Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
487/07.0GTLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: SANÇÃO ACESSÓRIA
Data do Acordão: 11/05/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA – 2º J
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 69º, Nº 2 DO CP
Sumário: A inibição prevista no artº 69º, nº 2 do Código Penal abrange todas as categorias de veículos com motor
Decisão Texto Integral: No processo supra identificado foi proferida sentença que, julgou procedente a acusação deduzida pelo Magistrado do Mº Pº contra o arguido:
Y... casado, motorista desempregado, filho de … e de …, natural da Ucrânia, nascido a XX/XX/XXXX, residente … Fátima.
E, condenou-o:
- pela prática de um crime de desobediência p. e p. pelo art.º 348.º, n.º 1, al. a) do Cód. Penal, na pena de 90 dias de multa à razão diária de € 5,00;

- na pena acessória de proibição de conduzir qualquer veículo motorizado pelo período de seis meses.


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Desta sentença interpôs recurso o arguido, formulando as seguintes conclusões na motivação do mesmo, e que delimitam o objecto:
1- O presente recurso incide sobre a escolha da pena, levada a cabo pelo douto tribunal recorrido.
2- No entender do recorrente o tribunal a quo devia restringir a proibição de conduzir de veículos ligeiros e permitir a condução de veículos pesados.
3- O recorrente tem carta de condução de veículos ligeiros e de pesados
4- O arguido é motorista profissional de veículos pesados de transportes internacionais, como se provou durante a audiência e se encontra como provado na douta sentença.
5- O arguido vive com a esposa, doméstica, e uma filha menor de dez anos de idade, numa casa arrendada, cuja renda é de 238,00 €
6- O arguido tem ainda uma filha de 12 anos de idade a viver na Ucrânia e para quem envia mensalmente, em média, a quantia de 200,00 a 300,00 euros mensais.
7- O arguido encontra-se profissional e socialmente integrado. É o suporte económico da família.
8- O equilíbrio e a estabilidade familiar e económica dependem dele.
9- O arguido desde a data dos factos que originaram o presente processo nunca mais praticou qualquer acto censurável
10- Os factos que deram origem ao presente processo decorreram quando o arguido conduzia um veículo ligeiro de passageiros.
11- O art. 69°, nº 2 do CP continua a prever a faculdade do tribunal restringir a proibição de conduzir a certa categoria de veículos ao dispor que "A proibição … pode abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria".
12- Nos termos do art. 40° do CP as penas têm por fim a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente, pelo que "a restrição da proibição de conduzir a certa categoria de veículos, pode constituir, desde que criteriosamente utilizada, uma forma de promover a reintegração do agente na sociedade (art. 40, nº 1 CP) evitando a sua dessocialização, ao mesmo tempo que melhor satisfaz o principio constitucional da proporcionalidade (art. 18 da CRP) em matéria de penas e mesmo o principio da igualdade, ao tratar de forma igual o que não é igual" – Ac. Rel. Évora proc. 2213/07 de 12-02-08.
13- A pena acessória de inibição de conduzir qualquer veículo motorizado pelo período de seis meses aplicado ao arguido que é motorista profissional de transportes internacionais, por factos ocorridos no decorrer da condução de um veículo ligeiro de passageiros, viola o art. 40 nº 1 do CP, dado que tal proibição impede o arguido de exercer a sua profissão, não permitindo assim, a sua reintegração na sociedade, ou seja a sua ressocialização.
14- A pena acessória de inibição de conduzir qualquer veículo motorizado viola o principio constitucional da igualdade previsto no art. 13° da CRP
15- Dado que trata de uma forma igual o que é desigual. Não é a mesma coisa proibir de conduzir qualquer veículo motorizado um condutor que habitualmente apenas conduz ao fim de semana, ou que pode apanhar o transporte público para ir para o trabalho e proibir de conduzir qualquer veículo motorizado um motorista profissional, dado que o veiculo pesado é o seu instrumento de trabalho e sem o qual não pode trabalhar, como é o caso do arguido.
16- Por isso e pelas mesmas razões também viola o principio da proporcionalidade previsto no art. 18° da CRP.
17- A douta sentença ao aplicar ao arguido a pena acessória de proibição de conduzir qualquer veículo motorizado viola o art. 58° da CRP, o direito ao Trabalho, dado que impede ao recorrente de exercer a sua categoria profissional de motorista de transportes internacionais, impedindo assim de exercer o seu direito ao trabalho.
18- Com a restrição de proibir ao recorrente de conduzir todos os veículos ligeiros assegura-se o fim das penas, nomeadamente a sua ressocialização e a sua promoção de reintegração do agente na sociedade e satisfaz o principio da proporcionalidade (art.18) e o principio constitucional da igualdade (art. 13).
19- Assim, o recorrente considera injusta, desproporcionada e discriminada a pena que o douto tribunal a quo lhe aplicou, devendo esta ser substituída pela pena acessória de inibição de conduzir veículos ligeiros.
20- AO recorrente deve ser permitido conduzir veículos pesados de transportes internacionais.
Nestes termos e nos melhores de direito deve o presente recurso proceder, substituindo-se a pena acessória de proibição de condução de qualquer veículo motorizado pelo período de seis meses por uma pena acessória de proibição de condução de qualquer veículo ligeiro pelo período de seis meses.
Responde o Mº Pº, formulando as seguintes conclusões:
1- A determinação da pena acessória enunciada no alínea c) do nº l do art. 69 do C. Penal, deve operar-se mediante recurso aos critérios gerais constantes do art. 71 do CP, mas com a ressalva de que a finalidade a atingir pela pena acessória é mais restrita, na medida em que a sanção acessória tem em vista sobretudo prevenir a perigosidade do agente, ainda que se lhe assinale também um efeito de prevenção geral.
2- Na verdade, a pena acessória incide sobre o instrumento da condução automóvel, privando o agente de exercer temporariamente a actividade em cujo exercício praticou a infracção, o que numa sociedade economicista - em que a pena de multa vê o seu efeito diluído, sendo incorporado como mais um entre os custos da condução automóvel - assume especial relevo, como factor de prevenção e correspondente motivação pela norma.
3- Ora extrai-se, de forma inequívoca, da leitura da sentença que o M mo Juiz atendeu a tais factores, os quais sem margem de dúvida nortearam a sua decisão que consistiu na determinação da proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de seis meses. Nestes termos, entendemos que só com a determinação do mencionado período de proibição se alcançará a pena justa e adequada, sendo atendidas as finalidades da pena acessória.
4- Frisando a facticidade relativa à sua actual situação social, familiar e profissional, defende o arguido que o tribunal “a quo" devia restringir a proibição de conduzir aos veículos motorizados com excepção dos veículos pesados internacionais, de forma a permitir o exercício da sua profissão, uma vez que, no seu entender, o art. 69, nº 2 do CP continua a prever a faculdade do tribunal restringir a proibição de conduzir a certa categoria de veículos ao dispor que "A proibição ... pode abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria".
5- No entanto, cremos não caber razão ao arguido, sendo certo que não deve ser essa a leitura do artigo supra-mencionado. Com efeito, o nº 2 do art.69 do C. Penal vem antes realçar que a proibição em referência pode/deve abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria, ou seja, afirma de forma peremptória que não há exclusão de qualquer tipo de veículo com motor.
Tal redacção tem por base precisamente o facto de impedir os arguidos de conduzir veículos com motor de toda e qualquer categoria, na suposição de que os mesmos poderão ser proprietários ou acesso a veículos com motor de qualquer categoria.
6- Pelo exposto, mormente a facticidade dada como provada na sentença e as normas legais vigentes, máxime os art. 69 e 71 do C.P, cremos que bem andou o M mo Juiz ao aplicar ao caso em análise a pena acessória de inibição de conduzir todos os veículos motorizados pelo período de cinco meses.
Nesta Relação, O Ex.mº PGA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Foi cumprido o art. 417nº 2 do CPP.
Respondeu o recorrente mantendo o já pedido no recurso.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir:
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São os seguintes os factos que o Tribunal recorrido deu como apurados, bem como os elementos de escolha e determinação da medida da sanção acessória:
II. FUNDAMENTACÃO:
1. FACTOS PROVADOS:
Da Culpabilidade:
1- No dia 09.11.2007, entre a 1h e as 3h da madrugada, o arguido conduzia o veículo com a matrícula XX-XX-XX, ligeiro de passageiros, pela Estrada Nacional n.º 242, nas imediações da localidade da Barosa, Leiria.
2- O arguido foi alvo de fiscalização pela patrulha da GNR composta pelos soldados HL... e MB..., na sequência do que procederam ao teste de despistagem, com vista a averiguar se o arguido exercia a condução sob a influência do álcool, tendo tal teste acusado uma TAS de 2,86 g/l.
3- Face a tal resultado, a aludida patrulha conduziu o arguido ao Destacamento de Trânsito da GNR em Leiria a fim de ser realizado o teste de alcoolémia quantitativo.
4- No Destacamento de Trânsito da GNR em Leiria, o arguido recusou-se a realizar o aludido teste, pese embora a patrulha lhe tenha explicado que incorria na prática de um crime de desobediência caso persistisse nesse comportamento.
5- O arguido agiu de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta lhe era proibida por lei.
Da determinação da sanção:
6- O arguido trabalhava como motorista de transportes internacionais e auferia cerca de € 1.500,00 mensais, actualmente encontra-se desempregado há cerca de 6 meses, não auferindo qualquer subsídio, estando à procura de emprego.
7- Vive com a esposa, doméstica, e uma filha menor com dez anos de idade.
8- O arguido tem ainda uma filha de 12 anos a viver na Ucrânia e para quem envia mensalmente, em média, a quantia de € 200,00 a € 300,00.
9- Vivem em casa arrendada, com o que suportam mensalmente a quantia de € 238,00.
10- O arguido sofreu um acidente na sequência do que recebeu uma indemnização de € 18.000,00, encontrando-se em litígio o pedido de um montante de indemnização ainda superior ao valor recebido, sendo com aquele valor que o agregado faz face às suas despesas.
11- O arguido tem como habilitações literárias 9 anos de escolaridade obrigatória e 3 anos de um curso técnico profissional de carpintaria; a esposa tem 12 anos de escolaridade obrigatória e 3 anos de um curso técnico profissional de fiscalidade.
12- O arguido foi anteriormente condenado:
- por decisão de 28.02,2005, pela prática em 07,08.2004 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. p. pelo art. 292, n.º 1 do CP na pena de 75 dias de multa à taxa diária de € 4,00 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 3 meses, pelo Processo Comum Singular n.º 288/04.8PBVNO, do 2.° Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Ourém. Tendo sido declarada extinta em 23.02.2006 a pena de multa aplicada pelo cumprimento.
Não existem factos não provados com relevância para a discussão da causa.
Medida da sanção acessória:
(…) Cabe, ainda, in casu, ajuizar da aplicação da pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, em conformidade com o disposto no artigo 69, nº 1, al. c) do C.P., fixada entre 3 meses e 3 anos. A pena, ainda que acessória, nunca poderá ultrapassar a medida da culpa, expressa no facto típico.
Analisemos, então, o caso sub judice segundo os critérios gerais que regem a medida da pena já enunciados - artigo 71 do C.P.
Foi dado como provado que o arguido recusou submeter-se ao exame para detecção de condução sob de veículo sob efeito de álcool, mesmo após ter sido informado de que incorria na prática de um crime de desobediência, advertência que aliás não é sequer exigível. O arguido persistiu na recusa. São evidentes, como supra adiantadas, as necessidades de prevenção geral positiva e também as necessidades de prevenção especial, em especial atendendo à condenação anterior por factos relacionados com a natureza daquele pelo qual já anteriormente foi condenado.
Com efeito, a opção do legislador tem sido por uma maior severidade na punição do crime e sanção acessória correspondente, o que revela a sua intenção de classificar com maior severidade tal comportamento estradal, tendo essencialmente em consideração que o índice de sinistralidade das nossas estradas é decorrente de condutas relacionadas com o abuso do álcool.
Por outro lado, sucede que esta pena não é susceptível, atenta a sua natureza, de ser suspensa na sua execução ou substituída por caução, sob pena de violação do princípio da legalidade.
E finalmente, há que atender ao facto de tal pena acessória ter também em vista a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano, ou seja que tenha também um efeito que se pretende seja dissuasor de tais comportamentos de condução sob o efeito do álcool.
Pelo exposto, no caso sub iudice, atenta a função limitadora da culpa e as referidas exigências de prevenção, perante a impossibilidade de apurar a TAS, em virtude da recusa do arguido, considero adequada a pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pelo período de seis meses.
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O direito:
As conclusões formuladas pelo recorrente, delimitam o objecto do recurso.
A questão única suscitada prende-se com, a pena acessória que, entende o recorrente, deveria restringir-se à proibição de condução de veículos ligeiros.
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Na sentença recorrida, foram observados os critérios legais de escolha e determinação da medida da pena, bem como da sanção acessória.
Com a aplicação das penas visa-se a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente, artº 40º nº1 do Cód. Penal, sendo que quanto à medida da sanção de inibição deve ter-se em conta a perigosidade do agente.
Sendo que, em caso algum, a pena (sanção) pode ultrapassar a medida da culpa, artº 40º nº 2 do C. Penal.
Decorre, assim, de tais normativos que a culpa e a prevenção constituem os parâmetros que importa ter em apreço na determinação da medida da pena (sanção).
Importa ter em conta que as exigências de prevenção neste tipo de situações demandam uma severa punição, atento o número de sinistros rodoviários em Portugal, onde anualmente são ceifadas número elevado de vidas, muitas vezes causados pelo excesso de álcool (não foi o caso dos autos, felizmente).

Na génese da conduta do arguido, desobediência, está o excesso de álcool no sangue, situação que não pode ser olvidada.

As exigências de prevenção geral assumem incontornável relevo no caso sub judice, na medida em que amiúde se verifica a condução de veículos à total revelia das regras legais inerentes a tal actividade, a que acrescem os índices de sinistralidade rodoviária (também) por essa via verificados.

Há que ter em conta as finalidades da prevenção, quer geral, quer especial, incentivar nos cidadãos a convicção que comportamentos deste jaez são punidos e que também visam diminuir o índice de sinistralidade rodoviária, que é elevadíssimo e preocupante, assim como há que dissuadir o arguido para que não volte a prevaricar (e a questão coloca-se no plano da condução sob a influência do álcool, situação em que o arguido é repetente, e que foi o que despoletou a desobediência).

Realça-se, a inserção social do arguido e no mundo do trabalho.

Pondera-se o facto de necessitar da carta de condução para exercer a sua actividade profissional (circunstância que o arguido não ponderou antes de ingeriras bebidas alcoólicas).

Não tendo uma taxa de alcoolemia em concreto, não podemos esquecer que o teste de despistagem que deu positivo indicava 2,86 g/l.
O arguido não pode pretender ser beneficiado, pelo facto de ter-se recusado a efectuar o teste quantitativo.
A pena acessória só faz sentido enquanto sentida como tal pelo seu destinatário, e visa essencialmente prevenir a perigosidade do agente – cfr. Ac. desta Relação de 7-11-1996, in Col. jurisp. tomo V, 47.
Como salienta o prof. Figueiredo Dias in Direito Penal Português- As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 165, a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados tem como pressuposto material “a circunstancia de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável”, donde que “então essa circunstância vai elevar o limite da culpa do (ou pelo) facto”, acrescentando, “por isso, à proibição de conduzir deve também assinalar-se (e pedir-se) um efeito de prevenção geral de intimidação, que não terá em si nada de ilegítimo porque só pode funcionar dentro do limite da culpa"
Há que ter em conta todos estes vectores, sem sobrevalorizar, nem minimizar as consequências que a inibição de conduzir possa provocar na vida profissional do arguido.
Atenta a natureza de uma pena ou sanção, o condenado tem de senti-la sob pena de se poder traduzir em “absolvição encapotada”, e não surtir o efeito pretendido pela lei, o que aconteceria no caso delimitação da inibição a determinada categoria de veículos.
As penas e sanções têm essa designação, de outro modo não o seriam, nem constituiriam dissuasor necessário para prevenir as infracções, se não forem sentidas como tal, quer pelo agente, quer pela comunidade em geral.
O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, e todos os factos que alega na motivação do recurso (nomeadamente ser motorista profissional) deveriam ter sopesado no sentido de o dissuadir de praticar o crime, pois que lhe deveria incutir um especial dever de cuidado, que não teve.
Quanto a transtornos e incómodos que a impossibilidade de conduzir acarretará ao infractor, diremos que, é pelos incómodos e transtornos que causam que as penas e sanções têm essa designação, de outro modo não o seriam, nem constituiriam dissuasor necessário para prevenir as infracções.
Limitação da inibição a categoria determinada de veículos:

Do que já ficou dito resulta inequívoco que a inibição deve abranger todas as categorias de veículos com motor.

De outro modo não surtia qualquer efeito.
O recorrente só faz esse pedido por ser titular de licença de condução que abrange mais que uma categoria de veículos.
Se procedesse este pedido formulado no recurso, equivalia à não aplicação da sanção acessória da inibição.
O perigo para a segurança da circulação rodoviária que se pretende acautelar com a incriminação da condução sob o efeito do álcool, assim como a segurança das pessoas, advém exclusiva ou predominantemente da condução em estado de embriaguez e não da categoria de veículo motorizado conduzido.

A interpretação feita pelo recorrente ao art. 69 nº2 do CP, podendo ser uma das possíveis, temos que não será a mais correcta.

Entendemos que a interpretação mais correcta vai no sentido de entender que inexiste categoria de veículos com motor que possa ser excluída da possibilidade de inibição.

Para se entender que a inibição pode ser limitada a categoria determinada de veículos com motor, não teria o legislador na alteração produzida pela Lei nº 77/01, suprimido a expressão ”ou de uma categoria determinada”.

A não se entender assim ficariam frustrados os fins que se visam atingir com a norma que prevê a proibição de conduzir em consequência da condenação pelo crime de condução em estado de embriaguez, sendo certo que são os “profissionais do volante” – aqueles que exercem a sua profissão conduzindo veículos automóveis - que mais riscos à segurança da circulação e a quem se exige, consequentemente, um especial dever de cuidado no cumprimento das normas que visam salvaguardar a segurança, sua e dos demais cidadãos.
A prevenção especial, necessária in casu só se satisfaz com a inibição de conduzir abrangendo qualquer categoria de veículos motorizados.

Não se verifica um quadro especialmente relevante que permita restringir a proibição de conduzir apenas a alguns veículos motorizados.
Não basta ser-se motorista profissional, para que a inibição não abranja a categoria de veículos normalmente utilizada.
Dito de outra maneira, quem apenas esteja habilitado a conduzir veículos ligeiros, ser-lhe-ia irrelevante que o inibissem apenas de conduzir veículos pesados ou motociclos.
Assim, e como já referimos, propendemos para interpretar o art. 69 nº 2 do CP, no sentido de que a decisão de inibição “pode abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria”, engloba todas as categorias de todos os veículos a motor. Daí a alteração introduzida pela lei 77/01, que alterou a redacção do preceito que era, “pode abranger a condução de veículos motorizados de qualquer categoria ou de uma categoria determinada”, (sublinhado nosso).
Até porque não faria sentido que no caso de cometimento de crime a inibição de conduzir pudesse ser restrita a determinada categoria de veículos (ou excepcionada certa categoria), e no caso de contra-ordenação fosse extensiva a todas as categorias. O art. 147 do Código da Estrada com a epigrafe “inibição de conduzir” apenas refere que a sanção acessória consiste na inibição de conduzir, nº 1, acrescentando o nº 2 que a inibição “refere-se a todos os veículos a motor”.
Na redacção anterior é que havia a possibilidade de restringir a inibição a categoria determinada de veículos, agora não, já que a orientação foi no sentido de restringir “direitos” dos infractores (para tentar evitar sinistralidade estradal).

E, desta interpretação não resulta qualquer violação de princípios constitucionais, como alega o recorrente.

Violação do princípio constitucional da igualdade haveria no caso de se decidir no sentido do pretendido pelo recorrente. O recorrente pretende ser beneficiado, não inibido, pelo facto de ser motorista profissional, sendo que esse benefício traduziria desigualdade perante todos os condutores alcoolizados mas não motoristas de profissão. O recorrente é que pretende um tratamento desigual para o que é igual.

O facto de o recorrente não poder exercer a condução de veículos motorizados, não o impede de exercer qualquer outro tipo de actividade. Pelo que inexiste qualquer violação ao direito ao trabalho.

A proporcionalidade há-de verificar-se em função do facto cometido, e não em função da actividade exercida pelo recorrente, fora das circunstâncias em que os factos ocorrerem.

No entender do recorrente, o poder sancionatório do Estado é inconstitucional, porque qualquer pena ou sanção vai restringir, limitar direitos dos condenados (maxime a privação da liberdade).


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Face ao exposto entendemos ter ficado demonstrada a sem razão do recorrente, e a improcedência de todas as conclusões formuladas, e anão verificação de ofensa a qualquer dos princípios enunciados pelo recorrente.
Decisão:
Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação e Secção Criminal em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirma-se na integra a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 Ucs.

Coimbra,
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