Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2555/18.4T8PBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
CAUSA PREJUDICIAL
ACÇÃO DE DEMARCAÇÃO
INVENTÁRIO
Data do Acordão: 06/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - POMBAL - JL CÍVEL - JUIZ 2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 272 CPC, 1353, 2174 CC, 52 RJPI
Sumário: I - Existe prejudicialidade de uma causa em relação a outra, para efeito de suspensão desta – artº 272º nº1 do CPC - quando na primeira se discuta - em via principal e sem que na segunda o possa ser (prejudicialidade em sentido forte que impõe a suspensão) ou via incidental (prejudicialidade em sentido fraco que aconselha a suspensão) – uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta.

II - Um inventário mortis causa, no qual é relacionado imóvel doado pelo de cujus a um interessado, prejudica uma ação de demarcação por este instaurada relativamente a tal imóvel, em termos de, ao menos, aconselhar a sua suspensão ; pois que esta ação tem como pressuposto a propriedade do bem – artº 1353º do CC – e no inventário ele pode ser licitado e adjudicado a outro interessado – artºs 52º do RJPI, aprovado pela Lei 23/2013 de 05.03 e 2174º do CC.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO TRIBUNAL DA  RELAÇÃO DE COIMBRA

1.

M (…) e marido, R (…), instauraram contra  M (…) e mulher I (…) acção declarativa, de condenação, com processo comum.

Pediram:

A demarcação, com implantação de  marcos, dos prédios confinantes pertencentes às partes.

Os réus contestaram.

Invocaram, para além do mais, a existência de causa prejudicial ao julgamento da acção.

Disseram que os bens imóveis de que os autores se arrogam proprietários, por meio de doação, irão ser objecto de partilha no inventário que se encontra a correr por morte dos doadores,  pelo que a pretensão dos autores poderá não surtir efeito caso aqueles imóveis venham a ser adjudicados a outros herdeiros, nomeadamente aos aqui réus.

2.

Na sequência processual, foi proferido o seguinte despacho.

«…Resulta(ndo) dos documentos juntos aos autos que aquele processo se encontra na fase de relacionamento dos bens, constando da respectiva relação os bens doados que são objecto da presente acção.

Cumpre apreciar.

Segundo o disposto no artigo 272.º n.º1 do Código de Processo Civil, o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado.

No caso presente, os autores pretendem ver demarcados os limites de uma unidade predial, composta por dois imóveis, de que se arrogam proprietários, com base numa aquisição por doação efectuada pelos seus pais, correndo simultaneamente um processo de inventário para partilha da herança aberta por óbito daqueles, no qual tais imóveis se encontram relacionados, por força da colação (cf. artigo 2104.º do Código Civil).

Significa isto que, caso venha a ser arguida e reconhecida a inoficiosidade da referida doação, nos termos previstos no artigo 1365.º do Código de Processo Civil, tais bens podem  não vir a ser adjudicados aos donatários, aqui autores, falecendo, assim, o pressuposto basilar em que assenta a presente acção.

Impõe-se, pois, antes de mais, aguardar o resultado da partilha da herança aberta por óbito dos doadores dos prédios objecto da presente acção, que se afigura assim prejudicial ao julgamento da presente causa.

Face a todo o exposto e ao abrigo do disposto no artigo 272.º n.º1 do Código de Processo Civil, determino a suspensão da instância até à homologação da partilha no âmbito do processo de inventário n.º 1820/17…»

3.

Inconformados recorreram os autores.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1ª) A presente ação visa a demarcação ou estabelecimento da linha divisória, entre os identificados prédios dos AA no art. 6º da p.i. e, o dos RR, identificado no art. 17º da mesma petição; os quais, são confinantes entre si, havendo incerteza quanto à sua estrema.

2ª) O inventário, posteriormente instaurado pelos RR, pretende neutralizar a presente ação, no seu interesse útil e necessário.

3ª) A questão das respectivas propriedades e a sua titularidade; foi debatida, apreciada e decidida no âmbito das ações nº 644/99; 115/95 e 1207/14.9TBPBL e; acórdão de 27/11/2001, conforme certidão junta com a p.i.

4ª) Os RR não põem em causa o direito de propriedade dos AA, nem o deles RR, como não põem a confinância dos mesmos e, a incerteza / dúvida quanto à estrema.

5ª) A decisão da causa não está dependente do julgamento de qualquer outra ação, nem se afigura ocorrer outro motivo justificativo, para impedir o prosseguimento dos ulteriores termos processuais.

6ª) É direito do proprietário poder obrigar os donos dos prédios confinantes, a concorrerem para a demarcação das estremas entre o seu prédio e o deles e; a proteção jurídica através dos tribunais, implica o direito de obter em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a sua pretensão.

7ª) Ao Juiz, cumpre dirigir activamente o processo de se pronunciar pelo seu andamento célere, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que, garantam a composição do litígio em prazo razoável.

8ª) Os AA, como donatários, podem alienar os prédios e evitar licitações no Inventário.

9ª) Sem condescender a suspensão devia, ter fixado prazo.

10ª) Por erro de interpretação e/ou aplicação, o despacho recorrido não é o mais consentâneo com os princípios gerais do direito civil e processual atinentes, nem com os dispositivos legais aplicáveis.

11ª) Revelam-se violados o disposto no art. 1353º do CC; arts. 2º; 6º; 152º; 272º, nº 1 e 281º, nº 5 do CPC.

4.

Sendo que, por via de regra: artºs 635º e 639º-A  do CPC - de que o presente caso não constitui exceção -, o teor das conclusões define o objeto do recurso, a questão  essencial decidenda é  a seguinte:

Suspensão da instância por existência de causa prejudicial.

5.

Apreciando.

5.1.

Nos termos do artº 272º nº1 do CPC:

«O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado»

Quanto a esta matéria continua a manter-se válida  e actual a lição do Prof. Alberto dos Reis.

O qual ensinava que: «Uma causa é prejudicial a outra quando a decisão da primeira pode destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda

Deste modo: «…verdadeira prejudicialidade e dependência só existirá quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental, como teria de o ser, desde que a segunda causa não é a reprodução, pura e simples, da primeira.

 Mas nada impede que se alargue a noção de prejudicialidade, de maneira a abranger outros casos. Assim pode considerar-se como prejudicial, em relação a outro em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal.

Há efectivamente casos em que a questão pendente na causa prejudicial não pode discutir-se na causa subordinada; há outros em que pode discutir-se nesta. Na primeira hipótese o nexo de prejudicialidade é mais forte, na segunda mais frouxo; na primeira há uma dependência necessária, na segunda uma dependência meramente facultativa ou de pura conveniência.»

(sublinhado nosso)

Sendo que, mesmo neste último caso, a suspensão é ou pode ser admissível, pois que a sua razão de ser é a «economia e coerência de julgados» - cfr. Comentário, 3º, 268/69/72, com sublinhado nosso.

Indicando este Mestre como exemplos de prejudicialidade mais forte os casos da acção de anulação de casamento relativamente à acção de divórcio e o da acção de anulação de arrendamento no atinente à acção de despejo.

Nos quais se pode concluir que, para além de o resultado possível de uma acção ser susceptível de conduzir à impossibilidade ou inutilidade de outra causa, existe ainda, atento  o ângulo de conexão das respectivas relações materiais controvertidas, uma precedência lógica entre o fim de uma acção e o da outra.

Miguel Teixeira de Sousa, in Revista de Direito de Estudos Sociais, ano XXIV, nº 4, Outubro-Dezembro de 1977, 305-306, expende que: «…a prejudicialidade refere-se a hipóteses de objectos processuais que são antecedente da apreciação de um outro objecto que os inclui como premissas de uma decisão mais extensa. Por isso, a prejudicialidade tem sempre por base uma situação de conjunção por inclusão entre vários objectos processuais simultaneamente pendentes em causas diversas.

Estando-se perante eventualidades de prejudicialidade quando a dependência entre objectos processuais é acidental e parcialmente consumptiva, pode definir-se aquela como a situação proveniente da impossibilidade de apreciar um objecto processual, o objecto processual dependente, sem interferir na análise de um outro, o objecto processual prejudicial" (realce nosso).

Concluir-se-á, pois, em tese geral, que, para efeito de consideração da prejudicialidade justificativa da suspensão da instância, a decisão de uma causa depende do julgamento de outra quando na causa prejudicial esteja a apreciar-se uma questão cuja resolução possa modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão do outro pleito

Ou, por outras palavras, entende-se por causa prejudicial aquela que tenha por objecto pretensão que constitui pressuposto da formulada. – cfr. Ac. do STJ de  06-07-2005, dgsi.pt, p.05B1522.

Conceitos estes que resultam reforçados do disposto no nº 2 do art. 276º do CPC, segundo o qual:

«Se a decisão da causa prejudicial fizer desaparecer o fundamento ou a razão de ser da causa que estivera suspensa, é esta julgada improcedente».

5.2.

In casu.

Resultou, essencialmente, provado:

Os autores são donos, via doação dos pais da autora, outrossim pais do réu, de prédios que confinam com o prédio pertencente aos réus.

O prédio dos autores está relacionado no inventário para partilha do acervo patrimonial hereditário instaurado, por óbito dos pais da autora e do réu, anteriormente à propositura da presente acção.

Perscrutemos.

Estatui o artº 1353º do CC:

O proprietário pode obrigar os donos dos prédios confinantes a concorrerem para a demarcação das estremas entre o seu prédio e o deles.

Como claramente dimana deste preceito e, até certo ponto, é aceite pelos recorrentes  - alcandorados no Aresto que citam: Ac. da RC de 23.09.2003, p. 296/06.4 -, a definição da propriedade dos prédios confinantes, máxime a do impetrante da demarcação, não  constitui o objecto da acção de demarcação, o qual passa pela definição do local das estremas divisórias dos prédios.

Mas tal propriedade constitui - pelo menos por via de regra de que o caso não constitui exceção -  um requisito ou pressuposto, conditio sine qua non, de tal acção e do pedido de demarcação.

Ou seja, quem peticiona a demarcação tem de ter um título  - ou, ao menos, um direito ou interesse atendível – para tal pretensão.

Sendo que a lei define tal título – ao menos prototípica ou paradigmaticamente – como sendo o direito de propriedade  cujo complexo de  direitos  abrange, como se vê, o de pedir a demarcação do seu prédio.

Assim sendo, facilmente se pode concluir que,  pedida a demarcação das estremas do prédio  com invocação da sua propriedade, esta tem de estar assente e indiscutível.

E se este direito é colocado sub sursis, seja no processo  de demarcação, seja noutro, obviamente que o pedido de demarcação não pode ser apreciado e concedido sem que a questão da propriedade, como requisito prévio inarredável, seja definida.

No caso vertente assim é.

A invocada propriedade dos prédios dos autores advém de uma doação que dos mesmos lhe foi feita pelo seus pais e sogros.

Instaurado inventário para partilha do acervo hereditário destes, tal prédio foi relacionado em tal inventário.

Tanto quanto se alcança destes autos, tal relacionação nem sequer foi posta em causa pelos ali interessados e aqui autores.

Assim, o quid essencial decidendo atém-se e está em saber se tal  relacionação pode implicar  para os autores a perda da propriedade dos prédios.

A relacionação terá por fundamento os institutos da colação, pela qual devem ser  restituídos à massa da herança, para igualação da partilha, os bens ou valores que foram doados – artº 2104º do CC.

E, bem assim,  poderá  ser fundamento de inoficiosidade,  figura atinente, no âmbito da partilha hereditária, às liberalidades, as quais assim são taxadas quando «ofendam a legítima dos herdeiros legitimários» - artº 2168º do CC.

As vicissitudes  relativas aos bens doados relacionados no inventário quando sobre eles algum interessado pretenda licitar e se conclua que  doação é inoficiosa vêm prescritas no artº 52º do REGIME JURÍDICO DO PROCESSO DE INVENTÁRIO aprovado pela Lei n.º 23/2013, de 05 de Março, a saber:

 Artigo 52.º

Avaliação de bens doados no caso de ser arguida inoficiosidade

1 - Se houver herdeiros legitimários e algum interessado declarar que pretende licitar sobre os bens doados pelo inventariado, a oposição do donatário, seja ou não conferente, permite requerer a avaliação dos bens a que se refira a declaração.

2 - Feita a avaliação e concluídas as licitações nos outros bens, a declaração fica sem efeito se vier a apurar-se que o donatário não é obrigado a repor bens alguns.

3 - Quando se reconheça, porém, que a doação é inoficiosa, observa-se o seguinte:

a) Se a declaração recair sobre prédio suscetível de divisão, é admitida a licitação sobre a parte que o donatário tem de repor, a que não é admitido o donatário;

b) Se a declaração recair sobre coisa indivisível, abre-se licitação sobre ela entre os herdeiros legitimários, no caso de a redução exceder metade do seu valor, ficando o donatário obrigado a repor o excesso, caso a redução seja igual ou inferior a essa metade;

c) Fora dos casos previstos nas alíneas anteriores, o donatário pode escolher, entre os bens doados, os bens necessários para o preenchimento da sua quota na herança e dos encargos da doação, e deve repor os que excederem o seu quinhão, abrindo-se licitação sobre os bens repostos, se for ou já tiver sido requerida, não sendo o donatário admitido a licitar.

4 - A oposição do donatário é declarada no próprio ato da conferência, caso o mesmo nesta esteja presente.

5 - Não estando presente, o donatário é notificado, antes das licitações, para manifestar a sua oposição.

6 - A avaliação pode ser requerida até ao fim do prazo para exame do processo para a forma da partilha.

 Conexo com este preceito encontra-se o artº 2174.º do CC, o qual, quanto ao modo da redução da doação em caso de inoficiosidade da mesma, rege nos seguintes termos:

Artº 2174º

Termos em que se efectua a redução

1. Quando os bens legados ou doados são divisíveis, a redução faz-se separando deles a parte necessária para preencher a legítima.

2. Sendo os bens indivisíveis, se a importância da redução exceder metade do valor dos bens, estes pertencem integralmente ao herdeiro legitimário, e o legatário ou donatário haverá o resto em dinheiro; no caso contrário, os bens pertencem integralmente ao legatário ou donatário, tendo este de pagar em dinheiro ao herdeiro legitimário a importância da redução.

3. A reposição de aquilo que se despendeu gratuitamente a favor dos herdeiros legitimários, em consequência da redução, é feita igualmente em dinheiro

Ora conforme dimana  destes preceitos, rectius das partes sublinhadas, existe a possibilidade de, no inventário, caso o valor da redução a efectivar para cumprir a legítima seja superior a metade do valor do bem doado, este ser objecto de licitação pelos restantes interessados, na qual, inclusive, o donatário não pode participar.

Ou seja, neste caso, a verificar-se, o bem doado deixa de ser propriedade do donatário.

Nesta conformidade se alcançando que, ex vi do inventário em causa, existe a possibilidade de os prédios dos autores deixarem de ser seus.

O possível argumento de que o processo de inventário corre no notário e, assim, não é uma «causa»,  para o presente efeito, revela-se insubsistente, porque formal, rebuscado e especioso.

O termo «causa»  tem de ser entendido, lato sensu, como um processo,  considerado este, numa definição possível, e para o efeito que nos ocupa, como uma sequência ordenada e fiscalizada de atos relativos a uma matéria tendentes à obtenção de uma decisão final vinculativa.

Ora este jaez pode e deve ser atribuído ao processo de inventário, pois que ele corre sob a supervisão de uma entidade/autoridade – Notário -, a quem a lei, nesta matéria, atribui poderes decisórios eivados de autoridade impositiva, os quais, inclusive, podem ser apreciados, em via de recurso, pelo juiz.

Por conseguinte, está configurada uma situação de prejudicialidade ou causa prejudicial.

 Configurada senão em sentido forte, nos termos sobreditos, a qual, necessariamente, impunha a suspensão da presente acção, ao menos com a acuidade e força suficientes para  a aconselhar.

Efetivamente, basta atentar, repete-se, que existe a possibilidade de os prédios dos autores assumirem um novo dono.

Ora a razão de ser da suspensão por causa prejudicial, qual seja a economia de meios e a coerência de julgados, não se compadecem com a continuação da presente acção  e o proferimento nela de decisão final,   para depois, com a concretização da aludida possibilidade de aquisição dos prédios por outrem,  se assumir supervenientemente inútil, infundamentada e contraditória com a nova realidade dominial dos prédios dos autores advinda do inventário.

Outros argumentos aduzidos pelos recorrentes não colhem.

A venda do bem pelos donatários é, em  tese jurídico-formal, possível; resta é saber, se, perante os contornos delineados, vg. a sua relacionação no inventário, é admissível; ademais, hic et nunc,  a venda não está concretizada.

Relativamente a os réus terem instaurado o inventário para protelarem ou perturbarem a presente acção inexistem elementos bastantes para assim se concluir.

 No atinente à pretensão de fixação de prazo para  suspensão, aos recorrentes falha, meridianamente, a razão.

O artº 272º nº3 do CPC por eles invocado, vira-se contra si.

Estatui ele:

3 - Quando a suspensão não tenha por fundamento a pendência de causa prejudicial, fixa-se no despacho o prazo durante o qual estará suspensa a instância.

Verifica-se assim que o prazo da suspensão apenas é de fixar quando ela tenha sido determinada por razão que não tenha a ver com a existência de causa prejudicial.

No caso vertente tal requisito não se verifica, pois que a suspensão foi decretada precisamente com fundamento na existência desta causa.

Logo, não deve, nem pode, o juiz fixar prazo, alheado de tal acção e descurando-a.

O que bem se compreende, pois que o tempo da prejudicialidade terá de ser o tempo e o prazo durante o qual a causa prejudicial  demore a ser decidida.

No caso sub judice a suspensão foi decretada « até à homologação da partilha no âmbito do processo de inventário».

Destarte,  também neste particular conspeto, a decisão se mostra consonante com a  lei e com a melhor interpretação que dela se tem por operada.

Improcede o recurso.

6.

Sumariando – artº 663º nº7 do CPC

I - Existe prejudicialidade de uma causa em relação a outra, para efeito de  suspensão desta – artº 272º nº1 do CPC -  quando na primeira se discuta -  em via principal e sem que na segunda o possa ser (prejudicialidade em sentido forte que impõe a suspensão) ou via incidental (prejudicialidade em sentido fraco que aconselha a suspensão) – uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta.

II - Um inventário mortis causa, no qual é relacionado imóvel doado pelo de cujus a um interessado, prejudica uma ação de demarcação por este instaurada relativamente a tal imóvel, em termos de, ao menos, aconselhar a  sua suspensão ; pois que esta ação tem como pressuposto a propriedade do bem – artº 1353º do CC – e no inventário ele pode ser licitado e adjudicado a outro interessado – artºs 52º do RJPI, aprovado pela Lei 23/2013 de 05.03 e 2174º do CC.

7.

Deliberação.

Termos em que se acorda negar provimento ao recurso e, consequentemente, confirmar a decisão.

Custas pelos recorrentes.

Coimbra, 2019.06.11

Carlos Moreira ( Relator )

Moreira do Carmo

Fonte Ramos