se a julgamento e acabou por ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente por provada e assim:

- Condenou a Ré a pagar à Autora A...a quantia de € 28.531,24 (vinte e oito mil quinhentos e trinta e um euros e noventa e quatro cêntimos, acrescida de juros, à taxa legal, a contar da citação e até integral pagamento;

- Condenou a Ré a pagar à Autora B.... a quantia de € 4.824,95 (quatro mil oitocentos e vinte e quatro euros e noventa e cinco cêntimos), acrescida de juros, à taxa legal, a contar da citação e até integral pagamento.

Daí o presente recurso de apelação interposto pela Companhia de Seguros C..., a qual no termo da sua alegação pediu a procedência do mesmo de harmonia com o que explana nas suas alegações.

Foram para tanto apresentadas as seguintes,

Conclusões.

1) Independentemente da decisão substantiva da causa que em próximas conclusões se questionará, dir-se-á que o Tribunal a quo se "distraiu” pois “esqueceu-se” de deduzir à indemnização arbitrada à primeira Autora as seguintes quantias:

a) € 1.371,86 pagos pela Ré à primeira Autora, após incidente de consignação em depósito, referentes ao custo da reparação da dianteira do SCANIA (00-00-QE) depois de deduzida a referida franquia contratual de 2%;

b) € 7,500 referentes à venda dos salvados do SCANIA (00-00-QE) por parte da primeira Autora ao comerciante de automóveis, E... ;

2) Donde, como à data do sinistro o SCANIA (00-00-QE) estava seguro na Ré pelo valor máximo de € 31.923,06 em caso de perda total (e estamos perante uma situação típica de perda total, porque o veículo valia € 35.000, o seu salvado € 7.500 e a sua reparação € 29.114,23), mesmo que a Ré tivesse obrigação de indemnizar a primeira Autora, a sua obrigação estava circunscrita ao valor de € 23.305,20 só de capital, e nunca a € 28.531,24 (valor da reparação deduzido da franquia de 2%) que lhe foi arbitrado pela primeira instância, uma vez que estamos no domínio da responsabilidade contratual (seguro de danos próprios) que se rege pelo clausulado da apólice e não na presença de um caso de responsabilidade civil subjectiva aquiliana ou objectiva tratada nos artsº 483º e segs. do Código Civil, casos em que o lesado (dentro de determinados limites legais) pode exigir à seguradora do veículo responsável pelo acidente a reparação da sua própria viatura.

3) Entrando agora na decisão de mérito, entende a ora apelante que não tem obrigação de indemnizar as recorridas em virtude de se ter logrado demonstrar (é pelo menos essa sua opinião) duas causas contratuais de exclusão da cobertura deste sinistro, a saber:

4) A primeira, salta à evidência das alíneas B), C), D), F), H) e I) dos Factos Assentes e das respostas dadas aos factos 11º até 14º da Base Instrutória de onde resulta que tanto os danos sofridos pela galera, como sobretudo os sofridos no SCANIA (salvo, quanto a estes o da sua dianteira), foram motivados pela forma deficiente como a carga da galera estava estivada;

5) Daí advém que em relação aos danos dos dois veículos se aplicasse a exclusão da sua cobertura nos termos das Apólices juntas aos autos e que aqui se dão por integralmente reproduzidas, como também e de acordo com o disposto no artº 19º d) do DL 522/85, de 31 de Dezembro, no limite, sempre a seguradora, não fosse a referida exclusão, teria direito de regresso contra a segunda Autora, caso não se considerasse a cabeça tractora e a galera como uma única “unidade circulante", como apenas um veículo;

6) A segunda é ainda mais clara e consta logo da Alínea R) dos Factos Assentes, que se transcreve: "De acordo com a artº 2º da Condição Especial 2ª Choque, Colisão e Capotamento, das condições especiais do seguro facultativo das apólices referidas em M), a garantia não abrange quebras ou danos causados por objectos transportados ou durante operações de carga e des-carga” (cfr. fls. 59)";

7) Esta causa de exclusão do risco expressa no artº 2º da Condição Especial 2 Choque, Colisão e Capotamento, das Condições Especiais do Seguro Facultativo da Apólice referida na alínea M) dos factos assentes é formal, escrita, explícita e de fácil compreensão para o “homem médio", não levantando dúvidas de interpretação, e honre-se o Tribunal recorrido e as AA. que, neste aspecto, nunca se atreveram a dizer que não a compreendiam;

8) Tal significa, em síntese, que, tendo todos os danos causados nos veículos das AA., com excepção dos verificados na parte da frente do 00-00-QE, aliás já pagos à recorrida “ A....”, sido causados pelo objecto transportado na viatura C-598000, mais concretamente um bloco de ferro, não há lugar ao ressarcimento dos danos às AA. porque a cabeça tractora e a galera constituíam, aquando do sinistro, uma "unidade circulante", sendo por isso indiferente se a carga vinha bem ou mal acondicionada, se a deslocação da carga/objectos se ficou a dever ao embate do 00-00-QE, a uma simples travagem, à conjugação dos dois factores ou mesmo a uma condução ziguezagueante da cabeça tractora daquela unidade circulante (00-00-QE I C-598000) para se determinar que, no caso concreto, a aqui recorrente não tem o dever de indemnizar as recorridas;

9) Apenas um jogo semântico e capcioso, que não se admite como possível, entre expressões como "carga" e "objecto" poderia considerar que o bloco de ferro que provocou os danos afinal não era isso mesmo, um objecto.

10) A sentença recorrida revela uma oposição evidente entre a fundamentação e a decisão por erro notório de apreciação da prova, pelo que violou por erro de interpretação e aplicação o disposto nos artigos 426º, 427º do Código Comercial, bem como no artº 19º al. d) do DL nº 522/85, de 31 de Dezembro, nos artsº 236º nº 1, 238º, 364º nº 1, 405º, 483º e 499º, todos do Código Civil e, por último, nos artsº 10º e 11º nº 2 do DL 446/85, de 25 de Outubro.

Contra-alegaram os apelados pugnando pela confirmação da sentença.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

                      *

2. FUNDAMENTOS.

O Tribunal deu como provados os seguintes,

2.1. Factos.

2.1.1. No dia 04 de Agosto de 2004, pelas 12H00, na Estrada Nacional n 1, ao Km 129,500, concelho de Leiria, ocorreu um acidente em que foram intervenientes as seguintes viaturas:

- Veículo nº l, 00-00-QE, pesado de mercadorias, propriedade da Autora “ A...”, conduzido por F... ;

- Veículo nº 2, 11-11-QJ, ligeiro de passageiros, propriedade de D..., conduzido pelo mesmo;

– Veículo nº 3, C-59800, reboque de mercadorias (vulgo “galera”), propriedade da Autora " B....”, a qual se encontrava e circulava atrelada ao veículo nº 1. (Alínea A) dos Factos Assentes)

2.1.2. Todos os veículos circulavam no sentido de marcha norte-sul (Alínea B) dos Factos Assentes)

2.1.3. A determinada altura do percurso o condutor do veículo nº 2 fez sinal de mudança de direcção para a direita, atento o sentido de marcha em que circulava. (Alínea C) dos Factos Assentes)

2.1.4. Ao aperceber-se de tal sinal de mudança de direcção, o condutor do veículo nº l travou imediatamente, não tendo, porém, conseguido evitar a colisão com o veículo nº 2, embatendo contra este (Alínea D) dos Factos Assentes).

2.1.5. O embate ocorreu com a parte frontal direita do veículo nº l contra a parte traseira esquerda do veículo nº 2 (Alínea E) dos Factos Assentes).

2.1.6. Após o embate os veículos imobilizaram-se alguns metros mais à frente. (Alínea F) dos Factos Assentes).

2.1.7. O local do embate era uma recta com boa visibilidade, precedida de uma curva para a direita. (Alínea G) dos Factos Assentes)

2.1.8. No local do embate a faixa da rodagem tinha 6,35 metros de largura. (Alínea H) dos Factos Assentes)

2.1.9. O estado do tempo era bom. (Alínea I) dos Factos Assentes).

2.1.10. A Autora “A...” é uma empresa de transportes rodoviários de mercadorias. (Alínea J) dos Factos Assentes)

2.1.11. A Autora “B....”é igualmente uma empresa de transportes rodoviários, cujo objecto social consiste na realização de “transportes públicos rodoviários de mercadorias nacionais e internacionais", correspondente logística, armazenagem e distribuição, comércio de importação exportação de grande variedade de mercadorias nomeadamente produtos alimentares, higiene e peças para veículos automóveis”( Alínea L) dos Factos Assentes).

2.1.12. À data do acidente os veículos nº 1 e 3 encontravam-se a circular com os respectivos riscos de circulação transferidos para a Ré, por via de contrato de seguro com cobertura de responsabilidade civil contra terceiros e, bem assim, com a cobertura de danos próprios, titulados respectivamente, pelas Apólices nº 5000.999954.50 e nº 5000.987667.50. (Alínea M) dos Factos Assentes).

2.1.13. O veículo nº 1 circulava com as seguintes coberturas de seguro:

a) Responsabilidade civil "ilimitada".

b) Choque, colisão e capotamento – 39.903,83 euros – franquia 2%.

c) Incêndio, Raio e explosão – 39.903,83 euros - franquia 2%.

d) Furto e roubo – 39.903,83 euros

e) Quebra de vidros – 1.500,00 euros.

f) Em caso de perda total do veículo pelo valor de € 31.923,06 (Alínea N) dos Factos Assentes)

2.1.14. O veículo nº 3 circulava com as seguintes coberturas de seguro:

a) Responsabilidade Civil “ilimitada”

b) Choque, colisão e capotamento – 17.457,92 euros – franquia 2%

c) Incêndio, raio e explosão – 17.457,92 euros – franquia 2%

d) Furto ou roubo – 17.457,92 euros;

e) Em caso de perda total do veículo pelo valor de € 15.404,04. (Alínea 0) dos Factos Assentes)

2.1.15. Ao abrigo de um outro contrato de seguro celebrado entre a autora A... e a Ré, titulado pela Apólice nº 8210.6000685.62, encontrava-se contratualmente assegurado e reconhecido o seguinte: “Para os devidos efeitos se declara que os veículos de matrícula C-59800 (...) ficam seguros nesta apólice nos mesmos termos, condições/limites fixados para idêntico risco subscrito por AZP/Tr Concha Azul Unip., Lda. (Alínea P) dos Factos Assentes).  

2.1.16. De acordo com o nº 2 da condição especial 1ª Seguro facultativo, das condições especiais do seguro facultativo das Apólices referidas em 12), a garantia não compreende quaisquer danos “Causados aos objectos e mercadorias transportados no veículo a que este contrato se refere, ainda que sejam propriedade dos respectivos passageiros, salvo se expressamente for contratada tal cobertura” (Alínea Q) dos Factos Assentes).

2.1.17. De acordo com o artigo 2º da condição especial 2, choque, colisão e capotamento, das condições especiais do seguro facultativo das apólices referidas em 12), a garantia não abrange quebras ou danos “causados por objectos transportados ou durante operações de carga e de carga” (Alínea R) dos Factos Assentes).

2.1.18. O veículo nº 1 sofreu danos cuja reparação importa o montante de € 29.114,23. (Alínea S) dos Factos Assentes)

2.1.19. O veículo nº 3 sofreu danos, cuja reparação importa o montante de € 4.923,42 (Alínea T) dos Factos Assentes)

2.1.20. O veículo nº 3 tinha um valor comercial não inferior a € 17.500,00 (Alínea U) dos Factos Assentes).

2.1.21. O veículo nº 1 tinha, à data do acidente, um valor comercial não inferior a € 35.000,00 (Resposta ao facto 1º da Base Instrutória)

2.1.22. A reparação do veículo nº l permitia reparar integralmente todos os danos sofridos no acidente (Resp. ao facto 2º da B.I)

2.1.23. A Autora A...solicitou a realização de tal reparação à Ré (Resp. ao facto 3º da B.I.)

2.1.24. A qual recusou a reparação total do veículo, admitindo apenas uma reparação parcial. (Resp. ao facto 4º da B.I.)

2.1.25. A reparação dos danos na frente do veículo n.l foi avaliada em € 1.399,17, incluindo IVA (Resp. ao facto 5º da B.I.)

2.1.26. Os seus salvados valiam pelo menos € 7.500,00 (Resp. ao facto 8º da B.l.)

2.1.27. Os danos na cabine do veículo nº l foram causados pela deslocação para a frente da carga que era transportada na galera, um bloco de ferro pesando toneladas, causando danos também na “galera” (Resp, ao facto 9º da B.I.)

2.1.28. Os danos no veículo nº 3 foram causados pelo deslocamento para a frente do bloco metálico que era transportado na traseira do reboque sobre o eixo traseiro (Resp. ao facto 10º da B.I.).

2.1.29. A galera ou reboque do veículo acidentado tinha sido carregado na Alemanha com duas cargas distintas (Resp. ao facto 11º da B.I.).

2.1.30. Essas cargas eram dois blocos metálicos pesando cada um deles toneladas. (Resp. ao facto 12º da B.I.)

2.1.31. Esses blocos eram transportados um atrás do outro, havendo um espaço vazio no meio de ambos. (Resp. ao facto 13º da B.I.).

2.1.32. Já em Portugal, em Oliveira de Azeméis, foi descarregado o bloco da frente (Resp. ao facto 14º da B.I.).

                        +

2.2. O Direito.

Nos termos do precei­tuado nos artsº 660º nº 2, 684º nº 3 e 690º nº 1 do Código de Pro­cesso Civil, e sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, as conclusões da alegação de recurso deli­mitam os poderes de cognição deste Tribunal. Nesta conformi­dade e conside­rando também a natureza jurídica da maté­ria versada, cumpre focar os seguintes pontos:

- A interpretação da cláusula contratual inserta no artigo 2º Condição Especial da Apólice e o caso em análise.

- Têm cabimento as reduções na indemnização referidas pela apelante?

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2.2.1. A interpretação da cláusula contratual inserta no artigo 2º Condição Especial da Apólice e o caso em análise.

Está em causa a interpretação da cláusula contratual inserta no artigo 2º da condição especial 2ª da Apólice.

Com fundamento em dois contratos de seguro celebrados com a Ré Seguradora C...ora apelante, pretendem as AA. ver-se ressarcidas pelos danos próprios sofridos. Peticionam a condenação da Ré a pagar à 1ª Autora a quantia de € 35.000 ou subsidiariamente, a quantia de € 31.923,06, ou, ainda subsidiariamente, a quantia de € 29.114,23, em qualquer caso acrescidas de juros legais; e a pagar à 2ª Autora a quantia de € 4.923,42 ou subsidiariamente a quantia de € 15.404,04, acrescidas de juros legais. Os referidos danos ocorreram em dois veículos o pesado 20-12 QE, propriedade da 1ª Autora e o reboque C-27-60 QJ propriedade da 2ª que seguia atrelado ao primeiro. O acidente deflagrou quando no dia 4 de Agosto de 2004 o veículo QE e respectivo atrelado transitavam na EN nº 1 acabando por embater no ligeiro de passageiros 27-60 QJ, propriedade de D....

A questão fulcral a decidir se há ou não lugar à indemnização que as AA. reclamam.

O Tribunal respondeu positivamente a esta questão com base na plena validade dos contratos de seguro acordados com a Ré.

A Ré por via deste recurso contrapõe que não tem obrigação de indemnizar as recorridas em virtude de se ter logrado demonstrar duas causas contratuais de exclusão da cobertura do sinistro:

- A primeira refere a apelante, salta à evidência das alíneas B), C), D), F), H) e I) dos Factos Assentes e das respostas dadas aos factos 11º até 14º da Base Instrutória de onde resulta que tanto os danos sofridos pela galera, como sobretudo os sofridos no SCANIA (salvo, quanto a estes o da sua dianteira), foram motivados pela forma deficiente como a carga da galera estava estivada. Daí advém que em relação aos danos dos dois veículos se aplique a exclusão da sua cobertura nos termos das Apólices juntas aos autos e que aqui se dão por integralmente reproduzidas, como também e de acordo com o disposto no artº 19º alínea d) do DL 522/85 de 31 de Dezembro, no limite, sempre a seguradora, não fosse a referida exclusão, teria direito de regresso contra a segunda Autora, caso não se considerasse a cabeça tractora e a galera como uma única “unidade circulante", como apenas um veículo;

- A segunda é ainda mais clara e consta logo da Alínea R) dos Factos Assentes, que se transcreve: "De acordo com a artº 2º da Condição Especial 2ª Choque, Colisão e Capotamento, das condições especiais do seguro facultativo das apólices referidas em M), a garantia não abrange quebras ou danos causados por objectos transportados ou durante operações de carga e des-carga” (cfr. fls. 59)";

Esta causa de exclusão do risco expressa no artº 2º da Condição Especial 2 Choque, Colisão e Capotamento, das Condições Especiais do Seguro Facultativo da Apólice referida na alínea M) dos factos assentes é formal, escrita, explícita e de fácil compreensão para o “homem médio", não levantando dúvidas de interpretação;

Decidindo, começaremos por referir que não vê do teor das alíneas das alíneas B), C), D), F), H) e I) dos Factos Assentes e das respostas dadas aos factos 11º até 14º da Base Instrutória de onde o apelante poderá extrair a conclusão de que quer os danos sofridos pela galera (exceptuados os da dianteira) como os registados no SCANIA tivessem sido causados pela forma deficiente como a carga da galera estava distribuída; é que na verdade e nomeadamente as respostas aos quesitos 11º a 14º, são meramente descritivas, deles não transparecendo nenhum facto negativo quanto ao acondicionamento da carga. Aliás tão pouco há nos autos quaisquer elementos esclarecedores quanto ao modo como a carga deveria ter sido transportada e em que medida a metodologia utilizada no acondicionamento da mesma se traduziu num desvio culposo em relação às regras que deveriam ter sido observadas.

A segunda objecção ao dever de ressarcir os AA. estaria vertida no artigo 2º das condições especiais da Apólice a que alude a alínea R) da Base Instrutória, ou seja a exclusão "(…) de quebras ou danos causados por objectos transportados ou durante operações de carga e descarga”.

A questão suscitada remete-nos para a problemática da validade das cláusulas gerais insertas nos contratos. As cláusulas contratuais gerais surgiram como fruto da massificação negocial que se verificou após a revolução industrial e que tem vindo a acentuar-se com a expansão do comércio e serviços, propiciada pelo fenómeno da globalização cujos instrumentos facilitam a oferta e procura de bens em mercados até há pouco tempo   dificilmente acessíveis em razão do respectivo distanciamento. É claro que toda esta evolução pressupõe e exige mecanismos reguladores jurídicos eficientes de molde a acompanhar os inegáveis benefícios facultados pela nova ordem económica. Tais mecanismos, para que possam ser úteis, terão que ser eficientes e tal só poderá suceder na medida em que fomentem a economia de tempo e igualação no tratamento dos clientes e fornecedores.  

Mas o dinamismo assim criado traz em si também as desvantagens inerentes à supressão ou redução da liberdade de negociação inadaptação dos interesses particulares com o inevitável pendor para a desigualdade das partes com a que é economicamente mais forte a fazer inclinar a seu favor a balança contratual[1]. Assim se explica que os "contratos de adesão" instrumentos reguladores por excelência da massificação tenham merecido a atenção dos Estados com vista a procurar minorar tanto quanto possível as desigualdades provocadas por abusos de regulamentação e capciosidade em consequência do modo como são por vezes intencionalmente redigidos. Fruto desta tendência, o DL nº 446/85 de 25 de Outubro, de inspiração germânica, surgiu entre nós como a primeira tentativa de disciplinar as cláusulas contratuais gerais insertas nos contratos – estatuindo que "as cláusulas gerais elaboradas sem prévia negociação individual que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem respectivamente a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente Diploma" – Cfr. artigo 1º nº 1. Um dos campos preferenciais de atenção deste Diploma concentra-se nos "contratos de adesão" nomeadamente no âmbito dos seguros. É assim desde a Directiva comunitária nº 93/13/CEE do Conselho de 5 de Abril que veio a ser transposta pelo DL 220/95 de 31 de Agosto alterando o DL 446/85.

Um dos normativos do citado Diploma legal e com reflexos no nosso caso é precisamente o artigo 10º ao estatuir que "as cláusulas contratuais gerais são in­terpretadas e integradas de harmonia com as regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, mas sempre dentro de cada contrato singular em que se incluam"; tocamos assim a problemática da interpretação das cláusulas do contrato. Concretamente e no caso sub iudice insurge-se a Ré C...contra a sentença apelada a propósito da interpretação conferida à cláusula inserta no artigo 2º da Condição Especial 2 do Contrato onde se lê que "a garantia não compreende quaisquer danos causados aos objectos e mercadorias transportados no veículo a que este contrato se refere, ainda que sejam propriedade dos respectivos passageiros, salvo se expressamente for contratada tal cobertura".

Entendeu-se na sentença apelada que os termos da Apólice de Seguro fundamentam a atribuição de indemnização às AA. com base no seguro com elas contratadas pela Ré Allianz. No entanto esta defende um ponto de vista oposto, argumentando que os danos provocados nos veículos das AA. o foram por um objecto transportado na viatura C-598000, mais concretamente um bloco de ferro. Nesta perspectiva, adianta a apelante, é indiferente que o evento se tenha ou não dado por via do choque com o veículo ligeiro ou por causa do mau acondicionamento da carga, já que o sucedido cabe, na tese da Ré, no âmbito da cláusula de exclusão de responsabilidade civil. A apelante não tem razão. Deu-se efectivamente como provado que os danos na cabine do veículo nº 1 foram causados pela deslocação para a frente da carga que era transportada na galera, um bloco de ferro pesando toneladas, causando danos também na galera. Por seu turno os danos no veículo nº 3 foram causados pelo deslocamento para a frente do bloco metálico que era transportado na traseira do reboque sobre o eixo traseiro. A galera ou reboque do veículo acidentado tinha sido carregada na Alemanha com duas cargas distintas; essas cargas eram dois blocos metálicos pesando cada um deles toneladas.

 Ora prova-se de igual modo que à data do acidente os veículos das AA. encontravam-se a circular com os respectivos riscos de circulação transferidos para a Ré por via de contrato de seguro com cobertura de responsabilidade civil contra terceiros e bem assim com a cobertura de danos próprios titulados respectivamente pelas Apólices nº 5000.999954.50 e nº 5000.987667.50.

Concretamente

- O veículo nº 1 circulava com as seguintes coberturas de seguro:

a) Responsabilidade civil "ilimitada".

b) Choque, colisão e capotamento – 39.903,83 euros – franquia 2%.

c) Incêndio, Raio e explosão – 39.903,83 euros - franquia 2%.

d) Furto e roubo – 39.903,83 euros.

e) Quebra de vidros – 1.500,00 euros.

f) Em caso de perda total do veículo pelo valor de € 31.923,06 (Alínea N) dos Factos Assentes)

- O veículo nº 3 circulava com as seguintes coberturas de seguro:

a) Responsabilidade Civil “ilimitada”

b) Choque, colisão e capotamento – 17.457,92 euros – franquia 2%

c) Incêndio, raio e explosão – 17.457,92 euros – franquia 2%.

d) Furto ou roubo – 17.457,92 euros;

e) Em caso de perda total do veículo pelo valor de € 15.404,04. (Alínea 0) dos Factos Assentes).

Do cotejo dos termos que constam das cláusulas do seguro com o constante das restrições a que acima aludimos teremos de concluir, que se devidamente ponderadas, muito dificilmente um declaratário normal a quem tivesse sido colocada a proposta de contrato aceitaria concluí-lo nos termos citados. Mas acima de tudo não pode negar-se que os ditos objectos cuja deslocação originou os danos, constituem para todos os efeitos carga, como de resto se vê claramente dos factos provados onde se não faz referência restritiva a danos provocados por carga transportada mas unicamente causados por objectos que a viatura eventualmente transportasse. É que os conceitos de carga e objectos não coincidem necessariamente, já que pode perfeitamente conceber-se a hipótese de uma viatura transportar objectos que não constituam carga pretendendo com isso excluí-los do âmbito da actividade comercial. Esta é a interpretação que se nos afigura mais razoável e também nomeadamente à luz do disposto no artigo 11º nº 1 e 2 do DL 446/85 de 7 de Julho de harmonia com o qual "na dúvida prevalece o sentido mais favorável ao aderente"[2].

Mas há um outro factor impeditivo do desfecho da acção no sentido pretendido pela apelante: é que o artigo 5º nº 1 do Diploma supracitado manda que "as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou aceitá-las", sendo certo que nos termos do nº 3 "o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais". Por seu turno o artigo 8º alínea a) estatui que "consideram-se excluídas dos contratos singulares as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5º"[3].

Nesta conformidade não mostrando a Ré ter comunicado a cláusula de exclusão às AA. sempre a mesma teria que considerar-se excluída no caso em análise. No mais também se não provou qualquer outro facto impeditivo do ressarcimento nomeadamente que o sinistro se tivesse ficado a dever ao mau acondicionamento da carga.

                      +

2.2.2. Têm cabimento as pretendidas reduções na indemnização referidas pela apelante?

Entende a apelante que a sentença em crise "apesar de ter notado que aos valores indemnizatórios a que chegou havia que descontar o das respectivas franquias contratuais de 2%, esqueceu-se que a Ré, após deduzir incidente de consignação em depósito, pagou à primeira Autora em 19/12/2005, pelas 10H00 e em diligência designada pelo próprio Tribunal para o efeito, o custo da reparação da dianteira do Scania 00-00-QE no valor de € 1.371,86 depois de deduzida a franquia de 2%. De igual forma "não reparou que os salvados do Scania 00-00-QE valiam pelo menos € 7.500,00 (resposta dada ao quesito 8º a fls. 347) e que os mesmos restaram na legítima posse da primeira Autora". Também não se apercebeu "que à data do sinistro o Scania 20-12 QE estava seguro na Ré pelo valor máximo de € 31.923,06 em caso de perda total (Doc. 12 junto pelas AA. com a sua PI; "e que nos termos da Apólice para que estejamos perante o conceito de perda total basta que o valor venal do veículo à data do sinistro, deduzido do valor dos seus salvados, seja inferior ao valor seguro, ou seja, mesmo que a viatura sinistrada valesse € 35.000 deduzindo os € 7.500 dos salvados, obteríamos o montante de € 27.500". "Pelo que mesmo na hipótese académica de não vir a proceder alegação e conclusões infra, ao valor da indemnização arbitrada à primeira Autora haveria sempre que diminuir primeiro o valor de € 1.371,86 que esta recebeu em 19-12-2005 e segunda a quantia de € 7.500 quanto aos salvados".

Diremos a este propósito e no que concerne ao valor dos salvados começaremos por referir que na consideração dessa matéria termos que ater-nos aos factos provados já que a Ré não requereu a reapreciação da matéria de facto. Prestado este esclarecimento cabe-nos apenas referir que a Companhia de Seguros recusou o pagamento da totalidade do valor da viatura pelo que não se coloca a questão do desconto do valor dos salvados.

No mais refira-se que não há nos autos quaisquer outros elementos para deduzir à indemnização o que quer que seja para além das importâncias que a sentença apelada aponta e que levou em consideração.

Nesta conformidade sempre a apelação terá que improceder.

Poderá assim concluir-se:

1) As cláusulas contratuais gerais surgiram como resultado da massificação que se verificou após a revolução industrial e que tem vindo a acentuar-se com a expansão do comércio e serviços propiciada pelo fenómeno da globalização cujos instrumentos proporcionam a oferta e procura de bens em mercados até há pouco tempo dificilmente acessíveis.

2) Esta evolução pressupõe e exige todavia mecanismos reguladores jurídicos eficientes de molde a acompanhar os inegáveis benefícios facultados pela nova ordem económica. Tais instrumentos para que possam ser úteis terão que ser eficientes e só o poderão ser na medida em que fomentem a economia de tempo e igualação no tratamento dos clientes e fornecedores.

3) Assim se explica que os "contratos de adesão", instrumentos reguladores por excelência da massificação negocial, tenham merecido a atenção dos Estados com vista a procurar minorar tanto quanto possível desigualdades provocadas por abusos na sua regulamentação e capciosidade em consequência do modo como são por vezes intencionalmente redigidos.

4) Fruto deste esforço, o DL nº 446/85 de 25 de Outubro de inspiração germânica surgiu entre nós como a primeira tentativa de disciplinar as cláusulas contratuais gerais insertas nos contratos.

5) À interpretação das ditas cláusulas aplicam-se à partida as normas gerais, devendo o Juiz estar atento aos termos do contrato em ordem impedir que equivocidades de índole puramente formal possam interferir no equilíbrio das prestações e justiça material que teleologicamente dever prosseguir, considerando em última análise o disposto no artigo 11º nº 1 e 2 do DL 446/85 de 7 de Julho, de harmonia com o qual "na dúvida prevalece o sentido mais favorável ao aderente".

6) As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra, sob pena de exclusão, aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou aceitá-las, cabendo o ónus da prova dessa comunicação ao contratante que submeta a outrem as ditas cláusulas.

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   3. DECISÃO.

Pelo exposto acorda-se em julgar a apelação improcedente confirmando assim a sentença apelada.

Custas pela Apelante.


[1] Para mais desenvolvimentos cfr. v.g. Joaquim de Sousa Ribeiro "O Problema do Contrato" - As cláusulas contratuais gerais e o princípio da liberdade contratual, Colecção Teses, Almedina, Coimbra, 1999, pags. 323 ss; Carlos Ferreira de Almeida "Contratos I, Conceito. Fontes. Formação", Almedina Coimbra 3ª Edição pags. 157 ss. Antunes Varela "Das Obrigações em Geral" I, 6ª Edição, Almedina, Coimbra 1989 pags. 262 ss. Galvão Telles "Manual dos Contratos em Geral", Refundido e Actualizado, Coimbra Editora, 4ª Edição, pags. 316 ss.
[2] Cfr. Ac. do S.T.J. de 01-03-2001 (P. 3942/00) in Col. de Jur., 2001, 1, 135 e de 15-05-2001 (P. 897/01) in Col. de Jur., 2001, 2, 82.

[3] Cfr. Acs. do S.T.J. de 10-1-2008 (P. 4690/2007) Col. de Jur., 2008, I, 39; de 11-4-2000 (P. 240/2000) in Bol. do Min. da Just., 496, 235; desta Relação de 30-11-2004 (R. 3142/2004) in Col. de Jur., 2004, V, 29; de 22-1-2002 in Col. de Jur., 2002, I, 16.